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Web scraping: da inovação à regulamentação

Web scraping: da inovação à regulamentação

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Web scraping é a coleta automatizada de dados na internet, que apresenta desafios jurídicos relacionados à privacidade e direitos autorais.

1. INTRODUÇÃO

Na era digital em que vivemos, a quantidade de informações disponíveis na internet é vasta e em constante expansão. Diariamente, uma infinidade de dados preciosos é publicada online, abrindo portas para uma gama diversificada de oportunidades e desafios. Uma dessas ferramentas que se destacou nesse contexto é o web scraping, que no português pode ser traduzida como “raspagem de dados”. Embora muitos já tenham ouvido falar do termo, compreender completamente o que é o web scraping, sua utilidade multifacetada e os impactos jurídicos associados é fundamental para explorar com sabedoria o vasto território da internet.

No cerne da definição:

“A raspagem de dados da web, também conhecida como web scraping, ou colheita ou extração de dados na web, refere-se basicamente à coleta de dados de sites por meio do Protocolo de Transferência de Hipertexto (HTTP) ou por meio de navegadores da web”

Ao invés de copiar e colar manualmente dados de páginas da web, o web scraping envolve o uso de scripts e programas para coletar e organizar automaticamente informações de interesse a partir de múltiplas fontes. Essa prática pode variar desde a coleta de dados simples, como preços de produtos, até tarefas mais complexas, como análises comparativas de tendências de mercado.

A utilidade do web scraping é ampla e variada, abrangendo diversos setores da economia e da sociedade. Empresas podem se beneficiar ao monitorar seus concorrentes, analisar a opinião dos clientes sobre seus produtos e serviços e realizar pesquisas de mercado aprofundadas. Jornalistas e pesquisadores podem usar web scraping para coletar dados relevantes e atualizados para suas investigações. Além disso, o web scraping pode impulsionar a inovação, permitindo o desenvolvimento de aplicativos e serviços que aproveitem informações valiosas disponíveis online.

Contudo, essa prática não é isenta de controvérsia.

O web scraping pode levantar sérias questões jurídicas, especialmente relacionadas à privacidade, direitos autorais e uso indevido de informações. Enquanto as páginas da web são tecnicamente públicas, a coleta automatizada de dados pode ser interpretada como uma invasão de privacidade, especialmente quando informações pessoais são extraídas. Além disso, o uso não autorizado de conteúdo protegido por direitos autorais pode resultar em violações legais. Nesse contexto, a linha que separa a exploração ética e legítima da internet do abuso potencial é tênue e frequentemente questionada.

Não obstante a relevância da técnica e impacto direto em questões legais, no Brasil, pelo menos mediante os mecanismos de buscas de jurisprudência dos principais tribunais do país, até a presente data, não foram identificados sequer um precedente em sede de tribunal que tenha analisado o tema.

Assim, este artigo se propõe a explorar o conceito de web scraping, examinando suas diversas aplicações e os desafios legais que o acompanham. Ao compreender tanto o potencial transformador quanto os riscos associados, podemos embarcar em uma jornada informada e responsável pelo vasto universo da coleta de dados online.


2. Aplicações Versáteis do Web Scraping.

No contexto do processamento de big data, o web scraping é um aliado estratégico em num mercado em constante mutação. Através da coleta automatizada de dados, empresas, por exemplo, podem monitorar a concorrência, rastrear preços de produtos, analisar feedback de clientes e identificar tendências de mercado. Essas informações não apenas informam decisões estratégicas, mas também permitem ajustes ágeis para atender às demandas do mercado.

Jornalistas e pesquisadores também se beneficiam do web scraping ao coletar dados para suas investigações. A capacidade de extrair informações de múltiplas fontes em larga escala acelera o processo de pesquisa e fornece dados atualizados e relevantes para a produção de matérias jornalísticas investigativas ou estudos acadêmicos de alta qualidade.

No campo dos investimentos, o web scraping pode desempenhar um papel crucial na otimização da tomada de decisões de investimento, proporcionando dados em tempo real e insights valiosos. Ao coletar informações financeiras e de mercado de fontes variadas, como notícias financeiras e plataformas de negociação, os investidores podem monitorar o desempenho de ativos e identificar tendências.

Além disso, o rastreamento do sentimento do mercado e das redes sociais permite antecipar reações dos investidores a eventos econômicos. O web scraping também ajuda a monitorar concorrentes e setores, identificar oportunidades ocultas, inclusive mediante a coleta de dados alternativos.

Além disso, o web scraping estimula a inovação ao abrir portas para o desenvolvimento de aplicativos e serviços orientados por dados. Essas inovações, por sua vez, impulsionam o progresso tecnológico e aprimoram a experiência do usuário, seja em análises de mercado, assistentes virtuais ou análise de tendências.

No entanto, é importante reconhecer que, apesar de suas vantagens, o web scraping também acarreta desafios jurídicos e éticos significativos que merecem uma análise aprofundada.


3. Desafios Jurídicos e Éticos no Uso de Web Scraping.

Apesar de parecer um conceito novo, na verdade a técnica de web scraping tem inicio desde 1989, quando Berners-Lee criou a World Wide Web em 1989 como uma forma para professores universitários e pesquisadores compartilharem informações.

À medida que o web scraping se torna mais difundido e seu papel se expande, surgem questões complexas relacionadas à legalidade e ética de sua prática. A coleta automatizada de dados pode esbarrar em barreiras legais, levantar preocupações sobre privacidade e direitos autorais, e desafiar os princípios éticos que regem a exploração da web.

A coleta de dados sensíveis ou pessoais pode comprometer a privacidade dos indivíduos e levantar questões éticas sobre consentimento e uso responsável. Mesmo que as informações estejam publicamente disponíveis, a automação da coleta pode ampliar o alcance e o potencial impacto negativo sobre os titulares dos dados.

Além disso, o web scraping pode esbarrar em questões de direitos autorais, especialmente quando conteúdo protegido é coletado e redistribuído sem autorização. O uso indevido de propriedade intelectual pode resultar em ações legais, exigindo uma abordagem cautelosa e respeitosa ao uso de informações online.

A complexidade desses desafios exige uma compreensão profunda das regulamentações e leis aplicáveis, bem como a adoção de práticas éticas que equilibrem o potencial transformador da web scraping com os direitos e responsabilidades de todos os envolvidos.

Assim, não obstante a existência da legislação que de forma indireta trate do processamento de dados tais como a LGPD, Marco Civil da Internet Propriedade Intelectual, dentre outras, o web scrapping, em si ainda, carece de maiores regulamentações e compreensões do mundo jurídico.


4. CONCLUSÃO.

Em um mundo onde a coleta e análise de dados desempenham um papel central, o web scraping se destaca como uma ferramenta poderosa e versátil. Suas aplicações impactam uma ampla variedade de setores, desde negócios até pesquisa e desenvolvimento. No entanto, sua prática não é isenta de desafios, especialmente no que diz respeito a preocupações legais e éticas.

Ante a falta de maiores regulamentações no Brasil, alguns pilares éticos/legais podem ser considerados para utilização mais consciente e ética do web scraping, não obstante, algumas das diretrizes abaixo possam ser objeto de flexibilizações diante do caso concreto:

  1. Dados Públicos: Colete informações amplamente acessíveis e de domínio público.

  2. Frequência Adequada: Limite as solicitações para não sobrecarregar o servidor.

  3. Respeito aos Termos: Verifique os termos de uso do site e obtenha permissão se necessário. Este ponto, importante destacar que é bastante controvertido, sobretudo quando os Termos de Uso limitar o uso do web scrapping para informações de caráter público

  4. Identificação Adequada: Inclua informações de identificação nas solicitações HTTP.

  5. Privacidade Respeitada: Não colete informações pessoais sem consentimento.

  6. Transparência e Precisão: Seja transparente sobre fonte e método de coleta, interpretando resultados de forma ética.

Ao explorar o mundo do web scraping, é fundamental adotar uma abordagem informada e responsável. Conhecer tanto suas aplicações transformadoras quanto os desafios que enfrenta nos permite utilizar essa técnica com sabedoria, garantindo conformidade legal e práticas éticas. Enquanto navegamos pelo vasto território da internet, é crucial manter um equilíbrio entre inovação e responsabilidade, para que possamos explorar o potencial do web scraping de maneira consciente e ética.


REFERÊNCIAS


Autor

  • Diego Andrade Vidal

    Advogado, especialista em Direito Tributário e Proteção de Dados LGPD & GDPR. Sócio da Sousa Vidal Advogados. Membro Efetivo da Comissão de Estudos de Tributação Empresarial do IBRADEMP – Instituto Brasileiro de Direito Empresarial.Membro Efetivo da Comissão Especial de Privacidade, Proteção de Dados e Inteligência Artificial da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção de São Paulo.

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