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ACP contra TELEMS por descumprimento de contrato de cessão de linhas telefônicas

ACP contra TELEMS por descumprimento de contrato de cessão de linhas telefônicas

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Uma interessante ação civil pública do Ministério Público sul-mato-grossense, relativa ao descumprimento, pela companhia telefônica estadual, de um plano de expansão telefônica, em que os pretendentes haviam se cooperado em regime de autofinanciamento. Enviado por seu subscritor, promotor de Justiça do Consumidor de Campo Grande (MS), Amilton Plácido da Rosa (e-mail: [email protected]; home-page: http://pjccg.vila.bol.com.br).

Exmo. Senhor Juiz de Direito da ____ Vara de Fazenda Pública e Registros Públicos da Comarca de Campo Grande:

O Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul, ora representado pelo Promotor de Justiça de Defesa do Consumidor desta Comarca, que ao final subscreve e que recebe intimações pessoais na Rua Íria Loureiro Viana, 415, Vila Oriente, nesta Cidade de Campo Grande, com fundamento no artigo 129, III, da Constituição Federal, somado aos artigos 1º, II; 2º, 3º; 5º, caput; 11 e 12 , da Lei 7.347, de 24.07.85, que disciplina a Ação Civil Pública, e ainda ,nos artigos 6.º, VI; 81, parágrafo único e incisos I e II; 82, I; 83; 84, "caput" e parágrafos 3º e 4º; 90 e 91 do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078, de 11.09.90) e ancorado nos fatos apurados no Procedimento Administrativo 017/96, em anexo, propõe nesse Juízo a presente

AÇÃO CIVIL PÚBLICA

(retribuir em ações a participação financeira dos adquirentes das últimas linhas telefônicas comercializadas pela Empresa Inepar SA. Indústria e Construções; transferir os terminais para o nome do promitente-cessionário, investindo-o na condição de assinante; fazer a retribuição em ações, na proporção da participação econômica do consumidor, corrigidas monetariamente e acrescidas dos juros devidos, em relação a todas as 30.000 linhas telefônicas do PCT/91; e findar em 30 dias o processo já iniciado tendente à retribuição em ações em relação às 10.000 linhas telefônicas comercializadas pela Inepar, de modo que todas as subscrições em ações se dêem neste ano de 1997, bem como iniciar de imediato o mesmo processo e terminá-lo em 60 dias, contados da decisão judicial, em relação às 5.000 últimas linhas comercializadas pela Inepar, a respeito das quais a ré se nega a fazer a devida retribuição em ações) e para a cobrança de multa e de perdas e danos, por atraso na deflagração do processo tendente a dação do acervo e, conseqüente, distribuição de dividendos aos promitentes usuários a partir de 3 anos da assinatura do contrato de cada consumidor com a Empresa Inepar SA. Indústria e Construções, em face de TELECOMUNICAÇÕES DE MATO GROSSO DO SUL S/A - TELEMS, empresa concessionária de serviços públicos de telefonia, integrante do "Sistema Telebrás", com sede à Rua Tapajós, n.º 660, nesta Cidade pelas razões de fato e de direito que passa a expor:



DOS FATOS:

Usando do disposto na Portaria 086/91, a Comunidade de Campo Grande, por não ter suas necessidades de telecomunicações suficientemente atendidas e se fazendo representar pelo Município de Campo Grande, firmou, em 16 de dezembro de 1991, com a ré Telems "Contrato de Promessa de Entroncamento e Absorção de Rede" (f. 50/54 do PA), através do qual a ré se comprometeu - conforme exigia a referida Portaria n.º 086/91 - a transferir os terminais telefônicos para o nome dos promitentes-cessionários, investi-lo na condição de assinante e a retribuir em ações a participação econômica dos adquirentes do direito de uso de linhas telefônicas, já que a expansão se faria sob o regime de autofinanciamento, isto é, a própria comunidade, na pessoa de cada adquirente, financiaria a obra, que, ao final, passaria à propriedade da concessionária, que a retribuiria, de forma integral, em ações (cláusula 6.3, f. 53), não possibilitando, assim, qualquer prejuízo ao promitente cessionário ou enriquecimento ilícito da requerida.

Concomitantemente, através do Contrato de Prestação de Serviços em Regime de Empreitada Global, a Comunidade de Campo Grande contratou - também em 16 de dezembro de 1991 - as empresas Inepar SA. Indústria e Construções e Consil Engenharia Ltda., para que elas elaborassem os projetos e efetuassem a expansão de 30.000 linhas telefônicas, com base no Plano conhecido por Planta Comunitária de Telefonia - PCT (1), levando em conta as áreas mais necessitadas da cidade.

A comercialização dos terminais implantados ficou, com exclusividade, a cago das empresas empreendedoras (item 4.1 do contrato de Empreitada Global, f. 44 do Procedimento Administrativo 017/96), que deveriam instalá-los no prazo de 24 meses, a contar da assinatura do contrato (item 3.1 do contrato de Empreitada Global).

É bom salientar desde logo que cada uma das empreendedoras ficou responsável por 50% das linhas a serem implantadas, cabendo, portanto, 15.000 linhas à Inepar e 15.000 linhas à Consil.

Embora a expansão total seja de 30.000 linhas telefônicas, por questões comerciais e operacionais, a Empresa Inepar dividiu seu programa em duas fases, a primeira de 10.648 terminais e a segunda de 4.352 terminais, sendo que os telefones a comercializar seriam de 10.115 e 4.134, respectivamente, ficando a diferença dos terminais como reserva técnica da ré, por força contratual. Com a mesma finalidade, a Empresa Consil dividiu o seu programa em 3 fases, sendo a primeira de 5.148 terminais, a segunda, de 5.048 e a terceira e última etapa, de 4.812, sendo que os telefones a comercializar seriam de 4.891, 4.795 e 4.571, respectivamente, ficando a diferença dos terminais como reserva técnica da ré, também por força contratual.

Os projetos, a compra de terrenos e os materiais, os critérios técnicos da construção, ou seja, tudo o que envolveria a referida expansão deveria passar pelo crivo e aprovação da ré, que fiscalizou o tempo todo todos os serviços realizados, na forma como estava estabelecido no Contrato de Promessa de Entroncamento e Absorção de Rede (item 5.2, f. 51 do Procedimento em anexo).

Posteriormente, visando sempre obter a pronta adesão e o investimento do público alvo, a concessionária fez constar no contrato padrão (Contrato de Participação Financeira em Programa Comunitário de Telefonia, f. 95) que seria usado pelas empresas empreendedoras (Consil e Inepar) a cláusula 5.0, que dispunha que os investimentos do consumidor seriam retribuídos em ações e na mesma proporção de sua participação.

Foi por conta dessas promessas feitas pela ré que a comunidade se viu movida a participar daquele plano de expansão, preferindo fazer seus investimento em linhas telefônicas, ao invés de aplicar suas parcas economias em outros investimentos, cabendo ressaltar aqui que algumas vezes fez tal investimento com enorme sacrifício, sempre na esperança de ser acionista da ré, podendo, com isso, obter o direito de uso de uma linha telefônica e de participar dos lucros sociais da Empresa, bem como exercer o direito de subscrição de novas ações da ré.

Ocorre, porém, que - com o advento da Portaria 610, de 19 de agosto de 1994, que republicou a NET 004/DNPU - ABRIL DE 1991 (versão agosto de 1991), estabelecendo que os novos planos de expansão de telefonia não teriam mais o valor da participação financeira retribuído em ações aos promitentes-assinantes - a ré - contrariando não só a Portaria n.º 086/91 mas os próprios termos da Portaria 610/94 e não fazendo qualquer aditivo no Contrato de Promessa de Entroncamento e Absorção de Rede firmado com a Comunidade de Campo Grande - obrigou as empreendedoras Consil e Inepar a modificar seus contratos padrões e veiculando em suas publicidades, que a partir daquela data ela, a Telems, não mais retribuiria em ações a participação econômica do promitente-assinante no plano de expansão/91, que se encontrava em andamento, sem qualquer alteração do objeto contratual (cláusula 5.0, "in fine", f. 272, anverso), prejudicando, dessa forma, cerca de 10.000 promitentes-assinantes (5.000 do contrato da Inepar e 5.000 do contrato da Consil, estes últimos já objeto de ação civil em curso pela 1ª Vara de Fazenda Pública e Registros Públicos).

Melhor sorte não está tendo aqueles promitentes-assinantes que tiveram a promessa da ré de que teriam sua participação econômica retribuída em ações, dado que o processo necessário para efetuar tal retribuição nunca é deflagrado, e quando o é, anda tão lento, se arrastando por longos e infindáveis anos, que só dá prejuízos aos consumidores adquirentes que a muito fizeram seu investimento econômico, sem qualquer retorno, não podendo eles dispor livremente de suas ações, para negociá-las em bolsas ou para usufruir dos dividendos oriundos dos lucros sociais da empresa ré (apesar de que nunca se ouviu nesse país que a ré, Sociedade Anônima que é, cumprisse o disposto no Artigo 109, inciso I, da Lei n.º 6.404, de 15 de dezembro de 1976, no sentido de dar ao acionista seu direito essencial de participar dos "lucros sociais").

Isso sem dizer que, nessas condições, o consumidor não pode sequer ter o direito de uso da linha telefônica em seu nome, sendo obrigado, quando transfere esse direito a terceiro, a fazer por um preço bem abaixo do mercado, mesmo porque não pode transferir a linha para o nome do novo usuário, ficando, inclusive com o risco de pagar possíveis contas telefônicas feitas pelo novo adquirente do direito de uso, somando ainda outros prejuízos fáceis de se imaginar.

Para evitar tais abusos é que o Contrato de Promessa de Entroncamento e Absorção de Rede, em seus itens 6.4 e 6.5, previu que "na ativação da rede, a Telems assumirá de imediato todas as responsabilidades inerentes à exploração do serviço telefônico público, passando cada participante inscrito pela comunidade a condição de assinante do serviço" e "as instalações podem ser ativadas e transferidas para a Telems em etapas, desde que sua aceitação possa ser também realizada na mesma forma." Mas tais disposições a ré nunca cumpriu.

Percebe-se que o andamento desse processo de retribuição ocorre a passos de tartarugas, enquanto que os jornais publicam freqüentemente que a ações Telebrás elevam-se nas bolsas de valores a cada dia, basta ver que em relação às primeiras 10.196 linhas comercializadas pela Consil a ré não deu sequer sinal de iniciar o processo competente e necessário para a retribuição das ações e cria todos os dias subterfúgios novos para iludir o consumidor. E em relação as 10.648 primeiras linhas implantadas pela Inepar, iniciou o processo, mas faz de tudo para que ele se torne interminável e eterno, com grandes vantagens para si e ingentes prejuízos para os adquirentes.

Não é por demais reprisar, e agora usando outros argumentos e exemplos novos, que o atraso só traz resultados práticos à ré e prejuízo ao consumidor. Basta, para isso, ressalta-se que se a ré Telems tivesse efetuado a transferência do acervo nos prazos devidos, ou seja, 36 meses (24 meses para a expansão do Sistema Telefônico e 12 meses para se efetuar o processo de dação), a quantidade de ações que o promitente-assinante receberia é sem dúvida maior que a quantidade que receberá no momento em que ocorrer esta transferência, visto que o valor patrimonial da ação tem-se valorizado a cada ano, fazendo com que o número de ações diminua dia a dia para o promitente-assinante. Assim, se não houver uma providência judiciária de imediato, a desvalorização do patrimônio do promitente-assinante continuará em escala ascendente, proporcionalmente ao tempo em que se demorar para se efetuar a transferência definitiva do acervo.

Ajuda a ré nesse retardamento o expediente criado por ela consistente em poder efetuar contrato de comodato com as empresas empreendedoras, em nome de quem se encontram as notas fiscais dos bens implantados, para o fim de usufruir da receita dos telefones em operação.

Para se perceber também que as intenções da ré é de dificultar e de retardar ainda mais o processo de retribuição, basta examinar a CT. 20000/638/97 que ela enviou, em 14 de julho último, a Consil, exigindo que esta empresa faça, por etapa, a identificação das notas fiscais referentes às 15.000 linhas telefônicas instaladas por esta empresa empreendedora, o que é impossível nesse momento e se constitui numa exigência absurda, conforme afirmou o representante da Consil e do que tem plena ciência o réu Wolney Arruda.

Afirma aquela correspondência CT. 20000/638/97 (f. 337 dos autos de Procedimento Administrativo 017/96) que a identificação das notas fiscais por etapa "se faz necessária, uma vez que o laudo de avaliação deverá ser estruturado de forma a possibilitar a identificação dos bens que serão incorporados à Empresa por Dação e aqueles, relativamente à última etapa, que serão transferidos na forma de Doação." (grifou-se).

Além de ser uma operação quase que impossível, não há necessidade alguma de se fazer a identificação por etapas das notas fiscais, posto que: 1) embora a aceitação pudesse ter sido feita por etapas, não o foi, com prejuízo único para o consumidor, não se podendo agora querer fazer tal procedimento, para aumentar ainda mais esse prejuízo; 2) não há necessidade de se fazer distinção entre os bens a serem incorporados por dação e doação, uma vez que a incorporação por doação é uma ofensa à constituição, à lei, ao contrato firmado com a Comunidade e principalmente aos direitos dos promitentes cessionários; 3) o outro elemento para se fazer a transferência do acervo, a avaliação do patrimônio, deveria ser efetuado da mesma forma que a concessionária-ré o faz quando da comercialização direita ao promitente-assinante que é o valor do autofinanciamento (2) praticado pela mesma ou seja R$ 1.117,63, e que é também o mesmo valor praticado pelas empresas Inepar e Consil; 4) tal exigência não traz nenhuma utilidade e facilidade para acelerar o processo, mas, ao contrário, só o alongará ainda mais. De grande esclarecimento e valia é a resposta enviada pelo Presidente da Consil a esta Promotoria de Justiça, em resposta à notificação n.º 105/97 (documento em anexo, f. 338/339):

"5) (....) tendo em vista que estamos a mercê das artimanhas da Telems/Telebrás, que vêm criando situações para avaliar o patrimônio a ser transferido para as mesmas, com os valores mais baixo possíveis sem nenhuma pressa em concretizar o processo de dação, em função de que na conclusão da dação, os valores atribuídos ao patrimônio e respectivamente às ações abaterão imediatamente do limite de investimento anual da Telems, como também, se faz necessário um aumento de capital da Telebrás para a retribuição das ações.

6) Para comprovar as informações contidas no item 5, anexamos à presente cópia da CT 20000/63/97 de 29/07/97 da Presidência da Telems onde o mesmo após 9 meses da entrega pela Consil dos documentos contábeis da obra, vem de maneira absurda solicitar mudanças impossíveis de serem atendidas, conforme já informado anteriormente pela nossa CT 1493/97 de 29/10/96 (cópia anexas), mudanças essas, que além de lesar o consumidor demonstra claramente a intenção da Telems, não só de ganhar tempo como de transferir para a Consil a responsabilidade pelo atraso no processo de dação" (CT-CG-710/97, f. 338/339 dos autos de PA que instrui a presente ação).

Para se ter uma idéia clara de que a deflagração e a conclusão do processo que culmina com a transferência dos terminais para o nome do promitente-assinante, investindo-o na condição de assinante e subscrevendo em ações no valor de sua participação financeira retribuição de ações só dependia e depende da ré, e mesmo para evitar colocações absurdas por parte dela, com o fim de levar a erro o juízo, como é do seu costume, cita-se aqui as etapas a serem seguidas:

  1. depois de concluída a obra, a ré deve expedir o "Termo de Aceitação";
  2. avaliar o acervo;
  3. convocar a assembléia geral extraordinária dos acionistas (convocação esta que é feita, a qualquer momento, pelo Presidente da Telems que é também Presidente do Conselho de Administração) para aprovação do laudo de avaliação do Acervo da Planta Comunitária de Telefonia;
  4. aceitar o acervo, cuja transferência é feita através de escritura de dação pela Prefeitura com anuência das empresas empreenderas, e, ato contínuo, transferir os terminais telefônicos para o nome dos promitentes-assinantes, investindo-o na condição de assinantes;
  5. convocar uma nova Assembléia para se proceder o aumento do Capital Social e capitalização dos créditos relativos à etapa inicial do acervo da Planta Comunitária de Telefonia desenvolvida pelas empreendedoras; e
  6. feita a avaliação, incorporação e aumento de capital, a concessionária deve retribuir em ações (fechamento e aumento de capital) o valor da participação financeira do promitentes-assinantes (item 5.3 da Portaria 086/91), que passam a ser acionistas do Sistema Telebrás, fazendo jus, portanto, a: a) participar dos lucros sociais e, em caso de liquidação, do acervo da companhia; b) fiscalizar, na forma prevista na lei, a gestão dos negócios sociais; c) ter preferência para a subscrição de ações, partes beneficiárias conversíveis em ações, debêtures conversíveis em ações e bônus de subscrição; e d) retirar-se da sociedade nos casos previstos em lei (Artigo 109 c.c. 111, § 1º, ambos da Lei n.º 6.404, de 15 de dezembro de 1976).

Outro ponto digno de nota e que terá grande importância no desdobrar dessa ação é a existência de uma nova modalidade de aquisição de direito de uso de linha telefônica implantada recentemente no país e que vigorou de forma plena a partir de 1º de julho de 1997, pela qual o interessado paga apenas o preço correspondente a instalação da linha (R$ 300,00) acrescido do valor do imposto competente (R$ 8,00). Está ela em oposição a modalidade anterior, em que o usuário pagava o valor de R$ 1.117,63 (a vista) pelo direito ao uso da linha, mas, em contrapartida, recebia ações Telebrás, na proporção de seu investimento (R$ 1.117,63).

Há de se explicar com bastante clareza que existem duas modalidades de autofinanciamento dentro do Sistema Telebrás. Um desenvolvido pelas próprias concessionárias do serviço público de telefonia e outro realizado através do Programa Comunitário de Telefonia, sendo esta última modalidade o tratado nesta ação.

No autofinanciamento desenvolvido pelas concessionárias, o promitente-assinante adquire o direito de uso da linha, participando do plano com R$ 1.117,63 e recebendo o valor de sua participação (R$ 1.117,63) em ações do Sistema Telebrás, cuja expansão telefônica a ser realizada para atendimento desse promitente assinante será realizado pela concessionária local com os recursos oriundos desse autofinanciamento.

Em relação a este plano, houve, conforme noticiado na imprensa, duas tentativas de fraudar o consumidor. Uma, em que a Telebrás afirmou que devolveria em dinheiro a participação econômica do usuário. Outra, em que devolveria o referido valor em ações com base no valor de mercado das mesmas e não pelo seu valor patrimonial, conforme previstos nos contratos firmados.

Em virtude da grita popular e das ações judiciais propostas em todo país, a Telebrás não viu outra saída alternativa senão a de cumprir o contrato, pois caso contrário os prejuízo econômicos e morais seriam incalculáveis (Documentos em anexo: "Telebrás Recua e Decide Pagar em Ações")

Cabe aqui, antes de falar no outro plano de autofinanciamento, esclarecer o porquê das duas tentativas de golpe do Sistema Telebrás, demonstrando a tentativa de enriquecimento ilícito da Holding e de suas concessionárias e o prejuízo do consumidor.

Em ambos os casos, o consumidor adquirente estaria de se beneficiar da valorização das ações Telebrás nas bolsas de valores (na ordem de R$ 1.392,37, conforme Artigo de Jaques Wagner, publicado na Folha de São Paulo em 9/7/97 - anexo), ficando essa valorização para a Telebrás e para o Governo Federal.

No autofinanciamento desenvolvido nos Programas Comunitários de Telefonia, o promitente-assinante adquire o direito de uso da linha, participando do plano com R$ 1.117,63, devendo receber em ações o valor de avaliação do patrimônio a ser transferido para a concessionária limitada essa retribuição ao valor máximo da participação financeira praticado pela concessionária em sua área de concessão, ou seja, R$ 1.117,63. Sendo que a expansão telefônica a ser realizada para atendimento desse promitente assinante será realizado pelas empresas empreendedoras (no caso Inepar e Consil) com os recursos oriundos desse autofinanciamento feito pela Comunidade.

No caso em exame, ao proceder a avaliação do acervo em relação às 10.648 linhas leva a cabo pela Inepar, a Telems desconsidera o valor pago pelo consumidor (R$1.117,63) que é o mesmo do autofinanciamento praticado e retribuído em ações quando o autofinanciamento é realizado pela ré, para efetuar uma avaliação de R$743,60 (doc. anexo), tratando os consumidores de forma diferenciada, causando prejuízos aos adquirentes dos Programas Comunitários de Telefonia.

Vê-se claramente que a Telems busca praticar, com isso, o mesmo engodo que tentou, sem resultado positivo, praticar a Holding.

A avaliação deveria, no mínimo, ser igual ao valor investido e desembolsado pelo consumidor e nunca inferior, da mesma forma como ocorre quando o autofinanciamento se dá em áreas ampliadas pela própria concessionária (primeira forma de autofinanciamento descrito acima).

A avaliação prevista no artigo 8º da Lei das SA.s não é para prejudicar o consumidor, mas para assegurar os direitos dos acionistas. Assim, a retribuição das ações devem se dar na forma prevista no Item 3.2 da Norma 03/91, publicada através da Portaria n.º 86/91 (f. 146 a 148 dos autos de PA).

Espera-se que a ré não se utilize da Portaria 1.028, de 20/08/97 (anexa, f. 288 dos autos de PA) para retribuir as ações com base no valor de mercado das ações, pois estará tentando aplicar o mesmo engodo que tentou recentemente o Sistema Telebrás conforme se explicou anteriormente, visto que todos os contratos firmados com os promitentes-assinantes em questão e também o contrato de Promessa de Entroncamento e Absorção de Rede foram firmados em data anterior à publicação desta portaria, não podendo ela ser aplicada aos mesmos, sendo que neste ponto a referida Portaria é clara quando, em seu item 5.1.1.1, letra "c", dispõe que o previsto no "caput" deste item "aplicar-se-á somente aos contratos assinados a partir de 25 de agosto de 1996".

Não pode, portanto, a ré se utilizar desta Portaria para retribuir, em ações, a participação econômica do consumidor, participante do PCT/91, utilizando o valor de mercado para a conversão da participação em ações, como dá entender que assim agirá quando menciona a referida portaria na f. 274 dos autos de PA, item 3.


DO DIREITO:


Da Obrigação de Fazer

A ré, como já se viu, assumiu algumas responsabilidades perante os investidores que financiaram a expansão de 30.000 linhas telefônicas em Campo Grande, entre ela a de retribuir, de forma integral e acrescidos dos juros devidos, a participação deles no referido plano de expansão, após receber todo o acervo sob a modalidade de dação:

"5.1.2 - A concessionária retribuirá em ações, nos termos das normas em vigor, o valor de avaliação acima referido, limitada essa contribuição ao valor máximo de participação financeira por ela praticado em sua área de concessão". (NET 004/DNPU - ABRIL DE 1991, f. 152)

"5.1 - As importâncias recebidas a título de participação financeira, inclusive juros, serão capitalizadas e retribuídas em ações, após a sua integralização da participação pelo promitente-assinante.

No mesmo sentido é a cláusula 6.3 do Contrato de Promessa de Entroncamento e Absorção de Rede (f. 53) e cláusula 5ª, "in fine", do Contrato de Participação Financeira em Programa Comunitário de Telefonia (f. 95, anverso).

Assumiu também o dever de passar cada participante escrito pela comunidade a condição de assinante do serviço na ativação da rede, que há muito já foi feita, conforme prevê o item 6.4 do Contrato de Promessa de Entroncamento e Absorção de Rede (f. 53).

Na lição de Washington de Barros Monteiro,

"Aquilo que as partes, de comum acordo, estipularam e aceitaram, deverá ser fielmente cumprido (pacta sunt servanda), sob pena de execução patrimonial contra o devedor inadimplente". (Cód. Civil, art. 1058, parágrafo único). ( Curso de Direito Civil, 5º vol., Direito da Obrigações, 2º parte, Ed. Saraiva, 1989, pág. 09).

No mesmo sentido é Silvio Rodrigues,

"Aquele que, através de livre manifestação de vontade, promete dar, fazer ou não fazer qualquer coisa, cria uma expectativa no meio social, que a ordem jurídica deve garantir."(Em Direito Civil, vol. 03, Ed. Saraiva, 7º edição, pág. 12).

Da maneira como agiu a suplicada, não retribuindo em ações a participação financeira de cerca de mais de 4.134 promitentes-assinantes, que adquiriram o direito de uso de linha telefônica através da Empresa Inepar, está descumprindo princípios fundamentais do direito, conforme demonstrado acima, o que deve ser reparado, através da presente ação.

O Código de Defesa do Consumidor traz em seu artigo 51 e incisos dispositivos que demonstram claramente a ilicitude dos atos praticados pela Telems.

"Art. 51 - São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:

I - (....) impliquem renúncia ou disposição de direitos.(....);

(....);

IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa fé ou a eqüidade;

(....);

XIII - autorizem o fornecedor a modificar unilateralmente o conteúdo ou a qualidade do contrato, após sua celebração;

(....);

XV - estejam em desacordo com o sistema de proteção ao consumidor.

§ 1º - Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que:

I - ofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertence;

II - restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou o equilíbrio contratual;

III - se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso

A ré assumiu com a Comunidade de Campo Grande, através do "Contrato de Promessa de Entroncamento e Absorção de Rede", a obrigação de retribuir em ações a participação do consumidor, não podendo, agora, se negar a cumprir o que pactuou, sob qualquer fundamento, mesmo porque não existe base legal, contratual ou regulamentar para assim proceder.

A Portaria n.º 086/91 obriga a ré a transferir os terminais telefônicos para o nome do promitente-cessionário, investindo-o na condição de assinante, e a retribuir em ações a participação econômica dos adquirentes do direito de uso de linhas telefônicas.

A Portaria 610, de 19 de agosto de 1994, que republicou a NET 004/DNPU - ABRIL DE 1991 (versão agosto de 1991), por sua vez, não desobrigou a requerida de fazer tal retribuição. Ela apenas estabeleceu que os planos de expansão de telefonia que viessem a existir, a partir daquela data, não teriam mais o valor da participação financeira retribuído em ações aos promitentes-assinantes, o que não é o caso do presente PCT, posto que já se encontrava em vigor e nenhuma alteração sofreu após a edição da mencionada portaria.

Essa Portaria deixa a coisa mais clara ainda quando determina, em seu item II, que "suas alterações não são aplicáveis aos projetos que se achavam em curso, quando da edição da Portaria n.º 375, de 22 de julho de 1994, nos quais a concessionária e a Comunidade tenham firmado Contrato de Promessa de Entroncamento e Absorção de Rede, não alcançando, também, as ampliações desses mesmos projetos, desde que, nesta última hipótese, os pedidos para tal finalidade tenham sido formalizados em data anterior ao da publicação desta Portaria."

Mesmo que a Portaria desobrigasse a ré do dever assumido (o que não deixaria de ser um atentado ao direito de propriedade e ao princípio de isonomia), ela deveria ter chamado novamente a Comunidade e com ela renegociado e não forjado uma possível alteração contratual, unilateralmente e a manus militari. Qualquer aditivo a ser introduzido deveria ter sido feito no "Contrato de Promessa de Entroncamento e Absorção de Rede" e não nos contratos padrões usados pelas empreendedoras Inepar e Consil.

Clara é a atitude lesiva por parte da ré, que se aproveitando de uma condição de monopólio de mercado, da ignorância do consumidor em relação aos seus direitos e ao ordenamento legal vigente, impõe "leis" próprias, submetendo tudo que se refere a telefonia ao seu livre arbítrio, sobrepondo sua vontade aos princípios básicos que devem nortear as relações de consumo e até mesmo aos princípios basilares do direito e se enriquecendo ilicitamente a custa da ignorância popular.

Dessa forma, a Cláusula 5ª, item 5.2, do Contrato de Participação Financeira em Programa Comunitário de Telefonia (f. 272 do PA) firmado entre o consumidor e a Inepar, que implica em renúncia de direitos, no caso, renúncia ao direito de subscrever em ações o valor de sua participação financeira, não tem validade alguma, sendo nula de pleno direito, nos exatos termos do Artigo 51, e incisos já citados, do Código de Defesa do Consumidor.

Com essa atitude, a Telems não só desrespeitou a lei e a cláusula contratual, mas também feriu alguns princípios constitucionais como da propriedade e da isonomia. Não se pode admitir que consumidores na mesma situação possam ser tratados de forma tão desigual. A um, dando o direito de receber ações pelo investimento feito, e, a outro, que fez igual investimento, negar o mesmo direito. Pergunta-se: como a Telems irá retribuir o investimento feito por 4.134 (quatro mil cento e trinta) consumidores, integrantes da segunda fase do projeto da Inepar, se lhes está negando o direito à ação que lhe é devida, quando eles nenhum direito tem à linha, mas tão somente a seu uso? Negando as ações, a Telems deve dar direito de propriedade as linhas, pois caso contrário está havendo enriquecimento sem causa. Se as ações não são mais entregues, o que justifica o valor tão alto cobrado para o direito ao uso da linha? Basta observar que atualmente a própria ré faz instalações de linhas telefônicas por R$ 300,00.

Nessa situação se vê que as informações feitas na imprensa, em nível nacional, pelo Sistema Telebrás, no sentido de que todas as participações dos usuários em expansão telefônica será retribuída em ações, é totalmente enganosa e falsa, só buscando ganhar tempo e prejudicar o usuário (documento em anexo).

Não só é antiético como antijurídico propor a uma comunidade que participe da expansão de um sistema de telefonia, sob promessa de retribuição de ação de sua participação econômica, para, após a efetiva participação e construção da expansão pretendida, negar a retribuição prometida, sob a alegação de que todo o acervo será transferido a título gratuito, apesar de ter consciência não só do lucupletamento ilícito, mas também da possibilidade de a ré auferir receitas sobre este patrimônio, sem nada ter feito para construí-lo. Claro está o enriquecimento sem causa, o auferimento de receitas indevidas, a prática de crime de estelionato e a grande falta de espírito público dos representantes da empresa que assim procede. O homem, assim visto, não se torna tão somente um lobo para o outro homem, mas uma verdadeira ave de rapina, que só espera pelos despojos dos seres viventes e indefesos para devorar.

Assumiu ela também o compromisso de iniciar e findar de pronto o processo tendente a fazer as retribuições devidas:

"As instalações podem ser ativadas e transferidas para a Telems em etapas, desde que sua aceitação possa ser também realizada na mesma forma." (Contrato de Promessa de Entroncamento e Absorção de Rede, item 6.5)

"5.1.1 - a capitalização deverá ser efetuada com base no valor patrimonial da ação, apurado no primeiro balanço elaborado e auditado após a integralização da participação.

5.3 - O prazo para retribuição em ações não poderá exceder a 06 (seis) meses da data do encerramento do balanço auditado referido no item 5.1.1." (Portaria 086/91, f. 147).

Percebe-se pelos contratos firmados que a ré só não estabeleceu penalidades para si. Aos promitentes-assinantes foram estipuladas multas de forma que se estes atrasassem no pagamento das parcelas, incidiria sobre elas uma multa de 10% mais juros moratórios de 1% ( um por cento) "pro rata die":

"3.3 - Sobre as parcelas pagas em atraso incidirão, além da atualização monetária, muita moratória de 10% (dez por cento) sobre o valor do débito, mais juros de mora de 1% (um por cento) ao mês pro-rata-die." (item 3.3 do Contrato de Participação Financeira).

As empreendedoras, por sua vez, tinham 24 meses, a contar da feitura do contrato com o consumidor, para fazer a ligação da linha telefônica na residência do contratante, sob pena de pagamento de multa.

O promitente-assinante em sua participação sempre teve o dever de manter-se em dia com suas obrigações pecuniárias, o mesmo acontecendo com as empreendedoras, não tendo razão, portanto, o fato de não haver nenhuma penalidade no caso das concessionária atrasar na retribuição em ações de que o promitente-assinante é merecedor, principalmente porque, da forma como está estabelecida, a ré, quando cumpre suas obrigações, a faz da forma como e quando quer. O que fere de morte o princípio de Igualdade, do equilíbrio e da boa fé, estando a merecer pronta correção por parte do Poder Judiciário.

Se o prazo é de 24 meses para a instalação das linhas e após esta etapa já se está apto para se efetuar a transmissão das mesmas a ré, esta deve, de pronto, iniciar o processo tendente a retribuição, o qual não pode ultrapassar o prazo de 6 meses, a contar da instalação.

Além do mais, a contrário senso, nos termos do Art. 1.098 do Código Civil, pode os promitentes-cessionários exigirem da Telems o cumprimento da obrigação que ela assumiu, já que cumpriram integralmente a deles.

Da Mora e da Conseqüente Obrigação de Reparar os Prejuízos Causado e de Atribuir os Dividendos Referentes aos Lucros Sociais:

Não tendo cumprido, a tempo, os compromissos assumidos deve a ré ressarcir os danos causados (Artigos 159 do Código Civil e 12 e 14 do Codecon) e pagar os dividendos a que teriam direito os promitentes-assinantes como acionistas se a subscrição fosse realizada na época aprazada (Artigo 109 c.c. 111, § 1º, ambos da Lei n.º 6.404, de 15 de dezembro de 1976).

A ré está, sem dúvida alguma, em mora, visto que deixou de cumprir as obrigações dela, "ex vi" do disposto no Artigo 955 do Código Civil.

Cabe-lhe, portanto, o dever de purgar a mora, arcando com os prejuízos decorrentes até a data da efetiva aceitação da dação em pagamento. Assim determina a lei civil, nos seus artigos 956 e 959, inciso I, como segue:

"Art. 956 - Responde o devedor pelos prejuízos a que a sua mora der causa.

Art. 959 - Purga-se a mora:

I - por parte do devedor, oferecendo este a prestação, mais a importância dos prejuízos decorrentes até o dia da oferta."

Mister se faz observar que, por prejuízos, entende-se não só o que o credor efetivamente perdeu, mas o que, razoavelmente, deixou de lucrar. Essa é a inteligência do Artigo 1.059 do Código Civil.

Nesse sentido há que se levar em conta os dividendos que os promitentes-assinantes deixaram de receber, durante esse tempo todo, em face da demora da ré em os admitir na qualidade de sócios acionistas, nos exatos termos do Artigo 109, inciso I, da Lei n.º 6.404, de 15 de dezembro de 1976.

É oportuno esclarecer que, em se tratando de ação coletiva de responsabilidade pelos danos causados, pleiteia-se, por meio dela, apenas condenação genérica, de modo a fixar a responsabilidade da ré pelos danos causados, como prevê o Artigo 95 do Código de Defesa do Consumidor.

Dos Danos Causados:

Danos, sem dúvida houve, e foram causado porque os consumidores investiram seus parcos recursos esperando um retorno rápido e, ludibriados, viram o tempo passar sem expectativa de receber os resultados desejados e prometidos da aplicação feita. Esperava o consumidor que no prazo máximo de dois anos após a assinatura do contrato obteria as ações, com seu investimento devidamente corrigido, para comercializá-las ou para poder esperar os dividendos que como acionista da empresa ré teria direito. Não vieram nem ações nem dividendos. Apenas ilusões restaram.

Da forma como anda o processo, o consumidor se vê obrigado a ficar com o dinheiro de seu investimento retido devido a inoperância e má fé da concessionária, com grande prejuízo e sacrifício seu e de seus familiares, porque, quase sempre, quem está nesta situação é o pequeno investidor que lança mãos de sua poupança para participar desses programas, com a esperança sempre crescente de que terá alguma chance de melhorar seu capital.

Maior e irreparável prejuízo sofreria aqueles consumidores que já foram avisados de que não terão direito à retribuição alguma, se não fosse a possibilidade de verem a Justiça ser feita através do Poder Judiciário.

Esses e outros prejuízos serão demonstrados de forma concreta no momento oportuno, por meio de liquidação de sentença.

Da Necessidade de se Prevenir o Dano:

A ré deve ser compelida a retribuir, de forma integral e de imediato, a participação financeira dos promitentes-assinantes, transferindo-lhes as respectivas ações, bem como os terminais para o nome deles e os investindo na condição de assinante, com direito aos dividendos correspondentes aos lucros sociais e a subscrição de novas ações da ré, tendo em vista que os consumidores não poderão aguardar novos prejuízos para depois tentar ver se consegue repará-los.

Os órgãos de defesa das relações de consumo, entre eles o Poder Judiciário não devem apenas buscar a reparação dos danos causados aos consumidores, mas sobretudo preveni-los.

Nesse sentido, o art. 6º do CDC, VI, dispõe que constitui direito básico do consumidor:

"a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos" e, ainda, "a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos ou serviços."

Como já se demonstrou, o único interesse da ré é o de aumentar o seu patrimônio com o recebimento do acervo telefônico e dos valores mensais referentes a impulsos e interurbanos que são possíveis graças à expansão feita pela coletividade, sem se importar em cumprir o estabelecido em contrato, no prazo e condições pactuadas.

Deve-se levar em consideração que o consumidor, como parte vulnerável na relação de consumo, não pode ficar à mercê de práticas abusivas e duvidosas, sob pena de não se lhe oferecer qualquer segurança ou garantia, necessitando ele, assim, mais do que a tutela administrativa, a judicial.

Quanto à Necessidade da Concessão Liminar da Tutela:

Prescreve o parágrafo § 3º do Artigo 84 do Código de Defesa do Consumidor que:

"Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao Juiz conceder a tutela liminarmente ou após justificação prévia, citado o réu."

No que se refere à ação de obrigação de fazer, concernente à entrega de todas as ações referentes as 14.250 linhas comercializadas pela Inepar, inclusive as 4.134 que a ré se nega a dar o direito ao consumidor de subscrevê-las, é imperiosa e necessária a concessão da tutela liminarmente, de acordo com o disposto legal acima referido, dado que o fundamento da demanda é relevante e há justificado receio de ineficácia do provimento final.

A relevância da demanda se prende ao fato de a ré ter descumprido cláusula contratual, ferido princípios constitucionalmente consagrados e ofendido norma de ordem público e interesse social, como o é a Lei n.º 8.078, de 11 de setembro de 1990, conhecida como Código de Defesa do Consumidor (CDC).

Como já foi dito, a ré deveria ter retribuído em ações a participação de todos os promitentes-adquirentes do direito de uso de linhas telefônicas há pelo menos 1 ano após a instalação das linhas, pois se a empresa Inepar teve 24 meses para efetuar a referida instalação, a ré deveria fazer sua parte em no máximo até 12 meses depois, e não o fez.

A negação de retribuição em ações das 4.134 últimas linhas telefônicas é uma medida arbitrária que só dá prejuízo ao consumidor, não devendo persistir porque:

  1. ofende o princípio "pacta sunt servanda", posto que vai contra disposição contratual (item 6.3 do Contrato de Promessa de Entroncamento e Absorção de Rede feito pela Comunidade e Telems;
  2. caracteriza alteração unilateral de contrato (Artigo 51, XIII, do CDC), daquelas que: a) implica renúncia de direitos do consumidor (Artigo 51, I, do Codecon); b) estabelece obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada e que é incompatível com a boa fé e a eqüidade (Artigo 51, IV, do CDC); e c) está em desacordo com o sistema de proteção ao consumidor (Artigo 51, XV, do CDC);
  3. ocasiona enriquecimento ilícito da ré, em prejuízo irreparável ao consumidor;
  4. tipifica o crime de estelionato, dado que os representantes atraíram os consumidor para participar economicamente do Plano Comunitário de Telefonia/91 sob a promessa de que seus investimentos seriam retribuídos em ações, para, após a efetiva participação, se negarem a fazer a retribuição prometida;
  5. depõe contra o direito e o princípio da propriedade garantidos pelos artigos 5º, "caput", e inciso XXII, e 170, II, ambos da Constituição da República Federativa do Brasil, bem como contra o princípio da igualdade (direito que o Estado Democrático deve assegurar, como se vê do Preâmbulo da Constituição Federal e em seu artigo 5º, "caput"), uma vez que os 20.000 consumidores que tiveram direito à retribuição em ações no PCT/91, bem como os consumidores que obtiveram direitos de uso de linha telefônica pelo processo de autofinanciamento desenvolvido pela própria concessionária para os quais está sendo garantido também o direito à referida retribuição estão na mesma situação que os 10.000 outros consumidores do mesmo PCT/91, não podendo ser tratados de forma desigual; e
  6. contraria as Portarias 086/91 e 610/94, ambas do Ministério das Comunicações, as quais a ré diz estar seguindo.

O justificado receio de ineficácia do provimento judicial final é também evidente, posto que sem a concessão dessa medida a ré seguirá negando-se a entregar as ações que deve, ou mesmo, prolongando a entrega daquelas que não têm como refutar, desrespeitando toda coletividade de Campo Grande, a lei e os milhares de contratos firmados.

Uma sentença judicial prolatada daqui a dois, três ou quatro anos, determinando que se retribua em ações a participação econômica do consumidor não terá sentido algum. Naquele momento, esta ação já terá perdido um de seus objetos, justamente o requerido nessa liminar, com prejuízos irreparáveis para o consumidor, posto que: a) não poderá dispor do seu patrimônio (as ações) no momento que melhor lhe convier; b) dificilmente receberá os dividendos referentes aos anos que passarem durante o tramitar do processo; c) não terá direito à subscrição de novas ações da ré pelo mesmo período que durar o trâmite do processo; d) os danos e prejuízos que sofreram até o presente se acumularão ainda mais, sem perspectiva alguma de reparação.

O atraso só interessa à ré, que conseguirá acumular, com isso, mais lucros a custa de lesões irreparáveis aos consumidores.

O que querem os consumidores que procuram esta Promotoria de Justiça diariamente é uma resposta imediata e eficaz do Ministério Público e do Poder Judiciário, pois todos já se conscientizaram de que aguardar pacientemente pela ré só lhes trará mais aborrecimentos e prejuízos, tanto de ordem econômica quanto moral.

Assim, os consumidores lesados esperam o deferimento da liminar.



DOS PEDIDOS:



Do Pedido de Concessão de Tutela Liminar:

Por todo o exposto, o Ministério Público requer a concessão liminar da tutela, "inaudita altera pars", no sentido de se determinar que:

a) a ré ponha cabo, no prazo de 30 dias, ao processo já iniciado tendente a retribuir em ações a participação econômica do consumidor e a transferir os terminais telefônicos para o nome dos promitentes-cessionários, investindo-os na condição de assinantes, tudo em relação às primeiras 10.115 linhas telefônicas comercializadas (de um total de 10.648 linhas implantadas) pela Empresa Inepar, dando assim cumprimento, imediato, ao item 3.2 da Norma 03/91, publicada pela Portaria 86/91 (encontrado nos autos de PA às f. 147) e ao previsto no item 6.4 do Contrato de Promessa de Entroncamento e Absorção de Rede (f. 53); e

b) inicie, de pronto, o mesmo processo e o finde em 60 dias, contados da decisão judicial, em relação às 4.134 últimas linhas comercializadas pela mesma Empresa Inepar SA. Indústria e Construções, a respeito das quais a ré se nega a fazer a devida retribuição em ações, para se evitar prejuízo irreparável aos promitentes-assinantes.

Requer também que, sem prejuízo da responsabilidade penal por crime de desobediência, em caso de descumprimento dos preceitos contidos nas letras "a" e "b", seja cancelado o contrato de comodato firmado entre a Telems e a Empresa Inepar e os valores recebidos referentes a utilização desses telefones sejam recolhidos no banco HSBC Bamerindus S.A., Agência 1687 - URB CEAP, conta corrente n.º 10951-29, em favor do Fundo Estadual de Defesa dos Direitos do Consumidor - FEDDC, criado pelo Artigo 8º da Lei Estadual n.º 1.627, de 24 de novembro de 1995, por se tratar de receita indevida (aquele que não cumpre sua obrigação não deve exigir o cumprimento da obrigação assumida pela outra parte) e para se fazer justiça ao consumidor.

Dos Pedidos e Requerimentos Finais:

Requer, ainda, o autor que a liminar pleiteada acima seja ratificada em definitivo em decisão derradeira e que a ré seja condenada a:

  1. fazer a retribuição em ações Telebrás, de forma integral, isto é, no valor do autofinanciamento pago pelo promitente-assinante, ou seja, R$ 1.117,63, corrigidas monetariamente e acrescidas dos juros devidos, "com base no valor patrimonial das ações" da época em que deveriam ter ocorrido a transferência do acervo, em relação a todas as 30.000 linhas telefônicas referentes à PCT/91, sem exceção de nenhuma linha e sem abatimento de qualquer gasto, por mais privilegiado que a requerida julgue ser;
  2. ressarcir as perdas e danos econômicas e morais sofridas pelos promitentes-assinantes em virtude dos atrasos ocorridos na transferência das ações, sendo que tais danos deverão ser apurados em liquidação de sentença, a ser promovida por cada interessado, onde deverão fazer as provas respectivas;
  3. pagar os dividendo relativos aos lucros sociais aos usuários promitentes assinantes que não tiveram sua participação econômica retribuída em ações, a contar do 3º anos após a assinatura do contrato de instalação da linha firmado pelo consumidor e as Empresas Inepar e Consil;
  4. apresentar em juízo o valor dos dividendos, a partir de 1993, a ser atribuído a cada ação, discriminando os valores por tipo de ação;
  5. informar e comprovar documentalmente os valores arrecadados mensalmente referentes aos 15.000 terminais em operação e instalados comercialmente pela Inepar;
  6. apresentar, em juízo, as avaliações efetuadas pelas comissões de peritos avaliadores que elaboraram o laudo de avaliação n.º 001/96, constante das f. 280 a 282 dos autos de PA;
  7. informar a situação de cada contrato de comodato firmado entre a ré e as Empresas Inepar e Consil, especificando a data de vencimento e renovação de cada um deles;
  8. pagar as custas processuais e os honorários advocatícios, sendo que estes serão revertidos ao FEDDC - Fundo Estadual de Defesa do Consumidor, já mencionado acima.

Requer, outrossim, a citação dos réus, com a autorização de que trata o artigo 172, §2º, do Código de Processo Civil, no endereço inicialmente referido, para, querendo, contestarem a ação ora proposta, sob pena de revelia, advertência esta que deverá constar do mandado.

Requer, também, a desconsideração da personalidade jurídica da empresa ré, caso ocorra quaisquer das situações previstas no artigo 28, "caput", e seus parágrafos, especialmente no parágrafo 5º, do Código de Defesa do Consumidor, com a conseqüente condenação da Diretoria da Telems, seu Presidente, WOLNEY ARRUDA, seu Diretor Administrativo Financeiro, GERALDO DAVID LOUREIRO LEITE, seu Diretor de Serviços, ALBERTO JOSÉ SIRENA e seu Diretor de Engenharia, PAULO CÉSAR PEREIRA TEIXEIRA.

Requer, igualmente, a dispensa do pagamento de custas, emolumentos e outros encargos, à vista do disposto nos artigos 18, da Lei 7347/85 e 87, da Lei 8078/90.

Também é requerida a publicação de edital no órgão oficial, a fim de que os interessados, querendo, possam intervir no processo como litisconsortes, sem prejuízo de ampla divulgação pelos meios de comunicação social por parte deste Órgão de Defesa do Consumidor, tudo como previsão no Artigo 94, da Lei 8.078/90.

Requer, finalmente, o julgamento antecipado da lide, nos termos do Artigo 330, inciso I, do Código de Processo Civil.

Embora esta ação seja de natureza economicamente inestimável, dá-se à causa, meramente para os efeitos fiscais, o valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais).

Protesta provar o alegado por todos os meios em direito admitidos.

Termos em que

Pede deferimento.

Campo Grande, 9 de Abril de 1998.

Amilton Plácido da Rosa
Promotor de Justiça

(1) Programa Comunitário de Telefonia - PCT é uma modalidade de autofinanciamento criada pelo Sistema Telebrás para possibilitar que uma determinada comunidade efetue a implantação ou expansão telefônica, fazendo-se representar por entidades públicas, que contratam empresas do ramo para proceder as expansões necessárias, devido a incapacidade financeira e de investimento do Sistema, sendo que o consumidor recebe, em ações, o valor correspondente ao investimento realizado.

(2) Autofinanciamento é a modalidade de comercialização utilizado pelo próprio Sistema Telebrás que possibilita ao adquirente autofinanciar seu direito de uso de linhas telefônicas e, em contrapartida, receber em ações do Sistema o valor correspondente em ações, sendo que as expansões são efetuadas pela própria Telebrás ou por suas concessionárias.



Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROSA, Amilton Plácido da; ARINOS, Alessandro Augusto dos Santos. ACP contra TELEMS por descumprimento de contrato de cessão de linhas telefônicas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 3, n. 24, 21 abr. 1998. Disponível em: https://jus.com.br/peticoes/16031. Acesso em: 26 abr. 2024.