Resumo: Em uma sociedade repleta de desavenças e dissídios decorrentes do convívio humano, nasce a necessidade de meios equivalentes de resolução desses conflitos. Nesse aspecto, a conciliação surge como uma ferramenta que busca a solução dessas desavenças de forma pacífica. O instituto da conciliação vem crescendo cada vez mais e se difundindo na sociedade como instrumento hábil na resolução de questões decorrentes do divórcio litigioso, tais como guarda, alimentos, direito de visitas e divisão de bens. Para resolução dessas questões, os envolvidos tendem a se submeterem a um processo custoso, dispendioso e desgastante, que muitas vezes se estendem por anos, atulhando o judiciário. Daí a importância desse método de autocomposição que, por meio de um terceiro imparcial, o conciliador, visa à solução dessas questões de forma célere, segura e eficaz, com vistas à instauração de um acordo entre as partes. No presente trabalho, serão investigados os principais aspectos da conciliação, suas características, previsão legal, diferenças em relação à mediação, princípios e regras e, especificamente, sua aplicação nas ações de divórcio litigioso. A relevância do estudo se justifica em preencher as lacunas sobre o tema e trazer a importância da promoção da conciliação nas ações de divórcio litigioso através de doutrinas, artigos, trabalhos acadêmicos, jurisprudências e julgados sobre o tema, os quais irão subsidiar e incrementar a elaboração do projeto. O objetivo geral é analisar o instituto da conciliação nas ações de divórcio litigioso. Os objetivos específicos são: Conceituar o instituto da conciliação e expor suas características; realizar levantamento estatístico sobre a conciliação nas ações de divórcio litigioso no município de Paracuru referente aos anos de 2015 a 2021 e apresentar análise doutrinária e jurisprudencial sobre a conciliação nas ações de divórcio litigioso. A metodologia adotada é fundada em pesquisa qualitativa e quantitativa. Qualitativa, visto que serão expostas peculiaridades sobre a conciliação, de forma a explanar como funciona esse instituto nas ações de divórcio litigioso. E também quantitativa, através da coleta de dados estatísticos tendo por base as ações de divórcio litigioso da Comarca de Vara Única Francisco Adalberto O Barros Leal no Município de Paracuru. A conciliação não é algo recente e vem ganhando espaço com o passar dos anos como método de solução de conflitos de forma célere, ampliando o acesso à justiça. No município de Paracuru não é diferente, a conciliação tem se mostrado eficiente e uma excelente ferramenta para aviltar a mora processual. Por meio da análise de dados coletados no Sistema de Automação da Justiça(SAJ), será possível analisar a eficiência da conciliação nas ações de divórcio litigioso no município de Paracuru, como também aspectos relacionados a esse instituto, tendo em vista que na comarca de Paracuru ainda não são realizadas audiências de mediação.
Palavras-chave: Conciliação. Divórcio litigioso. Paracuru.
1. INTRODUÇÃO
A conciliação é um método de autocomposição, que visa garantir maior celeridade no processo e a resolução pacífica de conflitos entre as partes. O novo Código de Processo Civil (CPC), Lei 13.105/2015, de 16 de março de 2015 (BRASIL, 2015), é responsável por tornar tal instituto obrigatório no âmbito do processo civil, estimulando a autocomposição. Sobre o tema, Freddie Didier (2017, p. 305) afirma que: (...) o estímulo à autocomposição pode ser entendido como um reforço da participação popular no exercício do poder no caso, o poder de solução dos litígios.
Todavia, o instituto da conciliação já existia antes do CPC/2015, e obteve status constitucional a partir da primeira Constituição de 25 de março de 1824, que trazia no seu artigo 161: Sem se fazer constar que se tem intentado o meio da reconciliação não se começara processo algum (BRASIL, 1824).
Nos anos seguintes, a conciliação foi trazida por diversas legislações, como a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), que ressaltou a necessidade de se buscar nos conflitos de trabalho, a conciliação entre as partes (BRASIL,1943)[1]. A Constituição de 1988 que, por sua vez, trouxe entre seus princípios nas suas relações internacionais a solução pacífica de conflitos (BRASIL, 1988)[2] e a Resolução n. 125 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ, 2010), que regulamentou a autocomposição no âmbito dos tribunais, trazendo procedimentos e regras para a solução de conflitos.
Sobre o instituto da conciliação, existe doutrinador que a conceitua como uma transação acordada entre as partes em juízo. Segundo Humberto Theodoro Júnior (2017, p. 153), A conciliação é uma transação alcançada em juízo, por meio da intervenção do juiz junto às partes, ou do conciliador ou mediador antes de começar a instrução processual.
Outrossim, embora não seja novidade, importante ressaltar como a conciliação foi valorizada no CPC de 2015, como um meio equivalente para resolução de dissídios, e com o passar dos anos vem se tornando cada vez mais presente e eficiente na promoção da pacificação social. Por sua vez, Fernanda Tartuce (2018, p. 70), Os meios consensuais fazem parte de um movimento para mudar a forma como a justiça é distribuída. Uma vez que a mediação e a conciliação foram desenvolvidas no curso das atividades judiciais, elas têm a capacidade de promover um novo pensamento sobre como alocar e fazer cumprir a jurisdição.
Nas ações de divórcio litigioso, não é diferente, a conciliação tem se mostrado uma forma bastante eficaz, evitando a frequente recorrência das partes ao judiciário e promovendo acordos de forma mais célere e pacífica, principalmente pelo fato de que, nessa forma de dissolução do casamento, os cônjuges não acordam sobre diversas questões atinentes ao divórcio, como divisão de bens, pensão, dentre outros.
A conciliação nas ações de divórcio litigioso tem o objetivo de evitar que as partes se submetam a esses desgastes. Todavia, optando as partes por ingressar no judiciário com uma ação de divórcio litigioso, inicia-se um processo mais longo e demorado, pois o tempo investido em uma disputa judicial pode ser significativo, sem esquecer-se da perda financeira que pode ocorrer para as partes, tais como custas, honorários advocatícios e juros. Nesse sentido, afirma Marinoni et al. (2017, p. 16) que: (...) os custos do litígio talvez recomendem a conciliação das partes, por meio de técnicas com as quais o conciliador possa sugerir as partes uma resposta ideal a seus problemas.
Por isso, se torna bem mais eficiente a solução desses conflitos decorrentes do divórcio litigioso a partir da conciliação. Nesse diapasão, Dinamarco (2019, p. 32) destaca que: A conciliação consiste na intercessão de um sujeito entre os litigantes com vista a persuadi-los à autocomposição sugerindo-lhes soluções e induzindo-os a se comporem amigavelmente.
Carlos Roberto Gonçalves (2017) ressalta sobre a possibilidade da reconciliação das partes nas ações de divórcio. O Código de Processo Civil prevê a realização de audiência prévia de conciliação que deve ser feita inclusive nas ações de família, como o divórcio litigioso. A própria Lei de Divórcio (Lei n°6.515/77) estimula a promoção da conciliação pelo juiz.
Para Tartuce (2018), nas causas cíveis a conciliação deve estar presente e é considerado um dever do juiz.
Outrossim, no presente trabalho será utilizado jurisprudências, artigos e pesquisa científica por meio da coleta de dados estatísticos, tendo por base as ações de divórcio litigioso referentes aos anos de 2015 a 2019, da Comarca de Vara Única Francisco Adalberto Barros Leal, localizada no Município de Paracuru, região metropolitana de Fortaleza.
2. ASPECTOS RELEVANTES SOBRE A CONCILIAÇÃO
A conciliação, mais precisamente nas ações de divórcio litigioso, está estritamente ligada a duas grandes áreas do Direito que é a disciplina de Direito Processual Civil, na parte que aborda sobre os meios equivalentes de resolução de conflitos e Direito Civil, mais especificamente com o Direito de Família.
O presente tópico tem o objetivo de demonstrar os efeitos do instituto jurídico da conciliação e sua aplicação no plano fático, destacando uma visão doutrinária e jurisprudencial sobre a matéria.
Nos últimos anos, muito vem se falando sobre métodos de resolução de controvérsias, para desenlace da grande demanda advinda do Poder Judiciário, com isso, o Novo Código de Processo Civil trouxe a possibilidade da realização da audiência de conciliação (SANTOS; ALEXANDRE, 2018).
É importante ressaltar que a Constituição Federal de 1988 consagrou como princípio fundamental nas relações internacionais a solução pacífica de conflitos (art. 4º, VII, CF) como também trouxe entre os direitos fundamentais, a garantia de um processo célere a partir de meios alternativos, nos termos do art. 5º, inciso LXXVIII (BRASIL, 1988), a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.
O instituto visa assegurar o princípio da razoável duração do processo e acesso à justiça, princípios fundamentais assegurados a todos os cidadãos.
Atualmente é perfeitamente possível vislumbrar o acesso à justiça com o objetivo de alcançar a pacificação social, sem recorrer ao judiciário. É o acesso à justiça pelos meios alternativos de solução de conflitos de interesses (RUIZ; PATTO, 2009).
Nas ações de família, o CPC/2015 impõe a todos os sujeitos processuais o dever de tentarem obter uma solução conciliada no litígio familiar. (PIMENTEL, 2016). Entretanto, em que pese a importância de conciliar, se faz necessário o respeito a autonomia da vontade das partes, que não poderão sofrer constrangimentos ou intimidações visando a autocomposição. (TARTUCE, 2015).
Outrossim, a Resolução n° 125/2010, de 29 de novembro de 2010 (CNJ, 2010), visou estimular a busca pela conciliação, e instituiu a Política Judiciária Nacional, que visa encorajar os órgãos judiciários a buscarem meios equivalentes de resolução dos conflitos, nos termos do art. 1° da referida resolução:
Art. 1º Fica instituída a Política Judiciária Nacional de tratamento dos conflitos de interesses, tendente a assegurar a todos o direito à solução dos conflitos por meios adequados à sua natureza e peculiaridade.
Parágrafo único. Aos órgãos judiciários incumbe, além da solução adjudicada mediante sentença, oferecer outros mecanismos de soluções de controvérsias, em especial os chamados meios consensuais, como a mediação e a conciliação, bem assim prestar atendimento e orientação ao cidadão.
Sobretudo faz-se necessário o estudo mais aprofundado sobre o instituto da conciliação, para compreensão de seus aspectos e sobre as formas de aplicá-la corretamente no caso concreto.
Ressalte-se que, tanto na separação judicial quanto no divórcio, a autocomposição se tornou a forma mais indicada para resolver esses tipos de litígios. Por isso, deve ser incentivada a conciliação. (RUIZ, 2005).
Ainda sobre o assunto, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) em sede de recurso especial se manifestou no sentido de que o juiz e todos os tribunais devem promover a conciliação:
RECURSO ESPECIAL - DIREITO DE FAMÍLIA - ALIMENTOS E GUARDA DE FILHOS - INCENTIVO À AUTOCOMPOSIÇÃO COMO FORMA DE RESOLUÇÃO ADEQUADA DE CONFLITOS. (...) 3. É inadiável a mudança de mentalidade por parte da nossa sociedade, quanto à busca da sentença judicial, como única forma de se resolver controvérsias, uma vez que a Resolução CNJ n.º 125/2010 deflagrou uma política pública nacional a ser seguida por todos os juízes e tribunais da federação,(...) consistente na promoção e efetivação dos meios mais adequados de resolução de litígios, dentre eles a conciliação, por representar a solução mais adequada aos conflitos de interesses(...)4. A providência de buscar a composição da lide quando o conflito já foi transformado em demanda judicial, além de facultada às partes, está entre os deveres dos magistrados(...)
(STJ - REsp: 1531131 AC 2015/0091321-6, Relator: Ministro MARCO BUZZI, Data de Julgamento: 07/12/2017, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 15/12/2017).
Com isso, pode-se dizer que a conciliação é de suma importância no processo civil, constituindo-se como um dos deveres do juiz no processo, todavia, não apenas o juiz deve promover a conciliação, conforme o art. 3°, §2° e §3° do NCPC (BRASIL, 2015):
Art. 3°. (...)
§ 2º O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos.
§ 3º A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial.
Extrai-se do dispositivo legal acima que promover a conciliação é também dever do Estado e de todos os envolvidos no processo
2.1 DIFERENÇAS ENTRE CONCILIAÇÃO E MEDIAÇÃO
É importante entender a diferença entre a conciliação e a mediação para saber aplicá-las de forma correta no caso concreto.
Tanto a conciliação como a mediação são formas alternativas de solução consensual de litígios que têm como objetivo restabelecer a comunicação entre as partes litigantes.
Nas palavras de Teodoro Júnior (2017, p. 567):
A conciliação e a mediação são métodos alternativos de resolução de conflitos, que vêm ganhando força nos ordenamentos jurídicos modernos, pois buscam retirar do Poder Judiciário a exclusividade na composição das lides. Ninguém melhor do que as próprias partes para alcançar soluções mais satisfatórias para suas contendas, chegando à autocomposição, por meio da alternative dispute resolution (ADR), na linguagem do direito norteamericano.
A conciliação e a mediação têm previsão legal no NCPC/2015, sendo dever do estado, como também de juízes, advogados, defensores, promotores e das partes promovê-las.
No art. 165, §3° e 4° do CPC (BRASIL, 2015), destaca-se a diferença entre os institutos da mediação e conciliação:
Art. 165.(...)
§ 2º O conciliador, que atuará preferencialmente nos casos em que não houver vínculo anterior entre as partes, poderá sugerir soluções para o litígio, sendo vedada a utilização de qualquer tipo de constrangimento ou intimidação para que as partes conciliem.
§ 3º O mediador, que atuará preferencialmente nos casos em que houver vínculo anterior entre as partes, auxiliará aos interessados a compreender as questões e os interesses em conflito, de modo que eles possam, pelo restabelecimento da comunicação, identificar, por si próprios, soluções consensuais que gerem benefícios mútuos.
Ou seja, essa diferença está pautada no vínculo entre as partes, pois na mediação necessariamente há vínculo anterior entre elas, já na conciliação não.
Outro aspecto é referente a atuação dos terceiros. Na mediação, o mediador atua de forma a restabelecer a comunicação entre as partes, já na conciliação, o conciliador atua de forma mais ativa, fazendo sugestões e alternativas para que as partes cheguem a um acordo.
Vale ressaltar que mesmo sendo necessária a atuação dos conciliadores e mediadores para restabelecimento do diálogo, ambos não podem expressar nenhum juízo de valor, ou seja, eles não podem tomar decisões ou impor condições, devendo atuar de forma imparcial. Seguindo essa linha de raciocínio, Tartuce (2018, p. 207) afirma que:
Além de impactar negativamente na autodeterminação das partes, uma atuação avaliadora do mediador poderá acabar afetando sua imparcialidade. O mediador precisa atuar com equidistância perante os participantes durante todo o procedimento, sob pena de ver comprometida a credibilidade de sua intervenção; ainda que não seja efetivamente parcial, há o risco de ele soar como tal perante um dos interessados, o que poderá comprometer a continuidade do procedimento.
O conciliador é um terceiro que atua nas audiências de conciliação com o objetivo de apaziguar conflitos entre as partes, buscando promover um acordo. Tartuce (2018, p. 54) conceitua o conciliador como:
Um profissional imparcial intervém para, mediante atividades de escuta e investigação, auxiliar os contendores a celebrar um acordo, se necessário expondo vantagens e desvantagens em suas posições e propondo saídas alternativas para a controvérsia, sem, todavia, forçar a realização do pacto.
Ressalte-se que para que o conciliador atue, tanto nas ações de divórcio litigioso, como nas demais ações, é necessário que ele não tenha vínculo anterior com as partes, pois ele é um terceiro imparcial, que conduzirá as partes á estabelecer um consenso, sem contudo, usar de força ou coerção.
Sobretudo nas ações de divórcio, o conciliador não tem poder de decisão, podendo mostrar alternativas e sugestões para levarem as partes à realização de um acordo, devendo orientar as partes a buscarem um meio mais célere de resolver os litígios decorrentes da ação, evitando problemas futuros, e perca de tempo e dinheiro. Nas palavras de Scavone Junior, No mundo contemporâneo, o profissional deve estar preparado para negociar e buscar a conciliação, deixando a Jurisdição como via posterior e reservada a conflitos de maior complexidade. (2018, p. 04).
Sobretudo, cabe às partes no divórcio o direito de escolherem o conciliador, sendo este cadastrado ou não no tribunal. Ademais, os conciliadores são auxiliares da justiça, conforme dispõe o art. 149, caput do NCPC (BRASIL, 2015):
Art. 149. São auxiliares da Justiça, além de outros cujas atribuições sejam determinadas pelas normas de organização judiciária, o escrivão, o chefe de secretaria, o oficial de justiça, o perito, o depositário, o administrador, o intérprete, o tradutor, o mediador, o conciliador judicial, o partidor, o distribuidor, o contabilista e o regulador de avarias.
Sendo assim, os conciliadores estão sujeitos aos mesmos impedimentos, direitos e deveres conferidos aos demais auxiliares da justiça.
Quanto ao tipo de conflito, a conciliação é indicada para conflitos objetivos, menos complexos e pontuais, já na mediação os conflitos são mais subjetivos, profundos e emocionais.
2.2 DOS PRINCÍPIOS QUE REGEM A CONCILIAÇÃO
Princípios são padrões de conduta a serem seguidos, fundamentos e características que servem como base para interpretação ou compreensão de determinado assunto.
Conforme Tartuce (2018, p. 213), No nível normativo, a relevância desses princípios foi amplamente reconhecida. O CPC / 2015 apontou que no art. 166. Os princípios orientadores da mediação e mediação judiciária são independência, imparcialidade, autonomia de vontade, confidencialidade e oralidade, informalidade e decisão informada.
Entre os princípios que regem a conciliação tem-se:
Princípio da independência: Esse princípio diz respeito à atuação dos conciliadores, sendo que eles devem atuar de forma independente, sem sofrer restrição, coação ou subordinação, assegurando assim maior autonomia nos acordos.
Princípio da imparcialidade: O conciliador deverá manter um distanciamento das partes, não podendo ter nenhum tipo de envolvimento anterior com os litigantes, podendo ser arguido suspeição ou impedimento contra o conciliador que violar esse princípio.
Princípio da isonomia: Esse princípio deriva do princípio da imparcialidade, na qual o conciliador deverá tratar as partes de forma igual, se qualquer preferência ou distinção quanto á sexo, cor, religião, capacidade financeira e etc.
Princípio da autonomia da vontade: O intuito da conciliação é fazer com que as partes cheguem a um acordo. As especificações e as regras do procedimento conciliatório deverá atender a autonomia da vontade das partes.
Princípio da busca do consenso: Tal princípio visa evitar a adversariedade entre as partes, fazendo com que as partes busquem um consenso de forma a solucionar os conflitos de forma pacífica.
Princípio da confidencialidade: Diz respeito ao sigilo sobre as informações no curso do procedimento. Esse sigilo deve ser mantido não apenas pelas partes, como também pelo conciliador, que não poderão expor ou depor sobre informações que tiverem conhecimento através da atuação no processo.
Princípio da oralidade: A audiência de conciliação será sempre oral, preservando a comunicação entre as partes e o conciliador, que promoverá a restauração do diálogo entre as partes.
Princípio da informalidade: Na conciliação não existem regras preexistentes, fazendo com que as audiências sejam informais, sendo as normas decididas pelas partes.
(THEODORO JÚNIOR, 2017, p. 575-576).
Pelo princípio da independência o conciliador deve agir de forma independente, sem sofrer coações, restrições ou impedimentos, podendo atuar livremente na conciliação. Quanto ao princípio da imparcialidade, diz respeito ao distanciamento que o conciliador deve ter das partes, devendo agir de forma neutra durante toda a conciliação.
Todavia, nada impede de o conciliador dar alternativas para melhor resolução dos conflitos, aplicando diversas técnicas visando estabelecer um cenário viável a autocomposição, não afetando o dever de imparcialidade.
O princípio da autonomia das vontades diz respeito ao direito das partes decidirem sobre as regras, formas e o resultado do acordo celebrado entre elas.
O princípio da confidencialidade deve ser obedecido para que seja garantido o sigilo durante as sessões de conciliação, pois não é permitido que as informações produzidas durante a audiência de conciliação sejam reveladas em outros processos.
O princípio da informalidade é importante no sentido de promover uma conversa mais informal e sem regras exageradas, proporcionando uma maior descontração e flexibilidade para facilitar o diálogo entre as partes envolvidas objetivando uma melhor negociação entre os sujeitos.
Segundo Teodoro Júnior (2017), conforme o princípio da decisão informada, as partes têm o direito de obter informações sobre seus direitos e alternativas acordadas. O acordo deve conter todas as normas e regras acordadas por ambas as partes.
Nas palavras de Tartuce (2018, p. 219), O princípio da autonomia de vontade e decisão informada é imprescindível, para que os interesses do mecanismo de consenso das partes interessadas não sejam prejudicados; estes devem ser amparados na sua liberdade ao máximo e dispor de informações suficientes para que possam obter resultados satisfatórios. A violação dessas diretrizes costuma ser fatal em termos de credibilidade e até mesmo da utilidade da autoconstrução.
Desta feita, nota-se que é imprescindível que as partes tenham todas as informações necessárias para celebrarem um acordo eficaz e satisfatório.
2.3 DA CONCILIAÇÃO PRÉ-PROCESSUAL E PROCESSUAL E DA PRESENÇA DE ADVOGADO
Sabe-se que a conciliação é uma forma de facilitar o acesso à justiça e conforme o NCPC/2015, a conciliação deve ser promovida a qualquer tempo, por isso há a hipótese de ser realizada antes mesmo do início do processo, que é a chamada conciliação pré-processual.
Essa modalidade acontece quando a ação é passível de autocomposição, com isso é realizada a conciliação no objetivo de instaurar acordos, e posteriormente os termos serão encaminhados ao juiz que realizará a homologação.
A respeito da conciliação pré-processual, o Conselho Nacional de Justiça tem o seguinte posicionamento:
Esse procedimento se constitui em um método de prevenção de litígios e funciona como opção alternativa ao ingresso na via judicial, objetivando evitar o alargamento do número de demandas nos foros e a abreviação de tempo na solução das pendências, sendo acessível a qualquer interessado em um sistema simples ao alcance de todos. [] A principal característica dessa modalidade de conciliação é a promoção de encontros entre os interessados, nos quais um conciliador buscará obter o entendimento e a solução das divergências por meio da composição não adversarial e, pois, ainda antes de deflagrada a ação. [].
(CAVALCANTE, 2013, apud PROJETO MOVIMENTO PELA CONCILIAÇÃO, 2006, p. 02).
Com isso, facilita ainda mais o acesso à justiça, possibilitando um acordo que será mais rápido, antes mesmo de iniciar o processo.
Segundo Araújo (2018, apud CALMON, 2013, p. 136), a conciliação pré-processual visa evitar um processo custoso e demorado:
Considera-se conciliação pré-processual aquela que se desenvolve sem que haja processo judicial em curso, mas, por se tratar de conciliação e não de mediação, é realizada no âmbito do Poder Judiciário. Esse é o espaço próprio para o Poder Judiciário atuar na tentativa de evitar o processo judicial. Trata-se da hipótese em que é criado um setor de conciliação para proporcionar aos envolvidos no conflito um mecanismo que proporcione a obtenção do acordo e, por consequência, que seja evitado o custoso e burocrático processo judicial. Denomina-se pré-processual porque o processo será instaurado posteriormente exclusivamente para homologação do acordo obtido ou, para a solução heterocompositiva, caso não se logre êxito na obtenção do acordo (...)
Já a conciliação processual é aquela realizada após o início do processo, que poderá ser efetivada mesmo se já houver sido proposta anteriormente, conforme art. 359, do NCPC (BRASIL, 2015):
Instalada a audiência, o juiz tentará conciliar as partes, independentemente do emprego anterior de outros métodos de solução consensual de conflitos, como a mediação e a arbitragem.
A diferença entre conciliação pré-processual e processual é que na conciliação pré-processual a ação não foi instaurada, não sendo obrigatório existir um processo para ela ser realizada, já na conciliação processual, o processo já foi instaurado anteriormente.
Sobre a conciliação processual, Araújo (2018, apud CALMON, 2013, p. 137) afirma que:
A conciliação processual ocorre concomitantemente ao processo e é desenvolvida no ambiente judicial. Pode ser levada a efeito pelo próprio juiz da causa ou por um conciliador. A primeira faz parte do procedimento e encontra-se prevista em diversos dispositivos da legislação processual brasileira, desde a Consolidação das Leis do Trabalho, de 1943, ate o Código de Processo Civil, constantemente atualizado, que sugere a conciliação em todas as fases do processo. A conciliação judicial desenvolvida por conciliador assemelha-se á pré-processual(...)
Todavia, ressalte-se que a conciliação processual não evita o processo. Ademais, tanto na conciliação processual como pré-processual, os advogados exercem o papel de defender os interesses dos clientes, visando um possível acordo entre as partes.
Conforme o NCPC/2015, a presença de advogado é obrigatória nas audiências de conciliação, é o que traz o §9°, do art. 334 do NCPC (BRASIL,2015).
Todavia, sem a presença de advogado, a audiência de conciliação se torna nula, conforme jurisprudência do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, in verbis:
APELAÇÃO CÍVEL. FAMÍLIA. DIVÓRCIO. ACORDO. AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO. SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA. PARTE RÉ DESACOMPANHADA DE ADVOGADO. NULIDADE. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA.O NCPC, em seu art. 334, § 9º, prevê expressamente que, na audiência de conciliação ou de mediação, as partes devem estar acompanhadas por seus advogados ou defensores públicos. Apesar do acordo entabulado entre as partes, homologado por sentença proferida em audiência de conciliação, a demandada estava desacompanhada de advogado, o que torna nulo o ato processual.DE OFÍCIO, DESCONSTITUÍRAM A SENTENÇA. UNÂNIME.
(Apelação Cível, Nº 70082894510, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Julgado em: 30-01-2020) (TJ-RS - AC: 70082894510 RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Data de Julgamento: 30/01/2020, Oitava Câmara Cível, Data de Publicação: 04/02/2020).
Nota-se que apesar haver acordo entre as partes, homologado por sentença, a audiência de conciliação em que não comparecer advogado torna-se nula, sem produzir nenhum efeito.
Todavia, o CNJ (2020) já tomou posicionamento diferente. Por maioria dos votos do plenário, decidiu não ser obrigatória a presença de advogado em conciliações nos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (CEJUSC).
A decisão foi tomada com base na resolução n° 125/2010, onde traz a permissiva da atuação de advogado, contudo, não tornando tal atuação obrigatória, conforme art. 11 da resolução n° 125/2010 (CNJ, 2010): Art. 11. Nos Centros poderão atuar membros do Ministério Público, defensores públicos, procuradores e/ou advogados.
2.4 A IMPORTÂNCIA DA CONCILIAÇÃO
Desde os primórdios, existem na sociedade relações humanas muitas vezes que são marcadas por práticas oriundas da autotutela, em que a justiça deve ser feita com as próprias mãos, fazendo jus à lei de Talião: olho por olho e dente por dente, gerando mais conflitos e desestabilizando a sociedade como um todo.
Outra prática também comum é a extrema recorrência ao judiciário para resolução de desavenças, fazendo com que a máquina pública fique cada vez mais atulhado, tornando o processo que já não é tão rápido, mais demorado ainda, evidenciando a cultura do litígio.
Na área familiar não é diferente, os casais muitas vezes motivados pelo sentimento de ódio e vingança acabam optando pela violência por conta de questões decorrentes do divórcio, ou então decidem ingressar com uma ação de divórcio litigioso no judiciário, como uma forma de se vingar e verem o quanto antes seus pedidos julgados procedentes.
Todavia, o Estado não tem a capacidade de resolver de forma pacífica todos os litígios, tendo em vista o aumento populacional, fazendo com que as demandas de divórcio litigioso cresçam cada vez mais, com processos que se estendem por anos.
É por essas e outras razões que se faz cada vez mais necessário a busca por alternativas consensuais para resolução desses conflitos decorrentes da convivência humana. Nesse âmbito, a conciliação se mostra como um meio bastante eficaz para a solução pacífica de dissídios. Conforme a Ministra Ellen Gracie (2007, online):
Uma Justiça mais acessível, efetiva, simples e informal é o que deseja a população brasileira. A adoção da conciliação tem se revelado fórmula hábil para atender a esse anseio(...)
É indispensável divulgar a existência de uma maneira nova de resolver as querelas. Sentar para conversar, antes ou depois de proposta uma ação judicial, pode fazer toda a diferença.
Nessa perspectiva, a conciliação tem se mostrado ferramenta importante para desafogar o judiciário e tem se tornado um dos caminhos mais viáveis para resolução de conflitos decorrentes do divórcio litigioso.
O principal aspecto que faz com que seja tão importante conciliar nas ações de divórcio litigioso é a prevenção de conflitos.
Os benefícios são inúmeros para as partes quando elas optam pela conciliação para resolução do divórcio litigioso. Pois ambas terão uma rápida resolução das controvérsias, evitando maiores desavenças e mantendo uma boa relação entre os envolvidos, retirando o espírito de animosidade entre elas e primando pela boa convivência.
Outro benefício é o restabelecimento da comunicação entre as partes, possibilitando a discussão de questões decorrentes do divórcio litigioso e encontrar saídas para o impasse, fazendo com que as partes pactuam acordos de forma voluntária e que atendam às suas necessidades.
A conciliação também é importante no divórcio litigioso para a instauração da pacificação social, abandonando a cultura do litígio e intensificando a cultura da paz. Segundo Tartuce (2018, p. 245):
Pacificar com justiça é a finalidade almejada por todo método idôneo de composição de controvérsias. Não se trata, porém, de tarefa simples; por envolver o alcance de um estado de espírito humano, pacificar abrange aspectos não apenas jurídicos, mas sobretudo psicológicos e sociológicos.
Ou seja, para a promoção dessa pacificação, faz-se necessário a mudança de mentalidade da sociedade, que deverá abrir espaço para formas mais pacíficas e eficazes de resolver os dissídios. Nessa linha de pensamento, a Ministra Ellen Gracie (2007, online) afirma que:
É necessário que os agentes envolvidos - magistrados, promotores, advogados, defensores e principalmente as próprias partes - promovam profunda alteração de mentalidade e adotem a disposição de modificar condutas consolidadas por longos anos de atuação com foco na litigiosidade.
Outrossim, sabe-se que a sociedade necessita de formas de resolução de conflitos, e com o passar dos anos a conciliação vem buscando atender essas necessidades, prevenindo conflitos, resolvendo controvérsias de forma pacífica restabelecendo a comunicação entre as partes, buscando manter uma boa relação entre as partes e promovendo a cultura da pacificação social na sociedade, se mostrando como o caminho mais eficaz para o acesso à justiça de forma célere, segura e eficiente.