Segue acórdão firmado em 10/10/2012, onde o relator Min. Luiz Fux manteve a sentença favorável ao autor, servidor do INSS, no sentido de ter o seu auxílio alimentação equiparado ao do TCU.
RE 711429 / SC - SANTA CATARINA
RECURSO EXTRAORDINÁRIO
Relator(a): Min. LUIZ FUX
Julgamento: 10/10/2012
Publicação
PROCESSO ELETRÔNICO
DJe-202 DIVULG 15/10/2012 PUBLIC 16/10/2012
Partes
RECTE.(S) : INSTITUTO NACIONAL DE SEGURO SOCIAL - INSS
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL FEDERAL
RECDO.(A/S) : IVO HERMES
ADV.(A/S) : EDGAR JOSÉ GALILHETI
Decisão
RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. DIREITO ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL DO INSS. AUXÍLIO-ALIMENTAÇÃO. EQUIPARAÇÃO AO VALOR PERCEBIDO POR SERVIDOR DO TCU COM FUNDAMENTO NO PRINCÍPIO DA ISONOMIA. AUMENTO DE VENCIMENTOS E EXTENSÃO DE VANTAGENS
E GRATIFICAÇÕES PELO PODER JUDICIÁRIO E PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. TEMA Nº 315 DA GESTÃO POR TEMAS DA REPERCUSSÃO GERAL DO STF. DEVOLUÇÃO DO PROCESSO AO TRIBUNAL DE ORIGEM (ART. 328, PARÁGRAFO ÚNICO, DO RISTF).
Decisão: O Supremo Tribunal Federal reconheceu a repercussão geral da controvérsia objeto dos presentes autos “em que se discute, à luz dos artigos 5º, II; 37, caput e X, da Constituição Federal, se o Poder Judiciário ou a Administração Pública
podem, ou não, aumentar vencimentos de servidores públicos civis e militares regidos pelo regime estatutário, ou estender-lhes vantagens e gratificações, com base no princípio da isonomia, na equiparação salarial ou a pretexto de revisão geral anual”.
Trata-se do Tema nº 315 da Gestão por Temas da Repercussão Geral, submetido à apreciação do Pleno nos autos do RE nº 592.317/RJ, Relator o Ministro Gilmar Mendes, e que se encontra pendente de julgamento.
In casu, o acórdão recorrido assentou:
“O auxílio-alimentação pago aos servidores do INSS (e aos servidores públicos federais civis) tem fundamento no artigo 22 da Lei nº. 8.460/92, com redação dada pela Lei nº 9.527/97, que dispõe acerca do auxílio-alimentação no âmbito do Poder
Executivo:
Art. 22. O Poder Executivo disporá sobre a concessão mensal do auxílio-alimentação por dia trabalhado, aos servidores públicos federais civis ativos da Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional. (Redação dada pela Lei nº 9.527,
de 1997).
§ 1º A concessão do auxílio-alimentação será feita em pecúnia e terá caráter indenizatório. (Incluído pela Lei nº 9.527, de 1997).
§ 2º O servidor que acumule cargo ou emprego na forma da Constituição fará jus a percepção de um único auxílio-alimentação, mediante opção. (Incluído pela Lei nº 9.527, de 1997).
§ 3º O auxílio-alimentação não será: (Incluído pela Lei nº 9.527, de 1997)
a) incorporado ao vencimento, remuneração, provento ou pensão; (Incluído pela Lei nº 9.527, de 1997)
b) configurado como rendimento tributável e nem sofrerá incidência de contribuição para o Plano de Seguridade Social do servidor público; (Incluído pela Lei nº 9.527, de 1997)
c) caracterizado como salário-utilidade ou prestação salarial in natura. (Incluído pela Lei nº 9.527, de 1997).
Decreto 3.887/2001 (ato decorrente do poder regulamentar):
Art. 1º O auxílio-alimentação será concedido a todos os servidores civis ativos da Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional, independentemente da jornada de trabalho, desde que efetivamente em exercício nas atividades do
cargo.
§ 1º O auxílio-alimentação destina-se a subsidiar as despesas com a refeição do servidor, sendo-lhe pago diretamente.
§ 2º O servidor fará jus ao auxílio-alimentação na proporção dos dias trabalhados, salvo na hipótese de afastamento a serviço com percepção de diárias.
Art. 2º O auxílio-alimentação será concedido em pecúnia e terá caráter indenizatório.
Art. 3º Ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão caberá fixar o valor mensal do auxílio-alimentação, observadas as diferenças de custo por unidade da federação.
Parágrafo único. O servidor que acumule cargos na forma da Constituição fará jus à percepção de um único auxílio-alimentação, mediante opção.
Como se vê, a verba destina-se a indenizar as despesas do servidor com sua alimentação, baseada nos dias trabalhados. Não é incorporada à remuneração ou ao subsídio. Não implica 'aumento' de vencimentos, porque exaurida com a finalidade específica
(alimentação), não atraindo, portanto, a incidência da Súmula nº. 339 do STF:
Não cabe ao poder judiciário, que não tem função legislativa, aumentar vencimentos de servidores públicos sob fundamento de isonomia.
Assim, em que pese as decisões citadas pelo INSS (AgRg no REsp 1025981/PR, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 19/02/2009, DJe 04/05/2009 e TRF4, AC 0028304-31.2008.404.7000, Terceira Turma, Relator João Pedro Gebran Neto, D.E.
21/02/2011), entendo, com a devida vênia, que estão equivocados ao partirem da incidência da Súmula 339 do Supremo Tribunal Federal. Em primeiro lugar, como acima asseverado, por se tratar o auxílio-alimentação de verba específica, não incorporada à
remuneração ou ao subsídio (aposentados não o recebem). A dois, porque a referida Súmula foi editada em 13 de dezembro de 1963 (ou seja: sequer sob a égide da Carta Política de 1988) quando ainda vigia o entendimento - hoje superado - de impossibilidade
de atuação judicial em casos envolvendo decisões dos demais Poderes, sobretudo em questões ligadas à escolha de políticas públicas, atos administrativos, e atos de Governo.
Verificado que o pedido da parte autora não esbarra na referida Súmula e, destarte, inexiste impossibilidade jurídica do pedido, resta saber se a fixação de valores diferenciados para o pagamento do auxílio-alimentação a servidores de órgãos
diversos fere o princípio da isonomia, como afirmado na inicial.
O parágrafo 3º do Decreto nº. 3.887/2001, que regulamentou a Lei nº. 8.460/92, supratranscrito, deixa claro que o auxílio-alimentação pode ser fixado de forma diferenciada pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, desde que observadas as
diferenças de custo por unidade da federação.
Assim sendo, é possível, teoricamente, a distinção no valor do auxílio alimentação pago aos servidores em função do local do trabalho, desde que o critério de distinção seja proporcionalmente observado no momento de se aplicar o fator de
diferenciação, sob pena de violação às garantias constitucionais da isonomia e da proporcionalidade.
Portanto, inexiste dúvida de que o único critério de distinção escolhido pelo legislador para a fixação do valor do auxílio-alimentação foi o de diferenças de custos de alimentação existentes nas unidades federativas. Critério esse isonômico e
proporcional, porquanto leva em consideração o valor efetivamente despendido pelo servidor com alimentação ante o custo de vida de sua unidade federativa (há diferentes custos de vida em toda a unidade federativa).
No caso concreto, contudo, o Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, notadamente ao editar as Portarias nº 71, de 15.04.2004, e nº. 42, de 09.02.2010, não obedeceu aos próprios critérios que lhe servem de fundamento (custo de vida no local
de exercício). De fato, estabeleceu valores diferenciados para o pagamento do auxílio-alimentação com base no órgão ao qual o servidor está vinculado, afrontando o princípio da isonomia previsto no caput do art. 5º da Constituição, mormente quando se
leva em conta que tanto os servidores do INSS quanto os servidores do TCU são regidos pelo mesmo regime jurídico e observam a mesma legislação.
A inobservância ao critério normativo traçado é verdadeira discriminação gratuita, pois não há adequação racional entre o tratamento diferenciado construído e a razão diferencial que lhe serviu de supedâneo, fazendo-se necessária a incidência do
princípio da isonomia como forma de combater distinção.
Ressalte-se que o parágrafo 1º do art. 39 da Constituição Federal, em sua redação original, impunha ao legislador ordinário a obrigatoriedade de assegurar, aos servidores da administração direta, isonomia de vencimentos para cargos de atribuições
iguais ou assemelhados do mesmo Poder. E, em que pese a nova redação do citado parágrafo dado pela EC nº. 19/98 não trazer, de forma expressa, a obrigatoriedade do legislador ordinário assegurar isonomia de vencimentos para cargos de atribuições iguais
ou assemelhados do mesmo Poder, a necessidade de tratamento igual para iguais situações é decorrência indissociável da garantia constitucional da isonomia (art. 5º, caput, da CF).
De toda forma, permaneceu no ordenamento jurídico a previsão da Lei 8.112, de 11.12.1990, que assegura isonomia de vencimentos para cargos de atribuições iguais ou assemelhadas do mesmo Poder, ou entre servidores dos três Poderes, ressalvadas as
vantagens de caráter individual e as relativas à natureza ou ao local de trabalho (art. 41, § 4º). Dizem os artigos 40 e 41 do referido diploma legislativo:
Art. 40. Vencimento é a retribuição pecuniária pelo exercício de cargo público, com valor fixado em lei.
Parágrafo único. (Revogado pela Lei nº 11.784, de 2008)
Art. 41. Remuneração é o vencimento do cargo efetivo, acrescido das vantagens pecuniárias permanentes estabelecidas em lei.
§ 1º A remuneração do servidor investido em função ou cargo em comissão será paga na forma prevista no art. 62.
§ 2º O servidor investido em cargo em comissão de órgão ou entidade diversa da de sua lotação receberá a remuneração de acordo com o estabelecido no § 1o do art. 93.
§ 3º O vencimento do cargo efetivo, acrescido das vantagens de caráter permanente, é irredutível.
§ 4º É assegurada a isonomia de vencimentos para cargos de atribuições iguais ou assemelhadas do mesmo Poder, ou entre servidores dos três Poderes, ressalvadas as vantagens de caráter individual e as relativas à natureza ou ao local de trabalho.
[Destacou-se.]
Destarte, entendo que os atos Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão - em especial as Portarias nº 71, de 15.04.2004, e nº. 42, de 09.02.2010, que fixaram as verbas em R$ 126,00 e R$ 304,00, respectivamente, como valores do
auxílio-alimentação pagos aos servidores públicos federais civis do Poder Executivo - são inconstitucionais. É que, de fato, ainda que referido Ministério tenha 'poder' para fixar o valor da verba indenizatória de auxílio alimentação, este poder é
limitado pela finalidade a que se destina a verba e, como repisado, pelos princípios constitucionais, aptos a 'controlar' todos os atos normativos, sem que isso implique quebra da Separação dos Poderes. Pelo contrário: tal possibilidade de controle é
ínsito ao Sistema de Freios e Contrapesos por nós adotado.
Conclusão: a sentença deve ser mantida na integralidade, condenando-se o INSS a pagar à parte autora a diferença entre o valor do auxílio alimentação por ela percebido e aquele auferido pelos servidores do TCU - Tribunal de Contas da União, como
determinado na sentença.
Considero prequestionados os dispositivos enumerados pela Ré nas razões recursais, declarando que a decisão encontra amparo nos dispositivos da Constituição Federal de 1988 e na legislação infraconstitucional, aos quais inexiste violação. O Juízo
não está obrigado a analisar todos os argumentos e dispositivos indicados pelas partes em suas alegações, desde que tenha argumentos suficientes para expressar sua convicção.
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Ante o exposto, voto por NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO”.
Destarte, ante a similitude da controvérsia, dou provimento ao agravo de instrumento para admitir o recurso extraordinário e, com fundamento no artigo 328, parágrafo único, do RISTF (na redação da Emenda Regimental 21/2007), determino a DEVOLUÇÃO
dos presentes autos ao Tribunal a quo, para que seja observado o disposto no artigo 543-B e parágrafos do Código de Processo Civil.
Publique-se.
Brasília, 10 de outubro de 2012.
Ministro Luiz Fux
Relator
Documento assinado digitalmente