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Estado-Ciência.

As bases racionalistas da mordernidade: Educação, Ciência e Direito

Estado-Ciência. As bases racionalistas da mordernidade: Educação, Ciência e Direito

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        Homo homini lupus

        Hobbes

        Saber é poder

        Bacon

        A rudeza nasce da ignorância

        Vico

        Sapere aude!

        Kant

        RESUMO: O objetivo do texto é traçar em linhas gerais o espírito revolucionário que ostentou e instigou o período histórico que ficou conhecido como Renascimento. Além da enorme influência da chamada Rota da Seda, é de conhecimento comum que a passagem ao capitalismo foi marcante, assim como organização e centralização dos Estados, a laicização que está por trás da formação do Estado-Nação, o fortalecimento do pensamento em prol da unidade jurídica secular, as inúmeras profissionalizações, descobertas científicas, o papel social incalculável de <notáveis homens de ciência>, as suas invenções técnicas e o aprimoramento tecnológico, a Expansão Ultramarina e a demanda inquestionável pela Educação do Homem Novo: (re)público, laico, nacionalista, empreendedor, conquistador, individualista.

        Estudar o Renascimento, em pleno século XXI, não é uma fuga ascética do mundo, diria Weber (1979), nem tampouco uma expectativa tola de se encontrar respostas milagrosas. Porém, diante dessa real crise de civilização [01] que enfrentamos é, no mínimo, um retorno, como tentativa, de nos socorrermos contra a mediocridade reinante. Para fins didáticos, iniciaremos o artigo com uma apresentação dos conceitos fundamentais a este entendimento global do Renascimento e de suas conseqüências e heranças deixadas ao futuro, ou seja, nós e a modernidade que nos abrigou.

        Em suma:

        O termo "Renascimento" foi empregado pela primeira vez em 1855, pelo historiador francês Jules Michelet, para referir-se ao "descobrimento do Mundo e do homem" no século XVI. O estudo da literatura antiga, da história e da filosofia moral tinha por objetivo criar seres humanos livres e civilizados, pessoas de requinte e julgamento, cidadãos, mais que apenas sacerdotes e monges. No campo do direito, procurou-se substituir o abstrato método dialético dos juristas medievais por uma interpretação filológica e histórica das fontes do direito romano. Os renascentistas afirmaram que a missão central do governante era manter a segurança e a paz. Maquiavel sustentava que a virtù (a força criativa) do governante era a chave para a manutenção da sua posição e o bem-estar dos súditos [02].

        O poder político forte, organizado e pronto para agir, em seguimento à Razão de Estado, ainda era preciso fortalecer o escopo ideológico do homem do Renascimento. Um dos primeiros autores a se debater em torno disto foi Comenius (1592-1670), com sua obra máxima Didática Magna (escrita entre 1627 e 1632) ou Tratado da arte de universal de ensinar tudo a todos. No título já está posta sua inclinação: o método deveria permitir aos professores ensinar menos e aos alunos aprenderem mais. Logo se vê aí a posição ocupada pela disciplina e pela pesquisa.

        Como um dos expoentes do Movimento do Mecanismo (veremos adiante), escrevia que a ordem é a alma das coisas e que a repartição do tempo, da matéria e do método dever ser como a de um relógio. Como temente a Deus e ainda preso à Escolástica, dita a Sagrada Escritura como corretivo do relógio moral humano: "Não há melhor meio para corrigir a corrupção do que a reta educação dos jovens. Do mesmo modo, não há Estado sem escola, pois a educação é um viveiro de virtudes (neste sentido será seguido por Helvétius (tributário de J. Locke): "A harmonia social poderia ser, mediante tal enfoque, obtida do agenciamento pedagógico da sociedade" (Boto, 1996, p. 23).

        Humanista como era e realista, escreveu que os bons mestres são poucos e seguem aos ricos e não povo. Por essa razão citará Diógenes, discípulo de Pitágoras: "Qual é o fundamento de todo Estado? A educação dos jovens" (Monteiro, 2006, p. 49 – grifos nossos). Afinal, sem cuidados, a maior parte da juventude cresce em meio a uma selva. Este traço de seguir aos ricos, neste período, entretanto, tinha outra interpretação que não somente a usura ou da ostentação. É uma relação entre estética e política:

        Opiniões saudáveis do povo — Ser elegante não é coisa vã; pois é mostrar que um grande número de pessoas trabalha para si; é mostrar pelos cabelos que se tem um criado pessoal, um perfumista, etc; pelo peitilho, o bordado, os passamanes... Ora, não é uma simples superficialidade, nem simples arreios, ter vários braços. Quanto mais braços se tem, mais forte se é. Ser elegante é mostrar sua força (1994, Pascal, p. 07).

        Contudo, Comenius dirá que a excelência do homem está na instrução, a virtude (a moral) e a piedade. Portanto, a verdadeira educação não introjeta nada do exterior, pois deverá fazer aflorar o que há dentro de cada um, como uma videira (que dá vida): "Os órgãos dos sentidos são os órgãos do conhecimento, do desejo de saber que é inato e permanente" (Monteiro, 2006, p. 49).

        Para tanto, não bastava o Estado Guarda-Noturno, que desse segurança aos seus súditos, era necessário o tal Estado Empreendedor, não apenas conquistador como no passado bárbaro, mas sim de bases racionais, ou seja, plausíveis, críveis e confiáveis diante da margem de acerto e erro. Este Estado erigiu um porto-seguro no direito, ou melhor, num sistema jurídico unificado (ao revés do pluralismo jurídico medieval), nas palavras de Antonio Carlos Wolkmer:

        A questão jurídica irá ser tratada de forma distinta pelos dois expoentes da Reforma. Enquanto o teólogo Lutero desprezava o jurídico e detestava os juristas tanto quanto a filosofia de Aristóteles e a escolástica metafísica, Calvino, formado em Direito, aplica no estudo da Bíblia o método exegético do mundo jurídico. Trata-se de um jurista que, em Genebra, incorpora e leva adiante os propósitos da Reforma naquilo que Lutero desconsiderava: a organização da Igreja reformada [...] A orientação humanista incidiu, como não poderia deixar de ser, no âmbito da teoria e da prática jurídica. Assim, o humanismo no Direito contribuiu para uma natural e clássica revisão crítica da cultura jurídica produzida pela Idade Média. O próprio eixo explicativo de sustentação da doutrina do Direito Natural começa a se deslocar para a sociedade humana e para a natureza racional do homem, antecipando-se, assim, o que seria mais tarde a proposição filosófica do contrato social [...] Algumas características da época, como a secularização, a racionalização, a individualidade e o antropocentrismo, marcam a passagem para a construção e consolidação de um novo mundo que legitima também uma nova forma de produzir, pensar e praticar o Direito. Assim, a "nova consciência jurídica européia" nasce da convergência histórica do naturalismo, da individualidade e da centralização política burocrática. A par de toda essa dinâmica específica, a nascente cultura jurídica eurocêntrica está profundamente afetada por fenômenos radicais e criadores que têm suas raízes no Humanismo renascentista e na Reforma Protestante. Tanto um quanto o outro, desses movimentos, exerceram uma influência direta nas instituições jurídicas e na moderna doutrina dos direitos fundamentais [03].

        Posteriormente à centralização do Estado-Leviatã de Hobbes (1983), o único capaz de dar segurança e, ao mesmo tempo, reunir recursos para as grandes navegações, desembarcamos no jusnaturalismo de John Locke. O liberalismo clássico de Locke, quando voltado a esta relação Estado-Direito, pressupõe uma relação objetivo entre o Poder Extroverso do soberano e seus súditos. Por exemplo, ao indagar acerca do que é o poder político?

        Por poder político, então, eu entendo o direito de fazer leis, aplicando a pena de morte, ou, por via de conseqüência, qualquer pena menos severa, a fim de regulamentar e de preservar a propriedade, assim como de empregar a força da comunidade para a execução de tais leis e a defesa da República contras as depredações do estrangeiro, tudo isso tendo em vista apenas o bem público (Locke, 1994, p. 82).

        Ou quando trata diretamente do que entende pelo que seja ou deva ser o Poder Legislativo: "A lei civil, sendo o ato de todo o corpo político, tem a primazia sobre cada parte do mesmo corpo" (Locke, 1994, p. 138). Para em seguida nos revelar a fonte do próprio direito consuetudinário, aquele baseado nos costumes — a Comunidade Civil ou commonwealth:

        Como a forma de governo depende da atribuição do poder supremo, ou seja, do Legislativo, é impossível conceber que um poder inferior possa prescrever a um superior, ou que um outro além do poder supremo faça as leis, a maneira de dispor o poder de fazer as leis determina a forma da comunidade civil (Locke, 1994, p. 160).

        Em seguida ainda nos traça um panorama do alcance e dos limites ao Poder Legislativo:

        Primeiro: ele não é exercido e é impossível que seja exercido de maneira absolutamente arbitrária sobre as vidas e sobre as fortunas das pessoas [...] Segundo: O Legislativo, ou autoridade suprema, não pode arrogar para si um poder de governar por decretos arbitrários improvisados, mas se limitar a dispensar a justiça e decidir os direitos do súdito através de leis permanentes já promulgadas e juízes autorizados e conhecidos [...] Terceiro: O poder supremo não pode tirar de nenhum homem qualquer parte de sua propriedade sem seu próprio consentimento [...] Quarto: O poder legislativo não pode transferir para quaisquer outras mãos o poder de legislar; ele detém apenas um poder que o povo lhe delegou e não pode transmiti-lo para outros (Locke, 1994, pp. 163-164-166-168).

        Tais limites, pois, são demarcados por deveres e por obrigações peculiares às funções requeridas ao próprio Poder legislativo:

        Primeiro: Ele deve governar por meio de leis estabelecidas e promulgadas, e se abster de modificá-las em casos particulares, a fim de que haja uma única regra para ricos e pobres, para o favorito da corte e o camponês que conduz o arado. Segundo: Estas leis só devem ter uma finalidade: o bem do povo. Terceiro: O poder legislativo não deve impor impostos sobre a propriedade do povo sem que este expresse seu consentimento, individualmente ou através de seus representantes [...] Quarto: O legislativo não deve nem pode transferir para outros o poder de legislar, e nem também deve depositá-lo em outras mãos que não aquelas a que o povo o confiou (Locke, 1994, p. 169).

        O que, em tese, a fim de que poder controle poder, deveria desembocar na hierarquia entre os poderes:

        Em uma sociedade política organizada, que se apresenta como um conjunto independente e que age segundo sua própria natureza, ou seja, que age para a preservação da comunidade, só pode existir um poder supremo, que é o Legislativo, ao qual todos os outros estão e devem estar subordinados; não obstante, como o legislativo é apenas um poder fiduciário e se limita a certos fins determinados, permanece ainda no povo um poder supremo para destituir ou alterar o Legislativo quando considerar o ato legislativo contrário à confiança que nele depositou [...] Deste modo, a comunidade permanece perpetuamente investida do poder supremo de se salvaguardar contra as tentativas e as intenções de quem quer que seja, mesmo aquelas de seus próprios legisladores, sempre que eles forem tão tolos ou tão perversos para preparar e desenvolver projetos contra as liberdades e as propriedades dos súditos (Locke, 1994, p. 173).

        Por fim, mas o que talvez devesse constar do princípio, porque tudo isto só faria sentido se prevalecesse o interesse público, surge como um dos temas centrais do Segundo Tratado sobre o Governo Civil, o princípio da moralidade: "A regras salus populi suprema lex é certamente tão justa e fundamental que aquele que a segue com sinceridade não corre um risco grande de errar" (Locke, 1994, p. 179).

        Com isto chegamos à idéia da liberdade e das relações construídas de forma real e duradoura, como reino terrestre, e o papel da educação na sua elaboração. Depois de Comenius, um passo decisivo rumo ao Homem Novo, primeiro foi dado por Helvétius e, posteriormente, por Diderot:

        Ocorrerá, a partir de meados do século XVIII, uma intensificação do pensamento pedagógico e da preocupação com a atitude educativa [...] Das relações mestre e discípulo às determinações políticas do ato pedagógico, tudo isso seria considerado decorrente de um fator preliminar, concernente à identificação dos mecanismos propulsores do aprendizado humano [...] Da Ilustração à Revolução, a pedagogia desloca-se do terreno filosófico para incursionar pela prática política, pelo lugar institucionalizado na escola propugnada; deixa de ser objeto privilegiado do indivíduo para ser concebida como direito e capacidade inerentes à espécie [...] Advogar ou não a escola para todos foi, desde logo, estratégia política de matriz iluminista (Boto, 1996, pp. 21-23).

        Este é marco histórico do aprender a aprender política. Neste aspecto, diverge bastante do Renascimento e sua clara intenção pela matematização das relações humanas e com a natureza (como veremos).


Construir a liberdade e a felicidade na Terra

        Por outro lado, em linha de confronto direto a este conjunto de pensamentos iluministas (mais idealistas do que o realismo de Estado poderia permitir), vejamos a distinção nítida entre Nação e Pátria: Nação é uma fronteira política em relação à identidade da etnia, já fazia notar Diderot, em 1750, no famoso Enciclopédia ou Dicionário raciocinado das ciências, das artes e dos ofícios. Pátria, por sua vez vem de pater (pais e filhos):

        A origem desse conceito situa-se no âmbito da família, como célula original, de onde seriam derivadas as acepções de sociedade e de Estado. Sendo a pátria um poder tão antigo quanto a sociedade, ela, assim, remete ao sentimento de público, fundador da soberania: uma felicidade que só vigora no coletivo, na partilha de virtudes, típica da vontade política que clama por democracia: "Amor das leis e da felicidade do Estado, amor singularmente reservado às democracias; é uma virtude política pela qual se renuncia a si mesmo preferindo ao interesse próprio o interesse público; é um sentimento e não uma continuação do conhecimento; o último dos homens do Estado pode ter tal sentimento, tanto como o chefe da república" (Boto, 1996, p. 43).

        Por sua vez, a Pátria deveria excluir a tirania, incongruente com o ideal de liberdade que se gestava no período revolucionário de 1789:

        "As suspeitas, os remorsos, os terrores cercam-no por todos os lados; não conhece ninguém digno de sua confiança, apenas têm cúmplices, e nenhum amigo. Os povos, exaustos, degradados, envilecidos pelo tirano, são insensíveis aos seus insucessos, e as leis que violou não o podem auxiliar: em vão reclama a pátria. Haverá alguma onde um tirano reina?" (Boto, 1996, p. 43 - nota 33).

        Vemos como a modernidade construiu as bases técnicas e científicas de sua razão. O tema pode ser tratado como Estado-Ciência, quando uma forma política que precisa da ciência para o seu próprio desenvolvimento, mas, para isso, sabe que é preciso ter "liberdade para conhecer". O tema também pode ser debatido como Estado Cientificista, quando a forma política subjuga o conhecimento para fins estritamente relacionados à razão de Estado; quando a crítica, tão necessária ao crescimento do conhecimento, desapareceu. No entanto, ao contexto como um todo, sem as tradicionais divisões do Renascimento e do Iluminismo que o seguirá, em séculos, daremos o nome de Estado Cientista ou Cientificista:

        Em suma, os tecnodirigentes estão de acordo no essencial. A política politiqueira e a administração executiva estão mortas. Viva o político e a gestão! As opções partidárias cedem lugar à resolução dos problemas. São afastados revolucionários e conservadores, deixando caminho livre para os animadores da mudança social. O Estado-cientificista será dirigido por negócios e técnicos (Pisier, 2004, p. 493 – grifos nossos).

        O tema ainda poderia ser visto como Estado Cientista, quando a forma política passa a ser o principal investidor na área científica, no conhecimento, pois disso depende todo o desenvolvimento social. Portanto, o Estado Cientificista nada mais é do que uma das versões mais modernas do Estado de Necessidade, e que veio oferecer doses generosas de razão, método, perspectivas e estratégias diferentes para amparar/suprir as necessidades do capital. Assim como o Estado de Sítio Político servir-lhe-ia como uma dotação suplementar de "razão política" necessária à manutenção do poder sob a Razão de Estado. No final, ainda há um pequeno escorço comparativo entre os ideais de uma educação republicana e a realidade imposta à educação tecnicista pelo Estado Cientificista (predecessor técnico do Estado de Exceção).

        A relevância deste tema para entender o conjunto que dá forma ao Estado Cientificista (ou Estado-Ciência) faz uma espécie de mediação entre a Razão de Estado clássica (dos séculos XV e XVI) e o Estado de Necessidade (já afirmado pela Revolução Francesa). O Estado Cientificista, portanto, exerceu o papel de dotação racional para o desenvolvimento capitalista: uma justificativa política do capital. Esse processo passou a ser conhecido como mecanismo e é óbvio que se liga ao cartesianismo. De modo direto: "Há um cartesianismo metodológico, que consiste em só nos fiarmos na evidência racional, um cartesianismo científico, que se confunde com o mecanismo, um cartesianismo metafísico, que considera a existência do nosso pensamento como a nossa primeira certeza" (Alquié, 1987, p. 17).

        Curiosamente, a virtù não será algo assim tão positivista, que separe tão frontalmente objeto e sujeito, aliás, esta separação nos deixaria muito distantes da virtù. Portanto, dada mais distante da virtù do que separar talento e ação, intenção e resultado, condições e vontade, meios e subjetividade, objetividade e interesses, razão e força. Neste sentido, a virtù é uma construção histórica e sociológica, pois há momentos históricos, bem como sociedades que animam este projeto e outros, em contrário, que nos afastam contundentemente desse objetivo. Mas de que é feito o mecanismo?


Mecanismo: Galileu – Descartes - Hobbes – Bacon

        O "movimento do mecanismo" promoveu a razão necessária ao Estado Moderno, como mecanismo de superação do "estado de necessidade da natureza". O mecanismo ofereceu o aporte do argumento lógico ao "poder instrumental" do Leviatã. O mecanismo ainda empregou um sentido científico à dominação política e projetou a "dominação técnico-racional", em compasso com o discurso do Estado de Direito (como queria Weber):

        O mecanismo é uma filosofia da natureza segundo a qual o universo e qualquer fenômeno que nele se produza podem e devem explicar-se de acordo com as leis dos movimentos materiais. <A minha filosofia>, escrevia Descartes a Plempius, <só considera grandezas, figuras e movimentos, à semelhança do que faz a mecânica>. A fórmula será constantemente retomada no seu século: tudo na natureza se faz por <figuras e movimentos> (Alquié, 1987, p. 59).

        Como veremos, no mecanismo, há uma mescla entre racionalidade e empirismo. Sob essa influência, mas em período subseqüente, também surge Blaise Pascal (1623-1662): filósofo, místico, físico e matemático. A frase mística "o coração tem razões que a própria razão desconhece" é uma síntese de sua doutrina filosófica: entre raciocínio lógico e emoção. Pascal foi um gênio matemático e também criou a primeira calculadora mecânica. Além de sua intensa atividade científica, ainda se dedicou a trabalhos de natureza filosófico-religiosa e, como teórico, destacou-se como um dos mestres do racionalismo e do irracionalismo. Porém, antes disso, no século XVII, o mecanismo tinha uma fórmula simples: Tudo na natureza ocorre por meio de figuras e dos seus movimentos. É deste fluxo que advém a ciência clássica. Também é neste sentido que se pode dizer que o mecanismo promoveu uma revolução na ciência sem ter sido uma teoria científica — distinguiu-se como uma nova racionalidade e por trazer outra forma de apreensão dos fenômenos. O próprio surgimento do mecanismo se deu com uma descontinuidade, mas o sentido laico e comum é a necessidade de explicar os fenômenos da natureza exclusivamente pelas leis dos movimentos da matéria — e esta não tem alma. Esse típico pensamento mecanicista (tendo o cartesianismo por referência) logo ganhou a consciência do homem comum. Os "mecanicistas" ainda rejeitaram as físicas animista, qualitativa, finalista. Mas o Mecanismo não foi só uma ilustração filosófica, foi uma obra de concretude técnica ou, mais precisamente, de obras mecânicas (além da própria mecânica, enquanto parte da física):

        MECÂNICA – tradicionalmente a teoria das máquinas, em particular as cinco "máquinas simples": a alavanca, a cunha, a roldana, o parafuso e o molinete. Transformada durante a revolução científica para incluir teorias de colisão e outros problemas associados com corpos em movimento (Henry, 1998, p. 139).

        Foram aí indicadas cinco peças, além da lançadeira voltante, que propiciou a alavancagem da Revolução Industrial. O que também se percebe hoje com mais clareza é que o próprio Renascimento não foi uma era homogênea, recheada de grandes gênios e em meio a cursos revolucionários contínuos. Houve sim, como longo processo de amadurecimento e de profundas transformações, certos momentos ou fases em que dialogavam plenamente o moderno e o arcaico, o novo e as tradições, as mudanças e o sectarismo, a alquimia e a química, a RETA RAZÃO e o pensamento mágico:

        "MIRABILIA" — literalmente, "coisas maravilhosas". Usado para denotar máquinas ou autômatos que costumavam ser mostrados na corte em exibições, cerimônias, espetáculos teatrais e ocasiões similares e que pretendiam produzir, por meios ocultos, efeitos impressionantes ou surpreendentes, mas apenas divertidos (Henry, 1998, p. 22).

        Esta mescla ou era de transição entre épocas tão díspares, até que se conhecesse todo o potencial do Renascimento(?), também teve obscuridades ou incertezas (aliás, muito apropriadas quando se trata de ciência):

        Entretanto, o autor daquele livro seiscentista de ‘química’ empregava largamente uma simbologia de derivação alquimista, defendia a existência de uma real analogia entre as propriedades do arsênico e do antimônio e o comportamento dos animais (a serpente e o lobo) com cujos nomes as substâncias eram simbolizadas: ou seja, identificava (como tipicamente ocorre dentro do ‘mundo mágico’) as propriedades e as características dos objetos usados como símbolos com as propriedades e as características dos objetos ou das coisas reais simbolizadas (Rossi, 1992, pp. 331-332 – grifos nossos).

        Esta análise — do livro Schema materialum pro laboratorio portabili sive Tripus Hermeticus fatidicus pandens oracula chymica, de Johann Joachim Becher (1689) — revela que há magia no Renascimento, que o próprio desencantamento do mundo (como racionalidade progressiva) não é um processo uno, homogêneo, onipresente. Na verdade, ainda que talvez seja o período mais fulgurante da história humana (maior ainda do que as civilizações grega e roamana), o Renascimento foi um processo tortuoso, contraditório e extremamente beligerante.

        Para Galileu, de modo semelhante, só a razão (consciência dos fatos) leva à verdade, no debate entre ciência (moderna) e fé deve prevalecer o argumento lógico (principalmente porque se deve aplicar essa lógica às próprias Escrituras):

        Eu acrescentaria somente que, se bem que as Escrituras não possam errar, os seus intérpretes e expositores poderiam, entretanto, incorrer por vezes em erros, e de várias maneiras [...] Pois nem toda afirmação da Escritura amarra-se a uma obrigação tão severa como cada efeito da natureza [...] E quem quererá colocar um limite à capacidade do espírito humano? Quem ousará afirmar já ser conhecido tudo o que existe de cognoscível no mundo? (Galileu, 1988, pp. 18-19-20 – grifos nossos).

        Entretanto, lhe permaneceu vivo esse espírito de desconfiança, ou melhor, de não apostasia diante do conhecido e do conhecimento. Afinal, como ensinou Galileu: Quem afirmará que já se conhece tudo o que possa ser conhecido no mundo?

        De certo modo, pode-se reportar ao atomismo da Grécia clássica (Demócrito, Epicuro) para buscar suas raízes. Galileu se declarou epicurista [04] e isto o desvinculou da filosofia natural do Renascimento, abrindo as portas da natureza: "Este materialismo desmistificava os prestígios da natureza e podia ajudar fortemente os homens a tornarem-se <senhores e possuidores> dela" (Alquié, 1987, p. 61). Ou seja, o mecanismo procurou livrar o homem da ação dos poderes que não fossem científicos ou provindos da razão: "A doutrina que então explicava a matéria por meio de um arranjo mecânico de átomos destinava-se a desprender o homem de todos os poderes exteriores a si; nem as coisas cá de baixo nem os astros lá do alto podiam exercer influência sobre ele" (Alquié, 1987, p. 61). No entanto, havia uma diferença acentuada entre atomistas e mecanicistas: "Os mecanicistas do século XVII reclamam a liberdade que se obtém dominando a natureza; os atomistas antigos haviam buscado a que se alcança preservando-se da natureza" (Alquié, 1987, p. 61). Os mecanicistas eram intervencionistas, mas, além disso, o século XVII queria desvendar o mundo. De certo modo, diferentemente de muitos outros "colaboradores menores" (Torricelli, Cavendish, Mersenne), Descartes foi mais dogmático: "A dúvida permitiu encontrar as verdades primeiras a partir das quais se funda uma ciência certa" (Alquié, 1987, p. 63). Sua dúvida metódica trouxe-lhe rápidas certezas.

        Por isso, também viram sucumbir a idéia do cosmos como "hierarquia ontológica fechada" — em benefício de um mundo aberto e em movimento, e segundo leis gerais e comuns. Por exemplo, para Descartes, a natureza é matéria: "A natureza nada inventa: há tão-só fenômenos que aí aparecem, explicáveis por algumas leis simples e imutáveis" (Alquié, 1987, p. 66). Também o homem é matéria, e máquina em movimento — para Descartes, o homem é simples: "O corpo do animal e do homem, excetuada uma maior complexidade, não funciona de modo diferente de qualquer maquinaria fabricada pelos homens" (Alquié, 1987, p. 66). Relógios e órgãos são bem semelhantes, assim como nervos e tubos. A água que brota das fontes, pode mover máquinas ou pronunciar palavras. As molas se armam como tendões. Contudo, é pelo pensamento que o homem compreende a máquina, e tanto o seu corpo quanto a mecânica do mundo. Mais especificamente, Descartes e Pascal fizeram assim uma distinção do espírito e da matéria [05]. Talvez ainda deva-se dizer que havia uma tendência à mecanização radical: "Pensando que o seu corpo é uma máquina integrada na grande máquina do universo, o homem assegura a sua dignidade" (Alquié, 1987, p. 67). Neste sentido, se ainda quisermos, os gregos também conheciam a arte dos "mecanismos autômatos" (Losano, 1992).

        Observando-se retrospectivamente, no entanto, há uma forte ironia quanto aos princípios e resultados do mecanismo: "Foi como filosofia da natureza, como teoria geral do mundo, que ele se mostrou fecundo, dando ao homem um outro olhar sobre o universo, e não na sua aplicação ao pormenor dos fenômenos" (Alquié, 1987, p. 70). Sua superação também se deu de modo lento, em concomitância com o surgimento das ciências especializadas: o funcionalismo seria um caso típico. Enfim, a partir de então, o "conhece-te a ti mesmo" iria depender do conhecimento da física e da mecânica mais especificamente.


De que serviu a mecânica?

        O Homo faber potencializou a si mesmo com o uso de instrumentos achados ou fabricados; desde muito cedo, a técnica exerceu o papel de longa manus no trabalho de fabricação do próprio homem. Por isso, tal qual hoje em dia, no começo era a técnica, especialmente a mecânica. Desde o início, a mecânica apareceu para o homem associada à satisfação das necessidades e à tentativa de sobrevivência: "Deslocar pesados fardos e assegurar o equilíbrio de massas importantes foram manifestamente, desde a mais alta antiguidade, as duas preocupações principais da humanidade desejosa de desafiar a ação destruidora do tempo e de se superar a si mesma nas produções estáveis de civilização" (Alquié, 1987, p. 83). O complemento subseqüente dessa intervenção, como sabemos, foi a "fabricação da cultura" e também aí a mecânica se associou ao mito do poder e da opulência e tão presente no deslocamento das toneladas que acionariam a força da "civilização do movimento [06]": "O mito da torre de Babel corresponde a esta realidade. A abundância dos monumentos de todas as espécies, desde os enormes menires até aos zigurates e às pirâmides do Egito, é testemunho do acesso dos grupos humanos, em todos os pontos do globo e em tempos muito remotos, a técnicas de grandes construções" (Alquié, 1987, p. 83). Parte do método científico moderno, por sua vez, tem dívidas teóricas com os gregos clássicos e com instrumentos de uso prático: "No movimento derivado do Renascimento, o século XVI ocidental redescobre a obra teórica mais elaborada da ciência helênica, a de Arquimedes, e esta obra, centrada na estática, apresenta a regra de equilíbrio da alavanca reta a partir de considerações lógicas independentes da natureza da gravidade" (Alquié, 1987, p. 84). De modo complementar, a balística sempre esteve associada à agressividade natural do poder e à conquista, tornando-se imprescindíveis a direção e a precisão. Porém, a eficácia militar só se tornou possível com a chegada de outro profissional aos paióis e arsenais: o "matemático-engenheiro". Ali se misturaram completamente o movimento, a razão e a violência (que serviriam ajustadamente ao poder nascente do Estado Moderno). A par disso, dois novos instrumentos aperfeiçoados nos séculos XV e XVI colaboraram com esta equação do poder: a biela-manivela e o volante. Teoricamente, a obra de Galileu, Discursos e Demonstrações Matemáticas em torno de Duas Novas Ciências, é um marco dessa alteração da visão de mundo, sobretudo porque trocou a estática pela mecânica (ou mecanismo).


Galileu e a verdade empírica

        Galileu Galilei (1564-1642) tornou-se um mártir na defesa dos "direitos da razão", mas acabou seus dias preso e sofrendo humilhações físicas e morais, após ser condenado pelo Santo Ofício em 1633. Curiosamente, a prova formal apresentada por ele sobre o movimento da Terra (o fluxo e o refluxo do mar) de nada valia. Entretanto, suas contribuições foram muito além, por exemplo, quando aperfeiçoou consideravelmente a luneta e "a apontou para o céu". Também não viu o florescer da álgebra, mas o que havia feito pela matemática, há muito se antecipara a seu tempo: a língua da matemática permitiria ler o livro da natureza. Desde cedo, no entanto, teve facilidade para a música e o desenho, e notável habilidade para a construção de instrumentos. Sua formação posterior (o pai foi seu primeiro professor) lhe garantiu uma erudição humanista. Já adulto, estudara Damte e aí se inspirou na recusa à empáfia e à soberba: "A poesia burlesca que ele escreveu contra o uso da toga revela, já nesta época, o caráter militante da sua aversão às estruturas conservadoras que lesam a independência do espírito" (Alquié, 1987, p. 07). De outro modo, cientificamente, Galileu identificou melhor o heliocentrismo na madrugada do dia 07/01/1610. Assim, na carta que escreveu ao príncipe de Florença dizia do seu entusiasmo pela ciência inteiramente nova que lhe antevia: o movimento do mecanismo. Depois, como réplica a muitos ataques que sofrera, Galileu escreveu uma outra carta à grã-duquesa Cristina, afirmando que: "...a intenção do Espírito Santo é ensinar-nos como se deve ir para o Céu, e não como vai o Céu" (Alquié, 1987, p. 12). Perto do fim, já condenado, Galileu manteve a dignidade de sua postura — em sua defesa, sempre se valeu de argumentos da pesquisa racional. Por fim, na França, sob a proteção do parlamento e de um laicizismo maior, suas obras puderam circular mais livremente. Mesmo cego, Galileu continuou pesquisando, dando provas do que é ser um clássico: "o verdadeiro sábio é aquele que, até o fim, volta a empreender tudo de novo" (Alquié, 1987, p. 15).

        É interessante perceber como o embate pela razão estava presente em Galileu e ainda que, em outras palavras, fosse clara a preocupação de que primeiro era preciso relativizar a metafísica para só depois propor-se um método arrojado, metódico, racional, definível para qualquer um que o quisesse empregar. Em Galileu é expressa esta percepção de que a ignorância é o que aterroriza e não o conhecimento adquirido na verdadeira investigação empírica da realidade.

        Diante do inevitável conflito, Galileu faz uma aparente concessão à metafísica daqueles que se mantinham aferrados à interpretação dogmática das escrituras, mas isto não passava de outro simples exercício de sua inteligência e sagacidade superiores. Usava de um estratagema da razão contra a sedição que se poderia provocar, enfrentando-se a dogmática e a metafísica diretamente. Portanto, era mero artifício (e que levava o adversário a crer que fosse uma real concessão), para então chegar ao destino proposto:

        Tendo eu, portanto, descoberto e logicamente demonstrado que o globo do Sol se movimenta em torno de si mesmo, fazendo uma inteira evolução em um mês lunar, aproximadamente na exata direção em que se processam todas as outras evoluções celestes; e sendo, ainda mais, muito provável e razoável que o Sol como instrumento e regente máximo da natureza, quase coração do mundo, dê não somente, como claramente dá, a luz, mas também o movimento dos planetas que giram em torno dele; e se, conforme a tese de Copérnico, atribuímos principalmente à Terra a evolução diurna; quem não vê que para deter todo o sistema bastou deter o Sol, como exatamente indicam as palavras do texto sagrado, sem alterar o restante das recíprocas relações dos planetas, alterando somente o espaço e o tempo da iluminação diurna? (Galileu, 1988, p. 24).

        Vê-se aí qual era a real dimensão e a força da religião naquela época (e que Galileu quisera contornar, mesmo sem sucesso): era mais fácil deter o Sol do que reinterpretar as Escrituras ou não interpretá-las literalmente. Portanto, colocar o Sol em seu devido lugar foi a maior incumbência que se propôs esse movimento do racionalismo e do heliocentrismo. De qualquer forma, eram já os passos fundamentais de um presunçoso racionalismo que não faria nenhuma concessão.


Descartes e o racionalismo ou cartesianismo

        O que é cartesianismo? É a típica maneira de "pensar racionalmente" (livre da metafísica, do apriori religioso) e teve início com René Descartes (1596-1650) — contemporâneo de Galileu Galilei (1564-1642), de Francis Bacon (1588-1679) e de Hobbes (1588-1679). A idéia mais simples que constitui o raciocínio lógico (aplicado à ciência) talvez se expresse pela chamada "dúvida metódica":

        Seu propósito central consistia em nada reconhecer como verdadeiro sem que, antes, tivesse passado previamente pela sua razão, pelo crivo de um procedimento metódico, baseado na dúvida [...] Nenhuma idéia merece o qualificativo de verdadeira, se não for objeto de um questionamento radical que permita chegar a princípios, proposições primeiras, que sejam, de fato, indubitáveis (Rosenfield, 2005, p. 07).

        Obviamente que se tratava de uma tentativa de fugir dos preconceitos e dos apostolados não-científicos, das ideologias até então dominantes. Por isso, Descartes foi o precursor do racionalismo [07]:

        E como se tratava de um "discurso do método", a sua preocupação central residia no como conhecemos, no como podemos ter acesso a idéias verdadeiras, que fossem imunes ao erro, quando perseguidas segundo um procedimento metódico, sistemático [...] Descartes propugnava por um pensamento jovem, aberto à crítica e aos questionamentos, capaz de exercer uma dívida cética e de resistir à mesma dúvida graças a uma razão aberta ao questionamento de seus próprios princípios [...] Moderno, ele defendia a idéia de que a razão deveria permear todos os domínios da vida humana, numa atividade libertadora, pois voltada contra as mais diversas formas de dogmatismo (Rosenfield, 2005, pp. 11-12 – grifos nossos).

        Era um "método virtuoso" que deveria dirigir as paixões, como "conceitos atuantes que pudéssemos estimar como morais": "Estando a alma indissociavelmente unida ao corpo, não sendo ela como um ‘piloto alojado, em seu navio’, coloca-se a questão de como deve agir o homem virtuoso respondendo às paixões de seu corpo" (Rosenfield, 2005, p. 15). Como um racionalista, diferenciado de um Aristóteles e de um Cícero, Descartes apostava na razão e no bom senso — nossa "igualdade natural está pautada nesta racionalidade inata a todo ser humano". Pensava o bom senso a partir de um "agir racional" [08], guiado pela razão e não refém das paixões:

        Descartes considerava o bom senso ou a razão a coisa do mundo a melhor compartilhada, de tal maneira que a capacidade de discriminar o verdadeiro do falso torna todos os homens, independentemente de sexo, cor ou religião, iguais. A razão é formalmente igual em todos, o que os distingue é a sua aplicação, pois essa deriva dos costumes, da religião, dos conhecimentos adquiridos, daquilo que ganhou o estatuto de verdade, embora não o seja. A razão iguala, as opiniões diferenciam os homens [09] [...] Eis porque Descartes procura estabelecer um método que possa ser seguido por todo e qualquer homem, independentemente de época, opinião, crença, costumes ou sexo [...] Um método voltado, então, para a busca da verdade e não da verossimilhança (Rosenfield, 2005, pp. 17-18).

        O racionalismo, basicamente, estava organizado em três bases:

        1) Psicológica – a razão é equiparada ao pensar e, portanto, é uma atividade cognoscível superior à emoção e à mera vontade; contraposto ao emocionalismo e ao voluntarismo, identifica-se com o intelectualismo.

        2) Epistemológica ou Gnosiológica – o único órgão completamente desenvolvido ao pensar e, portanto, que efetue a atividade cognoscível, é o que dá provimento à razão; contrapõem-se ao empirismo e intuicionismo.

        3) Metafísica – a realidade é de caráter racional (racionalismo metafísico); contrapõem-se ao realismo empírico e, com muita freqüência, ao irracionalismo.

        Essas três correntes básicas do racionalismo subsistiram praticamente durante toda a Idade Média, mesmo que modificadas pelas diferentes abordagens dos problemas. Por exemplo, ser racionalista não significou forçosamente toda a realidade e, mais particularmente, se fosse transparente à razão humana. Neste caso, podia-se admitir o racionalismo como suscetível ou não de integrar-se ao sistema das verdades da fé. Ao mesmo tempo, o racionalismo integrou-se à Teoria do Conhecimento, principalmente quando se contrapunha ao empirismo. E sob esta marca ou visão de mundo predominante, é que Descartes construiu as premissas de seu método, sob quatro regras demarcadas e fixas:

        [1] A primeira regra estipula não aceitar nada como verdadeiro sem antes ter passado pelo crivo da razão [2] Segundo, tudo o que aparece como complexo deve ser dividido em tantas partes simples quanto possíveis, pois a razão, ao focar um problema perfeitamente delimitado, tem mais condições de resolvê-lo do que se encarar algo composto de várias maneiras [3] Terceiro, uma vez feito esse processo de simplificação, ele deve seguir um ordenamento, de modo que a remontagem para o composto ou complexo possa ser feita sem desvios, que prejudicariam a verdade almejada [4] Quarto, como esse procedimento pode ser retomado e repetido por qualquer um, ele deve dar lugar a tantas revisões quanto necessárias, de modo que as contribuições e objeções de todos possam ser levadas em consideração, pois ela é a condição mesma de estabelecimento da verdade (Rosenfield, 2005, pp. 21-22).

        Aquele que não pensa profundamente, com dúvidas constantes e amparadas, metodicamente, não vive a experiência da totalidade humana. Em síntese: a dúvida estimula o raciocínio e assim se elabora a razão, para se revelar como bom senso: um agir pensado, metodicamente calculado [10] ("bom senso não é um agir-com-fé", mas sim com a razão) é o que conduz à liberdade. Portanto, o desenvolvimento da razão deveria tornar a vida social melhor, e a ciência ajudaria nesse processo de hominização.


Empirismo

        A expressão empirismo deriva do grego e traduz a experiência proporcionada pelos órgãos dos sentidos ou a vivência decorrente dos sentimentos, afeições, emoções acumuladas em sua memória. Por isso, também é considerado como uma teoria de caráter epistemológico, pois é relativo à natureza do conhecimento. Há uma tendência a proporcionar explicações genéticas do conhecimento, além do uso recorrente de termos como sensação, impressão, idéia. Há inúmeras linhas de interpretação, mas o precursor teria sido Bacon, com a idéia de que o experimentalismo científico deveria trazer benefícios à vida prática. Neste afã, estudou metalurgia, química, geologia e, acima de tudo, desenvolveu grande entusiasmo pela técnica (veja-se Novum Organum). Formou-se em direito e também foi literato (veja-se Nova Atlântida). Buscava o saber como um todo coerente, mas o filósofo natural deveria ser como uma abelha: um ser ativo, fecundo e à procura de resultados práticos. Afirmava em todas as obras que saber é poder. O real interesse do saber está em conquistar a natureza: o saber não tem valor em si mesmo (ensimesmado, estocado como memorização, retórica). Seu utilitarismo reconhecia o saber em sua totalidade e não apenas em aplicações imediatas, desejando que servisse à humanidade:

        XXIX. Nas ciências que se fundam nas opiniões e nas convenções é bom o uso das antecipações e da dialética, já que se trata de submeter o sentimento e não as coisas [...] XXXVI. Resta-nos um único e simples método para alcançar os nossos intentos: levar os homens aos próprios fatos particulares e às suas séries e ordens, a fim de que eles, por si mesmos, se sintam obrigados a renunciar às suas noções e comecem a habituar-se ao trato direto das coisas [...] A formação de noções e axiomas pela verdadeira indução é, sem dúvida, o remédio apropriado para afastar e repelir os ídolos [...] XLI. Os ídolos da tribo estão fundados na própria natureza humana, na própria tribo ou espécie humana. É falsa a asserção de que os sentidos do homem são a medida das coisas [...] XLII. Os ídolos da caverna são os dos homens enquanto indivíduos [...] XCV. Os empíricos, à maneira das formigas, acumulam e usam as provisões; os racionalistas, à maneira das aranhas, de si mesmos extraem o que lhes serve para a teia. A abelha representa a posição intermediária: recolhe a matéria-prima das flores do jardim e do campo e com seus próprios recursos a transforma e digere [...] Por isso muito se deve esperar da aliança estreita e sólida (ainda não levada a cabo) entre essas duas faculdades, a experimental e a racional [...] XCIX. De fato, o artesão, despreocupado totalmente da busca da verdade, só está atento e apenas estende as mãos para o que diretamente serve a obra particular [...] CIV. Muito se poderá esperar das ciências quando, seguindo a verdadeira escala, por graus contínuos, sem interrupção, ou falhas, se souber caminhar dos fatos particulares aos axiomas menores, destes aos médios, os quais se elevam acima dos outros, e finalmente aos mais gerais [...] CV. Mas a indução que será útil para a descoberta e demonstração das ciências e das artes deve analisar a natureza, procedendo às devidas rejeições e exclusões, e depois, então, de posse dos casos negativos necessários, concluir a respeito dos casos positivos [...] Ainda nos pode ser indagado, mais como dúvida que como objeção, se intentamos, com nosso método, aperfeiçoar apenas a filosofia natural ou também as demais ciências: a lógica, a ética e a política. Ora, o que dissemos deve ser tomado como se estendendo a todas as ciências [...] CXXIX. Vale também recordar a força, a virtude e as conseqüências das coisas descobertas [...] Referimo-nos à arte da imprensa, à pólvora e à agulha de marear. Efetivamente essas três descobertas mudaram o aspecto e o estado das coisas em todo o mundo: a primeira nas letras, a segunda na arte militar e a terceira na navegação (Bacon, 2005, pp. 38-97).

        Bacon não poderia ter concluído seu pensamento de um modo mais claro, quando pensamos que foi um dos mais dignitários homens do Renascimento – aliando arte, política, técnica e ciência.

        Kant reagiu a esta posição, porque embora todo conhecimento comece com a experiência, nem todo conhecimento resultante procede dessa mesma experiência.


Realismo

        Em seguida, o realismo também se avolumaria como método e rigor científico, à medida em que a razão e a verdade não poderiam estar, é claro, a não ser na própria realidade. Agora, a questão estava em saber como escarafunchar esta realidade a fim de que as aparências se discrepassem em virtude das ranhuras elucidativas. Contudo, em resumo, por realismo, temos que:

        1) "Realismo" é o nome da atitude que se atém aos fatos "tal como são" sem pretender sobrepor-lhes interpretações que os falseiam ou sem aspirar a violentá-los por meio dos próprios desejos. No primeiro caso o realismo equivale a uma forma de positivismo [...] já que os fatos de que se fala aqui são concebidos como "fatos positivos" [...] No segundo caso temos uma atitude prática [...] O chamado "realismo político" (Realpolitik) pertence a esse realismo prático. 2) "Realismo" designa uma das posições adotadas na questão dos universais [...] a que sustenta que os universais existem realiter ou que universalia sunt realia. 3) "Realismo" é o nome que se dá a uma posição adotada na teoria do conhecimento ou na metafísica. Em ambos os casos, o realismo não se opõe ao nominalismo, mas ao idealismo [...] O realismo ingênuo supõe que o conhecimento é uma reprodução exata (uma "cópia fotográfica") da realidade. O realismo científico, empírico ou crítico adverte que não se pode simplesmente equiparar o percebido com o verdadeiramente conhecido, e que é preciso submeter o dado a exame e ver (para depois levá-lo em conta quando forem formulados juízos definitivos) o que há no conhecer que não é mera reprodução (Mora, 2001, pp. 2471-2473).

        Como diria Giambattista Vico (1989), o restaurador do racionalismo na modernidade clássica (1668-1744), da rudeza nasce da ignorância, pois quem não sabe sempre duvida, citando em latim a lei das XII Tábuas: Si quis nexum faciet mancipiumque, uti lingua nuncupassit, ita ius esto.


Sobre o homem mau em Hobbes

        Já em Hobbes, destaca-se a preocupação e a busca pela RETA RAZÃO: O contrato civil dá origem ao Estado de direito como uma moral civilizadora, reguladora das necessidades de sobrevivência; sublimando-as, subsumindo-as em um tipo de Estado (Angoulvent, 1996, p. 49). Para Hobbes, somos levados a um princípio passional: o medo.

        A matematização da política seguia, sob o Renascimento, o mesmo influxo da geometrização das ciências: a ciência matemática da mecânica (terrestre). Ciência dividida em: estática, hidrostática e cinética. Porém, aliavam-se guerra e status político da própria ciência ao curso global das mudanças, o que, talvez, pudéssemos chamar com mais propriedade de mudanças de paradigmas: desenvolvimento tecnológico devem ser considerados em paralelo e entrecruzando-se, de forma radical ou revolucionária, em determinada época, com as alterações de maior relevância e significado, do papel social das ciências e das forças motrizes do telos, do comus e do ethos social. Com Hobbes e sua tentativa de fixar com precisão não só o poder do Leviatã, mas também do conatus não seria diferente, entendo-se conatus (ou endeavor) como uma espécie de conexão ampliada entre sentidos, sentimentos, significados que envolvem as inúmeras teias entre mente e mundo.

        Assim, como se diz fortuitamente, se o homem é mau, por natureza, em Hobbes, como lobo de outro homem, sem restrições, então, para Hobbes a razão humana está submetida à própria maldade, assim como todas as demais características humanas.

        Contudo, lembrando-se que sempre foi temente a Deus (até por conveniência), crente nos direitos naturais, jusnaturalismo, não se pode concluir como na premissa de cima, porque seria como que admitir que o direito derivasse da consciência mal-sã.

        Sobretudo se pensarmos que o lobo do homem se revela pelo "estado de necessidade", então, o contrato social, motivado/motivador do conatus, aí o homem seria capaz de produzir uma RETA RAZÃO - razão esta que levaria de encontro ao juízo superior do soberano e, ao mesmo tempo, que o distanciaria da maldade que "lhe" seria natural e esperada em toda condição ou estado de necessidade.

        No pensamento renascentista, seria como se a política (racionalismo-prático) suplantasse as emoções. Afinal, a política é organização da Polis. O ideal estaria em assegurar da melhor forma possível o poder, do Leviatã, isto é, em organizar e centralizar o poder, fundar o Estado-Nação e sua soberania subjacente à Razão de Estado (aliás, o tema mais candente entre os séculos XV e XVII).

        Mas, se era uma fase de ampliação de horizontes, igualmente deveria ser de aplicação de novas ou de outras formas de utilização das mesmas ciências, com outro olhar e perspectiva muito mais dirigida pelos fins. Se saber era poder, com os matemáticos em ação não haveria margem de erro (em política, não haveria margem para perdão, isto é, o erro que seria absolvido):

        Por mais contrário que o movimento da Terra possa parecer à filosofia natural, Copérnico insistiu, ele deve ser verdadeiro porque a matemática o exige. Isso foi revolucionário [...] Os fatores que contribuíram para estimular essa tendência foram variados e complexos, mas incluem a recuperação de textos matemáticos da Grécia antiga por eruditos humanistas que forneceram novos meios para a formulação de exigências quanto à unidade da matemática, sua utilidade e sua certeza como meio de estabelecer a verdade [...] (Henry, 1998, p. 22).

        Todavia, tudo isto só seria possível se houvesse munição tecnológica suficiente, engenho e razão direcionados ao mesmo fim, à conquista e conservação de mais poder. Tudo feito com o máximo de objetividade — tanto a matemática o exigia que "navegar é preciso". Navegar é preciso, como necessidade de ampliação dos horizontes dos conquistadores, quanto à precisão de cálculo deveria se apoiar em determinado instrumental técnico: bússola e astrolábio, por exemplo. Nunca houve política sem tecnologia e, no Renascimento menos ainda:

        Inovações nas operações militares, em particular a inventiva resposta ao cerco por canhões, o bastião resistente à artilharia e vários projetos de engenharia civil como a recuperação de terras, construção de canais ou mesmo o simples levantamento topográfico para propósitos fiscais, foram vistos como causas importantes não só do status mais elevado dos matemáticos nos primeiros tempos da Europa moderna, mas também do maior interesse da matemática [...] Mudanças na natureza e na estrutura das cortes reais numa Europa de Estados cada vez mais absolutistas também deram ao mathematicus oportunidades mais amplas de fazer sentir sua presença (Henry, 1998, p. 27).

        Para se ver o Novo Mundo era preciso muita fé, sem dúvida, mas a fé com um pé na razão e na ciência e outro nos fins políticos. Decerto que este realismo não podia acertar como simples soma de dois mais dois, igual a quatro, porém, traçava aí as linhas gerais do realismo que habitaria toda a modernidade e a racionalidade técnica até meados do século XX. Um de seus grandes nomes, não só como cientista (matemático), mas sim como pensador político foi Pascal.

        Se a ação política não é em si matematizável, diante das próprias condições da realidade que permeia o realismo político, especialmente na relação entre objetivos e efeitos, ao menos pode ser melhor escalonada (não precisamente raciocinada) entre meios e fins. Nisto será, enquanto prática social, uma ação política fria, realista, calculista — quanto a ser isenta de piedade, uma vez que o erro em política é sempre derrota e a derrota equivale à morte política: vita mea, mors tua. Como nos diz A. Comte-Sponville (Pascal, 1994), o político-matemático era um pensador de rara luz, de tão crua, capaz de ver com radicalidade e certo revolucionarismo moderno, de notável lucidez e desiludido. Por vezes, desesperado quando se voltava à sociedade que o cercava, mas sem se esconder no niilismo ou no individualismo a-político. Há uma virtù em Pascal e, talvez, seja a de ser profusamente realista e sem utopias, desilusões, mágoas ou rancores — o que, certamente, é raríssimo de se ver no cotidiano da vida real. Como nos diz, pela razão dos efeitos: "A concupiscência e a força são as fontes de todas as nossas ações: a concupiscência produz as voluntárias: a força, as involuntárias". (Pascal, 1994, p. 08). A concupiscência na vida diária, sinônimo de sensualidade, lascívia, em política é simplesmente sedução, oratória, impressionismo e/ou marketing.

        Também podemos dizer que não lhe impressionava o maniqueísmo ou messianismo puritano, como idealista sem realidade, pois não há mal sem o bem e vice-versa. Se lemos somente o primeiro trecho da citação, sem o cuidado necessário, parece retomar o lendário do homem, lobo do homem:

        Todos os homens se odeiam naturalmente uns aos outros. Faz-se o possível para utilizar a concupiscência em benefício do bem público; mas isso é fingimento, e uma falsa imagem da caridade; pois, no fundo, é apenas ódio [...] fundamentaram na concupiscência e dela extraíram regras admiráveis de governo, de moral e de justiça; mas esse fundo infame do homem, esse fingmentum malum, está apenas coberto: ele não foi tirado [...] Injustiça. — Não encontraram outro meio de satisfazer a concupiscência sem prejudicar os outros (Pascal, 1994, p. 10-11).

        Ódio ou luta de classes? O silogismo se apóia em metáforas! Deste realismo político, além da prática da navegação precisa, exata, ainda temos como derivado o materialismo e o Positivismo (como perspectiva política, religião ou método), mas especialmente a partir dos séculos XIX e XX.

        Este Homem Novo, marcado pelo individualismo, no período propriamente do Renascimento, não permitiu ver o Outro, mesmo sob constantes alertas morais, porque o EU era muito mais importante ao capital e sua expansão do que o apego ao comus e ao ethos:

        O eu é odioso [...] Em suma, o eu tem duas qualidades: ele é injusto em si, ao fazer-se o centro de tudo; ele é incômodo aos outros, ao querer sujeitá-los: pois cada eu é o inimigo e gostaria de ser o tirano de todos os outros [..] Cada um é para si, pois, ao morrer, tudo está morto para si. E daí cada um acreditar ser tudo para todos [...] Um homem que se põe à janela para ver os que passam, se eu estiver passando, posso dizer que ele se pôs aí para me ver? Não, pois não em pensa em mim em particular. E quem ama alguém por causa de sua beleza, ama-a de fato? Não, pois a varíola que matará a beleza sem matar a pessoa, fará com que não mais a ame (Pascal, 1994, pp. 12-12).

        Assim, o filósofo-matemático nos faz lembrar novamente de Hobbes e seu Homo homini lupus, porém não se deve confundir o individualismo do Renascimento nem com o hedonismo de um Epicuro, por exemplo, da Grécia clássica, nem com o niilismo ou cinismo abjeto atual. Isto fica mais claro no próprio Pascal quando se refere à conquista e à glória:

        A maior baixeza do homem é a busca da glória, mas este é também o maior sinal de sua excelência; pois, não importa as posses que tenha na terra, a saúde e a comodidade essencial que possua, ele não estará satisfeito se não for estimado pelos homens. Julga tão grande a razão do homem que, mesmo tendo alguma vantagem na terra, não estará contente se não estiver vantajosamente situado também na razão do homem (Pascal, 1994, p. 18).

        Contudo, esta lógica seria demasiadamente refeita a partir do que Marx (1977) chamou de a acumulação primitiva do capital, sobretudo, entre as duas grandes revoluções industriais.


Materialismo

        O materialismo e o realismo conheceram diversas fontes inspiradoras em idéias/ideologias e em autores: Demócrito; Maquiavel; Michelet; Marx. O materialismo afirma que todas as coisas são compostas de matéria e os fenômenos são o resultado de interações materiais: a existência dos objetos independe do pensamento e por isso pertence à classe da ontologia monista. A expressão foi utilizada por Leibniz (1702) e reivindicado por La Mettrie (1748). Alguns dos mais representativos filósofos pré-socráticos foram: Leucipo, Epicuro, Lucrécio e os estóicos.

        Das Luzes ao Positivismo e, de lá para cá, como podemos (re)tomar o realismo, mas sem retirar-lhe o básico: o mínimo de realidade político-social? Neste caso, o Iluminismo ainda teria fogo e luzes para lançar-se sobre ideais nobres e que pudessem dobrar a dureza excessiva de alguns métodos. Afinal, agora diante das duas grandes revoluções tecnológicas (1750-1850), era mais necessária a crença de que no amanhã está o bem, a felicidade, a justiça. Este positivismo era especialmente herdeiro dos ideais da Revolução Francesa e não tanto dogmaticamente metódico.


Direito à Educação e Esclarecimento

        A principal referência é Kant e o melhor produto teórico é o seu texto O que é Esclarecimento. Em suma, o Aufklärung instiga a que se "ouse pensar" e assim "ouse fazer": "Sapere aude!". "Tenha coragem de fazer uso do teu próprio entendimento". Desse modo, o esclarecimento instiga à saída do homem de sua menoridade. E o que é menoridade? "A menoridade é a incapacidade de fazer uso de seu entendimento sem a direção (tutela) de outrem". O homem da menoridade precisa de um condottiere, seja na vida privada, seja para assuntos de relevância pública.

        Depois de libertos do primitivo estado de natureza (naturaliter maiorennes), as causas internas à permanência do indivíduo na menoridade (intelectual, moral, política, cultural) são a preguiça ou comodidade e a covardia. É cômodo não ter de fazer por si mesmo – no senso comum, diz-se que "pensar dói". Também não se tem necessidade de pensar ou fazer, se é possível apanhar tudo pronto [11]. Alguns ainda consideram difícil esta passagem, mas o perigo não é grande, porque só se aprende a andar após algumas quedas (está aí o método da "tentativa e erro"). Então, a maioridade corresponde a abandonar primeiramente o embrutecido estado de gado doméstico.

        Para a menoridade ainda concorrem a adesão e a aceitação de verdades prontas, dogmas e preceitos inquestionáveis: preceitos e fórmulas, esses instrumentos mecânicos de uso "racional" ou dons naturais, são os grilhões da consciência à menoridade. Esta razão domesticada é, portanto, uma das causas centrais da menoridade. Também pode incorrer em grave erro quem considera ser viável saltar o fosso da liberdade sozinho, pois a liberdade é uma construção social.

        Todavia, alguns podem iniciar essa cruzada, sozinhos e mesmo que seja longa e penosa. Alguns que tenham pensamento próprio, libertando-se do jugo de tutores e da comodidade, espalharão ao redor de si o espírito da avaliação racional do próprio valor e da vocação inata ao homem de pensar (e agir) por si mesmo. Instigada por um líder consciente, a massa oprimida e subjugada pode gritar e lutar por sua liberdade (mas, desde que seja um líder e não outro tutor). Por isso, o preconceito, a indiferença, o ranço da menoridade [12] podem voltar-se contra seus agentes e ainda alimentar, em alguns sobreviventes, o direito de rebelião ou sedição.

        Neste movimento social e temporal, de que tratam os libertários, o povo seria levado a pensar — até porque é rara a germinação natural. Mas, a instigação a se rebelar contra o status quo viria de uma vanguarda, uma vez que, raramente, pensa-se em ser livre, sendo-se criado como escravo. Por esta dialética negativa, o próprio Senhor de Escravos não é um liberto, nem se encontra na maioridade, simplesmente porque necessita (para tudo) de seus escravos, ou seja, de alguém que faça por ele.

        Neste caso, ainda é interessante pensar a aliança que se pode tecer entre cultura e política: Uma revolução talvez realize a queda do despotismo pessoal, da opressão pelo lucro incessante ou da dominação descabida, porém nunca produzirá verdadeira reforma (libertária) no modo de pensar. Este seria o real limite da própria vanguarda que conduz à liberdade, uma vez que ninguém é conduzido à liberdade, como estado-de-ser, sem saber do que se trata, isto é, sem ter a consciência dessa mesma liberdade. Portanto, só a iniciativa leva à liberdade e esta conduz ao esclarecimento — sendo que a base da liberdade (para os antigos) estava na isegoria e na isonomia. Então, o que é liberdade? Simplesmente, fazer uso público de sua razão em todas as questões.

        Por sua vez, o uso público da razão traz um interstício entre esclarecimento e conhecimento: quando o homem SÁBIO se expressa, livremente, diante do grande público do mundo letrado. Já o uso privado da razão é de pertencimento do SÁBIO que pode fazer uso de sua razão em função de certo cargo/função pública a ele atribuídas. Assim, para Kant, há certos casos inevitáveis ou necessários em que se constroem mecanismos de comportamento passivo ou de unanimidade artificial: em tais casos, não é permitido raciocinar, porque se espera a obediência. A educação dos antigos falava no temor reverencial.

        Pergunta-se: sob esta análise, o educador (professor) está mais para o SÁBIO (como especialista ou intelectual que faz um uso público da razão) ou se aparenta ao sacerdote (restrito ao uso privado da razão)?

        Em todo caso, para ficarmos nos casos sugeridos por Kant, pensemos na democracia representativa e no princípio da legalidade. Para o administrador público, a liberdade de agir está cercada, cerceada pela legalidade, impondo-se a este uma condição de agente público da obediência. O administrador público só pode fazer (agir), estritamente, diante do que a lei (anterior a seus atos) assim prescrever e autorizar [13].

        Outro caso considerado por Kant se refere à obrigatoriedade do pagamento de impostos que recai sobre todo cidadão. Obrigação da qual ninguém se desobriga, dado o caráter social da arrecadação dos impostos: originário e necessário à conservação do Contrato Social. A recusa ao pagamento de impostos pode gerar ou fortalecer o sentimento de descompromisso social ou de anomia (Durkheim, 1988) e daí derivar-se no movimento social da Desobediência Civil (Thoreau, 1966).

        Do que não se depreende, obviamente, o imobilismo: Nada existe aqui que possa constituir um peso na consciência. Isto é, constitui-se em dever cívico (ou da consciência daquele que não é senhoreado) questionar e se impor contra a opressão e a injustiça: um "Ouse questionar!". Mesmo o religioso tem o dever de se impor contra o erro, a exemplo das alegações da Reforma e de Lutero, insurgindo-se contra a venda de indulgências. Ao se deparar com tal nível de estranhamento ou de contradição, o indivíduo que ousa pensar (e agir) é compungido a renunciar à adesão ou promover uma ampla reforma dos pressupostos: Pois se acreditasse encontrar esta contradição, não poderia em sã consciência desempenhar sua função, teria de lha renunciar.

        A este tempo de Kant, um século antes, o liberalismo clássico de Locke (1632-1704) já havia anunciado a urgência da tolerância, principalmente religiosa. Portanto, nem sob o impacto do Contrato Social (ou da deliberação religiosa, invocando-se dogmas e preceitos sagrados), nem sob o codinome o livre-arbítrio, há legitimidade (para ser coerente com o uso pessoal da razão) para se abrir mão da liberdade ou, o que dá no mesmo, colocar-se livremente sob o jugo da escravidão (há contradição interna aos termos). Pela lógica (ou sob o império da lei) não são válidas ou legítimas tais cláusulas leoninas ou ainda as assim chamadas Leis de Plenos Poderes (porque se não se admite a divergência, não há liberdade e nem esclarecimento ou maioridade). De tal modo, condenar o povo à ignorância (negando-lhe o acesso à informação, a educação) é um crime de lesa pátria, pois o progresso é natural ao esclarecimento.

        Mas o povo, como coletivo, pode impor a si próprio leis de restrições, a começar da "liberdade de pensamento [14]"? Pensemos no chamado Estado de Emergência [15]: Seria certamente possível, como se esperasse por lei melhor, mas por determinado e curto prazo, e para (re)introduzir certa ordem. Ao que ainda se poderia acrescentar sob rígida vigilância e estrita ou crítica e urgente circunstância (ou em condições determinadas, espaço delimitado e um curto prazo pré-estabelecido). Historicamente, mesmo sob condições gravíssimas, seria difícil de se legitimar a opressão desmedida e sem fim. Este era o caso da nomeação de um Imperador [16] romano, a fim de se normalizar graves instabilidades institucionais, suspendo-se a vigência das garantias da República (mas não subtraindo-se ao Senado, que continuava como seu juiz).

        Durante a República, o título de imperator sinaliza apenas um "comandante das forças militares" e não Imperador. É óbvio, mas Imperador não combina com a idéia de República. Já a figura do Cônsul implicava que este comandante teria o mais importante cargo executivo da República.

        Por outro lado, renunciar ao esclarecimento não seria um direito individual, sagrado e consagrado pelo liberalismo e pelo Iluminismo?

        Um homem sem dúvida pode, individualmente, e mesmo assim por tempo limitado, no que lhe diz respeito, adiar o seu esclarecimento. Contudo, renunciar ao esclarecimento, para si ou para seus descendentes, é ferir os direitos mais sagrados da Humanidade. Portanto, se não é lícito ao povo tomar tal decisão, menos ainda será lícito a um governante decidir sobre esse fim.

        Renunciar ao esclarecimento é ir contra o "caminho normal, natural" da vida em sociedade, da Humanidade como um todo. É como se dissesse: a ninguém é dado o direito de se escusar da tarefa de ser humano. Seguindo Max Weber (1979), ainda se diria: "o desencantamento do mundo é inevitável, inexorável".

        O BOM governo, ao contrário, deve evitar que um súdito impeça a outros de trabalharem, de acordo com sua capacidade (e mais ainda se de forma violenta), para a determinação e a promoção de si mesmos. Também aquele se expõe à censura, sem reagir, ou o censurador padecem do mesmo mal: Ceaser non est supra grammaticos ("erra muito quem censura").

        De tal modo, a obrigatoriedade do ensino — como parte do direito à educação — teria reflexos diretos na tarefa da construção social do conhecimento e da consciência e da responsabilidade social.

        Assim, se é verdade que "erra muito quem censura", então, deve-se concluir pela afirmação tanto do "direito de livre pensamento" quanto pela "livre expressão", e se esta última condição for tomada, igualmente, como parte do direito à educação, logo, concluiremos pela necessidade da constância da "liberdade de cátedra".

        Neste contexto, o laicisismo (o Estado Laico como empuxo ao Estado Moderno) mostrou-se muito eficaz à luta pela liberdade e pelo reconhecimento de direitos, incluindo-se aí a educação. Isto se deu, em parte pela via armada da guerra civil, a exemplo da Inglaterra do século XVII, em parte como movimento social e cultural pela tolerância e pela liberdade. Serve de exemplo o fato de que num regime de liberdade, a tranqüilidade pública e a unidade social apaziguam fontes de inquietação.

        Nesse estado de liberdade pública, os indivíduos se desprendem progressivamente do estado de selvageria inicial e, talvez, sobrevivente à vida social contingente. Portanto, se fizermos uso de um raciocínio equivalente, podemos concluir que a não-liberdade ou o autoritarismo não podem nos conduzir à liberdade: não há como forçar à liberdade. Há sedução pela liberdade (como ação política ou religiosa, no caso dos movimentos pela tolerância religiosa) ou por seu ideal e isto, por si, já esclarece e elimina o que não-é-liberdade.

        Esse estado de liberdade pública, entretanto, encontrará uma ressalva quanto ao alargamento da liberdade ou, em sentido inverso, quanto a suas restrições: a Razão de Estado. Somente aquele, embora sendo esclarecido [17], não tendo medo de sombras e com um exército numeroso à disposição, bem treinado, pode dizer aquilo que não é lícito [18] a um Estado livre supor: raciocinais tanto quanto quiserdes e sobre qualquer coisa, contanto que obedecei! Parece clara a minuta da Razão de Estado que se constituiria sob o Estado Moderno.

        Em síntese, para o Iluminismo, a dignidade está em pensar livremente, para que o indivíduo deixe de ser máquina, a fim de se ver livre do jugo da cangalha do tutor ou do moinho da fortuna — e que geralmente falha em termos políticos. Por fim, vale indagar, hoje, será que experimentamos um mundo em tempos de esclarecimento? Ousemos um pouco e logo saberemos — como queria aquele Kant de há muito tempo:

        "Ouse saber!"

        "Ouse querer!"

        "Ouse questionar!"

        "Ouse fazer!"

        "Ouse lutar!"

        "Ouse vencer!"

        Em suma, nada mais era do que a súmula do projeto político ideal-Iluminista de se construir o reino da liberdade e da felicidade na Terra, com a ajuda da ciência, das artes (Renascença) e dos ofícios e tecnologias (da manufatura à grande indústria). No entanto, as exigências do século XIX, novamente, traziam à baila o inelutável método que melhor se aplicaria à vida social, política, ao mundo do trabalho ou à academia. É chegada a hora do positivismo de Comte se apresentar, como antecessor dos métodos modernos de produção do fordismo e do taylorismo.


POSITIVISMO

(1798-1857)

        O POSITIVISMO surgiu como tentativa de responder às grandes manifestações, de toda ordem, surgidas no mundo ocidental a partir da segunda metade do século XIX. Certamente, a maior ou principal ocorrência nestes meados do século XIX é o acirramento do capitalismo e seu marco mais forte e instigante é a 2ª Revolução Industrial, em 1850. Possivelmente Condorcet seja o primeiro POSITIVISTA. Mas também Saint-Simon procurou utilizar o método exato das ciências naturais como uma extensão aplicável à filosofia. Neste sentido, Auguste Comte ainda diria que o POSITIVISMO é uma grande corrente filosófica. Nesta fase, o que se pode notar como sua característica principal é a romantização da ciência [19], ainda que em Comte não haja romantismo algum, mas quando muito uma "religião social".

        Teses fundamentais do Positivismo

        1.A ciência é o único conhecimento possível e o método científico é o único validável.

        2.Segundo A. Comte, o método científico deve ser DESCRITIVO [20]. Partindo-se dos fatos mais simples para a gênese evolutiva dos mais complexos (é um herdeiro de Descartes).

        3.O Método da Ciência deve ser estendido a todos os campos de indagação e da atividade humana.

        4.Há uma nítida distinção entre sujeito e objeto do conhecimento.

        5.As proposições científicas são formuladas em busca da maior RAZOABILIDADE [21], RACIONALIDADE [22], NEUTRALIDADE [23], OBJETIVIDADE [24] e QUANTIFICAÇÃO [25] possíveis.

        O Positivismo também é evolutivo.

        Tome-se a demonstração dos três estados: teológico-fictício; metafísico-abstrato; estado positivo-científico. É como se o capitalismo sinalizasse para a fase mais avançada da própria evolução da espécie humana, indicando o ápice de nossa mental, cognitiva, analítica.

        Em síntese:

        -O Positivismo é herdeiro do Cartesianismo.

        -O Positivismo é uma filosofia positiva.

        -O Positivismo é uma proposição de cunho positivo para a vida social.

        -"O Positivismo é a verdadeira filosofia do povo".

        -O Positivismo reforçou a perspectiva do Nós — uma vez que, a idéia de indivíduo (provinda do individualismo) era considerada abstrata demais.

        -O Positivismo é (foi) uma busca pelo "bom senso universal".

        -O Positivismo é o prenúncio ou a primeira pronúncia da Sociologia.

        -O Positivismo aplica o método das ciências naturais às ciências sociais.

        -O Positivismo é uma filosofia da ciência, uma espécie de moral e até mesmo uma nova religião.

        Neste sentido, o Positivismo será eficaz. Mas, o Positivismo ainda é positivo.

        O termo positivo designa:

        - o real em oposição ao quimérico,

        - o útil. ............... ao desnecessário,

        - a certeza. .......... à indecisão,

        - o preciso. ......... ao vago,

        - aptidão para organizar. ... ao negativo, a aptidão para destruir,

        - o relativo. ........ ao absoluto (este último caráter está implícito no precedente, pois o absoluto é negativo [26]) (Comte, 1990, p. XIX).

        O Positivismo se apresentou, primeiramente, como Física Social.

        Como escreveu Auguste Comte: "Entendo por Física Social a ciência que tem por objeto próprio o estudo dos fenômenos sociais, considerados com o mesmo espírito que os fenômenos astronômicos, físicos, químicos e fisiológicos, isto é, como submetidos a leis naturais invariáveis, cuja descoberta é o objetivo especial de suas pesquisas" (Comte, 1983, p. 53).

        O Positivismo é uma doutrina que investiga leis, suas constâncias e relações:

        "Sua principal característica é substituir em toda parte a inacessível determinação das causas pela simples busca das leis, isto é, das relações constantes existentes entre os fenômenos observados" (Comte, 1990, pp. XXVIII-XIX).

        O Positivismo orienta para que se abandonem as vãs especulações teóricas e a metafísica, em prol de um conhecimento positivo.

        O que explicaria o fato de A. Comte ter escrito um livro-síntese com o título de Discurso Sobre o Espírito Positivo.

        Este abandono das vãs especulações levaria o Positivismo à predileção por meios/métodos de verificação/checagem pelo método quantitativo.

        Método quantitativo: quantifica-se tanto na coleta quanto na análise final dos dados (estatística e medidas numéricas), como garantia de precisão dos resultados, evitando distorções na análise e/ou interpretação.

        Porém, seguindo essas premissas, pode-se dizer que o raciocínio positivista sempre será lógico-dedutivo?

        Premissa maior: Todo homem é racional.

        Premissa menor: João é homem.

        Conclusão: Logo, João é racional

        -A METÁFORA MAIS FAMOSA na obra de Galileu — e que encerra em si o nó górdio da nova filosofia — é a do livro da natureza escrito em linguagem matemática. A filosofia está escrita nesse imenso livro que continuamente se acha aberto diante de nossos olhos (falo do universo), mas não se pode entender se antes não se aprende a compreender a língua, e conhecer os caracteres nos quais está escrito. Ele vem escrito em linguagem matemática e os caracteres são triângulos, círculos e outras figuras geométricas, sem as quais é impossível para os homens entender suas palavras; sem eles é rodar em vão por um labirinto escuro. (Saggiatore, 6) (Calvino, 2007, p. 90).

        Nunca deixa de provocar surpresa ou espanto vermos métodos científicos e tão caros à exatidão usarem tanto de metáforas, caminhos labirínticos, figuras de linguagem, balões de ensaio, sincretismos.

        Questões finais para refletirmos (seguindo Kant, Comte e a perspectiva atual que melhor represente a visão de mundo do leitor):

        1.Ousadia é sempre sinal de sabedoria?

        2.Como podemos desafiar a intolerância, o preconceito, mas com ousadia e prudência?

        3.Qual o limite entre a ousadia e a imprudência?

        4.Há superação da menoridade, sem ousadia?

        5.Por que o fanatismo (Voltaire), a covardia e o comodismo (Kant) implicam na "peste" da menoridade?

        6.A ciência é sempre positiva (positivista), com bons resultados para toda a Humanidade?

        7.Por que alguém escreveria um livro com o título de A Ciência Assassina?

        8.Será que hoje em dia alguém ainda diria que aos trabalhadores interessam mais os deveres do que os direitos, incluindo-se o direito à educação ou à participação e envolvimento político?


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Notas

  1. Agradeço esta referência ao Prof. Dr. Edemir de Carvalho, UNESP/Marília.
  2. Ver em: http://www.historiadomundo.com.br/idade-moderna/renascimento/.
  3. Veja-se em: http://www.buscalegis.ufsc.br/busca.php?acao=abrir&id=24571.
  4. Marx também fez sua tese de doutorado com base em Epicuro.
  5. Durante muito tempo, as Ciências Cognitivas também debateram a "dicotomia mente-cérebro".
  6. Talvez o que tenha faltado a alguns aborígenes na sua jornada civilizatória tenha sido a descoberta ou o uso mais sistemático do "movimento".
  7. O mesmo tipo de pensamento que havia levado os navegadores a questionarem a veracidade de a Terra ser chata e dessa "dúvida" terem tirado a certeza da navegação ultramarina, após a centralização de Portugal.
  8. Hoje, esse "agir racional" seria oposto a todo pensamento dogmático, refratário às críticas, e diga-se ele de si mesmo ser consciente ou não, como ocorre quase sempre com a ideologia.
  9. Foi este o sentido mais forte do "penso, logo existo", resgatado por Kant e depois por Rousseau: a potência racional (Canivez, 1991).
  10. A idéia de virtù como ato de um arqueiro que busca seu alvo, não é diferente disto.
  11. No sentido moderno, corresponde a "copiar, colar".
  12. O ditado popular também diz: "Vamos deixar como está, para ver como fica".
  13. Poderíamos relembrar dos militares que, em certas situações, o questionamento ou não-cumprimento de determinadas ordens (justas ou, pelo contrário, ilegais) pode ser (quase sempre é) considerado motim, e isto leva os leva à Corte Marcial.
  14. Veja-se, do ponto de vista constitucional o art. 5º, inciso IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato. É vedado o anonimato para coibir os crimes contra a honra.
  15. O art. 136 da Constituição Federal de 1988 trata das medidas de exceção, mas, ao invés de falar em Estado de Emergência, designa como estado de defesa. No § 1º expressa as limitações ou restrições que lhe são próprias: "O decreto que instituir o estado de defesa determinará o tempo de sua duração, especificará as áreas a serem abrangidas e indicará, nos termos e limites da lei, as medidas coercitivas a vigorarem...". Ver a íntegra das restrições à liberdade (inclusive de "esclarecimento") no Anexo I.
  16. Imperador: poder total (título de Augusto = "Preferido dos deuses").
  17. Kant poderia estar se referindo aos "déspotas esclarecidos" ou antecipando-se ao próprio jacobinismo que se seguiria à Revolução Francesa.
  18. É exatamente este o argumento dos que defendem o Estado de Exceção – como um Estado legalizado, não age fora dos limites da lei ou do "controle social" da própria liberdade. Para que se tenha melhor compreensão do alcance dos meios de exceção mais severos, veja-se art. 137 e ss. da CF/88 – Anexo II.
  19. Um traço comum ao Romantismo é a oposição ao capitalismo: aspira-se a uma espécie de socialismo utópico ou igualitarismo radical. Todavia, é complexo e contraditório como pensamento social e engajamento político – com uma postura politicamente moderada e socialmente avançada ou progressista.
  20. Uma espécie de narração dos fatos e eventos, suas interseções, confluências, atores, fatores, causas e efeitos, como se o pesquisador fosse um observador que nos contasse (narrasse) os detalhes dessas ocorrências (separando-as, classificando-as), mas sempre guardando distância do próprio assunto ou tema observado.
  21. Como utilização da razão (ratio) e do próprio controle racional sobre o uso de um determinado método, revelando-se como um dado amplamente verificável – implica, logicamente, em maior previsibilidade: possibilidade concreta, significativa de verificação da ocorrência dos dados ou fatos previamente sinalizados.
  22. Tudo aquilo que é lógico, em conformidade com um bom método ou que é razoável (em virtude da própria razão) e que estaria de acordo com a faculdade de bem julgar.
  23. Sob a perspectiva positivista, trata-se justamente da eqüidistância em que se devem postar sujeito e objeto do conhecimento.
  24. Manter o foco da ação no objeto previamente designado.
  25. O melhor exemplo é o emprego da estatística (análise quantitativa) na pesquisa social.
  26. Entretanto, façamos aqui uma breve pausa, pois a negação pressupõe um apartamento, uma seleção, uma separação indiscriminada ou aleatória e, por fim, a exclusão do indivíduo. A negação da identidade ao povo judeu, na Alemanha nazista, levaria à chamada Solução Final, ou seja, à sua eliminação física, cultural.

Autor

  • Vinício Carrilho Martinez

    Pós-Doutor em Ciência Política e em Direito. Coordenador do Curso de Licenciatura em Pedagogia, da UFSCar. Professor Associado II da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar. Departamento de Educação- Ded/CECH. Programa de Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade/PPGCTS/UFSCar Head of BRaS Research Group – Constitucional Studies and BRaS Academic Committee Member. Advogado (OAB/108390).

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MARTINEZ, Vinício Carrilho. Estado-Ciência. As bases racionalistas da mordernidade: Educação, Ciência e Direito. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2033, 24 jan. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12240. Acesso em: 29 mar. 2024.