Todas essas definições de justiça apresentadas são metafísicas. Está no momento de reconstruirmos filosoficamente, com um paradigma pós-moderno, o conceito de justiça. Primeiramente, justiça nao é um ideal. é um discurso. Leia os clássicos, desde heráclito a teógnis, desde cícero e a retórica, que a justiça é produto linguístico, é produto da construção linguístico-retórica. Se nao for entendida assim, continuaremos na metafísica essencialista, definitória apriorística de conceitos estanques e não-pragmatizáveis do justo, pois uma teoria da justiça que não seja processualizável em termos linguísticos e discursivos nao é democraticamente participativa nem gnoseologicamente aberta a sínteses de construção e re-construção de sentido.
A justiça tratada como ideal gerou mártires, sangue e lágrimas. Vejam: o senhor feudal que ordenava a morte do servo que lhe furtava comida considerava agir com justiça. O burguês que denuncia o empregado à polícia pelo mesmo motivo do senhor, também considera agir com justiça. Muito bem. Enquanto justiça formal, que é a justiça à luz de uma visão sobre a legalidade da conduta(como coloca felix openheim in:dicionário de filosofia, edunb, brasília, verbete 'justiça') ambos os "senhores" estão 'corretos'. Mas a discussao sobre o justo termina por aí. Onde atua o contraditório efetivo da parte do empregado e onde adentra nesse discurso de punibilidade a meta-ética(openheim, op. Cit.) de construção do justo dentro de um paradigma estruturante de um discurso contraposto. Ora, não se estar aqui nem defendendo a priori o "valor social" ou 'valor humanitário', estra-se defendendo uma visão crítica e discursiva sobre um conceito de justiça que se deva estruturar discursivamente. O justo tratado como valor a priori é sempre perigoso, é direcionado por poucos, os 'donos dos sentidos', daqueles que podem vislumbrar a 'verdade" . A constituição tratada como ordem de valores apriorísticos é assaz perigosa, como alertou robert alexy em crítica a rudolf smend(nazista).
Ora, como disse foucault('a verdade e as formas jurídicas', editora nau-puc-rio, rio de janeiro), a verdade jurídica é uma relação contruída a partir de um paradigma de poder, de um poder-saber que estrutura discursos de dominação na maioria das vezes.
Assim, não basta um simples contraditório processual e a 'ampla defesa". Deve haver é o tratameto linguístico do discurso jurídico, com a análise desse discurso e a possibilidade de trabalhar com as aporias linguísticas do mesmo, para revelar possíveis contradições e incongruencias das 'tábuas de valor". A decisão pela justeza de um discurso passa bem mais que a visão privilegiada de um intérprete. Passa bem mais que por uma idéia de ulpiano de "dar a cada um o que é seu'. Dar o que a quem(interrogo). Dar como e de que modo(interrogo). A pessoa destinatária da sanção ou o autor da ação devem ter a oportunidade de construir seus valores a luz da análise discursiva e manusear o instrumental processual para a defesa de posições dentro do discurso aberto da normatividade a ser construída(partindo do paradigma de friedrich muller que norma é sempre o produto de uma interpretação e nao um texto acabado apriori, essencial - e diríamos de uma interpretação com sentido linguistico).
Assim, dizer o justo, preconizar o justo é a tarefa de estruturação de discursos jurídicos conflitantes dentro de uma estrutura processual posibilitadora de tal discursividade, com capacidade isocrítica constante para os participantes(teoria neoinstitucionalista de rosemiro leal- puc-minas). Ora, o conceito de justiça é a de um discurso construído dentro de uma instancia de poder, e construído dentro de uma processualidade - afinal, definir a justiça é definir a verdade jurídica, o que somente pode ser feito dentro de análise dos jogos de linguagem que se cruzam, que se combatem, como diz lyotard( 'o pós-moderno'); para lyotard nao existe um discurso a priori correto, mas narrativas entrecruzantes.
Somento o processo isocrítico e com estruturaçao dentro de um paradigma democrático-constitucional de fiscalização constante das premissas discursivas pode levar a um processo justo e a um direito justo em algum sentido - rosemiro leal(teoria processual da decisão jurídica, landy, são paulo)
assim, justiça é a busca da processualidade para que os agentes partícipes do processo e, lato sensu, toda a sociadade possam participar e controlar a institucionalização do justo.
Paradigma conceitual interessante dessa construção do justo é o traçado por serge-cristophe kolm("teorias da justiça", martins fontes, são paulo), para esse autor, justiça é poliarquia moral e racional circunscrita, efetivada dentro de um médoto de justeza e justificação. Isto é, justiça é justificação de posições morais, éticas, filsoófica e qualquer idéia que as partes queiram firmar(nao há verdades essenciais) ,mas construídas dentro de um processo de discussão da processualidade da narrativa e operando com a justificção à luz do ordenamento jurídico e seus valores intrínsecos(democraticamente decididos).
Não há um conceito apriórico de justo, há entrecruzamentos de narrativas que construem discursos que pretendem ser justos, que pretendem defender posições dentro da linguagem jurídica. Lembrem-se de nietzsche: "fatos é o que não há, mas apenas interpretações"