Assumir o risco(doloso) X Negligência,imperícia ou imprudência(culposo)
O art. 18 do CP possui a seguinte redação:
Diz-se o crime:
I - Doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo;
II - Culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, imperícia ou negligência.
A minha dúvida consiste no seguinte fato:
Um sujeito, andando em seu automóvel a uma velocidade de 200 KM/H acaba atropelando um pedestre e este vem a morrer. Ouvi dizer que tem juízes enquadrando os que assim procedem em crime doloso, no caso, o sujeito assumiu o risco de produzir o acidente visto que a velocidade empreendida em seu automóvel é considerada inadmissível!
Está certa a interpretação dos magistrados? Que outros tipos de exemplos podemos utilizar para exemplificar no caso de dolo o assumir o risco de produzir?
Penso que não, pois ainda que o sujeito tivesse a possibilidade de prever o resultado, não era a intenção dele causar o evento morte (confia-se de que não ocorrerá nenhum acidente). Difere do dolo eventual em que o agente prevê o resultado e assume o risco de produzi-lo, ou seja para o agente é indiferente que ocorra ou não o resultado morte.
É amarga a diferença entre o dolo eventual e a culpa consciente nesse caso.
Sabe-se que o dolo eventual existe sempre que o agente, prevendo o desastre que seu ato pode provocar, assume o risco de produzi-lo e pratica o ato "a qualquer preço", sendo indiferente à referida possibilidade de resultado naturalístico. Se o agente prevê o resultado, sabe que este poderá ser causado por seu ato e ainda assim resolve arriscar, o dolo eventual poderá existir quando o resultado se efetivar.
No dolo eventual, portanto, o agente sabe do resultado e pensa consigo mesmo que "dê no que der vou praticar o ato, custe o que custar."
Um casal, sabendo da gravidez indesejada da moça, resolve cometer o crime de aborto. Para isso resolvem adquirir uma substância proibida para gestantes, pois seus efeitos tiram a vida do feto.
O namorado da moça gestante, estudante de medicina, sabe que naquelas condições, se sua namorada ingerisse aquela substância poderia falecer, o que não era desejado, pois a morte desejada era somente a do feto.
Contudo, resolve arriscar e concorda que a moça use a referida medicação. A moça vem a falecer pelo uso da medicação.
Trata-se de um caso típico de dolo eventual.
Já na culpa consciente o agente, tendo também plena consciência da possibilidade do resultado indesejado, acredita, crê, confia que naquela situação o resultado não se dará.
A diferença básica entre a culpa consciente e o dolo eventual reside justamente no seguinte: na culpa consciente o agente tem a crença, a confiança de que o resultado, ainda que sendo possível, naquela circunstância não se efetivará. Ele sabe que há a possibilidade, porém crê que nessa situação não ocorrerá. Já no dolo eventual, o agente consciente do possível resultado e sabendo que poderá efetivamente ocorrer, ainda assim, arrisca.
Pode-se tomar o exemplo acima citado do casal e adaptá-lo a uma situação de culpa consciente: o rapaz, sabendo da possibilidade do resultado, crê, confia plenamente que naquela ocasião a ingestão da substância pela sua namorada não dará causa a sua morte. Contudo, sua espectativa de que não ocorreria a morte de sua parceira é contrariada pelo resultado naturalístico morte.
Após esse rápido comentário, deve-se afirmar que no caso do agente que conduz seu veículo em alta velocidade, para que seja considerado dolo eventual, deve ter-se como provada a indiferença do agente para com o possível resultado.
Contudo, se ele sabia do resultado mas naquele caso tinha plena confiança de que nada ocorreria, por ser, por exemplo, horário de pouco movimento, em que quase ninguém se via pelas ruas, temos então um caso de culpa consciente.
De tudo isso, tem-se que reconhecer que a realidade é muito mais vasta e extensa do que nossa capacidade de prevê-la e até de conhecê-la, e assim sendo, somente com a análise e estudo do caso concreto, das circunstâncias que o rodeavam é que se poderá definir se se trata de fato típico doloso ou culposo.
Somente o estudo aprofundado da realidade do caso concreto poderá dizer se a interpretação dos magistrados está ou não razoável.
A realidade é muito mais ampla do que nossa capacidade de conhecê-la. Contudo, ter uma noção ao menos aproximada da realidade é essencial para uma razoável aplicação do direito penal objetivo.
Qualquer crítica, favor enviar para [email protected]. Com certeza serão muito bem-vindas, já que é com as análises críticas que se aprende, que se evolui.
O mais importante,nos casos de colisões de veículos é analizar o tamanho do risco que foi assumido,entendermos juridicamente uma vioência de trânsito simplesmente como acidente e que deve ser analizado pela lei especial de trânsito 9503/97 art 302 homicídio culposo vejo como uma falha enorme do nosso ordenamento jurídico. É necessário o entendimento que o direito tem uma responsabilidade social enorme e não podemos banalizar vidas como tem acontecido no país. O Brasil é o país campeâo em mortes no trânsito no mundo. A pessoa que dirige embriagado,sem habilitação,e fazendo pegas,andando em alta velocidade burlando as leis de trânsito e matando pessoas inocentes.deveria ter o tratamento de criminoso que assumiu o risco de matar. país