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A aplicação da desconsideração da personalidade jurídica segundo decisões do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo e seu impacto nas decisões empresariais

A aplicação da desconsideração da personalidade jurídica segundo decisões do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo e seu impacto nas decisões empresariais

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A desconsideração da personalidade jurídica é necessária para coibir os abusos cometidos por sócios ou administradores de empresas, mas é preciso que ela seja aplicada de forma criteriosa. A banalização do instituto representa um desestímulo à livre iniciativa, comprometendo as atividades empresariais e, consequentemente, a economia do país.

1. INTRODUÇÃO

As empresas exercem papel fundamental no crescimento e desenvolvimento social de um país, à medida que, entre outras coisas, geram empregos e impostos.

Porém, em diversas ocasiões as pessoas sentem-se desestimuladas a investir suas economias na constituição de uma empresa ou a ingressar em seu quadro societário, uma vez que os riscos jurídicos dessa decisão são altos, sobretudo pelo comportamento inconstante e abusivo do juízo laboral.

O presente artigo tem como proposta analisar como os juízes trabalhistas, em especial os desembargadores do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo, estão aplicando o instituto da desconsideração da personalidade jurídica da empresa, e, por conseguinte, sobre a responsabilidade obrigacional dos seus sócios pelo passivo trabalhista. Busca, igualmente, ainda que de maneira sucinta, demonstrar o impacto do funcionamento do Judiciário nas atividades empresariais.

Trata-se de tema relevante, uma vez que interessa não apenas às sociedades empresárias, mas também, pela importância destas no cenário econômico, a toda a sociedade.

Para atingir os objetivos propostos, apresentaremos, inicialmente, alguns conceitos e informações jurídicas, que julgamos indispensáveis à compreensão da matéria. O capítulo seguinte é dedicado a estabelecer a repercussão que nos propusemos a demonstrar entre o desempenho do Judiciário e o empreendedorismo. Finalmente, nos capítulos 4 e 5, trataremos, respectivamente, do instituto da desconsideração da personalidade jurídica, discorrendo sobre seu objetivo e teorias e de como o instituto vem sendo aplicado pela Justiça laboral, com destaque para os julgados do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo.

Esperamos que o presente trabalho seja entendido não como uma crítica negativa à atuação do Judiciário, mas como um alerta aos magistrados, no sentido de que suas decisões devem guiar-se pela observação da realidade social e do impacto provocado na economia.


2. PESSOA JURÍDICA

2.1 Conceito e Natureza

Pessoa jurídica (ou moral) é a entidade diversa da pessoa natural (ou física), solenemente constituída pela vontade de outras pessoas, físicas ou jurídicas, "com personalidade e patrimônio próprios e distintos dos de seus constituintes, e determinada finalidade prevista na sua ata constitutiva". (LISBOA, 2002, p. 230).

Com relação à natureza jurídica da pessoa moral, várias teorias tentaram explicá-la. [01] Por extrapolar os objetivos do presente trabalho, não nos deteremos na análise do assunto, limitando-nos a consignar a adoção, pelo Código Civil pátrio, da denominada teoria da realidade [02] - ou, como prefere DINIZ (2002, p. 207), teoria da realidade das instituições jurídicas – que admite a personalidade das pessoas jurídicas como atributo reconhecido pelo Direito, e, neste contexto, uma realidade jurídica.

Na dicção do artigo 40, do Código Civil, as pessoas jurídicas podem ser de direito público, interno ou externo, e de direito privado. Focaremos nossa pesquisa exclusivamente nestas últimas, e, em especial, nas sociedades empresárias, uma vez que as pessoas jurídicas de direito público, conforme esclarece BRUSCHI (2009, p. 10), não são passíveis de desconsideração da personalidade jurídica.

Vale lembrar que, com base na conceituação de empresário (artigo 966, do Código Civil), considera-se empresária a sociedade que desenvolve atividade econômica organizada de produção ou circulação de bens e serviços.

2.2 Capacidade

A capacidade da pessoa jurídica decorre da personalidade que o Direito lhe reconhece por ocasião da inscrição de seu ato constitutivo no respectivo órgão de registro (artigo 45, caput, do Código Civil). A partir deste ato solene, a pessoa jurídica adquire vida própria, ou seja, capacidade para, em seu próprio nome, exercer direitos e contrair obrigações.

Na medida em que a lei estabelece a separação entre a pessoa jurídica e as pessoas que a compõem, reconhecendo, assim, a personalização da sociedade, os efeitos daí decorrentes são, nas palavras de FAZZIO JÚNIOR (2007, p. 159), a titularidade (autonomia) jurídica negocial, patrimonial e processual da empresa. Negocial, porque quando o sócio representa uma sociedade empresária, é esta quem efetivamente celebra o negócio, e não aquele. Patrimonial, posto que, regra geral, os bens da sociedade é que respondem pelas obrigações por ela assumidas. Processual, pois a pessoa jurídica possui legitimidade ativa e passiva em juízo.

São efeitos importantes para o desenvolvimento de atividades econômicas, sobretudo no que diz respeito à titularidade jurídica patrimonial – ou, na lição de COELHO (2003, v. 2, p. 15) – ao princípio da autonomia patrimonial, "alicerce do direito societário". Este princípio, a partir do momento que limita a possibilidade de perdas dos empresários, encoraja os investimentos privados, particularmente os de maior envergadura e mais longa duração, sujeitos a maiores riscos. Trataremos mais detalhadamente deste tema no capítulo seguinte. Por ora, parece-nos importante recorrer, uma vez mais, aos ensinamentos de COELHO (op. cit., p. 16):

Se não existisse o princípio da separação patrimonial, os insucessos na exploração da empresa poderiam significar a perda de todos os bens particulares dos sócios, amealhados ao longo do trabalho de uma vida ou mesmo de gerações, e, nesse quadro, menos pessoas se sentiriam estimuladas a desenvolver novas atividades empresariais. No final, o potencial econômico do País não estaria eficientemente otimizado, e as pessoas em geral ficariam prejudicadas, tendo menos acesso a bens e serviços. O princípio da autonomia patrimonial é importantíssimo para que o direito discipline de forma adequada a exploração da atividade econômica.

Oportuno ressaltar, igualmente, que, de forma inovadora – mas, frise-se – excepcional, o atual Código Civil prevê, no artigo 50, que "em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo" pela desconsideração da personalidade jurídica, estendendo, assim, a responsabilidade negocial aos bens particulares dos sócios ou administradores da pessoa jurídica. Busca-se, dessa forma, coibir a prática ilícita daqueles que se valem da pessoa moral para o acobertamento indevido de responsabilidades.

O desvio de finalidade configura-se quando comprovado que os sócios, desvirtuando os objetivos da empresa, e protegidos pelo "véu" da personalidade jurídica desta, lesionaram direitos alheios. A confusão patrimonial, por seu turno, verifica-se sempre que impossível distinguir, de forma suficientemente clara, os patrimônios dos sócios e o da sociedade, como, v.g., o pagamento, por parte da sociedade, de dívidas dos sócios, ou o recebimento, por parte destes, de créditos da sociedade.

Importante registrar que o instituto da desconsideração da personalidade jurídica não deve ser confundido com as hipóteses consagradas pela teoria ultra vires pela qual, em algumas situações, expressamente previstas em lei, o sócio, administrador ou dirigente da sociedade empresária, ao praticar atos de gestão com excesso de poder, com infração às normas jurídicas, ou estranhos aos negócios e objetivos da sociedade, pode ser diretamente responsabilizado. [03] Assim, enquanto na disregard of the legal entity a responsabilidade do sócio decorre de decisão judicial, na teoria ultra vires, ela resulta da aplicação da lei. Sobre o assunto, trazem-se à colação os esclarecimentos de CALVO (2005):

As normas que prevêem responsabilidade do sócio, subsidiária ou solidária, não se confundem com a desconsideração da pessoa jurídica. Os pressupostos são diversos e as conseqüências também. Na primeira hipótese, a responsabilidade é desviada da pessoa jurídica, que, assim, não é "desconsiderada", mas protegida das conseqüências de ato do sócio. Na segunda, o abuso protegido pelo princípio da separação patrimonial é contestado. Se o patrimônio da sociedade, que também responde pela dívida no caso, não é suficiente para satisfazer os credores, desconsidera-se a sua personalidade, para considerar o ato abusivo como ato do sócio, sendo esse responsável pelas dívidas.


3. RELAÇÃO ENTRE A ATIVIDADE EMPRESÁRIA E O JUDICIÁRIO

3.1 Considerações gerais

Dissemos, acima, que a limitação de perdas dos empresários encoraja os investimentos privados, estimulando o empreendedorismo e a criação de novas atividades, e, consequentemente, mais postos de trabalho. Isto se dá porque os investimentos privados dependem, entre outros fatores, do clima de confiança e de previsibilidade inspirado pelos governos, especialmente no que se refere ao respeito aos contratos e ao menor grau de incerteza jurisdicional. Daí a afirmação de FONSECA (2004) de que o funcionamento da Justiça e a previsibilidade das instituições representam o grande divisor de águas entre países que exercem todo seu potencial de crescimento e aqueles que "patinam no mesmo lugar".

Uma das maiores evidências da importância do sistema judicial sobre o desempenho de uma economia é a inclusão, pelas agências especializadas em calcular o "risco país", [04] de uma avaliação das instituições jurídicas e das garantias que estas são capazes de proporcionar aos direitos de propriedade. O rating do "risco país", por seu turno, influi no custo de captação externa e nas taxas de juros domésticas, e, através destas, no volume de crédito, no investimento, no crescimento, e assim por diante. Não por outra razão, aliás, há vários anos, o Congresso Nacional vem discutindo reformas para tornar o Judiciário brasileiro mais ágil e eficiente.

Ademais de encarecer – e até mesmo impossibilitar a captação de recursos – um sistema judicial incapaz de garantir o cumprimento de contratos e os direitos de propriedade, tende a inibir a execução de determinados negócios por parte das empresas. A eficiência destas também é comprometida pelo consumo de recursos no próprio processo de litígio, que demanda advogados, tempo e atenção. (PINHEIRO, 2003).

3.2 Evidência empírica

Pesquisas realizadas pelo Instituto de Estudos Econômicos, Sociais e Políticos de São Paulo (IDESP), e analisadas por PINHEIRO (2003), revelam dados que comprovam o impacto do funcionamento do Judiciário nas atividades empresariais.

Em resposta à indagação de se o mau funcionamento do Judiciário prejudica o desempenho da economia, metade dos entrevistados afirmou que sim, mas apenas um quarto respondeu que o mau funcionamento do Judiciário afeta negativamente suas empresas. Essas respostas, segundo PINHEIRO (2003), "confirmam uma conclusão que ficou clara ao longo das pesquisas: a empresa brasileira está organizada para evitar, de toda forma, qualquer contato com o Judiciário", ainda que isso implique perda de negócios, produção ineficiente, a utilização de máquinas em lugar de trabalhadores etc. Ou seja, o Judiciário afeta pouco a vida das empresas, porque elas, sempre que possível, o evitam.

Questionadas sobre os efeitos negativos das decisões judiciais, mais de um terço das empresas respondeu que a imobilização do capital financeiro é a forma mais comum pela qual o Judiciário impacta suas atividades e cerca de quinze por cento delas indicou ter tido suas atividades paralisadas por decisões judiciais.

Com relação ao desempenho insuficiente do Judiciário e sua influência nas decisões empresariais, metade dos entrevistados opinou que a deficiência da Justiça é responsável pelo aumento dos juros bancários, pela não terceirização das atividades diretamente relacionadas à produção, bem como pela não implementação ou diminuição do tamanho de muitos de seus projetos de investimento. Mais significativa, ainda, a revelação da tendência de substituir mão-de-obra por equipamento e a não realização de negócios com países com Judiciários pouco confiáveis.

Vários outros aspectos fizeram parte das pesquisas do IDESP e dos comentários de PINHEIRO (2003), mas cremos suficientes para nosso trabalho os acima apresentados, cujas consequências resumimos, transcrevendo as palavras do autor:

O banco cobrará um spread mais alto pelo maior risco de inadimplência, o investidor exigirá um retorno mas alto para compensar o risco de expropriação, o empregador exigirá pagar um salário mais baixo para cobrir o risco de ser acionado na Justiça do Trabalho. E, por essa lógica, como os agentes se adaptam, quanto menos privilegiado for o grupo social, e maior o "risco" de receber proteção, maior tenderá a ser a discriminação. Ao fim e ao cabo, não apenas serão menores o investimento e a eficiência, e, portanto, o crescimento, como serão os grupos que se deseja proteger os mais discriminados. E quanto mais difícil for discriminar, maior será o custo agregado em termos de crescimento sacrificado. Isso significa que são exatamente as partes que o magistrado buscava proteger que se tornam as mais prejudicadas por essa não neutralidade.

3.3 A desconsideração da personalidade jurídica no cenário econômico

Os riscos do investimento são inerentes às atividades empresariais, variando, apenas, em sua dimensão. Assim, nas atividades com baixa composição de riscos, a margem de lucros costuma ser reduzida, enquanto naquela em que o risco do investimento for elevado, a margem de lucros tenderá a ser proporcionalmente elevada. Este raciocínio é fruto da lógica elementar, que orienta todo e qualquer empresário: os ganhos devem compensar os riscos assumidos.

De forma simplificada, pode-se afirmar que existem dois grupos principais de riscos: os negociais e os jurídicos. No caso dos riscos negociais, considera-se, por exemplo, a possibilidade de surgir no mercado um concorrente mais eficiente. Normalmente, quando se consideram os riscos negociais, projetam-se perdas proporcionais aos investimentos realizados na atividade empresarial. Já no campo dos riscos jurídicos, considera-se não só o impacto de normas que imponham responsabilidades pessoais aos empreendedores capitalistas, como também o desempenho do Judiciário. Nesta hipótese, os cálculos projetados, costumam extrapolar a simples perda do investimento realizado, podendo atingir os patrimônios pessoais de sócios e administradores, elevando os riscos impostos aos empresários.

Esta elevação dos riscos por seu turno, como demonstram as pesquisas do IDESP acima descritas, redunda na timidez de investimentos e no encarecimento do crédito, que, por sua vez, acarretam a elevação nos preços dos produtos e serviços oferecidos, gerando efeitos econômicos negativos. Mesmo porque, de duas, uma: ou os riscos são agregados ao preço, corroendo o poder de compra dos salários, ou o empreendedor, verificando que os riscos não podem ser incorporados ao seu preço, simplesmente reduz ou paralisa suas atividades. Nos dois casos, a principal prejudicada é a sociedade, que terá menor oferta de empregos e menor poder de compra.

A propósito, COELHO (2003, p. 38) alerta que se o Direito não dispuser de instrumentos de garantia para os empreendedores, visando a preservá-los da possibilidade de grandes perdas, eles tenderão a aplicar seu capital em negócios que lhes assegurem "lucro suficiente para construírem um patrimônio pessoal de tal grandeza que não poderia perder-se inteiramente na hipótese de futura e eventual responsabilização". Para tanto, evidentemente, além de reduzir custos, teriam de praticar preços elevados.

Neste contexto, prossegue COELHO, o princípio da autonomia patrimonial das pessoas jurídicas, observado em relação às sociedades empresárias, "socializa as perdas decorrentes do insucesso da empresa entre seus sócios e credores, propiciando o cálculo empresarial relativo ao retorno dos investimentos".

Aí está a importância do instituto sob análise no cenário econômico. Por conseguinte, a disregard doctrine deve ser aplicada com grano salis, e descartada pelo Judiciário quando não caracterizada especificamente a utilização irregular da pessoa jurídica.


4. TEORIA DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA

4.1 Objetivo do instituto e breve histórico sobre suas origens

A teoria da desconsideração da personalidade jurídica foi criada para garantir que as sociedades empresárias não sejam utilizadas por seus sócios de maneira irregular, por meio da prática de atos abusivos à personalidade jurídica. Ela não visa a anular a personalidade da pessoa jurídica, "mas desconsiderá-la pontualmente no caso concreto, em relação às pessoas ou aos bens que através dela se ocultam". (SOUZA, 2010).

Sua origem deu-se na Inglaterra, em 1.897, no caso Salomon v. Salomon & Co., [05] a seguir relatado, com base nos ensinamentos de REQUIÃO (1969) e ZUCCHI (2004): Aarom Salomon era um próspero vendedor de calçados que, após mais de trinta anos, decidiu constituir uma sociedade anônima com outros seis integrantes de sua família, transferindo-lhe seu fundo de comércio. Pela cessão deste, a sociedade pagou a Salomon um determinado valor, parte em ações e outra, em debêntures, conferindo-lhe, assim, a condição de credor privilegiado da sociedade. Em um ano, a companhia entrou em liquidação. Verificou-se, então, que seu patrimônio era bastante para quitar as obrigações junto a Salomon, mas insuficiente para pagar os credores quirografários (sem garantia). O liquidante, no interesse destes, sustentou que a atividade da empresa era, ainda, a atividade pessoal de Salomon, que dela se valera para limitar sua própria responsabilidade, e que, por esta razão, deveria ele ser condenado ao pagamento dos débitos da companhia. Em última instância, reformando o que fora anteriormente julgado, a Casa dos Lordes decidiu que a companhia era distinta e separada da pessoa do sócio. Portanto, não existia responsabilidade nenhuma de Salomon para com os credores da empresa.

Como destaca Piero Verrucoli (apud BRUSCHI, 2009, p. 15), o caso Salomon influenciou o desenvolvimento da disregard doctrine de forma negativa. Isto porque a decisão tomada pela Casa dos Lordes, ao aplicar severamente o princípio da separação da personalidade jurídica entre o sócio e a sociedade, resultou num precedente a ser obrigatoriamente seguido por todas as jurisdições britânicas.

Posteriormente, os estudos sobre o tema foram aprofundados na Alemanha por Rolf Serick, influenciando outros países da Europa, em especial Itália e Espanha.

No Brasil, a teoria da desconsideração da personalidade jurídica veio a lume, em um primeiro momento, por meio da jurisprudência de nossos tribunais e de obras doutrinárias, com destaque para Rubens Requião, tido como pioneiro no trato sistemático da matéria. (FARIA, 2004). Sua positivação, entretanto, somente aconteceu com a promulgação do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/1990), artigo 28, e, posteriormente, em outros dispositivos legais. [06]

4.2 Teorias da desconsideração da personalidade jurídica

Existem, no Direito brasileiro, duas teorias da desconsideração. Na teoria maior (teoria subjetiva), o afastamento da personalidade jurídica pelo magistrado está condicionado à comprovação do desvio de finalidade ou de confusão patrimonial por parte dos sócios. Sem a presença destas práticas, inadmissível a aplicação do instituto, "mesmo que para a proteção da boa-fé". (COELHO, 2003, p. 36-37).

Já na teoria menor (teoria objetiva), o pressuposto para a desconsideração é simplesmente a demonstração, pelo credor, da inexistência de bens da empresa para saldar suas obrigações e "da solvência de qualquer sócio, para atribuir a este a obrigação da pessoa jurídica". Esta teoria equivale, na opinião de COELHO (2003, p. 35), "à simples eliminação do princípio da separação entre pessoa jurídica e seus integrantes", o que nos parece um uso inadequado do instituto. Isto porque o Direito, independentemente do ramo, deve guardar coerência com o restante do ordenamento jurídico, e o Superior Tribunal de Justiça (STJ), responsável pela uniformização da aplicação da lei federal, já decidiu que, "nos termos do Código Civil, para haver a desconsideração da personalidade jurídica, as instâncias ordinárias devem, fundamentadamente, concluir pela ocorrência do desvio de sua finalidade ou confusão patrimonial desta com a de seus sócios, requisitos objetivos sem os quais a medida torna-se incabível". [07]

Mesmo considerando a especialidade da Justiça trabalhista, não nos parece que ela possa ignorar solenemente a interpretação do STJ a respeito do assunto, sobretudo porque, como salienta MARTINS (apud BRUSCHI, 2009, p. 74), [08] a CLT é omissa quanto à aplicabilidade da teoria da desconsideração da personalidade jurídica. Por isso, para aplicar o instituto, os magistrados laborais devem valer-se, subsidiariamente, do disposto em outras normas do ordenamento jurídico. E dessas normas, com a entrada em vigor do Código Civil, em 2003, é a do seu artigo 50 a que deve prevalecer, [09] com a exegese que lhe conferiu o Superior Tribunal de Justiça.


5. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NA JUSTIÇA DO TRABALHO

5.1 Panorama geral

Em virtude da titularidade jurídica patrimonial, a responsabilidadepela satisfação dos créditos trabalhistas do empregado recai, como regra, inteiramente sobre o patrimônio do empregador, que, na dicção do artigo 2º da Consolidação das Leis Trabalhistas, é a "empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço". Isto porque, vale ratificar, a pessoa jurídica distingue-se inteiramente de seus membros, possuindo personalidade própria.

Ocorre que, nos casos em que resultam frustradas as tentativas de localizar bens da empresa, a Justiça trabalhista vem amplamente desconsiderando a personalidade jurídica do empregador, com a finalidade de arrecadar os bens dos sócios (SILVA, 2010, p. 145), independentemente do tipo societário. [10] E, ressalte-se, muitas das vezes sob a fundamentação de que a utilização do instituto da disregard of the legal entity independe dos requisitos de que trata o artigo 50, do Código Civil, isto é, do "abuso da personalidade jurídica caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial". Para a aplicação do instituto tem bastado, ao juízo laboral, o inadimplemento do crédito trabalhista e que a sociedade empregadora não possua patrimônio para suportar a execução.

Afirmamos isto, não apenas pelo observado em nossa prática advocatícia do dia-a-dia, mas também com base em levantamento realizado por SILVA FILHO (2009) junto ao Tribunal Superior do Trabalho, e em pesquisa jurisprudencial que efetuamos sobre o tema por meio de consulta a 81 (oitenta e um) acórdãos do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, relativos a processos julgados por este tribunal no período de 01/07/2009 a 31/12/2010, [11] alguns dos quais apresentamos no Anexo A.

Valemo-nos de trechos extraídos dos votos relatores dos referidos acórdãos, bem como de outros julgados, para demonstrar a falta de uniformidade na aplicação da desconsideração da personalidade jurídica por parte do TRT/SP e sintetizar a fundamentação usualmente utilizada por este tribunal para justificar o uso do instituto, buscando, também, analisá-la.

Sobre a não incidência do artigo 50, do Código Civil, encontramos várias decisões, dentre as quais elegemos a ementa abaixo, que espelha a singeleza com que o assunto é tratado na Justiça laboral:

EMENTA - Execução. Desconsideração da personalidade jurídica. A desconsideração da personalidade jurídica não exige solenidades, não é coisa que dependa de forma especial, de algum anúncio ou proclama ou editais. É uma circunstância, uma consequência, um fato. Se a empresa devedora não tem bens para responder pela execução, vai a Justiça atrás dos bens pessoais do sócio. Pronto. Já se desconsiderou a personalidade jurídica. (...). (Agravo de Petição, processo nº 01456-1997-301-02-00-9, 11ª Turma, Rel. Des. Eduardo de Azevedo Silva, j. 06/04/2010, publicação 13/04/2010). (Grifamos)

Em sentido contrário, numa das raras exceções entre os julgados analisados, transcrevemos parte do seguinte voto relator:

(...) Para a desconsideração da personalidade jurídica dos sócios ATÉ MESMO NO DIREITO DO TRABALHO, deve ser realizada análise com o fim de verificar se houve ou não o abuso no uso da personalidade jurídica. Somente no caso de constatação da ocorrência desse abuso, é lícito ao juiz aplicar tal medida. (...) não podendo ser aplicada a desconsideração da personalidade jurídica cegamente sem qualquer respaldo legal, invocando a hipossuficiência do trabalhador, pois os sócios que não tiveram posturas ilícitas ou abusivas serão demasiadamente prejudicados. (...) A desconsideração da personalidade jurídica deve ser aplicada com cautela, mediante provas inequívocas de fraude e/ou abuso de direito, o que não foi demonstrado na presente demanda. (...) o montante constrito poderá trazer à empresa-Agravante danos estrondosos, pois tornar-se-á uma inadimplente contumaz, deixando de efetuar o pagamento de funcionários e fornecedores, acarretando-lhe prejuízos de difícil reparação. (TRT/SP, Agravo de Petição, processo nº 02879200306402003, 7ª Turma, Rel. Des. José Roberto Carolino, v.u., j. 15/05/2008).

Outra alegação, comumente utilizada pelo juízo laboral, é aplicação analógica do artigo 28, caput e parágrafo 5º, do Código de Defesa do Consumidor, verbis:

Art. 28. O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração. (...) § 5° Também poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores.

A ideia é que os trabalhadores, assim como os consumidores, são hipossuficientes, merecendo, por conseguinte, idêntica tutela. Verifique-se:

Se o CDC garante a desconsideração da personalidade jurídica com vistas à defesa do consumidor, com muito mais razão há de agasalhar a pretensão do agravante, que intenta a cobrança de crédito de natureza alimentar. Configuraria inversão dos valores fundamentais tutelados pela Constituição Federal (art. 1º, III e IV) que simples consumidor fosse destinatário de ampla proteção, podendo perseguir o patrimônio dos administradores (art. 28 do CDC), e, igual garantia não se ofertasse a quem efetivamente produziu os bens e serviços com sua força de trabalho. (Agravo de Petição nº 02639199504602006, 4ª Turma, Rel. Des. Ricardo Artur Costa Trigueiros, v.u., j. 03/03/2009).

A exemplo de TARTUCE (2008), entendemos equivocada a invocação, pela Justiça do Trabalho, da teoria objetiva da desconsideração preconizada pelo código consumerista. Primeiro, porque, como já afirmamos, o Direito Civil, como fonte subsidiária do Direito trabalhista, torna obrigatória a observância do artigo 50, do Código Civil, que exige o elemento subjetivo do comprovado "mau uso" da personalidade jurídica da sociedade. Segundo, porque, pela leitura do artigo 1º do CDC, [12] verifica-se que as normas por ele estabelecidas aplicam-se, exclusivamente, às relações de consumo, como, aliás, deixa muito claro o parágrafo 2º do artigo 3º, do mesmo diploma legal [13] que, ao definir "serviço", exclui da sua abrangência as atividades de natureza trabalhista.

Verificamos, também, que alguns desembargadores do TRT/SP, mesmo admitindo a incidência do artigo 50, do Código Civil, na esfera trabalhista, afastam a personalidade jurídica da sociedade empresária, sustentando que o simples descumprimento das obrigações da empresa como empregadora caracterizaria o abuso da personalidade jurídica de que trata a referida norma.

Parece-nos uma visão distorcida. O abuso de direito de que trata a lei em comento diz respeito ao desvio de finalidade, isto é, à prática de atos diversos aos descritos no contrato ou estatuto social que rege as atividades sociais, e não a eventuais inadimplências. Portanto, se o sócio não fez uso abusivo do direito à personificação, não pode ser responsabilizado pelo descumprimento dos deveres da sociedade.

Por outro lado, se é certo que os sócios administradores são responsáveis pela prática de atos de gestão com excesso de poder, infração à lei, ou estranhos aos negócios da sociedade, não se trata, nestas hipóteses, da teoria da desconsideração da personalidade jurídica, mas sim, da responsabilização pessoal por ato ultra vires, como esclarecemos alhures.

Em nova investida contra os sócios, os desembargadores do TRT/SP sustentam que, frente ao caráter alimentar do crédito trabalhista, não pode prevalecer a tese da autonomia patrimonial das sociedades empresárias. Confira-se:

O crédito trabalhista é alimentar e sua natureza tem o condão de subverter a ordem normal da execução trabalhista em face da execução civil. Nesta, a pessoa jurídica tem prevalência, e a pessoa física é preservada até o limite do possível, mas na execução trabalhista, a execução deve ser célere e efetiva (...). O crédito alimentar não pode esperar. (...). (Agravo de Petição nº 02425200708902002, 12ª Turma, Rel. Des. Davi Furtado Meirelles, v.u., j. 12/11/2009).

Não discutimos a natureza alimentar do crédito trabalhista, mas, por outro lado, entendemos que a empresa, pela sua importância no cenário econômico, também merece ser resguardada. Ademais, como observa SILVA FILHO (2009), a Justiça trabalhista, ao desconsiderar indiscriminadamente a pessoa jurídica, sem investigar a existência de outros credores, da sociedade ou dos sócios, pode estar preterindo o direito de terceiros igualmente interessados na execução dos bens dos sócios, incluindo trabalhadores.

No campo processual, os magistrados obreiros costumam invocar o artigo 592, inciso II, combinado com o artigo 596, ambos do Código de Processo Civil. Aquele estabelecendo que os bens dos sócios, nos termos da lei, sujeitam-se à execução; este, que os bens particulares dos sócios não respondem pelas dívidas da sociedade, exceto nos casos previstos em lei. As referidas normas, como esclarece SILVA (2010) fundamentam a teoria da responsabilidade legal subsidiária, em que o sócio, na condição de executado, responde pelo débito trabalhista da empresa, mas tem o direito de exigir que primeiro sejam executados os bens da sociedade, como, aliás, determina o artigo 1.024, do Código Civil. [14]

Acontece que, na jurisprudência trabalhista, os bens dos sócios têm sido diretamente responsabilizados pelas dívidas da sociedade, em desrespeito ao benefício de ordem garantido pela legislação pátria. Nesse sentido, o seguinte julgado:

EMENTA - Agravo de Petição. Penhora de bem de sócio. Desconsideração da personalidade jurídica. Benefício de ordem. O crédito trabalhista é alimentar e sua natureza tem o condão de subverter a ordem normal da execução trabalhista em face da execução civil. Nesta, a pessoa jurídica tem prevalência, e a pessoa física é preservada até o limite do possível, mas na execução trabalhista, a execução deve ser célere e efetiva, refletindo-se em mais ampla possibilidade de configuração do grupo econômico, desconsideração de alterações estruturais, da personalidade jurídica, bem como a negativa do benefício de ordem. (...). (TRT/SP, Agravo de Petição, processo nº 02425200708902002, 12ª Turma, Rel. Des. Davi Furtado Meirelles, v.u., j. 12/11/2009). (Grifamos).

Além disso, com o cancelamento da Súmula nº 205, do Tribunal Superior do Trabalho, [15] firmou-se a orientação de que sequer é necessário que o nome do sócio conste do título executivo para que possa vir a responder pela execução, sob a alegação que a responsabilidade legal subsidiária é complementada pelo art. 4º, inciso V, parágrafo 3º, da Lei 6.830/1980. [16]

Tal prática, assim como as anteriormente citadas funcionam como verdadeiro desestímulo à constituição de sociedades empresárias, que são de suma importância para a economia do país e para toda a coletividade. São as sociedades empresárias que respondem pela maior contratação de trabalhadores, as que produzem a maior parte da riqueza do país, enfim, as responsáveis por desenvolver "a ‘livre iniciativa’ preconizada como um dos fundamentos da República enumerados no art. 1º da Constituição Federal ao lado dos ‘valores sociais do trabalho" (SILVA FILHO, 2009).

Em resumo, o que constatamos é que a desconsideração da personalidade jurídica vem sendo aplicada de forma incorreta e abusiva pela Justiça do Trabalho, desvirtuando totalmente a finalidade para a qual o instituto foi criado: coibir os abusos cometidos por sócios de empresas, por meio da personalidade jurídica. Não se pode admitir, como alerta SILVA FILHO (2009) que se rompa a personalidade jurídica de uma sociedade, que possui patrimônio próprio, para invadir o patrimônio dos seus sócios, cujos bens, em muitos casos, são os únicos de que dispõem para manter suas famílias. E arremata o autor: "Com toda certeza essa maneira de agir não se coaduna com o devido processo legal constitucional".

5.2 A responsabilidade trabalhista do sócio retirante da empresa

À luz do disposto no artigo 1.003, parágrafo único, do Código Civil, "até dois anos depois de averbada a modificação do contrato, responde o cedente solidariamente com o cessionário, perante a sociedade e terceiros, pelas obrigações que tinha como sócio". Esta norma, segundo SILVA (2010, p. 146), deve ser interpretada em conjunto com o artigo 1.032 do mesmo estatuto, segundo o qual a retirada, exclusão ou morte do sócio não o exime, ou a seus herdeiros, da responsabilidade pelas obrigações sociais anteriores, até dois anos depois de averbada a resolução da sociedade. Tais dispositivos, aliás, resolveram um dilema que sempre atormentou os Tribunais, qual seja, o limite temporal da responsabilidade do sócio que se desliga da sociedade. Restou consagrada, então, "a tese de que obrigação do ex-sócio não se perpetua, pois, caso contrário, estaria comprometida a segurança dos negócios e das pessoas". [17]

Na Justiça do Trabalho, cuja legislação não regulamenta a matéria, verificam-se três entendimentos distintos a esse respeito, criando uma insegurança jurídica para todas as pessoas que integram ou integraram os quadros societários de uma empresa.

O primeiro entendimento, ignorando o estatuto civil, simplesmente nega a aplicação dos referidos dispositivos legais, sob a alegação de que, se o antigo sócio se beneficiou do trabalho prestado pelo obreiro, deve continuar sujeito, pelo tempo que for necessário, à constrição de seus bens. Confira-se:

EMENTA - AGRAVO DE PETIÇÃO. TEORIA DA DESPERSONALIZAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA. INCABÍVEL APLICAÇÃO DOS ARTIGOS 1003 – PARÁGRAFO ÚNICO, E 1032, DO CCB, NESTA JUSTIÇA TRABALHISTA: A aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica patenteia-se em todas as sociedades modernas, encontrando guarida nesta Justiça Especializada, que busca os meios para a satisfação do crédito trabalhista, notadamente quando verificada a insuficiência do patrimônio societário. É inaplicável, no processo trabalhista, o disposto nos artigos 1003 - § único, e 1032, do Código Civil, que prevêem a responsabilidade do sócio retirante e dos seus herdeiros até dois anos depois de averbada a modificação contratual, tendo em vista as peculiaridades da ação trabalhista, que resguarda direitos de natureza alimentícia". (TRT/SP, Agravo de Petição em Embargos de Terceiro, processo nº 00690200806302004, 11ª Turma, Rel. Des. Dora Vaz Treviño, v.u., j. 28/04/2009). (Grifamos).

EMENTA - EXECUÇÃO DE BENS DOS SÓCIOS. A retirada da empresa, de sócio que conviveu e se beneficiou do trabalho do reclamante, não tem o condão de eximi-lo da execução, uma vez aplicável a desconsideração da personalidade jurídica. O disposto no art. 1003 do CC não se aplica à esfera trabalhista, por lidar com débito de natureza alimentar, decorrente de serviços prestados pelo autor que beneficiaram diretamente a empresa e seus sócios, que não podem se eximir da responsabilidade por sua devida satisfação. (Agravo de Instrumento em Agravo de Petição, processo nº 01576-2004-036-02-01-8, acórdão nº 20100611707, 4ª Turma, Rel. Des. Ricardo Artur Costa e Trigueiros, j. 29/06/2010, publicação 16/07/2010). (Grifamos).

Trata-se, no nosso sentir, de uma interpretação que fere de morte o princípio da segurança jurídica, [18] um dos postulados que regem o Estado de Direito, já que "o homem necessita de uma certa segurança para conduzir, planificar e conformar autónoma e responsavelmente a sua vida". CANOTILHO (2003, p. 257).

É justamente o princípio da segurança jurídica que explica a existência, em todas as áreas do Direito, da prescrição e da decadência, institutos que buscam, em nome desse princípio e da pacificação social, "a consolidação das situações jurídicas pelo decurso do tempo". (CAHALI, 2008, p. 18). Ora, se o Direito permite a extinção da pretensão de um direito subjetivo, e até a extinção do próprio direito, pela inércia de seus titular por determinado lapso de tempo, como justificar a manutenção de créditos trabalhistas, sem qualquer limitação temporal? Definitivamente, parece-nos que tese tão extremada não se coaduna com as demais normas do ordenamento jurídico pátrio. Mesmo porque, se a legislação trabalhista é omissa sobre o tema, os magistrados laborais deveriam valer-se, como determina o parágrafo único do artigo 8º e o artigo 769, ambos da CLT, das regras do direito comum (artigo 1.003, parágrafo único e artigo 1.032, do Código Civil), e também das normas do direito processual comum, no caso, do artigo 596, do Código de Processo Civil, que estabelece claramente a impossibilidade de os bens particulares dos sócios responderem pelas dívidas da sociedade, "senão nos casos previstos em lei", bem como sua responsabilidade subsidiária, ou seja, a que lhes garante que seus bens somente poderão ser executados depois que executados os da sociedade (benefício de ordem).

Uma segunda leitura a respeito da aplicação das normas civis em comento, admite a sua aplicação, estabelecendo que a responsabilidade do sócio permanece se a distribuição da ação ocorrer no prazo de até dois anos, contados da regular retirada. Esta solução, na opinião de SILVA (2008, p. 30), coloca o sócio retirante, a exemplo da tese anterior, "numa desconfortável posição de insegurança eterna", pois, como a distribuição interrompe a prescrição, colocando o devedor em mora (GARCIA, 2010, p. 327), na realidade, ele não se desliga nunca da sociedade, "muito embora não a comande e já não tenha mais direito de opinar sobre alocação de recursos e sobre prioridades da empresa".

A terceira tese defende que, transcorrido o prazo de dois anos a contar da regular retirada do sócio, este não poderá ser atingido pela execução forçada, ainda que a ação se refira a período de contrato de trabalho em que o sócio estava na empresa. É, de acordo com SILVA (2010, p. 147) – e também no nosso sentir – a solução que melhor se identifica com o princípio da segurança jurídica e com a norma disposta no artigo 1.003, parágrafo único, do Código Civil. Pode-se argumentar, diz o autor, que ela traz para o credor o ônus de impedir que a demora na tramitação do processo impeça o futuro ressarcimento de seu direito, o que seria injusto, uma vez que ele não tem como controlar o andamento da lide. Porém, como acrescenta o referido autor, valendo-se parcialmente das palavras de SILVA (2008, p. 31):

(...) não se deve esquecer que o Direito Processual assegura mecanismos para proteger o credor, seja por meio da antecipação de tutela, cabível no processo de conhecimento ou no de execução, seja por meio de medidas cautelares, como o arresto, tudo de modo a atender simultaneamente a "todos esses anseios de segurança, eficácia do art. 1.003 e garantia da utilidade do processo".

Para encerrar este capítulo, frisamos, recorrendo ao pensamento de PITTA (2005), que o posicionamento da Justiça do Trabalho de adotar como regra a teoria menor da desconsideração da personalidade jurídica, bem como de ignorar as normas civis e processuais civis ao aplicar o instituto, acarreta um custo social imensamente maior do que o prejuízo causado aos credores da sociedade, pois, no mínimo, o custo dos riscos jurídicos suportados pela empresa comporá o preço a ser pago pelos consumidores. Portanto, para resolver o conflito da aplicação, ou não, do instituto é mister analisar a prevalência do valor mais importante para a sociedade e, a exemplo do que pondera PEIXOTO (2003, p. 8-9), parece-nos que "o progresso e o desenvolvimento econômico proporcionado pela pessoa jurídica são mais importantes que a satisfação individual de um credor. Logo, deve prevalecer".


6. CONCLUSÕES

As pessoas jurídicas têm personalidade e patrimônio próprios, distintos dos de seus constituintes e, portanto, capacidade para, em seu próprio nome, exercer direitos e contrair obrigações.

Em decorrência do princípio da autonomia patrimonial, os bens da sociedade é que respondem, regra geral, pelas obrigações por ela assumidas. Tal princípio, ao limitar a possibilidade de perdas de seus sócios, estimula o empreendedorismo.

Apenas excepcionalmente, em caso de abuso da personalidade jurídica, ou confusão patrimonial, pode o magistrado desconsiderar a personalidade jurídica, estendendo a responsabilidade da sociedade ao patrimônio de seus sócios ou administradores.

O bom funcionamento da Justiça, assegurando o cumprimento dos contratos e tutelando os direitos de propriedade, são fundamentais ao crescimento da economia de um país, influenciando, também, no custo do crédito. De outro lado, um sistema judicial imprevisível e incapaz de garantir tais direitos tende a inibir a execução de determinados negócios por parte das empresas.

A elevação dos riscos das sociedades provoca o aumento dos preços dos produtos e serviços, bem como, na impossibilidade da incorporação destes riscos aos preços, redução ou até mesmo a paralisação das atividades empresariais.

Pela teoria maior (subjetiva) da desconsideração da personalidade jurídica de que trata o artigo 50, do Código Civil, o magistrado, desde que comprovado desvio de finalidade ou confusão patrimonial por parte dos sócios, poderá afastar pontualmente o "véu" da pessoa jurídica, para atingir os bens pessoais destes. Pela teoria menor (objetiva), o pressuposto para a desconsideração é simplesmente a demonstração, pelo credor, da inexistência de bens da empresa para saldar suas obrigações e da solvência de qualquer sócio, para atribuir a este a obrigação da pessoa jurídica.

Os magistrados do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo vêm aplicando ampla e abusivamente o instituto da desconsideração da personalidade jurídica, sob as seguintes alegações: a não incidência do artigo 50, do Código Civil, na esfera laboral; a aplicação analógica da teoria objetiva do instituto, previsto no artigo 28, caput e parágrafo 5º, do Código de Defesa do Consumidor; que o simples descumprimento da obrigação trabalhista, por parte da empresa, caracteriza abuso da personalidade jurídica; e, por fim, o caráter alimentar do crédito trabalhista.

O Direito Civil, fonte subsidiária do Direito trabalhista, torna obrigatória a observância do artigo 50, do Código Civil, sendo que o abuso de direito a que ela se refere diz respeito ao desvio de finalidade, e não a eventuais inadimplências trabalhistas. Não se aplica, na seara trabalhista, o Código de Defesa do Consumidor, conjunto de normas aplicável, apenas às relações de consumo.

Com relação à responsabilidade do sócio retirante da sociedade, os desembargadores do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo têm interpretado a matéria sem uniformidade. Ora entendem não se aplicar o 1.003, parágrafo único, do Código Civil, que limita a responsabilidade do sócio ao prazo de dois anos depois da sua retirada regular da empresa, ora compreendem que esse se aplica, mas estabelecem pontos de partida divergentes para sua contagem.

A desconsideração da personalidade jurídica é necessária para coibir os abusos cometidos por sócios ou administradores de empresas, mas é preciso que ela seja aplicada de forma criteriosa. A banalização do instituto representa um desestímulo à livre iniciativa, comprometendo as atividades empresariais e, consequentemente, a economia do país.


ANEXO A

Ementas do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo

EMENTA – Desconsideração da Personalidade Jurídica – Agravante – Ex- sócio. Responsabilidade Mantida – O artigo 1032, do CC, de 2002, não altera a responsabilidade do agravante, pelo simples motivo de que a dívida que originou o título executivo está associada a fatos contemporâneos ao tempo em que figurava como sócio. (TRT/SP, Agravo de Petição em Embargos de Terceiro, processo nº 00230200800802004, 12ª Turma, Rel. Des. Benedito Valentini, v.u., j. 16/04/2009).

EMENTA – Agravo de Petição. Desconsideração da Personalidade Jurídica da empresa. Constrição de bem imóvel de ex-sócio que se retirou da sociedade há mais de 02 (dois) anos da propositura da Reclamação Trabalhista. É absolutamente legal a desconsideração da personalidade jurídica da empresa quando esta não apresenta força financeira capaz de suportar a execução, conforme estabelecem o art. 28 da Lei n° 8.078/90 e arts. 50 e 1.024, ambos do Código Civil. Nessa circunstância o juiz pode determinar que a execução avance no patrimônio dos sócios para satisfazer as dívidas da sociedade executada. No entanto, o art. 1032 e o parágrafo único do art. 1.003, ambos do Código Civil, estabelecem que o sócio retirante ou excluído só responde pelas obrigações da sociedade no prazo de até 2 (dois) anos após a averbação da sua retirada ou exclusão. (TRT/SP, Agravo de Petição, processo nº 01548200103202000, 12ª Turma, Rel. Des. Marcelo Freire Gonçalves, v.u., j. 08/07/2009).

EMENTA - Desconsideração da personalidade jurídica. Excesso de penhora. Na Justiça do Trabalho, adota-se a teoria objetiva da desconsideração da personalidade jurídica, a teor do art. 28, parágrafo 5º, da Lei 8.078/90, motivo pelo qual carece de relevância a alegação de que não houve fraude ou abuso de direito (art. 50 do Código Civil). (...). Agravo não provido. (TRT/SP, Agravo de Petição, processo nº 00339200406202003, 12ª Turma, Rel. Des. Adalberto Martins, v.u., j. 30/07/2009).

EMENTA - Dívida trabalhista. Incapacitação financeira do empreendimento. Responsabilidade direta do devedor subsidiário. Impossibilidade jurídica. Execução em face dos sócios do devedor principal. A informação alusiva ao prosseguimento da atividade empresarial constitui-se em informação salutar, pois o encerramento das atividades do empreendimento (devedor principal) pode levar à excussão dos bens dos sócios; ressalte-se que os bens da empresa subsidiária não preferem aos do sócio do devedor principal, por força do disposto no art. 596 do CPC. A exegese do texto de lei em comento traz em favor do sócio tão somente o benefício de ordem; primeiramente respondem os bens da empresa pela dívida, e, após, os dos sócios. Isso quer dizer que a responsabilidade principal pela liquidação da dívida transfere-se da pessoa jurídica para a pessoa física do sócio. Não há juridicidade em se direcionar a execução para o devedor subsidiário antes da comprovação da insuficiência patrimonial da empresa principal e do esgotamento dos bens dos sócios. Atente-se para a previsão do art. 28 do CDC, de aplicação subsidiária ao processo do trabalho (art. 769): (...) A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração. Na hipótese de comprovação do estado falimentar, de insolvência, ou mesmo de encerramento ou inatividade da pessoa jurídica, transfere-se o liame obrigacional à figura dos sócios. Apenas na hipótese de insuficiência financeira dos componentes da base societária é que a dívida pode ser cobrada do subsidiariamente vinculado ao pagamento das verbas condenatórias. Apelo parcialmente provido. (Agravo de Petição, processo nº 00160-2005-231-02-00-5, acórdão nº 20100070960, 8ª Turma, Rel. Des. Rovirso Aparecido Boldo, j. 10/02/2010, publicação 19/02/2010).   

EMENTA - Penhora de conta corrente e desconsideração da personalidade jurídica. Agravo de Petição em Embargos de terceiro. Ex sócios. Importa, para fins de mensuração da responsabilidade dos agravantes (ex sócios) no caso em tela, a data da averbação da alteração do quadro societário perante a JUCESP (22/10/1996). Para fins de direito, os agravantes valeram-se dos préstimos trabalhistas da agravada durante o período que perdurou entre o início do contrato de trabalho desta e a averbação da retirada daqueles. O ordenamento veda o enriquecimento sem causa, bem como prevê a possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica, admitida na Justiça do Trabalho para salvaguardar o trabalhador hipossuficiente. Assim sendo, não havendo bens em nome da Sociedade Empresária que garantam a execução, cabível a responsabilização subsidiária dos agravantes (ex sócios) em relação aos valores devidos à agravada (empregada). A penhora é legítima. Quanto à desconsideração da personalidade jurídica, os agravantes não lograram comprovar a alegada precocidade da medida, já que apenas fizeram genéricas alusões aos autos principais onde corre a execução, não se ocupando em, quanto a isso, formar devidamente o instrumento do presente recurso. Mantenho." (Agravo de Petição em Embargos de Terceiro, processo nº 01265-2008-031-02-00-8, acórdão nº 20100319917, 10ª Turma, Rel. Des. Marta Casadei Momezzo, j. 13/04/2010, publicação 28/04/2010).      

EMENTA - Desconsideração da personalidade jurídica. Penhora na conta de sócio. Respondem pessoalmente, em razão da administração perpetrada, os sócios de empresa que não apresenta liquidez mínima à satisfação de dívida (CC, art. 50; CPC, art. 592, II). (TRT/SP, Mandado de Segurança, processo nº 10102-2009-000-02-00-9, SDI, j. 15/04/2010, publicação 06/05/2010).   

EMENTA - 1. Desconsideração da personalidade jurídica ex officio. Aplicação, por analogia, do artigo 28, "caput" e parágrafo 5º da Lei 8.078/90. Pode o Juiz, de ofício, desconsiderar a personalidade jurídica da empresa executada, caso constate ser a personalidade óbice à quitação da dívida trabalhista. Aplicação analógica do artigo 28, "caput" e "parágrafo 5º", da Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990. (...). (TRT/SP, Agravo de Petição e Embargos de Terceiro, processo nº 02416-2009-341-02-00-8, 8ª Turma, Rel. Des. Rovirso Aparecido Boldo, j. 28/04/2010, publicação 04/05/2010).          

EMENTA – Desconsideração da Personalidade Jurídica da Empresa – Possibilidade – Penhora em bem de sócios - Induvidoso que a pessoa jurídica, empregadora, é a executada na ação principal, devendo a execução recair sobre seus bens. Mas, na ausência deles, passíveis de penhora, pode a constrição recair sobre bens de propriedade dos titulares da pessoa jurídica quando esta ficou inadimplente sem que tenham sido encontrados bens ou recurso financeiro suficiente para que se pudesse dar efetividade à execução. (TRT/SP, Agravo de Petição, processo nº 02776-1999-074-02-00-3, 3ª Turma, Rel. Des. Mercia Tomazinho, j. 11/05/2010, publicação 21/05/2010).      

EMENTA – Penhora de Bens de Ex-Sócio. Desconsideração da Personalidade Jurídica. Apenas na impossibilidade de prosseguimento da execução em face da devedora principal, tanto da pessoa jurídica quanto dos atuais sócios, é que pode a execução voltar-se para ex-sócio, observados os termos do parágrafo único do artigo 1003 do CPC. Agravo de Petição a que se dá provimento. (Agravo de Instrumento em Agravo de Petição, processo nº 00018-2005-069-02-01-7, acórdão nº 20100432330, 3ª Turma, Rel. Des. Mercia Tomazinho, j. 11/05/2010, publicação 21/05/2010).       

EMENTA - Execução. Ex-sócio cotista. Responsabilidade. Se a empresa executada não dispõe de bens para a satisfação da obrigação, responde, com os seus pessoais o ex-sócio que integrava a sociedade no período do contrato de trabalho, ainda que apenas na condição sócio cotista, notadamente porque se beneficiou da força de trabalho do credor e deixou, ele mesmo, de dar cumprimento às obrigações trabalhistas. Teoria da desconsideração da personalidade jurídica, já há muito adotada na Justiça do Trabalho e que hoje avança para o direito comum. Agravo de Petição a que se nega provimento. (TRT/SP, Agravo de Petição em Embargos de Terceiro, processo nº 01418-2009-055-02-00-8, 11ª Turma, Rel. Des. Eduardo de Azevedo Silva, j. 07/07/2010, publicação 20/07/2010).

EMENTA - Desconsideração da personalidade jurídica. Validade. A desconsideração da personalidade da pessoa jurídica no Processo do Trabalho encontra fundamento no art. 135, III do Código Tributário Nacional, ao qual se refere expressamente o art. 4º da Lei de Execuções Fiscais que é aplicável subsidiariamente à execução trabalhista por força do art. 889 da CLT. Possível invocar também o art. 28 do Código de Defesa do Consumidor, este compatível com o Direito do Trabalho eis que ambos têm igual pressuposto (proteção ao hipossuficiente, lá - consumidor, aqui - empregado). Pela incompatibilidade com os Princípios do Direito do Trabalho, é afastada a aplicação do art. 50 do Código Civil. Recurso da agravante a que se nega provimento. (TRT/SP, Agravo de Petição em Embargos de Terceiro, processo nº 00966-2009-017-02-00-4, 3ª Turma, Rel. Des. Antero Arantes Martins, j. 03/08/2010, publicação 13/08/2010).

EMENTA - Da responsabilidade subsidiária - benefício de ordem. Foram esgotados todos os meio para excutir os bens da primeira reclamada e seus sócios, sendo legítima a execução em face da agravante, responsável subsidiária. Ademais, é pacífico que quem alega o benefício de ordem, deve nomear bens do devedor, sitos no mesmo município, livres e desembargados, quantos bastem para solver o débito, art. 827 do Código Civil, o que não ocorreu no presente caso. Mantenho. Do direcionamento da execução face aos sócios da primeira reclamada. Conforme se verifica às fls. 262/268, já houve a desconsideração da personalidade jurídica da primeira reclamada e prosseguimento da execução face seus sócios, a qual restou infrutífera, sendo legítimo o prosseguimento face a recorrente." (Agravo de Petição, processo nº 02725-2002-062-02-00-8, 10ª Turma, Rel. Des. Marta Casadei Momezzo, j. 31/08/2010, publicação 13/09/2010).

EMENTA – Responsabilidade do ex-sócio. Inaplicabilidade dos arts. 1003 e 1025 do atual Código Civil. Os arts.1003, parágrafo único, e 1025 do Livro II (Direito de Empresa e da Sociedade), seção II (Dos Direitos e Obrigações dos Sócios) e seção IV (Das relações com Terceiros), do Código Civil em vigor, concernentes à responsabilidade solidária do sócio cedente de suas quotas até 2 anos após a retirada da sociedade, passaram a viger somente a partir de 10.01.2003, nos termos do art.2044 do NCC. Tratando-se de disposições legais que versam sobre direito material, seus efeitos não retroagem para alcançar fatos já consumados sob a lei vigente à época (art.6º da LICC). E ainda que assim não fosse, o dispositivo em tela não se aplica à esfera trabalhista, por se tratar de crédito de natureza alimentar decorrente de serviços prestados pelo autor que beneficiaram diretamente a empresa e seus sócios, que desses encargos não podem se eximir a pretexto do desligamento societário. Assim, mantém-se a responsabilidade daquele que foi sócio à época de prestação de serviços pelo exeqüente, ingressando no pólo passivo da execução em andamento, em face da desconsideração da personalidade jurídica. (TRT/SP, Agravo de Petição, processo nº 02514200402202008, 4ª Turma, Rel. Des. Ricardo Artur Costa e Trigueiros, v.u., j. 27/10/2009).


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Notas

  1. Sobre as principais teorias que buscam explicar a natureza da pessoa jurídica, recomendamos a leitura de LOPES (1996, v. 1, p. 357-365), que as sintetiza de forma bastante clara, concluindo pela existência real da pessoa jurídica.
  2. LISBOA (2002, p. 233) esclarece que a teoria da realidade adotada pelo Código Civil é a da realidade objetiva, ou seja, aquela que permite conferir "vida autônoma a um organismo, que passa a ter realidade sociológica por se tornar sujeito de direito".
  3. Exemplos desta teoria podem ser encontrados nos artigos 117 e 158 da Lei 6.404/1976, que tratam, respectivamente, da responsabilidade do acionista controlador pelos danos por ele causados por atos praticados com abuso de poder e por procedimentos que violem a lei ou o estatuto social. Também o artigo 135, do Código Tributário Nacional, estabelece serem os administradores pessoalmente responsáveis por créditos tributários resultantes de atos praticados com excesso de poder ou infração à lei.
  4. O "risco país" é um índice denominado Emerging Markets Bond Index Plus (EMBI+), que busca determinar o grau de instabilidade econômica – e portanto, de "perigo" – que um país representa para o investidor estrangeiro. É calculado por agências de classificação de risco e bancos de investimentos. Na prática, o "risco país" é a sobretaxa que se paga em relação à rentabilidade garantida pelos bônus do Tesouro dos Estados Unidos, país considerado o mais solvente do mundo, ou seja, o de menor risco para um aplicador não receber o dinheiro investido acrescido dos juros prometidos. Para determinar essa sobretaxa, são avaliados, entre outros, aspectos políticos, fiscais e econômico-financeiros, bem como a confiança nas instituições, incluindo a segurança jurídica.
  5. KOURY (1997, p. 64) noticia a existência de um caso, nos Estados Unidos, que teria sido o pioneiro: o caso Bank of United States vs. Deveaux, em 1809, em que o Juiz Marshall, levantando o véu da pessoa jurídica (piercing the corporate veil), julgou-se competente para conhecer da causa baseado na nacionalidade dos sócios, e não na nacionalidade da empresa. Como não tratou de uma discussão sobre responsabilidade patrimonial, mas de simples competência de juízo, SILVA (1999, p. 32), não considera esse julgamento um verdadeiro leading case sobre o tema.
  6. Exemplificativamente, citamos o artigo 18 da Lei 8.884/1994 (Lei Antitruste) e o artigo 4º da Lei 9.605/1998 (Lei de Crimes Ambientais), verbis:
  7. Art. 18 [Lei 8.884/1994]: A personalidade jurídica do responsável por infração da ordem econômica poderá ser desconsiderada quando houver da parte deste abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração.

    Art. 4º [Lei 9.605/98]: Poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados à qualidade do meio ambiente.

  8. REsp 1.098.712/RS, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, Quarta Turma, v.u., j. 16/09/2010, DJe 01/10/2010.
  9. "Opinião exarada em palestra proferida em 14/08/2003, na IX Semana Jurídica da UniCapital, em São Paulo-SP".
  10. Defendem essa opinião, entre outros doutrinadores, BRUSCHI (2009, p.74-75), PEIXOTO (2003), TARTUCE (2008) e TOMAZETTI, Marlon (2003, p. 84).
  11. "(...) Nesta Justiça Especializada todos os sócios, independentemente do tipo societário, respondem pelos débitos trabalhistas caso as respectivas sociedades não cumpram com sua obrigação". (TRT/SP, processo nº 00157200320102008, Rel. Des. Jomar Luz de Vassimin Freitas, v.u., j. 30/06/2009). (Grifamos).
  12. A pesquisa foi realizada no site do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (<http://www.trtsp.jus.br/>), no dia 18/01/2011. Como parâmetro de busca foi digitada a frase "desconsideração da personalidade jurídica", elegendo-se a opção "Pesquisa de Ementas". Foram apontadas, então, 36 (trinta e seis) acórdãos publicados entre 01/07 a 31/12/2009 e 45 acórdãos no ano de 2010.
  13. Art. 1° O presente código estabelece normas de proteção e defesa do consumidor, de ordem pública e interesse social, nos termos dos arts. 5°, inciso XXXII, 170, inciso V, da Constituição Federal e art. 48 de suas Disposições Transitórias.
  14. Art. 3° (...) § 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista. (Grifamos)
  15. Art. 1.024. Os bens particulares dos sócios não podem ser executados por dívidas da sociedade, senão depois de executados os bens sociais.
  16. Súmula 205:    GRUPO ECONÔMICO. EXECUÇÃO. SOLIDARIEDADE - O responsável solidário, integrante do grupo econômico, que não participou da relação processual como reclamado e que, portanto, não consta no título executivo judicial como devedor, não pode ser sujeito passivo na execução.
  17. Art. 4º - A execução fiscal poderá ser promovida contra: (...) V - o responsável, nos termos da lei, por dívidas, tributárias ou não, de pessoas físicas ou pessoas jurídicas de direito privado; e (...) § 3º - Os responsáveis, inclusive as pessoas indicadas no § 1º deste artigo [o síndico, o comissário, o liquidante, o inventariante e o administrador], poderão nomear bens livres e desembaraçados do devedor, tantos quantos bastem para pagar a dívida. Os bens dos responsáveis ficarão, porém, sujeitos à execução, se os do devedor forem insuficientes à satisfação da dívida.
  18. Excerto de voto relator. TRT/SP, Agravo de Petição em Embargos de Terceiro, processo nº 01142200900402005, 11ª Turma, Rel. Des. Eduardo de Azeredo Silva, v.u., j. 03/11/2009.
  19. Na nossa Lei Maior, a segurança jurídica, como esclarece DELGADO (2005), é considerada sob três aspectos: como princípio, como valor e como direito fundamental. Como princípio, para garantir a segurança pública, a segurança jurídica, à dignidade humana, enfim, os direitos e garantias individuais e sociais.

Autor

  • Victor Gustavo Lourenzon

    Victor Gustavo Lourenzon

    Advogado especialista na área de contratos e Processo Civil, graduado pela Universidade Mackenzie de São Paulo e pós-graduado em Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas - FGV LAW, pós-graduado em Direito Processual Civil pela Escola Paulista de Direito - EPD e em Direito Público pela Faculdade Damásio de Jesus. pós-graduado em Direito do Trabalho pelas Faculdades Metropolitanas Unidas - FMU.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LOURENZON, Victor Gustavo. A aplicação da desconsideração da personalidade jurídica segundo decisões do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo e seu impacto nas decisões empresariais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 3054, 11 nov. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20401. Acesso em: 19 abr. 2024.