Qual é o crime ?
O indivíduo que pára numposto de gasolina, diz ao frentista para encher o tanque e sai do local sem efetuar o pagamento. Seria furto, furto mediante fraude, estelionato ou até mesmo apropriação indébita ?
Caro Hudson, é uma questão interessante, mas não inédita, como você vai verificar.
Vejamos as suas hipóteses:
Art. 155 - furto - subtrair é o verbo, o tipo penal exigido. A toda evidência, subtração não houve. Furto com fraude, também não é o caso, pois a subtração não se fez presente.
Art. 171 - Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento.
No caso, houve obtenção de vantagem, para o próprio autor do delito, pela que vc narra em sua questão. Houve indução do frentista a erro. É fácil afirmar-se isso. Mediante artifício? Não, claramente. Ardil? talvez. Ou qualquer outro meio fraudolento? Sim. É possível encaixar a conduta nesta regra de interpretação analogica, permitida pelo próprio comando legal (não se trata de analogia).
Note que analogia é diferente de interpretação analogica. Estariamos usando a anlogia se, por acaso, tipificassemos o delito como "outras fraudes", previsto no art. 176, que preceitua "tomar refeição em restaurante, alojar-se em hotel ou utilizar-se de meio de trasnporte sem dispor de recursos para efetuar o pagamento".
Em apoio a resposta apresentada, veja o seguinte Acórdão do TJDF: etiqueta acórdão
Órgão : Primeira Turma Criminal Classe : APR APELAÇÃO CRIMINAL N. Processo : 19.696/99 Apelante : ALEXSANDER ALVES DE SOUZA Apelada : JUSTIÇA PÚBLICA Relator Des. : EVERARDS MOTA E MATOS
EMENTA APELAÇÃO. FURTO. ESTELIONATO. CONDENAÇÃO. PROVA. NEGATIVA DE AUTORIA. - A apreensão da res furtiva , um automóvel, em poder do réu, com quem se encontrou uma chave "micha", aliada às circunstâncias da prisão, faz prova bastante da autoria do furto, restando o estelionato, como crime outro praticado, confirmado pelos frentistas do posto de abastecimento onde o golpe fora perpetrado, com o fito de evitar o pagamento do combustível.
ACÓRDÃO Acordam os Desembargadores da 1ª Turma Criminal do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, EVERARDS MOTA E MATOS - Relator, NATANAEL CAETANO Revisor e OTÁVIO AUGUSTO - Vogal, sob a presidência do Desembargador P. A. ROSA DE FARIAS, em CONHECER. IMPROVER. UNÂNIME, de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.
Brasília-DF, 16 de setembro de 1999.
Desembargador P. A. ROSA DE FARIAS Presidente
Desembargador EVERARDS MOTA E MATOS Relator
RELATÓRIO
ALEXSANDER ALVES DE SOUZA foi condenado, respectivamente, a 02 anos de reclusão, por furto qualificado. e 01 ano de reclusão, por estelionato, em concurso material - art. 155, § 4º, III e IV e 171, caput, c/c art. 69, todos do CPB. Inconformado, interpõe apelo, postulando absolvição por insuficiência de provas a justificar o decreto condenatório - art. 386, VI, do CPP, negando a autoria dos crimes a ele imputados, praticados em concurso. Contra-razões do MP às fls. 142/145. A douta Procuradoria de Justiça ofertou parecer opinando pelo conhecimento e improvimento do recurso. É o relatório.
VOTOS O Senhor Desembargador EVERARDS MOTA E MATOS - Relator Conheço do recurso, presentes seus pressupostos. Condenado por furto qualificado, insurge-se o apelante, via assistência judiciária, contra a r. sentença condenatória, sob o fundamento de inexistirem nos autos provas suficientes da autoria do delito. Inobstante a negativa de autoria do acusado, em ambas as fases, encontram-se nos autos provas substanciais a respeito de sua participação, tanto no furto do veículo quanto no estelionato. Há estreita compatibilidade entre os depoimentos do frentista do posto e dos policiais que perseguiram o acusado, efetuando o flagrante. A presença do Apelante nas imediações do posto de gasolina, enquanto o comparsa enchia o tanque, além da circunstância de terem empreendido fuga ao avistarem a viatura da PM, é fato provado. Foi encontrada, ainda, uma chave micha no interior do veículo, cuja eficiência para abrir portas e acionar ignição de automóveis restou confirmada pela perícia de fl. 64. Além do mais, a versão do Réu, de que estaria apenas de carona com Ricardo, um menor, não encontra ressonância no contexto probatório, e acaba até sendo contraditada por este comparsa (fl.102). Sem nenhuma procedência probatória, nem mesmo indiciária, a indicação de terceira pessoa, incerta e indeterminada, como autora dos fatos, feita pelo comparsa menor (Ricardo), que apenas aduziu a um certo "Junior", confessando, porém, o não pagamento do combustível. Quanto à testemunha da defesa, MARLENE DUARTE RODRIGUES (fl. 91v), seu depoimento não enseja álibi capaz de elidir a autoria do crime, ao contrário, confirma que o comparsa RICARDO "chegou à festa e o chamou, acha a depoente para andar de carro". Há pois prova suficiente da autoria e materialidade do crime, inviabilizando a pretensão absolutória, pelo que nego provimento ao recurso para manter, na íntegra, a r. sentença a quo, que impusera o cumprimento da pena em regime aberto. É como voto.
O Senhor Desembargador NATANAEL CAETANO Revisor
Condenado a 03 anos de reclusão, em regime aberto por infração aos art. 155, § 4º, III e IV e art. 171, caput, c/c art. 69, todos do CP, interpôs o réu o presente recurso, sustentando, em síntese, que as provas colhidas são insuficientes para respaldar o decreto condenatório, razão pela qual postula a absolvição. Narra a denúncia que o apelante foi preso em flagrante, em companhia do menor Ricardo, na posse da res furtiva - veículo GM/Opala Comodoro SL/E, ano 90, placa BOF 1981-DF. Dentro do veículo foi encontrada uma chave tipo micha. Consta, também, que abasteceram o veículo no Posto Guarapari fugindo sem pagar o combustível. As provas coligidas não permitem outra conclusão, destacando-se, neste sentido o Auto de Prisão em Flagrante; o Laudo de exame de veículo e de eficiência de objeto (fls. 62/64); o depoimento dos policiais e do frentista Posto Guarapari; as declarações do menor Ricardo de Sá Aguiar (fls. 102). A versão apresentada pela defesa, não conseguiu convencer o magistrado que assim se manifestou às fls. 120, compete ao acusado dar uma explicação razoável para encontrar-se na posse do objeto furtado. E no caso, tal versão não se coaduna com a versão do menor (à época dos fatos) Ricardo que em seu depoimento relatou uma terceira pessoa de nome Júnior como sendo a pessoa que pediu que abastecesse o carro. Correta, pois, a r. sentença hostilizada quando concluiu pela sua condenação. Ante o exposto, nego provimento ao apelo. É como voto.
O Senhor Desembargador OTÁVIO AUGUSTO - Vogal De acordo.
DECISÃO Conhecido. Improvido. Unânime.
Poderia ser enquadrado como "furto" (art. 155, CP) ou "estelionato" (art. 171, CP).
O "furto" é a subtração de coisa alheia; mas é praticado de forma que ninguém vê o crime sendo cometido. Ou seja, ninguém sabe quem subtraiu...simplesmente se dá a falta da coisa.
Já o "estelionato" é a obtenção, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, INDUZINDO OU MANTENDO ALGUEM EM ERRO, mediante ARTIFICIO, ARDIL, ou QUALQUER MEIO FRAUDULENTO. Que foi o caso.
Eu ficaria, tranquilamente, sem medo de errar, com "estelionato".