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A desordem do discurso jurídico.

Reflexões intempestivas

A desordem do discurso jurídico. Reflexões intempestivas

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Foucault, enquanto profeta anunciou que “o século XXI será deleuziano”. Ledo engano! O século XXI será sadiano.

"Quem só o Direito conhece, nem o Direito conhece"

(Oliver Wendel Holmes, juiz norte-americano)

"É preciso ser duro; mas perder a ternura jamais"

(Che Guevara)


UM ESCRITO, QUALQUER QUE SEJA não basta. E mesmo não querendo fazer apologia a inconclusão (por conta dos fetiches metodológicos que a institucionalizam), temos que reconhecer, é sempre um texto inacabado quer se queira científico ou não, mesmo porque, como disse Georges Bataille, "a filosofia jamais é uma casa, mas um canteiro de obras", de obras sempre incerta e imprecisa ("Metamorfoses somos e seremos...", como disse Jorge de Sena), que, nas palavras de Foucault, "indefinidamente, para além de sua formulação, são ditos, permanecem ditos e estão ainda por dizer", sendo possível (apesar de aporético e paradoxal) falar em falso, inexato, errôneo a título de hipótese de trabalho teórico (Althusser), mas também a título de uma experiência com a realidade concreta nua e crua suspeita de ser em si (Kant), [mesmo porque também, como diria o professor Emmanuel Carneiro Leão, "qualquer fato já é sempre feito", e, além disso, aponta Maria Helena Varela: "A nossa relação com o real foi sempre, e ainda é essencialmente mítica, imaginária, e a ela se subordinando o discurso racional" (VARELA, 1996)]... E, em última instância, somos justamente isso que em crítica de arte chama-se bricoleurs. E por seu infinito de buscas e lacunas insuperáveis, diz belamente Maria Helena: "A procura do eu individual e coletivo, do humano e do divino no humano, a viagem marítima ou sertaneja, histórica ou insituada, termina ou começa sempre nessa Viagem infinita da escrita, "l’infini de La mort impossible à mourir", como dizia Blanchot". (VARELA, 1996). Mas, como sair disso, que Barthes chama sartrenianamente un huis clos? Pergunta e responde com humor Umberto Eco: "Blefando. Pode-se blefar com a língua. Esse jogo desonesto, salutar e libertador chama-se literatura" (ECO, 1984). Trata-se, aqui, não de filosofia, mas de literatura, literatura jurídica, e, literalmente, de um blefe jurídico do STF dado em recente e inânime decisão a propósito da ADI nº 4277/DF e da ADPF nº 132/RJ, e, eu diria, com as palavras de Vladimir Safatle, "sem a compreensão adequada dos móbiles em operação no interior da filosofia moral" (SAFATLE, 2011). Penso em Baudrillard: "Haveria o direito ao desejo, o direito ao inconsciente, o direito ao gozo? Absurdo. É o que torna ridícula a liberação sexual, quando ela fala em direito" (BAUDRILLARD, 1996). Então, continuando com Baudrillard: "Por que não reivindicar o "direito" de ser homem ou mulher? Por que não também o de ser de Leão, Aquário ou Câncer? Mas o que significa ser homem ou mulher, se tivermos esse direito?", e, mais ainda, que direito? Concluindo: "Posso reivindicar o direito de mover, no jogo de xadrez, o cavalo em linha reta, mas que sentido isso pode ter? Ter direito nesse tipo de questão é estúpido" (BAUDRILLARD, 1996). Tudo isso quer dizer que não podemos blefar assim. Podemos? A resposta que aparece no horizonte do direito contemporâneo desenha o esboço de um sim na jurisprudência do STF. Estranho paradoxo, porque não se pode blefar com o Direito, portanto, trata-se, aqui, de pensar algo que só pode ser conquistado, por exemplo, com regras de um jogo de pôquer. Mesmo porque seria insensatez tratar estas regras como proposições hermenêuticas ou como paradigmas epistemológicos ou como filosofia moral, apesar de todas as profundidades receberem a espessura de uma carta de baralho e suscetível de serem embaralhadas e depois cartadas nas mãos dos jogadores previamente posicionados... Trata-se de um jogo e de jogadores? Não aqui! Mas é assim que, jogando, Foucault, por exemplo, como exímio jogador (criando, inclusive, regras do jogo), inicia a primeira de suas cinco conferências no Brasil, na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro entre 21 e 25 de maio de 1973, denominadas "A verdade e as formas jurídicas": "O que gostaria de dizer-lhes nestas conferências são coisas possivelmente inexatas, falsas, errôneas, que apresentarei a título de hipótese de trabalho; hipótese de trabalho para um trabalho futuro. Pediria, para tanto, sua indulgência e, mais do que isso, sua maldade" (FOUCAULT, 1999). Ok! É com maldade que digo: as conferências de Foucault, vindo a lume, se revelam inexatas demais, falsas demais, errôneas demais. E sem indulgência, as tarefas deixadas para o futuro árduas demais, e nem sei se valem à pena... Questão de temperamento: não me dobro ao rigor mortis da filosofia, não privilegio velórios, não creio que com minha sexualidade possa "ir para o céu" e tampouco penso que alguém tenha o paraíso terrestre no ânus e faça disso seu curso ontológico. Mas isso já é outra conversa, não cabe aqui. Em outras palavras, o conhecimento constitui e, pior ainda se constitui, como "uma fatalidade e uma espécie de maldição já reconhecida no Gênese ("Não provarás da árvore da Ciência")" (ROSSET,1989), que nos perturba na aurora e no crepúsculo, e é preciso não se importar em sofrer (a gente sempre erra) no interregno de algum tempo. Drama comum de mestres e discípulos, já que é preciso não permanecer discípulo. É que pensar não é um instinto natural, e por isso geralmente aparece como que sem necessidade e repleto de censuras e exclusões injustas e visíveis na superfície quando o fundamento fica ou é obnubilado por uma escrita, leitura, escuta ou surdez ideológica. Daí todas as aporias insolúveis, por exemplo, do conceito histórico e institucionalmente constrangedor de liberdade etc. Sempre! Razão pela qual, por exemplo, a liberdade de pensamento etc. só pode ser liberdade se dada a quem pensa radicalmente diferente, e por isso será sempre de resultado crítico, difícil, cruel, implacável, doloroso, inaceitável... E etc. porque todo conceito (Hegel) é como uma sentença de expulsão do paraíso, portanto, quanto maior o conhecimento maior é a dor e o sofrimento, como já o disse Schopenhauer. Conseqüentemente, como observou Bertrand Russel, "elegância e bom gosto são predicados para alfaiates e sapateiros", para o pensador são impróprias e mesmo inúteis. Dizer data venia não é sinal de polidez, educação, boa retórica, mas cinismo ou ironia. Ninguém sofre com elegância ou bom gosto. Por elegância talvez, alguns, (estética da existência?), mas por bom gosto, nunca, ninguém (ética da existência?). E Ernesto Sábato, recentemente falecido, disse: "Desejo ser seco e não enfeitar nada. Uma teoria deve ser implacável e volta-se contra seu criador se este não trata a si mesmo com crueldade" (SÁBATO, 1981), portanto, nem elegância, nem bom gosto, mas exigências da verdade (filosófica, histórica, científica, literária, jurídica etc.), e apenas isso, e, contra ela, a crença, a censura, a rejeição, a interdição, enfim, todos e mais uma vez os procedimentos de exclusão e opressão! Afinal diria Popper: "Nossa ignorância é sóbria e ilimitada", ou seja, sob ou sobre ela impõe-se um estranho dever ser ou um grande labor. Contra ela a exigência dos trabalhos científicos, e, com ela gestos e pedidos remanescentes de uma vida fascista. Um horror! É que poucos possuem o talhe humano necessários para a compreensão. Isso é muito triste! Falência das instituições e do processo educativo! Sem dúvida! Vazio de pensamento? (Arendt). Geralmente sim, infelizmente! Mas, de qualquer forma, ou talvez até por isso mesmo, como dizia Roland Barthes, "nós fazemos, nós continuamos sempre o mesmo discurso, é preciso muita paciência daqueles que nos cercam para suportar, de nossa parte, esse discurso imperturbável que é o nosso durante a vida" (BARTHES, 2003).


SABER DIZER UM SIM, SABER DIZER UM NÃO?

Nas palavras de Goethe, em "As afinidades eletivas", através de Edward, um dos personagens: "Devemos ficar sempre calados em sociedade para não incorrer, às vezes, no mesmo caso, pois não somente as observações significativas como também as opiniões mais triviais podem soar mal aos interesses das pessoas presentes" (GOETHE, 1992). Em outras palavras, ou, nas palavras de Foucault, em "A ordem do discurso": "Sabe-se que não se tem o direito de dizer tudo, que não se pode falar de tudo em qualquer circunstância, que qualquer um, enfim, não pode falar de qualquer coisa. Tabu do objeto, ritual da circunstância, direito privilegiado ou exclusivo do sujeito que fala..." (FOUCAULT, 2001). E a verdade? O que importa a verdade quando o charme de um "intelectual" está em engajar-se no prazer de "enfrentar o mundo todo, a família, o padre, o professor Ministro do Supremo Tribunal Federal", o policial, o professor, o Estado etc., esfacelar a tradição, enfraquecer a autoridade, quebrar tudo, liberar geral em nome do direito à felicidade, em nome do desejo, do gozo etc.? A motivação selvagem segue os argumentos mais pífios, e as motivações mais banais. Vide, por exemplo, a recente invasão da Reitoria da USP por estudantes. E basta a violência! Fato irrelevante é claro, mas denúncia que parece existir a crença que a violência em si e para si é parteira da história, logo que, em si e para si ela resolve tudo e qualquer coisa... Coisa louca! Mas que história? Guia-nos, portanto, uma angústia: não é mais necessário inequivocamente saber a que dizer "Sim" ou a que dizer "Não"? Talvez sim! Talvez não! Difícil saber. Mas, inegavelmente, por exemplo, diz Hanna Arendt, o esfacelamento da tradição ao aprofundar a lacuna atualmente existente entre o passado e o futuro, implicou (ou implica) "a perda de sabedoria, isto é, para falar como Karl W. Deutsch, na dificuldade de discernir, num contexto, as classes de perguntas que devem ser feitas" (ARENDT, 1977), e as respostas que deveriam ser dadas assumem o caráter de simulacro. Com efeito, parece não ser mais preciso saber inequivocamente a que dizer "Sim", a que dizer "Não"; tudo e qualquer coisa se tornam defensável em nome da "diferença", do "pluralismo", do "multicultural", da "ação afirmativa" etc. A resposta pode ser dada a gosto (Kant)... Tudo dependendo do que se gosta de comer ou de cheirar. De onde se coloca o céu: o céu na boca, o céu no ânus... Ou mesmo o céu no crime. O negócio é a lei do menos esforço... Estamos no paraíso da "estupidez"? O grande lance é ceder-se "as ilusões dos apaixonados pelo gozo orgásmico" (ROUDINESCO, 2008) ou pelo gozo lúbrico? Impõe-se a cada dia na esfera da sexualidade humana (como caso mais particular) o reinado do "ridículo" e do "tirânico" em nome da artistificação em simulacro da vida, humor, criação, paródia como remédio aos afetos tristes? É de se temer! Mesmo porque, como observa Roudinesco, "o sistema democrático, fundado no individualismo, na livre iniciativa e no mercantilismo, não estava (e não está) imune, a despeito de sua evidente superioridade, a inversão da Lei que não raro o levava (e ainda o leva) a aberrações contrárias a seus próprios princípios" (Cf. ROUDINESCO, 2008). Neste sentido, por exemplo, o rap Mano Brown, ao despejar um caminhão de palavras lixo em entrevista a revista FORUM, eivadas de clichês de algum "manual da oposição via rap", são lapidares: "Ajo como preto deveria agir. Digo "não" pras coisas que todo mundo acha que eu deveria dizer sim. Não precisamos disso" (ROVAI, 2011). Que bobagem! Como preto deveria agir? Não precisamos, quem? Não precisamos de que? Todos deveriam como o Mano Brow aderir ao rap made USA, ruminar o ressentimento racista do Norte no Sul e torná-lo fundamento de suas posições ideológicas? Sem cor, sem pobreza, o que é o racismo? Não vale para todos os racismos o que Jean-Paul Sartre disse em relação ao anti-semita: "escolhe o irremediável por medo da liberdade, a mediocridade por medo da solidão e, por orgulho, faz desta mediocridade irremediável uma aristocracia estratificada" (SARTRE, 1968). Existe uma maneira de preto agir oposta a de branco agir? Podemos dizer que branco é racista, e que preto não é racista? Preto é afro-descendente, não é também euro-descendente etc.? Pressupondo que a África toda seja preta (e não apenas negra), não há racismo na África? Basta ser preto para identificar-se africano, ou africano é quem nasce na África e vive nela e necessariamente não precisa ser preto ou negro? Um africano euro-descendente, branco, não é africano? Que homem ou mulher não tem sua origem mais longínqua na África? Em outras palavras, quem não é afro-descendente? Complexo de bastardia não pode definir uma identidade artificial e impelir a ação violenta de afirmação? Que homem, "branco" ou "preto", não é pobre? Ora, a manchete da entrevista-reportagem de Mano Brown estampa na página 6: "As palavras cortantes do Mano", e não "As palavras ignorantes de Mano". Por quê? São palavras de "luxo" ou do "lixo"? Ao ler a entrevista do Mano veio-me a lembrança, talvez imprecisamente, a metáfora do luxo do lixo desenvolvida por Joãozinho Trinta, da Escola Beija-Flor, como tema do enredo carnavalesco: "O lixo é um luxo" ou "o luxo é um lixo", sei lá! Talvez, de determinada perspectiva, a ordem dos fatores não altere o produto. São suplementares: "luxo" que gera lixo, "lixo" que gera luxo... A que dizer "não"? Ao luxo? Não diga isso para o filósofo francês Giles Lipovetsky. Ao lixo? Não diga isso para o carnavalesco Joãozinho Trinta. Mas, se se diz não a "vida", a "igualdade", a "liberdade", a "dignidade da pessoa humana", a "não violência", ou seja, "pras coisas que todo mundo acha que devo dizer sim", como disse o asno Mano Brown, em nome de que recusar o "direito" à eutanásia, a pena de morte, o racismo, ao livre comércio da droga ou dos órgãos etc.? No entanto o discurso do Mano Brown funciona. É um discurso de muita abertura (uma multiplicidade o atravessa ad infinitum e o faz minado de contradições) e sua eficácia é notável. Um discurso muito conveniente, para os arautos da opinião dominante que celebram a liberdade indeterminada e uma nova moral, uma moral hedonista. Como o asno Mano Brown eles também dizem, como muito bem anotou Phillipe Béneton, em seu ensaio "A nova roupagem do maligno", que:

- Seja autônomo, despreze os preconceitos, pense por si mesmo, satisfaça seus desejos, sua escolha vale como as outras, nós somos inocentes, viva a liberdade sem limites;

- Seja democrata, pratique a tolerância, os racistas, os sexistas, os "homófobos" são desprezíveis, é preciso ser de seu tempo, ame a humanidade, celebre a modernidade;

- Pense primeiro em si, rejeite as velhas morais puritanas do dom, da honra, do dever, cultive os prazeres do corpo, festeje à vontade.

Tudo isso, conclui Béneton: "é muito incoerente. Se todas as escolhas valem, a do racista e do canibal possuem o mesmo diapasão. Se sou absolutamente livre, sou também para não ser moderno ou democrata. Se sou sádico, devo ir até o final para saciar meus desejos? Se nenhum valor é imposto, em nome de que recusar a pureza ou o dever? Mas a retórica é poderosa, ela tende a mudar as máximas que governam os homens. Em nome de uma igual liberdade, ela tende a impor uma nova moral, centrada sobre o Eu e nas satisfações do homem físico. Vocês são os mestres, diz o discurso dominante, libertem-se e regressem à animalidade. O homem soberano está convidado a se tornar o último homem" (BÉNETON, 2002). O fato é que as pessoas como Mano não sabem o que estão dizendo, e não se importam em não saber. São ególatras ressentidos. Narcisistas com complexo de bastardia. Paranóicos angustiados e ocos... Apenas tagarelam, e o importante é tagarelar. E o Rap é pura e simplesmente tagarelice em nome da arte (já que tudo é arte, não há mais arte), e a sua simbologia social é o papagaio e tecnologicamente é o "celular" (sacando isso Mano diz recusá-lo), e sua "filosofia" (mesmo que não tenha ciência dela), parafraseando Deleuze-Guattari em "Mil platôs", são as "hecceidades"(quer dizer, individuações sem sujeito); seus "platôs" (quer dizer, as zonas de intensidade contínua onde se movimenta) são a miséria, a favela e o crime; seus "rizomas" (por oposição ao modelo da árvore) a África inexistente, logo, "o preto"; seus elementos são "singularidades" alienadas e sinistras, e suas "relações" devires, simulacros e buracos negros, quer dizer, a experimentação imediata que fazem de si mesmos é o caos político que Alexandre Youssef, articulista da revista TRIP (de 12 de maio de 2011), membro do Partido Verde, advoga, e, que, o jornalista José Arbex Jr. critica e, em artigo publicado em Caros Amigos, (nº 172/ 2011), chama de "fantástico liquidificador das ideologias" (que nada mais é, digo, do que os "agenciamentos" de Deleuze-Guattari). A saber, diz Youssef: "Imaginem um liquidificador em que se possa colocar as ramificações da esquerda, com estratégias e lógicas de mercado das agências de publicidade, misturando o rock, rap, artes visuais, teatro, um bando de sonhadores e outro de pragmáticos, o artista, o produtor, o empresário e o público. Tudo junto e misturado. O caldo dessa batida é uma nova tecnologia de participação e engajamento que funciona de forma exemplar para a circulação e produção musical, mas que, acima de tudo, é um projeto de formação política. O Fora do Eixo (abreviadamente, FDE, – É uma próspera empresa de gestão cultural que agrega 57 coletivos em todo pais, com capacidade de realizar 5 mil shows em 112 cidades), cria, portanto, uma geração que se utiliza sem a menor preocupação ideológica de aspectos positivos da organização dos movimentos de esquerda e de ações de marketing típicas dos liberais. É, como disse o teórico da contracultura Claúdio Prado, a construção da geração pós-rancor, que não fica presa à questões filosóficas e mergulha radicalmente na utilização da cultura digital para fazer o que tem que ser feito" (YOUSSEF apud ARBEX JR., 2011). Que dizer? Talvez que, ao contrário do Mano, Youssef e Cia não diz não para tudo... Reconhece que algumas coisas são importantes. Mas o problema talvez seja que diz sim a tudo... Mano ao avesso!


ONDE PODEMOS NOS SITUAR?

Estamos já no paraíso da estupidez humana? Tomara que não! Se sim Nietzsche tem razão: "(...): as verdades são ilusões, das quais se esqueceu que o são, metáforas que se tornaram gastas e sem força sensível, moedas que perderam sua efígie e agora só entram em consideração como metal, não mais como moedas" (NIETZSCHE, 1978). E o paraíso (tanto quanto o inferno) é a não reflexão, e tudo se reduz a questionamentos e ações vazias de pensamentos! Se não, se há algo no que se denomina humano que não pode ser negado por nenhum pensamento ou por nenhuma ação política totalitária (eis o grande ensinamento de Auschwitz), e é preciso fazer saber pensar e pensar efetivamente a verdade humana, e a dignidade da verdade humana etc. Pascal não dizia como muito bem lembrou Todorov, "que toda dignidade do homem consiste no pensamento"? (TODOROV, 1995). E Hannah Arendt, ao perguntar "o que o pensamento faz?", responde: ele descobre ou cria "significado" e o significado a dignidade do homem etc. E ao rastrear o conceito, ela começa com Platão, e vê como ele a atividade do pensamento no diálogo silencioso que cada um mantém consigo mesmo diante do mal, da morte, do medo, de seus atos cotidianos, da culpa diante de um erro etc. e que serve para abrir os olhos do espírito e fazê-lo desenvolver-se, e que pode tornar-se "dialético e crítico" justamente porque consiste nesse diálogo rápido e silencioso de perguntas e respostas consigo mesmo ou diálogos entre "amigos", cuja única regra é a "regra de coerência", a exigência de que o pensador não seja contraditório, inconseqüente, desonesto. Razão pela qual, para Heidegger, todo pensamento é "pensar pensando o pensamento de..." Neste sentido, de fato à direita que não tinha um discurso e se "limitava a defender-se do marxismo" etc., como observou Simone de Beauvoir, é verdade, mas assim pensava o pensamento de Darwin, Marx, Freud, Gramsci etc., e, agora, (graças ao seu labor sistemático e persistente de seus pensadores com o pensamento que lhe era alheio e opositor), com Foucault, com Deleuze et alii, finalmente possuem um discurso sofisticado, competente, sedutor, e tornou-se arrogante, não pensa mais, (para que? Foucault já anunciou que "o século XXI será deleuziano") e se dedica exclusiva e cegamente ao duplo marketing: das idéias de seus pensadores de última hora e o de suas mercadorias. Na onda deste discurso pluralista, multiculturalista, nômade e extremamente sedutor da direita no século XXI surfam, mesmo sem o saber, sem o querer, os Manos da vida e todos os Fora e a maior parte dos dentro do Eixo. Os interpretes, discípulos de todas as horas e todos os "filósofos do desejo", apenas oferecem mais uma volta no parafuso quebrando a nossa cabeça presa no torno capitalista ultraliberal. O fato é que Foucault, Deleuze, et alii., consolidam filosoficamente o capitalismo, contrariando paradoxalmente seus desejos críticos (digamos, en passant, diagnóstico correto, prognóstico errado, prescrição legível e tratamento inadequado), mas que, Foucault e Deleuze et alii, insinuando-se sub-repticiamente no discurso liberal, não como de quem parte do discurso, mas como quem são, "antes, ao acaso de seu desenrolar, uma estreita lacuna, o ponto de seu desaparecimento possível" (FOUCAULT, 2001), acabam dando o seu acabamento necessário, e, assim, fundamentam filosoficamente o ultraliberalismo, e, como dizem os franceses, colocam a cereja no bolo, ou seja, eles, com riso irônico nos lábios, vêm nos dizer "com uma voz sem nome" (Foucault) que os precediam há muito tempo, nas palavras de Lebrun, "que não há necessidade de regular alguma coisa, que a mão invisível vai regular as coisas, sozinha". No campo jurídico, três hurras a jurisprudência! Hurra! Hurra! Hurra! Velha conversa de personagens muito diferentes! Ou, nas palavras de Baudrillard: "(...), em algum lugar, tudo isso está desde já ultrapassado, e que Foucault só pode estabelecer um quadro tão admirável porque opera no acaso de uma época (talvez a "era clássica", da qual ele seria o último grande dinossauro) que está definitivamente em derrocada" (BAUDRILLARD, 1984). Um quadro em que o perverso morreu, logo, ninguém é perverso; e quem insistir em esclarecer a perversão, apontar o perverso, é chamado de defensor de uma vida fascista. Como conseqüência, esclarece Roudinesco: "Se ninguém é perverso, uma vez que a palavra morreu, qualquer pessoa é então suscetível de sê-lo, por menos que seja suspeita de ter sido intensamente obsedada, em diversas ocasiões, por fantasias sadomasoquistas, fetichistas, criminosas etc." (ROUDINESCO, 2008). E a formulação do problema da necessidade do pensamento, o pensar, se coloca imediatamente, com uma urgência inesperada contra todos que pressupõem o "fim da história", ou, ao contrário, de forma bizarra anunciam que tudo que não pertence ou se opõe a "cultura homossexual" é fascista, e, conseqüentemente, dela (da urgência) nos vêm à longa reflexão feita por Hannah Arendt sobre o mal no quadro político contemporâneo [de nosso "Breve" (HOBSBAWN, 1995), ou "Longo" (ARRIGHI, 1996) século XX], que se inicia (com data de edição brasileira) em "Origens do totalitarismo" (1990), passa por "Eichmann em Jerusalém; um relato sobre a banalidade do mal" (1983) para chegar, finalmente, em "A vida do espírito" (1991) e concluir em "Responsabilidade e julgamento" (2004) em que todas as questões morais que guiam o pensamento de Hannah Arendt recebem sua formulação mais cristalina. Não existe o perverso, logo, não existe o que pensar sobre ele? Em outras palavras, o problema do bem e do mal não se coloca mais? (...) Então, diz-nos Arendet: "Será possível que o problema do bem e do mal, o problema de nossa faculdade para distinguir o que é certo do que é errado, esteja conectado com nossa faculdade de pensar? Seria possível que a atividades do pensamento como tal – o hábito de examinar o que quer que aconteça ou chame a atenção independentemente de resultados e conteúdo específico – estivessem dentro das condições que levam os homens a se absterem de fazer o mal, ou mesmo que ela os "condicione" contra ele?" (ARENDT, 1971). O problema, portanto, consiste em saber o que é a Faculdade de Pensar. No nosso caso, como ela se conecta e se interliga com a possibilidade ou impossibilidade de pensar os "Fundamentos" da República (Art. 1º da CF/1988) diante da necessidade de distinguir o bem do mal, o que é certo do que é errado?


COMUNICAÇÃO E CONTROLE INTERSUBJETIVO DA DIGNIDADE?

Sejamos mais particulares, no escopo do presente ensaio trata-se de colocar a questão de saber o que pensamos diante do Art. 1º, III, da CF/1988, ou seja, "a dignidade da pessoa humana" como Fundamento? "O princípio do fundamento reza: nihil est sine ratione. Traduz-se: "Nada é na verdade sem fundamento"." (HEIDEGGER, 1956). Então, ela é intersubjetivamente comunicável e controlável? Que vínculos ela cria com o dever? Como julgar sem saber onde existe e onde não existe, insofismavelmente, questão de dignidade, ou mesmo, questão de direito? Por exemplo, na recente decisão do STF, de 5 de maio de 2011, em atendimento a ADI nº 4277/DF e a ADPF nº 132/RJ, consagrando a simulação do sexual e o império do Mesmo, reconheceu por unanimidade a união estável entre casais homossexuais (igualando-o ao do casal heterossexual), que dizem ufanistas uns tratar-se de um "marco do Direito brasileiro", outros, consolidação do "Brasil como verdadeiro Estado Democrático de Direito, solidificando a igualdade de direitos para todos", e, principalmente, muitos, dizem que com a decisão "o Supremo consagra o texto constitucional e celebra a vida, o direito, a liberdade, tendo como foco principal a dignidade humana", e os mais entusiasmados ou os mais desesperados (Kierkegaard) afirmam peremptoriamente que "a decisão do STF "revolucionou o Direito de Família no Brasil", e, que por isso a decisão é um libelo em defesa da "dignidade da pessoa humana". Uau!... Tais declarações são estranhas, consagram a fascinação pelo desconhecimento dos referenciais perdidos; mas de onde provêem? Sabem eles realmente o que estão dizendo? Ninguém demonstrou a menor perplexidade, a mínima dúvida, todos pareciam fazer revelações fundadas em certezas e experiências conclusivas de um roteiro histórico que é, no mínimo, duvidoso. O que é exatamente a dignidade? A resposta não é evidente, nem se evidencia imediatamente. Mas palavra já faz parte do ortodoxia ético-política e jurídica predominante. Mas o que significa? E o que importa se o STF tomou para si a responsabilidade legislativa de seu significado e prática... E ninguém parece observar que, nas palavras de Roudinesco, "na ausência de um pensamento pertinente oriundo da medicina, da etologia ou da biologia, é o direito que dá as perversões – se não à perversão – sua nova face institucional" (ROUDINESCO, 2008). Tal responsabilidade é sensata e democrática? É isenta de perigos e equívocos? A resposta é não. Por que transformações passa o homossexualismo para merecer agora, com a decisão do STF, uma face e uma função institucional? Com qual significação? Que controle sobre os homossexuais se pretende instituir e exercer ao excluí-lo do rol das perversões? Que significa tal exclusão? Toda perversidade é imanentemente má? O perverso é sempre do mal ou é do bem que nasce e sofre o perverso? Quem terá que arcar com as conseqüências inesperadas de tal decisão? Difícil saber! Principalmente se considerarmos, de uma maneira mais genérica e crítica, como Roudinesco, que é "pela identificação com o ideal de uma fetichização globalizada do corpo e do sexo dos humanos e dos não humanos, e através da primazia generalizada de uma supressão de todas as fronteiras o humano e o não-humano, o corpo e psique, a natureza e a cultura, a norma e a transgressão da norma etc. --, que a sociedade mercantil de hoje está em vias de se tornar uma sociedade perversa. Aliás, tanto pela difusão de imagens quanto pela instauração de uma pornografia virtual, regulamentada, limpa, higienista, sem perigo aparente. Essa sociedade, de certa forma, é mais perversa que os perversos que ela não sabe mais definir, mas, cuja vontade de gozo ela explora para em seguida reprimi-la" (Cf. ROUDINESCO, 2008). Então, para começar, é hora de perguntar com seriedade e intransigência: o que a decisão do STF tem a ver (visão direta e não oblíqua) com a "democracia" e "a dignidade pessoa humana" etc.? Evidentemente nada, e a questão não tem nada a ver com ser contra ou a favor. Não se trata de assumir uma posição maniqueísta, nem de julgamento, nem de crucificação, nem de repressão ao homossexualismo. Ao contrário, devemos a eles RESPEITO, assim mesmo, maiúsculo; mas não a custas de censuras e recusa de qualquer visão crítica e radical sobre eles. Não se trata, portanto, de ser reacionário ou não, mas, antes, de saber "separar o joio do trigo". O que queremos colher? Precisamos saber isso, para não arrancarmos o trigo... Não se trata, portanto, de neutralidade política. Como ficar neutro ou calado diante dos delírios homossexuais que já proclamam: "Para além de qualquer nostalgia em relação aos modelos gregos, helenístico e cristão, Foucault enxerga na homossexualidade moderna uma oportunidade estratégica de criação e de exploração de um campo relacional plural, horizontal, aberto às experimentações de prazer, desejo e convivência, relançando o "devir-homossexual" como inventividade, como experimentação, como criação de modos de vida plurais, com espaço para a singularização dos laços eróticos (micro)políticos e estéticos" (PAIVA, 2008). "Devir-homossexual como inventividade"? Uma "nova forma de existência, com base na sexualidade" (PAIVA, 2008). De onde nos vem a possibilidade de tamanho absurdo? Ora, observa Baudrillard, da "mesma forma que é absurdo dissociar em outras culturas o religioso, o econômico, o político, o jurídico, ou seja, o social e outras fantasmagorias categoriais pela simples razão de não terem cabimento naquelas culturas e que estes conceitos são como doenças venéreas com as quais as infectamos para melhor "compreendê-las, também é absurdo autonomizar o sexual como instância, como dado irredutível, ao qual todos os outros possam ser reduzidos" (BAUDRILLARD, 1984). "Devir-homossexual como inventividade"? Uma "nova forma de existência, com base na sexualidade gay? Sem dúvida! Ah!Ah!Ah! Mesmo porque, no estado de natureza nos parece evidentemente óbvio e natural que exista a homossexualidade em todo agrupamento de indivíduos sexualizados (de qualquer espécie, inclusive humana), onde um pequeno número de indivíduos machos fortes, adultos e ativos formam (digamos, na luta que culmina na "sobrevivência dos mais aptos") um "harém" de fêmeas, com as quais se acasalam, reservando assim para si com ferocidade despótica todas as fêmeas disponíveis, inclusive as próprias filhas e repelindo todos os machos mais fracos, inclusive seus filhos (Cf. DOBZANSKY, 1968). Para tal, no desenvolvimento da falsa-consciência homossexual temos que: "(...) A luta homossexual deve [...] aspirar à criação de um novo "direito relacional", que permita todo tipo de relações, em vez de impedi-las ou bloqueá-las" (ORTEGA, 1999, apud, PAIVA, 2008), e, assim, quem sabe,abrindo espaço maior também para a avissodomia, cinofilia, necrobestialismo, ofidicismo, simiofilia, voyeurismo animalesco, pseudozoofilia, sadismo bestial etc., enfim, qualquer forma de zoofilia ou homofilia em sua realidade mais cruel e imune a qualquer condenação penal. E no desenvolvimento da consciência-infeliz homossexual que: "A possibilidade de constituir formas novas de sociedade é também possível para a comunidade heterossexual, que tem de ser incluída na luta por um novo "direito-relacional" [...]". (ORTEGA, 1999, apud, PAIVA, 2008). Tem de ser incluída? Essa é boa! "Novo direito-relacional"? Em que consistiria? Responde Antonio Crístian Saraiva Paiva: "E é justamente no que a amizade permite ser tomada como instrumento de luta pela afirmação de novas virtualidades relacionais, novos estilos de amor, de trocar prazer, que sua tematização está indissociavelmente atrelada à questão da homossexualidade, da criação de uma "cultura gay", de um "modo de vida gay", que abriria um "especo outro no qual os indivíduos se produziriam como grupo social" (PAIVA, 2008). A amizade e o homossexualismo? Como esse binômio seria possível? Tudo é muito precipitado, bizarro, hiperbólico, paradoxal... "Pergunto-me", questiona Philippe Ariès, "se não haverá uma relação entre a extensão do domínio de uma homossexualidade normalizada e o enfraquecimento do papel desempenhado pela amizade na sociedade contemporânea"(ARIÈS,1983). E observa criticamente: "Progresso da homossexualidade e dos seus mitos, recuo da amizade, prolongamento da adolescência que se instala massivamente no núcleo da sociedade global: estas são características essenciais do nosso tempo que ligam não sei que correlação" (ARIÈS, 1983). Mas inegavelmente, concluímos, o homossexualismo "apresenta-se como produto de um mercado estritamente sexual, ligado ao orgasmo" (ARIÈS, 1983). No mais só a psicanálise poderia dar-nos uma indicação pois que coloca a questão da e em questão a "vida interior"... E talvez seja pertinente e prudente vacinar-se contra qualquer argumentação sofistica e observar imediatamente, como o faz com muita competência Elisabeth Roudinesco, que: "Nenhuma ciência, com efeito, salvo se for perversa, poderá provar a existência de qualquer perversão no reino animal. Os animais não conhecem nem a Lei nem a transgressão da Lei, não são fetichistas, nem zoófilos, nem pedófilos, nem coprófilos, nem necrófilos, nem criminosos, nem sádicos, nem masoquistas, nem voyeuristas, nem exibicionistas, nem capazes de sublimação. Não são transexuais, nem travestis, nem sequer homossexuais, bissexuais ou heterossexuais. A atividade sexual animal não responde a nenhuma dessas classificações" (ROUDINESCO, 2008). E assim, talvez, entender que entre os humanos a coisa é bem diferente; e, ao contrário, todas as perversões são possíveis e, mesmo, "desejadas", algumas são socialmente más, outras não, outras nem tanto, ou seja, a existência de uma dependência biológica indispensável do instinto sexual em relação à formação social e civilizadora, e, ao mesmo tempo, a multiplicidade e a extensão das possibilidades e das impossibilidades sociais e culturais de controle e de satisfação dos instintos (que a homossexualidade, por exemplo, é apenas uma das enésimas variáveis derivadas e não a hegemônica), revela-nos que o prazer voluntário de subjugar (a sempre presente dialética do senhor e do escravo em uma de suas mil e uma variações e desdobramentos psíquicos), e a "incessante e alucinada busca do gozo lúbrico" (que antropologicamente, digamos, teve factualmente partida no "estupro dos mais fracos" ou na "masturbação" etc. e que se inscreve psicoplástica e psicogeneticamente na psique) cumprirão seu papel para todo o sempre consagrando a "servidão sexual voluntária". Afinal, era preciso criar algum meio de satisfação substitutiva (mesmo que de base alucinatória) da necessidade sexual não sublimada, de realização do instinto (que impõe o desejo) etc. De busca do prazer, de gozo, de orgasmo sob o signo sócio-cultural do Mesmo e do Outro, da igualdade e da diferença, de liberdade e da felicidade et alli, sendo o Outro, a diferença, a felicidade simulacro do "sujeito/objeto" escondida na figura da amizade gay. E assim que, entre a espécie humana, alguns machos (e fêmeas), muitos (e muitas), cuja essência sócio-cultural fundamental consiste no desenvolvimento ontológico dialético do não-Ser, trabalham em profundidade (sem recair em pura negatividade) a própria denegação da e na diferença sexual, muitos, (e muitas), cuja fraqueza os dota de uma a "espinha mais flexível", aptos a pôr-se de quatro, dobrados pela força bruta e brutal de um desejo sexual imperativo do Outro identificado intersubjetivamente como o Mesmo – o desejo do Outro como diferente não existe, mas a sedução ainda persiste na igualdade como alteridade do cuidado de si numa interioridade concentrada no Mesmo –, são obrigados (por pura contingência) a dobrar-se, dobram-se e passam a sonhar e sonham fazer filhos pelas costas (movimento que Baudrillard vê em ação a "lógica da simultaneidade dos efeitos inversos"), fazem do ânus trombeta e cantam as vitórias de tal prazer e se tornam "homossexuais" sob o signo, é óbvio, do "direito natural" (Spinoza), articulados dialeticamente por uma consciência sexual infeliz e acalentados por consolações de uma falsa-consciência sexual emancipadora. Em última instância, não é o que dizem com "corpo de homem, alma de mulher", ou "ninguém nasce mulher, torna-se mulher" (Simone de Beauvoir) etc.? Inegavelmente, diz-nos Baudrillard: "Quando o mesmo se acasala com o mesmo tudo se torna obsceno" (BAUDRILLARD, 1996). Estamos querendo é saber: estamos criando uma República obscena? Isso significa que seria coerente criminalizar a homossexualidade, punir os homossexuais, dizer que o homossexualismo é contra a natureza, tratá-los como "doentes mentais" etc.? Evidentemente que não se trata de nada disso. E isso é o que se verifica historicamente desde a antiguidade clássica e, mesmo, na mais primitiva. Mesmo porque, diz-nos Baudrillard: "A liberação sexual, como a das forças produtivas, é potencialmente sem limites. Exige uma profusão realizada, sex affluent society. Não poderia tolerar a raridade dos bens sexuais, tampouco a dos bens materiais" (BAUDRILLARD, 1991). Isso em todas as sociedades, em todos os modos de produção registrados pela história, e, no caso particular da sexualidade, até a invenção da transgressão, da hierarquia, da disciplina, do controle etc., isto é, o homossexualismo etc. perdura na idéia do "direito natural" ou enquanto ele for a idéia do direito (ou nela mesma decline com a ascensão do cristianismo), como exemplifica Paul Veyne nos casos da Grécia e de Roma na antiguidade. Diz ele, "Catulo gaba-se das suas proezas" com rapazes e mulheres, e, em suas poesias "ameaça os seus inimigos de que os violará para mostrar o seu triunfo sobre eles" (VEYNE, 1983). "Cícero cantou os beijos que colhia dos lábios do seu escravo-secretário. Conforme os seus gostos, cada um optava pelas mulheres, os rapazes ou um e outros; Virgílio tinha o gosto exclusivo pelos rapazes; o imperador Cláudio, pelas mulheres; Horácio repete que adora os dois sexos" (VEYNE, 1983). O mais antigo monumento das letras latinas, o teatro de Plauto, "está cheio de alusões homófilas" e que "o modo habitual de contrariar um escravo é lembrar-lhe o serviço que o seu senhor espera dele e para o qual o escravo se tem de pôr de quatro" (VEYNE, 1983). "Desejo aos meus inimigos que amem as mulheres e aos meus amigos, os rapazes", escrevia o poeta Propércio num dia de amargura, pois a pederastia "e um rio calmo e sem naufrágio: que mal recear num espaço tão estreito" (VEYNE, 1983). "Para Platão, não era o homossexual que era contra-natureza, mas apenas o gesto que ele realiza. A distinção é de peso: um pederasta não era um monstro, membro de alguma raça de pulsões incompreensíveis – era muito simplesmente um libertino" (VEYNE, 1983). Concluindo, diz Veyne: "a pretensa repressão legal da homossexualidade visava na realidade impedir que um cidadão fosse sodomizado como um escravo" (VEYNE, 1983). E de fato o sexo não tem nada a ver com isso, "o que importa é não ser escravo, e não ser passivo. O legislador não pensa sequer em impedir a homofilia. Quer apenas proteger o jovem cidadão contra as investidas ativas" (VEYNE, 1983). Concluindo com Veyne, temos que no mundo Grego, tanto quanto no Romano, "não se classificava as condutas segundo o sexo, amor pelas mulheres ou pelos rapazes, mas em atividade ou passividade: ser ativo é ser macho, qualquer que seja o sexo do comparsa passivo. Ter prazer virilmente ou dá-lo servilmente, tudo está aí" (VEYNE, 1983). Em outras palavras, a proibição do incesto, o complexo de Édipo, tanto quanto a "pretensa repressão legal da homossexualidade" são apenas casos, (fundamentais por sinal) dentre todos os casos de desenvolvimento de nossos "abrigos abstratos" (ou "prisões imaginárias" como se queira, mas que nos colocou imediatamente ao abrigo possível da opressão sexual), que se constituíram em algo como que uma segunda natureza que se revelou, no decurso da história, facilmente corruptível, mutável, porque múltipla e imersa na multiplicidade de desacordos que a atravessa e o reivindica casuisticamente de acordo com uma complexa correlação de forças egoístas dominantes e seu leque de abrangência, intensidade, irradiação e necessidade.


DE QUE SE TRATA AFINAL?

A verdade a que de forma alguma podemos nos furtar, é que, nas sábias palavras de Spinoza, em seu "Tratado Político", "todo indivíduo, no estado de natureza, se pertence a si mesmo tanto quanto se ponha ao abrigo da opressão dos outros" (SPINOZA, s.d.). Então, o homossexualismo (entre outros fenômenos sociais) propiciou ou propicia "pertencer-se a si mesmo"? Propiciou ou propicia pôr-se "ao abrigo da opressão dos outros"? Ou apenas propiciou ou propicia a opressão de si por si mesmo a qual se soma a opressão especular dos outros? Em outras palavras, propiciou ou propicia "a dignidade da pessoa humana"? Estranho que se diga sim!... Apenas isso. Estranho! Pergunto: concordamos ou não com Marx, ou seja: "não é a consciência que determina o ser-social; é o ser-social que determina a consciência"? (MARX, 1841) Estranho ainda que se diga não, se considerarmos como Paul Veyne que "os homens não são animais e o amor físico não é neles dominado pela distinção dos sexos: como dizia Elisabeth Mathiol-Ravel, as condutas sexuais não são sexuadas" (VEYNE, 1983). Pergunto: então, como o escravo na Grécia ou em Roma etc., só os resta dizer: "Não há que se envergonhar de fazer o que o senhor manda"? (VEYNE, 1983). Então, por que estranho que se diga "Sim"? Não se trata, aqui, é bom frisar, de acolher a exclusão dos homossexuais do seio da família, mas, ao contrário, acolher os desejos dos homossexuais de constituir uma "família", mas não sem antes refletir com o rigor necessário sobre o que é ser família para não condenarmos uma criança a viver no simulacro e a reduzir-se a ser uma incapacidade de desejar, e institucionalizar a incapacidade de se auto-representar e a perversão melancólica. Em outras palavras, como uma criança adotada por casal homossexuais poderá agenciar um espaço psíquico próprio se ficar presa numa seqüência lingüística que não para de proclamar a propósito de seu "pai": "Esse homem tem corpo de homem, e alma de mulher" ou "Não se nasce mulher, torna-se mulher"...? E essa é a fonte de todo meu estranhamento. Estranho simplesmente porque ser ou não ser homossexual nada tem a ver com "a indignidade" ou "a dignidade da pessoa humana". Mas pode ser uma persistente questão biopolítica que é, atualmente, a política do neofascista em sua gestação ultraliberal! É isso que exige reflexão rigorosa sobre a validade, a eficácia, a legalidade e a consistência da decisão legal do STF em discriminar as práticas ditas legais das ilícitas em matéria de família, de sexualidade etc. E estranho ainda porque a observação de Paul Veyne e a de Mathiol-Ravel são inexatas, falsas, errôneas. Em primeiro lugar, os homens são animais. Não há porque negar isso, por mais que os criacionistas fiquem mais transtornados do que já são. Um animal sui generis, tudo bem, mas animais, e situam-se no Reino Animal e isso é o fundamento de suas condutas. Em segundo lugar, as condutas sexuais são naturalmente sexuadas por isso propiciam o deslocamento, a transferência, a sublimação e as vicissitudes da libido etc. e tudo o mais que torna possível o animal humano, ou seja, um ser dominado pela "vida do espírito"... Ora, se a reprodução humana, como um dos princípios da sobrevivência da espécie, é sexuada, as condutas sexuais são sexuadas (mesmo quando não tenham por fim imediato a reprodução, não significa que não sejam objetiva e psicologicamente reprodutivas), caso contrário, não haveria no ser humano a energia libidinal que propicia a catexe, isto é, a sobrecarga e o deslocamento necessário para o amor objetal (como diria Bloch, "ao olhar uma simples pedra brilhante, desperta muito do que desejará para si amanhã"), propiciando a formação da imaginação (o céu no ânus) quanto do desejo (a ânus no céu)e suas múltiplas realizações substitutivas de gozo (com todas as suas formas de frustrações possíveis) etc.. Dizer que o homossexualismo, e outras condutas sexuais que não visam à reprodução sejam assexuados é não saber nada da natureza dialética dual da sexualidade, dos instintos, do espírito humano, nem da sociabilidade, e é denunciar o homossexualismo como cemitério das causas naturais do desejo sexual, principalmente, se pensarmos numa "Metafísica do amor" como a que Arthur Schopenhauer nos lega para reflexão. Com efeito, se fossem assexuadas o ânus etc. não se revelaria um "céu" e vice-versa, nem o "sexo" produziria e reproduziria alucinações psicogenéticas (como o complexo de Édipo etc.). Neste sentido, o anti-Édipo, por exemplo, não passa de uma interessante bobagem... E mais, como as condutas sexuais objetivas e concretas (por serem essencialmente egoístas) são a gênese primitiva das relações sociais e as condiciona por contradizê-las dialeticamente com a carência, o desejo, o egoísmo etc., suscitando normas anticonflitivas, disciplinares e de segurança para a gênese do ser-social, (principalmente na "família"), em duas palavras, normas jurídicas, e, é óbvio que o amor físico estabelece-se socialmente como sendo "o elemento emocional nas relações sociais", como disse Christopher Claudwell... Como veremos no correr e no lambe-lambe das linhas, o que Christopher não percebeu foi, justamente, a impotência do Amor (ou da Amizade) perante as estruturas sócios-econômicas, político-culturais e Jurídico-ideológicas do Modo de Produção Capitalista. E mais, que o Amor é impotente, ainda que seja correspondido, porque dele se ignora que é apenas o desejo de cada um ser único na vida do outro, mas que aponta apenas para o próprio Ser e o senti passional dentro de si. O que, na corrupção do Ser, que se dá mais facilmente numa sociedade narcisista (também de consumo e espetáculo) em que prevalece a carência, a falta, a lacuna etc., leva ao homossexualismo quando não a simples perversividade. E é, justamente, na impossibilidade das estruturas estabelecerem o Amor (ou a Amizade) como fundamento do elemento emocional das relações sociais que se revela como sendo, paradoxalmente, o "amor" (estabelecendo-se, assim, as bases da falta, da carência e a intensidade do desejo). E isso Claudwell parece não ter considerado, e tampouco "Foucault". Então, a decisão do STF, de que se trata afinal? Difícil dizer! Mas sabemos que: "A cada fase do processo de acumulação do capital corresponde um cidadão sob medida que viverá, no conjunto de suas práticas sociais, o caráter legítimo dessa acumulação. A cada fase correspondem mecanismos de condicionamentos que garantirão o que os estrategistas da guerra do Vietnã denominam sem inúteis preocupações oratórias "a conquista dos corações e das mentes"" (MATTELART, 1976). Então, temos a questão: a homossexualidade está sendo erigida em modelo de cidadão sob medida? É o que advogam: "Frente a erosão das "metanarrativas" do amor, da família e da conjugalidade (...), que tipos de vínculos podem ser criados, multiplicados, intensificados, ressingularizados, na administração de uma intimidade gerida à margem da institucionalidade, como é o caso das amizades de amor homossexuais"(PAIVA, 2008). A decisão do STF, portanto, tem que ser muito bem pesada! É óbvio que a decisão pode ser classificada entre os objetivos jurídicos de melhoria da condição social dos homossexuais, e, pode ser explicada através do caráter modelo que os homossexuais tendem a ganhar num momento de liberalização ultraliberal dos costumes sexuais, atendendo, justamente, a diferenciação entre interesse sexual e procriação, inicialmente impulsionada pela prostituição e pela cultura homossexual foi, politicamente, promovida pelo "movimento feminino"; ideologicamente, pelo LGBT; socialmente, pelo controle da natalidade; economicamente, pela indústria farmacêutica; culturalmente, pela pornografia, juridicamente, pelos direitos humanos etc. Todos diferente e gravemente alheios tanto a realidade histórica dos homossexuais e os interesses do neoliberalismo, de um lado, quanto aos objetivos de uma perversa política estatal global de controle fundamentado na "adoção", de um lado, e na "família fragmentada (ou virtual)", do outro lado.


DECISÃO ANTIDEMOCRÁTICA

Mas a decisão do STF respeitou o princípio democrático e republicano da separação dos poderes? Evidentemente não! Como "observou o eminente constitucionalista Ives Gandra Martins, "a Suprema Corte incinerou o §2º do Art. 103, ao colocar sob sua égide um tipo de união não previsto na Constituição, como se Poder Legislativo fosse, deixando de ser "guardião" do texto supremo para se transformar em "Constituinte derivado"" (MARTINS, 2011). Ora, qual a previsão do Art. 103, § 2º da CF/1988? Diz o renomado jurista Ives Gandra da Silva Martins: "O Art. 103 §2º, determina que por ação de inconstitucionalidade por omissão, uma vez decretada OMISSÃO DO CONGRESSO, o STF deve comunicar ao Parlamento o descumprimento de sua função constitucional, sem, entretanto, fixar prazo para produzir norma e sem sansão, se não a produzisse". E concluindo: "Negou-se, assim, ao PODER JUDICIÁRIO a competência para legislar" (MARTINS, 2011). Em outras palavras, o STF deveria ter o cuidado de não ser ridículo para não recair em tirania (Spinoza). Então, como é possível a afirmativa de que a decisão do STF, de 5 de maio, seja a "consolidação do Brasil como verdadeiro Estado Democrático de Direito"? Alguma coisa está muito errado! A decisão do STF fere o princípio republicano da separação dos poderes. E se o Congresso Nacional, diz o professor Ives Gandra Martins, "tivesse coragem poderia anular tal decisão, baseado no artigo 49, inciso XI da CF/1988, que lhe permite sustar qualquer invasão de seus poderes por outro poder, inclusive, com a garantia das Forças Armadas (Art. 142, caput) para garantir-se nas funções usurpadas, se solicitar auxílio" (MARTINS, 2011). Mas, por que o Congresso nacional não derruba a decisão do STF? E para que serve um Congresso absolutamente desprovido de moral política para defender sua autonomia, funções, independência e integridade legislativa? Se considerarmos os noticiários da imprensa, não há porque estranhar o ativismo judicial do STF. O Congresso Nacional e o Poder Executivo tem-se revelado como

- um covil de desonestidade

- um antro de corrupção

- um centro de humilhação do povo

- um grupo de conspiradores contra o país que

- organizaram a ilegalidade e não cumprem o seu papel

- organizaram o caos legislativo

- organizaram a anarquia administrativa

- instalaram o suborno e a corrupção generalizada e

- o não cumprimento de seu papel institucional pela omissão legislativa.

E só nos resta à imprensa livre e independente como força inibitória (quando não fazem parte do problema) de uma rede de comprometimento e cumplicidade criminosa entre o Três Poderes da República Federativa do Brasil. Mesmo porque, pelo que sabemos quem pensa em democracia, em Estado Democrático de Direito hoje, tem que pensar em três princípios fundamentais que, na prática, está plenamente garantido na CF/1988, ao estabelecer um regime "representativo" para o Brasil, e que devem sua formulação original a filósofos que pertencem à era do "individualismo liberal" – isto é, a Locke (quanto ao primeiro princípio), a Locke e Montesquieu (quanto ao segundo) e a Jean-Jacques Rousseau (quanto ao terceiro). A saber: primeiro, o princípio de tolerância (que pode tomar a forma de princípio de laicidade, como meio de combater a opressão religiosa); segundo, o princípio de separação dos poderes, que se destina a proteger o cidadão contra todo abuso; e, finalmente, terceiro, o princípio de justiça, que equivale a visar um objetivo concreto: a justiça social (Cf. DELACAMPAGNE, 2001). Então, que resíduo de autoritarismo ainda persiste na sociedade brasileira, e que ignorado e incólume cresce na vida nacional, acumulando-se em decisões jurídicas de bases políticas concessivas ultraliberais e de controle que possibilitam afirmar sem pudor o simulacro que a decisão do STF seja "a consolidação do Brasil como verdadeiro Estado Democrático de Direito", "a defesa da dignidade da pessoa humana" etc.? Ora, não podemos nos permitir o luxo de esquecer que o plano autoritário dos militares, concluído pelo General Ernesto Geisel, "consistia em instituir um auto-regime para o judiciário" (Cf. CABEDA, 1998) de tal forma que pudesse transferir-lhe as atividades autoritárias favorecendo ao ativismo judicial que dispensaria a aplicação de novas medidas revolucionárias, que passam a ser tarefa formal do Judiciário, e, eis em vigor a LOMAN, Lei Complementar nº 37/79, Lei Orgânica da Magistratura Nacional. A coisa agora começa a extrapolar os limites constitucionais de uma Constituição que lhe é imprópria (mas que não a inibe) aproveitando-se da fraqueza de um Congresso Nacional que não tem competência moral para cumprir o seu papel institucional. E ao perceber que pode sair da timidez das sombras, emergir, vir à tona, mostrar-se sem pudor a face pró-1964, surfar na onda ultraliberal, então, começa a utilizar as afiadas garras herdadas onde seja possível. Simplesmente isso! Assim, como balão de ensaio, lembra-nos o juiz federal Oscar Valente Cardoso, o STF reconheceu vários direitos constitucional não devidamente regulamentados por lei, tais como a aposentadoria especial para os servidores públicos (garantidos pelo §4º, II do Art. 40), o aviso prévio proporcional (Art. 7º, XXI) e o direito de greve de servidores públicos (Art. 37, VII) etc. A ADI 4277 e a ADPF 132 (CARDOSO, 2011), conseqüentemente, permitem-se dar sempre mais um passo à frente em direção a ditadura judicial. Não há mais limen, o STF atravessou o Rubicão. No mais, se considerarmos que, como observou com muita propriedade Marcio Sotelo Felippe: "Quem pensa o Direito hoje tem que pensar em indivíduos livres e iguais. E quem pensa em liberdade e igualdade pensa na dignidade dos homens" (FELIPPE, 1996), inevitavelmente nos vem a indagação: a decisão do STF tornou o Fundamento da "dignidade da pessoa humana" um princípio intersubjetivamente comunicável? É preciso não confundir tolerância com permissividade, promiscuidade com liberdade etc. Então, evidentemente que não, ao contrário, o corrompeu, anulou e o dissolveu (mais uma vez) no Lago Paranoá. Ocultação de cadáver sob uma sentença de reconhecimento em nome de um "direito natural" (Spinoza). Ou ainda, como foi possível e/ou o que tornou possível desvelar o Fundamento republicano da "dignidade da pessoa humana" no "princípio da igualdade"? O princípio da igualdade reza: "Todos são iguais perante a lei,..." (Art. 5º da CF/1988), e não todos são iguais em dignidade. O que significaria dizer que todos são iguais em dignidade? Que em um escrupuloso ministro do STF e, por exemplo, no absolutamente inescrupuloso traficante e assassino Fernandinho Beira Mar, encontramos a mesma dignidade? Sim ou não? No "Estado natural" sem duvida. Tal foi a consideração da decisão do STF de 5 de maio? Não? Sim? Se "Sim", dá para entender, por exemplo, por que os Tribunais de Justiça "ignoram" (para felicidade geral dos criminosos que permanecem impunes) que

- extorsão é crime

- sabotagem é crime

- corrupção é crime

- concussão é crime

- peculato é crime

- omissão é crime

- roubo é crime

- informação erradas que leva a soluções erradas, é crime

- ilegalidade é crime

- nepotismo é crime

- prevaricação é crime...

Então, por que "ninguém" é punido? Aposentadoria é punição? Ora, "do nada, nada vem", então, o que autorizou ou autoriza a corregedora do CNJ, Eliana Calmon, reconhecer que a existência de "bandidos de toga" senão a vasta aplicação de sentenças de impunidade e conveniência? E o estado lastimável da justiça e o grau de violência, corrupção e criminalidade que impera no Brasil é a prova, não? Se "Não", então, precisa e efetivamente o que a coisa (em sua diferença) significa e como se qualifica? O que é a dignidade? Não há corporativismo entre os magistrados, garante o presidente da AMB, Henrique Calandra... E, no entanto, como disse Eliane Cantanhêde, colunista da follha.com, no dia 02 de outubro de 2011, em matéria intitulada "Barraco no Supremo": "a AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros), que, por corporativismo, entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade tentando limitar os poderes e a abrangência do Conselho Nacional de Justiça, órgão que fiscaliza o Judiciário e, portanto, os juízes". Enquanto isso, diz a jornalista Mírian Leitão, em seu artigo "Tudo dominado", publicado na coluna "Panorama econômico", do Jornal "A tribuna", de 02 de outubro de 2011, página 34: "A impunidade se instala como um vírus que vai corroendo a confiança nas instituições democráticas". Das 33 punições impostas pelo CNJ, 15 foram suspensas por liminares concedidas por ministros do Supremo, logo, não há bandidos de toga? Quantos, efetivamente, foram punidos? Como lamenta a jornalista Mirían Leitão em seu artigo: "Eles se infiltraram em todos os poderes, ministro Cesar Peluso, infelizmente". Onde fica a dignidade neste contexto? Em outras palavras, para deslindar "a ordem do discurso" é preciso pensar pensando o pensamento, o poder e a ordem que o configura... Mas, como? O fato é que já não "sabemos" mais dizer "não", logo, dizer "sim", não tem mais sentido, ou vive-versa. O fato é que, de acordo com a teoria dos sistemas, "a sociedade moderna resultaria da hipercomplexificação social vinculada à diferenciação funcional das esferas do agir e do vivenciar" (NEVES, 1996). Sobram, portanto, más configurações do "sim" e/ou do "não". Sobram, e elas continuam a proliferar... Difícil saber por onde começar! Então, como pensar? Todas as razões para o "sim" ou para o "não", digamos, usando expressões caras a Lacan, passaram a existir sem um "significante" real, mas não falso, e sim virtual, ubíquo, ubuesco; a possuir um "significado" vazio, nulo ou sem sentido, mas, estético e existencial, e uma "significação" indesejável, preterida ou indiferente, mas, sedutora. Então, por que pensar? Porque agora pensar se torna mais imprescindível do que nunca. Por que atualmente o negócio, a vida vivida, a experimentação é surfar insensatamente na onda do que está por vir simplesmente flutuando como uma folha seca solta ao sabor vento; mas pensar é observar os pequenos sinais que nos parecem dizer, constrangidos e temerosos, que alguma coisa se passa, alguma coisa muito grave, alguma coisa muito séria, alguma coisa muito errada, alguma coisa muito ruim, alguma coisa muito estranha, portanto, que começa a ficar não humana – (Marx dizia: "Nada do que é humano me é estranho"). E podemos, com sensatez, nos perguntar: então, fundamentalmente, do que se trata?... Trata-se, diz-nos Antonio Crístian Saraiva Paiva, de que "Foucault encontra a propósito a propósito da questão homossexual a possibilidade de reinvenção de uma moderna estilística da existência, falando assim de um "estilo de vida gay": trata-se de "criar uma nova vida cultural", uma nova forma de existência, com base na sexualidade". As relações que podem ser criadas (relações sexuais, relações sciais), e as formas de existência que a partir delas podem ser alcançadas através de um certo trabalho sobre si mesmo, de uma certa ascese, assumem a forma de amizade" (PAIVA, 2008). Mas em que consistiria esta "moderna estilística da existência"? Simplesmente que, diz-nos Peter Sloterdijk: "O individualismo não cessa de fazer alianças com tudo que tem a ver com o mundo moderno: com o progresso e com a reação a ele, com programas políticos de direita e de esquerda, com motivos nacionais e transnacionais, com projetos feministas, masculinistas e infantilistas, com modos de pensar e de sentir tecnófilos e tecnófobos, com morais ascetas e hedonistas, com conceitos de arte conservadores e vanguardistas, com terapias analíticas e catárticas, com estilos de vida esportivos e não esportivos, com a disposição para realizar coisas e com a disposição de nada realizar, com a fé no sucesso e com a descrença nela, com formas de vida cristãs e não-cristãs, com aberturas ecumênicas e com isolamentos locais, com éticas humanísticas e pós-humanistas, com o Eu que tem que estar em condições de acompanhar todas as minhas representações (eu diria, mais ao gosto de Foucault, "experimentações") e com o "si mesmo" diluído, o qual continua existindo apenas como uma sala de espelho de suas máscaras. O individualismo tem como condições de fazer alianças em todas as direções e Nietzsche é o seu profeta e seu designer" (SLOTERDIJK, 2004). Na verdade, fora do delírio gay, o que acontece?


MUTAÇÃO DO VÍNCULO SOCIAL?

Jean-Pierre Lebrun observa e existência e a promoção de uma "mutação do vínculo social" (que se formou a partir dos séculos XVIII-XIX) através, por exemplo, de uma substituição da paternidade e/ou da maternidade pela parentalidade "e para a qual somos literalmente arrastados" na maré montante ou jusante de uma afetividade de gênese intersubjetiva perversa. "E como podem perceber no termo parentalidade não se sabe muito bem quem é o pai e quem é a mãe" (LEBRUN, 2008), e prepara-se psíquica e sociologicamente o campo para a diluição do conceito de família e escancarar as portas para adoção como política de controle ao descontrole sexual e a irresponsabilidade das adolescentes (e mulheres em geral) que dão mais que chuchu na serra e movimentam o lucrativo mercado do sexo, do álcool e do parto. Fala-se, então, em afetividade como elemento fundante da condição humana moderna (essencialmente de incerteza e desorientação) das novas "entidades familiares" (Art.226, CF/1988) como se a afetividade fosse dela (a perversividade) desprovida. E nelas (entidades familiares) não existe mais a "mãe" ou o "pai", mas a maternidade e a paternidade, ou seja, na composição de uma família não existem mais causas, e sim apenas efeitos sem causas. A orgia é a regra, logo, "mãe" (ou "pai") e "afeto" se divorciam e tudo se reduz ao sexo. "Mãe" ou "Pai" não mais significam necessariamente "vínculos afetivos" nem "família" e para demonstrar tal realidade sacam a violência doméstica, e, mais uma vez, de efeitos sem causas. Neste sentido, diz-nos os defensores do Direito das Famílias que: "Ainda que tenha havido sensível mudança na concepção de família, ao inserir o afeto como traço identificador dos vínculos familiares, é impositivo invocar também o comprometimento ético que os vínculos afetivos geram" (DIAS, 2006). Isso é no mínimo paradoxal. Partindo de algumas observações de Christopher Lasch, no "Prefácio" de seu livro "Refúgio num mundo sem coração", podemos entender melhor as transformações da afetividade, ou melhor, por que se fala tanto em afetividade em Direito das Famílias, justamente quando elas, tanto a afetividade quanto a família, se pervertem se afastam e são negadas nos reflexos dominantes das relações econômicas estabelecidos no interior da família. Em primeiro lugar, se queremos defender os laços afetivos familiares e os comprometimentos éticos "que os vínculos afetivos geram", deveríamos não promover um modo de vida gay, mas sim combater no mínimo a atual organização do trabalho. Neste sentido, diz Lasch: "A crítica mais importante à atual organização do trabalho é que obriga as mulheres a escolher entre seu desejo de autosuficiência econômica e as necessidades de seus filhos" (LASCH, 1991). É óbvio que tal escolha não é fácil, mas a mulher tem que a levar a termo (em sua busca de progresso individual e satisfação das necessidades), e, para tal, necessariamente, se dobra a um processo de dessensibilização intersubjetiva que, é certo, não se realiza sem dor e sem sofrimento, sem remorso e sem culpa, mas que termina em inafetividade porque não se olha para o ordenamento social, mas, sim, para o ordenamento familiar pelo viés do ordenamento jurídico, e a família (e não a organização do trabalho) se converte em vilã da liberdade e da emancipação feminina, algo que deve ser combatida. Assim, conclui Lasch: "Em lugar de culpar a família por esta situação, deveríamos culpar as inflexíveis exigências do mercado de trabalho em si. Em lugar de perguntar como as mulheres podem ser liberadas da família, deveríamos perguntar como seria possível reorganizar – humanizar – o trabalho para que seja possível às mulheres competir economicamente com os homens sem sacrificar suas famílias ou, inclusive, a esperança mesma de uma família" (LASCH, 1991). Com efeito, quanto ao "comprometimento ético que os laços afetivos geram", se considerarmos, diz-nos Yves de La Taille, "a idéia de Bouer (ver Piaget, 1932) segundo a qual se a criança (por volta dos 4, 5 anos) respeita e, logo, obedece às regras morais, é porque respeita o que, para ela, representa a fonte dessas regras. Dito de outra maneira, não é tanto porque a criança aprecia intelectualmente as regras morais a que é submetida que a elas obedece, mas sim porque desenvolveu um sentimento de respeito pelas pessoas que apresentam tais regras e acentuam seu caráter de obrigatoriedade" (LA TAILLE, 2006). E isso exige fundamentalmente a presença da família, a autoridade dos pais. Mas, que aconteceria com a formação moral da criança se os pais não souberem mais a que dizer "Sim" e a que dizer "Não"? Ou seja, se os pais perderem a autoridade familiar? Como se constituirá a autoridade não histórica dos pais homossexuais de filhos adotivos? Com efeito, que são os pais? Quem são os pais? O STF precisava saber, antes de qualquer decisão, se os filhos adotados por casais homossexuais seriam educados com autoridade histórica. Seriam desprovidos de preconceitos sexuais? Ontologicamente como se formariam? Neste sentido, diria Hannah Arendt: "O desaparecimento do preconceito significa simplesmente que perdemos as respostas em que nos apoiávamos de ordinário sem querer perceber que originariamente elas constituíam respostas as questões" (ARENDT, 1977). Em outras palavras, uma estrutura familiar com autoridade indeterminada ou difusa não gerenciaria os valores morais num caos de ambigüidades, fraquezas, incertezas e amoralidade? Isso não estimularia um aumento crescente de casos de violência contra a família [internamente, agressão psicológica e/ou física, relações incestuosas etc., externamente, agressão social (bulling etc.), estupro, pedofilia etc.]? Consideremos a hipótese de que "vínculos afetivos" geram "comprometimento ético", resta-nos saber que "vínculo afetivo" capaz de gerar "comprometimento ético" pode existir em um Ser desenvolvendo-se numa estrutura familiar vacilante, indeterminada, flutuante, amoral e fora do social na pura disponibilidade (aberta a todas as combinações, a todas as seduções) de um EU em formação permanente que é o indivíduo e a subjetividade da "era do vazio" que se apresenta agora como um modo de vida gay? Então, por exemplo, é fácil perceber que as instâncias do "tribunal de menores", diz Donzelot, "implica a incrustação da criança e de sua família num contexto de notáveis, de técnicos sociais e de magistrados" (DONZELOT, 2001), o social por excelência – e tudo se torna mais técnico e competitivo, porém, sem nada significar: tudo se realiza incondicionalmente. Com a instauração do social somos intimados a falar, a gozar, a nos realizar, a ser si mesmo sob pena de... sob pena de que? Baudrillard tem razão: "Isso é provocação". Sob o signo da afetividade pura, estamos sendo engolfados no que Baudrillard denomina um "regime interindividual do pedido". E esclarece: "No regime interindividual do pedido (contrariamente ao amor, à paixão ou à sedução), somos submetidos à chantagem afetiva, somos o refém efetivo do outro: "se você não me der isso, você será responsável pela minha depressão – se você não me amar, você será responsável pela minha morte" e, é claro, "Se você não se deixar amar, você será responsável por sua morte". Em suma, um envolvimento histérico – intimação e solicitação de responder" (BAUDRILLARD, 1996). Fala-se, então, com cinismo e devoção de uma ética e de uma estética da existência gay. E assim, diz-nos Baudrillhard: "O movimento glorioso da modernidade levou não a uma transmutação de todos os valores, como havíamos sonhado, mas a uma dispersão e involução do valor, cujo resultado é para nós a confusão total, a impossibilidade de retomar o princípio de uma determinação (ética ou) estética, tanto quanto sexual ou política, das coisas" (BAUDRILLARD, 1996). Em outras palavras, "a ascensão do social e a crise da família são o duplo político das mesmas causas elementares", como disse Deleuze em Prefácio ao excelente livro "A polícia das famílias", de Jacques Donzelot. A saber: "novas relações entre o público e o privado; entre o judiciário, o administrativo e o estabelecido pelos costumes; a riqueza e a pobreza; a cidade e o campo; a medicina, a escola e a família etc." (Prefácio), e, por fim, o Estado e a família. Ora, podemos indagar, "existe uma boa substância social, uma idealidade da relação social que possa e deva ser liberada? A resposta é evidentemente não: o equilíbrio, a harmonia de um contrato social desapareceu no horizonte da história e estamos destinados a essa obscenidade diáfana da mudança" (BAUDRILLARD, 1996). E a família, de refúgio disciplinar em um mundo sem coração se transforma numa instituição sitiada no coração de uma sociedade de controle (Foucault) e autoritarismo jurídico. E a "mutação do vínculo social" familiar [vínculo estabelecido a partir dos séculos XVIII-XIX com a invenção da afetividade (Ariès)], é facilmente verificável e se revela em pequenos, mas significativos sinais extraídos de fatos triviais da vida familiar que, a partir da ascensão do social (setor estranho, de formação recente, poder invasivo, domínio híbrido, importância crescente que Donzelot analisa com competência) a coloca em crise transformando-a em família "fragmentada" ou "liberalizada". Com efeito, Lebrun observa a "mutação do vínculo social" em fatos sutis, por exemplo, na dificuldade dos pais "de dizer não aos filhos" (LEBRUN, 2008), e, observa: "Pode parecer um pouco banal, pode parecer anódino. Mas, se refletirmos um pouco podemos afinal nos perguntar: como se explica que uma coisa que durante séculos se transmitiu de geração a geração sem nunca precisar de estudo ou de escola para se transmitir – ou seja, que para ser pai ou ser mãe era preciso de vez em quando dizer não aos filhos –, como se explica que de repente tenhamos de inventar algo para o que parece ter se rompido nessa maneira de transmitir? Como compreender o que acontece?" (LEBRUN, 2008). Como compreender a "lei da Palmada"? Mas, mesmo com a compreensão, não deixará a família de chafurdar na lama, na anarquia e na irrealidade do cotidiano da guerra pura (Virilio- Lotringer) em que são simplesmente álibis, não só os "freaks", os "raps", os "funks", os "caipiras", os "boêmios" (jovens e adultos atolados no lodo da maturidade impossível), mas também os modernos, ("normalóides", "babacas", "caretas", "snobes" ou "comuns") e os pós-modernos (os rockers, heads bangeres, new romantics, skin heads, hip-hops, new wavers, surfers, punks, darks, yuppies etc.), todos figuras de um universo caótico e perverso, polifônico e polissêmico não mais neurótico, mas esquizofrênico... Cartas de baralho.


"A POLÍCIA DA FAMÍLIA"

Uma resposta, ou melhor, uma competente compreensão parcial do fenômeno de negação da família emana de "A polícia da família", de Jacques Donzelot, que Gilles Deleuze, no Prefácio, agradando a todos os movimentos sociais, nos diz: "Ele nos mostra o nascimento do Hibrido moderno: de que modo os desejos e os poderes, as novas exigências de controle, mas também as novas capacidades de resistência e de liberação vão se organizar e se confrontar nessas linhas". Linhas que Deleuze indica no decorrer do Prefácio. A saber, resumindo: 1ª linha: século XVIII, "uma linha baixa: uma linha de crítica ou de ataque contra as nutrizes e criadagem. (...)" (Prefácio). Esclarecendo: "o recurso a nutrizes do campo", observa Donzelot, "para cuidar de crianças constituía um hábito dominante na população das cidades. As mulheres aderiam a esse hábito porque eram muito ocupadas em seu trabalho (esposas de comerciantes e de artesãos) ou porque eram suficientemente ricas para evitarem o fardo da amamentação" (DONZELOT, 2001). Mas que "a ausência de contato entre a nutriz e os pais a não ser através de intermediários obscuros (agenciadores e agenciadoras) faziam da colocação das crianças aos cuidados de uma nutriz, a prática freqüente de um abandono disfarçado ou de manobras suspeitas" (DONZELOT, 2001). O fato é que, concluindo, diz Donzelot: "Os ricos podiam se beneficiar da exclusividade de uma nutriz, mas raramente da sua bondade", e assim, "os médicos descobrem, bruscamente, a explicação de muitas taras que afetavam as crianças ricas, no comportamento das nutrizes" (DONZELOT, 2001) e, de uma forma geral, da criadagem; a seguir, mais uma linha, diz Deleuze: 2ª linha: na história da sociedade moderna, com a afirmação do controle social sobre as atividades antes relegadas aos indivíduos ou às suas famílias, "a família tende a se destacar de seu enquadramento doméstico, mas também os valores conjugais tendem a se liberar dos valores propriamente familiares, assumindo uma certa autonomia" (Prefácio); e nasce o social. E "o social se centrará em torno da conjugalidade, sua aprendizagem, seu exercício e seus deveres, mas do que na família, seu caráter inato, seus deveres" (Prefácio); como conseqüência, entra em devir o papel do homem e o papel da mulher e 3ª linha: "a família tende a se desengajar da autoridade paterna e marital do chefe de família. O divórcio, o desenvolvimento do aborto das mulheres casadas, a possibilidade de perda do poder paterno, são os pontos mais notáveis dessa linha. (...)" (Prefácio) com todas as conseqüências objetivas e subjetivas, e, neste sentido observa Deleuze: "Mais profundamente, porém, o que fica comprometido é a subjetividade que a família encontrava em seu "chefe" responsável, capaz de governá-la, e a objetividade, que ela obtinha de toda uma rede de dependências e complementaridades que a tornavam governável" (Prefácio); e, principalmente, a 4ª linha: que operam "uma nova aliança entre a medicina (principalmente a psiquiatria ) e o Estado" (Prefácio) que se tornam conjuntamente higiênicas e que se impõem sob a "ação de fatores diversos (desenvolvimento da escola obrigatória, regime do soldado, surgimento dos valores conjugais, que dá ênfase a descendência, controle das populações, etc.)...". (Prefácio). E a medicina, evidentemente, manterá seu "caráter liberal privado (contrato) enquanto o Estado intervém necessariamente por meio de ações públicas e estatutárias (tutela)" (Prefácio). Portanto, "as núpcias entre a medicina e o Estado tomam andamento diferente, não somente em função da política comum que seguem (eugenismo, malthusianismo, planejamento familiar etc.), mas de acordo com a natureza do Estado que supostamente a implementa" (Prefácio); e por fim, uma linha a mais, 5ª linha: "a da psicanálise" (e atualmente a da psicologia, uma 6ª Linha?), que, segundo Donzelot, diz Deleuze: "se estabeleceu muito rapidamente num meio híbrido de público e privado" (Prefácio). E tudo se passa segundo Deleuze, "como se as relações Público-Privado, Estado-Família, Direito-Medicina etc., tivessem ficado muito tempo sob um regime padrão, isto é, de lei...". E conclui: "Mas "o" social nasce com um regime de flutuação" (eu diria, um regime de dilemas), "onde as normas substituem a lei, os mecanismos reguladores e corretivos substituem o padrão" (Prefácio). E é assim que, desde o final do século XIX conhecemos (e que no início do século XXI vemos como se desenvolve no vácuo, isto é, depois de Marx, tal qual ocorria com a economia política, antes de Marx) as conseqüências do desenvolvimento capitalista e liberal, e neste, o século XIX, assistimos que a expansão da função gerencial e o crescimento da burocracia criaram, sob a batuta Médica e Jurídica, o social como um novo campo de conhecimento, e todas as linhas do trabalho de Donzelot apontam para o que sabemos (no suor e na vida, no sangue e nos nervos, na mente e no coração) que implicou nas palavras de Christopher Lasch, na "destruição de valores importantes relacionados à história da família" (LASCH, 1991), e, principalmente, "a deterioração dos cuidados da criança e dos jovens, e a exigência de se fazer alguma coisa para detê-la" (LASCH, 1991) Mas o fato é que [século XX (final)-XXI (início)] "a indiferença ante as necessidades das crianças e dos jovens (apesar de paparicados) converteu-se em uma das características predominante de uma sociedade que vive para o momento, define o consumo de mercadorias como a forma mais elevada de satisfação pessoal e gasta os recursos existentes como criminosa negligência em relação ao futuro"’ (LASCH, 1991), e faz do "grau zero" do sexo (Baudrillard), a forma predominante de sexualidade e de transcendência individual. E assim, assistimos a um estranho jogo mortal. "Jogo de eqüifinalidade de todas as tendências, dos efeitos de verdade, da circulação das perguntas e das respostas, etc. Estamos com isso inaugurando uma forma coletiva de existência irônica que, em sua extrema sabedoria, não se interroga mais sobre as próprias bases e aceita apenas assistir ao espetáculo de sua extinção" (BAUDRILLARD, 1996). Portanto, a resposta de Lebrun, ou melhor, sua compreensão e problematização me parecem extremamente mais promissora, diretamente, para o caso do presente trabalho, que se liga embrionariamente a questões de Direito de Família, e, que, portanto, serve de roteiro para guiar, aqui, preliminarmente, nossa reflexão que de forma mais cuidadosa, minuciosa e profunda desenvolve-se no "Manual Crítico do Direito das Famílias".


DIGNIDADE VERSUS IGUALDADE?

Trata-se, portanto, de uma confrontação tetê-à-tête do Art. 1º, III, com o Art. 5º, I, da CF/1988. Em outras palavras, entre um "Fundamento" ("III – a dignidade da pessoa humana") e um "Direito e Dever Individual e Coletivo" ("I – homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição"). O que liga os dois dispositivos é a palavra pessoa que, strito senso, juridicamente significa ser ao qual se atribuem direitos e obrigações. A questão é saber, qual o fundamento de tais direitos e de tais obrigações? O que já é outra questão, e não cabe aqui. Apenas o pressupomos. Mas, evidentemente, nem a liberdade, nem a igualdade, são os termos que o fundamento fundamenta, mas a soberania, sede da razão e da virtude cívica. Mesmo porque, Lebrum "pensa a coisa da seguinte maneira": começa com uma indagação, "Mas o que é a humanidade?", porque no fundo "a questão que se coloca é esta", diz ele. Exatamente! Em outras palavras: "Há alguma coisa que atesta, que especifica, que seria particular ao ser humano? Parece que sim". Este é, por exemplo, o entendimento de Spinoza, uma vida humana é, segundo ele, "uma vida que não se define pela circulação do sangue e outras funções comuns a todos os animais, mas, antes de tudo, pela verdadeira vida da alma, pela razão e pela virtude" (SPINOZA, s/d). Há, por exemplo, o fato, assinalado por Lebrun, de que "somos os únicos animais que utilizam um sistema simbólico tão aperfeiçoado como a linguagem" (LEBRUN, 2008), que constitui, justamente, o seu principal meio, o mais efetivo, o mais expressivo, o mais significativo meio de comunicação e de ação comunicativa (Habermas). E é óbvio, isso tem um preço, e, segundo Lebrun, um preço muito alto. A necessidade de comunicação tornou-se tão complexa e sofisticada, que temos muita dificuldade de dizer e de saber, o que queremos e o que podemos esperar. É que, nas palavras de Erich Fromm: "O homem é o único animal que pode aborrecer-se, que pode ficar descontente, que pode sentir-se expulso do paraíso" (FROMM, 1983, p.44). E assim é por que "tendo consciência de si mesmo, percebe sua impotência e as limitações de sua existência" (FROMM, 1983, p. 44), ao visualizar seu próprio fim, a morte, e isso angustia. E é assim que ele tem que prestar contas de si a si mesmo, bem como do significado de sua existência, do sentido que deve dar-se ou de um desejo que o justifique. Tal como retrata o poema de Master Eckhart:

Ser eu um homem,

Isso compartilho com outros homens.

Ser eu capaz de ver e ouvir,

É o que também fazem todos os animais.

Mas eu ser eu é apenas meu,

Isso pertence a mim

E a mais ninguém;

A nenhum outro homem

Nem a anjo nem a Deus –

Exceto na medida em que

Sou idêntico a Ele.

E na medida da concepção de que "sou idêntico a Ele" desenvolve-se diante de um espelho um inestimável e profundo narcisismo, tão desvairado quanto religioso, estranho quanto alucinado, cínico quanto devoto que guia o processo capitalista de individualização ultraliberal fundamentado na instantaneidade e na corporeidade. Do final do século XX até hoje, quase 12 anos já vividos no século XXI, vivemos, na fórmula devida a Christopher Lasch em 1979, a "era do narcisismo". Idéia que recebeu seu eco mais notável em "A era do vazio: ensaio sobre o individualismo contemporâneo" de Gilles Lipovetsky, que diz: "O narcisismo surge a partir individualização ultraliberal da deserção generalizada dos valores e finalidades sociais, desencadeadas pelo processo de personalização. A desafeição aos grandes sistemas de sentidos e o hiperinvestimento no Eu são paralelos: (...) Tudo concorre à promoção de puro individualismo, também chamado ‘psi’, desembaraçado dos enquadramentos de massa e que tende à valorização generalizada do sujeito" (LIPOVETSKI, 1980, apud LE RIDER, 1983). E como disse, fundamentado na individualização cor-de-rosa e ultraliberal do social, então, como não observar, todas as pequenas manifestações individuais que assumem pela expansão da promiscuidade e da permissividade social cada vez mais valores coletivos: o culto do corpo, a obsessão pelo sexo culminando no sexo pelo sexo, a busca das drogas legais e ilegais, a religiosidade de auto-ajuda, a "culinária fusion", a egolatria, o engajamento tribal, a barbárie etc. Por quê? Uma boa resposta colho de Carmen Da Poian. Diz ela: "Vivemos num mundo desencantado e experimentamos atualmente o mal-estar nascido dos vazios provocados pela ausência de Deus, da fé e de lei", e, por outro lado, continua ela: "As noções de paternidade e de maternidade encontram-se em crise, ocasionando um mal-estar social, psíquico e biológico provocado pela falta de contornos e limites, o que ocasiona a força da violência pulsional. O estoque identificatório de que o sujeito atual dispõe é quase nenhum" (DA POIAN, 2001). Conseqüentemente, assistimos a proliferação de grupos definidos como minoritários e marginais na busca de direitos fundamentados ideologicamente na igualdade obscura dos (in)diferentes, na liberdade absurda da (in)distinção, e na dignidade (in)apreciável de quem avança para a "casa oito" (Malba Tahan), tal como o peão no jogo de xadrez. Mas há problemas ai. Muitos! "Há, portanto", assinala Lebrun, "uma perda de saber imediatamente o que é preciso fazer, como sabe o animal que se refere a um instinto". E conclui: "O ser humano não pode confiar no seu instinto" (LEBRUN, 2008, p.146), e essa debilidade biológica é sua força: a ausência relativa de uma regulamentação instintiva do processo de adaptação ao mundo que o rodeia. Com efeito, podemos dizer como Fromm, que: "O aparecimento do homem pode ser definido como tendo ocorrido no ponto do processo da evolução em que a adaptação instintiva atingiu seu mínimo. Ele aparece, porém, com novas qualidades que o diferenciam do animal: sua consciência de si mesmo como entidade independente, sua capacidade de lembrar o passado, de visualizar o futuro e de indicar objetos e atos por meio de símbolos; sua razão para conceder e compreender o mundo; e sua imaginação, graças à qual ele alcança bem além do limite de seus sentidos" (FROMM, 1983). Mas para tudo é preciso um basta, um freio, um limite, uma ordem. Há as sociedades humanas, diz Lebrun, e a personalidade humana e individual é determinada pelas particularidades da existência humana, comuns a todos os homens, portanto, (e já entramos na esfera do direito), observa com primor Umberto Eco, em "Os limites da interpretação": "temos concepções universais acerca do constrangimento: não se deseja que alguém nos impeça de falar, ver, ouvir, dormir, ingurgitar ou expelir, ir onde quisermos; sofremos se alguém nos amarra ou mantém-nos segregados, nos bate, fere ou mata, nos sujeita a torturas físicas ou psíquicas que diminuam ou anulem nossas capacidades de pensar" (ECO, 2000, apud, VALADÃO, 2008). Em outras palavras, isso quer dizer que, diz Lebrun, "todas as sociedades humanas se organizam em torno de interdições, de proibições fundamentais" (LEBRUN, 2008) para que os indivíduos não extrapolem o limites na busca de realização de seus interesses, desejos, paixões e gozos egoístas. "A proibição antropofágica, a proibição do assassinato, a proibição do incesto" (LEBRUN, 2008). Há sempre práticas, costumes, coisas permitidas, coisas toleradas, coisas proibidas. Sempre.


ORDEM DA PERDA DE GOZO?

"Portanto", diz Lebrun, há sempre "algo que organiza uma perda de gozo sempre necessária, sempre transmitida como necessária" (LEBRUN, 2008), em qualquer esfera da vida social. A proibição do incesto, por exemplo, atinge direta e particularmente o desenvolvimento e a organização familiar. Se quiserem, aos pais, irmãos, tios etc. Ora, a família, e nela os pais etc., "são o primeiro outro que cerca uma criança, que vão ensiná-las aos poucos (...) a encontrar seu lugar de adulto numa sociedade, como homem ou como mulher". Primeiro outro mais fundamental que cerca a uma criança, que vai ensiná-la aos poucos "a encontrar seu lugar de adulto numa sociedade" (LEBRUN, 2008). Inegavelmente, uma criança, qualquer criança, toda criança, precisará para participar da espécie humana, de certo modo, reapropriar-se progressivamente, subjetivar, fazer suas as leis da sociedade a que pertence. Sim, a lei interdita, separa, rejeita, exclui o que se queira, mas o faz por obediência, digamos, a um princípio de solidariedade, a um princípio de hospitalidade, ou seja, diz Lebrun: "o gozo completo deve ser perdido, para que em seu lugar se instale o que é nossa característica humana fundamental: ser capaz de falar" (LEBRUN, 2008). Mas o que aconteceu? Nietzsche anunciou: "Deus está morto!" O que isso significa? Que na história da humanidade, em todas as civilizações, em todas as sociedades, havia, diz Lebrun, "o lugar de Deus". Mesmo que fosse um não lugar (o céu, por exemplo), não era simplesmente um lugar vazio, mas era um lugar sagrado. E como observa Lebrun: "Todos sabiam que havia o lugar de Deus e, que a partir desse lugar, a legitimidade de ocupar uma série de lugares que de perto ou de longe, representavam esse lugar diferenciado, o do Chefe, o do Rei, do Presidente, do Mestre, do Pai, ou seja, seja lá o que for" (LEBRUN, 2008) fundamentado num "vínculo sagrado", logo, sujeito a ser monopolizado pela religião, tornando-se mais opressivo. É preciso observar, portanto, que foi a "liberdade natural" [liberdade do homem no "Direito Natural" (Spinoza)] que implicou no que Erick Fromm chama de "Medo a liberdade", ou seja, a necessidade de sentimentos de segurança através da submissão à autoridade, uma vez que a liberdade, ao separá-lo emocionalmente dos outros, provoca dor, solidão e medo. E assim, o medo a liberdade constituí o verdadeiro topos natural do poder onde se instauram práticas de liberdade política, ética, jurídica, religiosa etc. Podemos dizer como Spinoza em seu "Tratado político": "É preciso não esquecer que dependemos do poder de Deus" (acrescento do Rei, do Presidente, do Chefe, do Mestre, do Pai etc.,) "como a argila das mãos do oleiro, o qual tira da mesma matéria, vasos destinados ao ornamento e vasos destinados ao uso comum" (SPINOZA, s/d). Mas também, é preciso não esquecer que assim como a invenção do avião teve como resultado a invenção do acidente aéreo, a invenção do "lugar excepcional" que era o de Deus, do Rei, do Presidente, do Mestre, do Pai etc., implicou em opressão política, ética, jurídica, etc., e principalmente, a ainda atual e presente opressão religiosa, onde a estupidez humana parece não ter limites. Razão pela qual, notícia do outro mundo, contra a opressão e estupidez religiosa a morte de Deus foi anunciada, e, assim progressivamente, continua Lebrun, "esse modelo de funcionamento de um tipo de vínculo social foi sendo atacado e questionado". E foi assim que a "Modernidade rompeu com a idéia de que há uma heteronomia, uma transcendência religiosa" (LEBRUN, 2008). Ao contrário, afirmava que "nós é que vamos assumir nossos problemas". E isso mediante uma série de forças que se revelaram congruentes e auto-consistentes, que agiram no mesmo sentido. O discurso da Ciência, e, depois, a Democracia virá ocupar o lugar de Deus, justamente, e por representação o Povo (que se quer "a voz de Deus") que se quer se colocar nele, mas, se trata, fundamentalmente, de um lugar vazio, que se tornou lugar do Estado, e que tem que ser laico. E ainda hoje, por continuar sendo um lugar vazio, "há cada vez mais a idéia, espontaneamente partilhada por cada um, de que esse lugar diferente dos demais, esse lugar excepcional que era o de Deus, do Rei, do Presidente, do Chefe, do Mestre, é um lugar que não tem mais necessidade de existir" (LEBRUN, 2008). E assim, conclui Lebrun, "alguma coisa se completou". Sim, as referências se perderam! Vivemos agora em uma Sociedade que trocou "a ordem e a segurança pela busca do prazer e da liberdade individuais", em que "o indivíduo e sua autonomia valem mais do que a comunidade que o abriga e o patrimônio cultural herdado" (DA POIAN, 2001). Vivemos em uma sociedade sem herança, e presenciamos angustiados, "indivíduos órfãos de ideais e de verdades simbólicas que correm simplesmente atrás da sedução das imagens que lhes são propostas de inúmeros modos", e que, "tentam arrumar uma identidade que lhes permita viver os instantes, identidades adotadas sem firmeza alguma (movidos por um desejo histérico, desvairado e vazio), pois o mundo de hoje exige volatilidade, mudanças, trocas, descartabilidade" (e é preciso viver o momento no instante antes que ele se consuma) (Cf. DA POIAN, 2001). Ora, diz Richard Sennett (1999): "Como podemos decidir o que tem valor duradouro em nós, em uma sociedade impaciente que se concentra no momento imediato?". E assim, "provocado por essas constantes mudanças, como suportar e conviver com os vazios de sentido? Presentificam-se cada vez mais sensações de descrença, fracasso, despersonalização, enlouquecimento, morte psíquica e mesmo física" (DA POIAN, 2001), que, paradoxalmente, levam milhões de pessoas (com consciência infeliz anêmica) para as igrejas. E o boom evangélico é inevitável. Por quê? Diz Paul Israel (1977), uma "desumanização do sujeito", "não no sentido filosófico e moral, mas metapsicológico. Há uma desagregação do funcionamento mental, uma falha no processo de psiquização" (Cf. DA POIAN, 2001), e a religião como ópio do povo (Marx), torna-se um estranho vício. Busca-se preencher assim com qualquer simulacro o lugar de Deus, do Rei, do Chefe, do Presidente, do Mestre, do Pai deixados vazios. Mas, inutilmente, a coisa já se completou.


COMPLEMENTO VAZIO

Como vimos, Lebrun diagnostica a existência e a promoção de "uma mutação do vínculo social", e percebe a gênese deste processo na "morte de Deus", ou seja, no não mais existente (mas não inexistente, porque existente em simulacro) lugar de Deus – topos natural do poder do "Pai", do "Mestre", do "Chefe", do "Rei", do "Presidente", da "lei" etc. De qualquer autoridade. Nestes termos Carmen Da Poian é enfática: "Vivemos em um mundo desencantado e experimentamos atualmente o mal-estar nascido dos vazios provocados pela ausência de Deus, de fé e de lei" (DA POIAN, 2001). E a verdade é que o lugar de Deus etc. se trata de um lugar deixado assim, fundamentalmente vazio que aos poucos se esqueceu de que é mesmo um lugar vazio, e que Adam Smith colocou "a mão invisível do mercado" (para os evangélicos a própria mão invisível de Deus) e que para o liberalismo (como simulação ou dissimulação) é a Soberania, isto é, "nós é que decidimos", nós, o Povo do qual "o poder emana" através de "representantes eleitos" (Art.1º, Parágrafo único da CF/1988) pelo poder do capital financeiro nas eleições. Ai!Ai! E chamou isso de "Estado democrático de direito" (Art. 1º, caput) – determinações constitucionais da qual "estranhamente" (mas não paradoxalmente) estão fora o Poder Judiciário, pois, além de legislar etc., as regras para ingresso na Magistratura é absolutamente diferente de uma "representação eleitoral" (realiza-se por destino e/ou acaso), e, assim, injustificadamente, nega o princípio da igualdade et alii consolidando privilégios estamentais pois que se reserva exclusivamente para advogados. Incongruência e injustiça social são as palavras que se apresentam para representar tal exigência (já que uma das razões sacadas para justificar o ativismo judiciário é o princípio da igualdade) que, como diz Giovanni Sartori, "quando se busca a igualdade, as diferenças de poder, riqueza, status e oportunidades na vida, cuja existência é vista como "natural", deixam de ser diferenças rotineiramente aceitas" (SARTORI, 1994). Assim sendo, continua Sartori: "A igualdade simboliza e estimula a revolta do homem contra o destino e o acaso, contra a disparidade fortuita, o privilégio cristalizado e o poder injusto" (SARTORI, 1994). Compreensão que faltou (como veremos de forma específica e em outra ocasião), por exemplo, ao professor Celso Antônio Bandeira de Mello em sua reflexão sobre a relatividade do "Conteúdo jurídico do princípio da igualdade". E como agora somos "autônomos", "soberanos", "povo", "gozamos de igualdade jurídica" [que irônica e cinicamente reduz-se mais e mais a uma "igualdade de gêneros" (sic!)] na base irrefutável da desigualdade de fato e de direito etc., diz Lebrun: "Temos um projeto, uma orientação de imanência, não há mais transcendência". E viva a Igualdade! Certo! Mas há problemas ai. Alerta Lebrun observando: "Porque também não há mais transcendência, tampouco posição de exterioridade". E com isso, conclui Lebrun: "(...) há uma ruptura de solidariedade" (eu diria e também de hospitalidade, de representação, de compreensão, de identidade, de memória, de utopia etc.). "Pois com a prescrição da perda de gozo necessária à humanidade vê-se, de certo modo, negada, questionada, julgada como devendo não mais existir" (Cf. LEBRUN, 2008). E por quê? Porque hoje, continua Lebrun, "devemos aproveitar o que se apresenta, portanto, não mais se submeter a essa perda de gozo, mas sim banir de nosso trajeto essa necessidade de uma perda". E conclui: "Ai está algo que faz a cabeça de todo mundo". E que foi genialmente proposto por Foucault, Deleuze et alli. Somos neo-utilitaristas com visão de toupeira? Isso é outra questão, não cabe aqui. Mas, as conseqüências? Para Lebrun existem "a montante e a jusante". A gosto ou a desgosto. Mas isso não é tudo. Lembra-nos Jacques Leclercq: "Comer bem, alojar-se bem, vestir bem, cuidar do conforto em tudo, é uma preocupação dominante, senão a única da existência", (LECLERCQ, 1967), a que devemos acrescentar gozar bem, transar muito, qualquer forma de amar vale a pena etc., "centrando assim o homem em si mesmo e no que ele tem de menos propriamente humano" (LECLERCQ, 1967, p. 326), e que por isso (e que parece ser a única coisa que importa) atende imediatamente a necessidade dominante do gozo e encaixa-se muito bem com os interesses da "mão invisível do Mercado". Concluindo radicalmente: "Crianças, jovens educados nessa atmosfera tornam-se incapazes de perceber os valores espirituais. Não são maus, em certo sentido do termo; simplesmente não são humanos; sua vida desenvolve-se num plano mais animal do que humano. Seu ideal é do "porco satisfeito" e, mesmo que não sofram com seu estado, pelo menos enquanto são jovens e de boa saúde, ignoram, contudo, a alegria e a altivez do homem" (LECLERCQ, 1967). A questão que se coloca é: como essas crianças e jovens são cotidianamente educados? Desafiando qualquer autoridade, ligados em e seduzidos por milhares de cenas de violência e sexo por dia na frente à televisão ou ao vídeo-game etc., como não desenvolver comportamentos e atitudes agressivas, e como impedir que sejam conduzidas a dobrarem-se sob os efeitos de dessensibilização e do medo? Neste sentido, o Centro de Controle das Doenças, dos EUA, depois de analisarem milhares de pesquisas dos efeitos da violência na televisão sobre os telespectadores, declarou que a violência na televisão é um mal para a saúde pública, e, relacionou a mídia, juntamente com outros fatores sociais e psicológicos, como um fator de suma importância que contribui para a violência. Os estudiosos do fenômeno da violência, Ulla Carlsson e Cecília Von Feilitzen, afirmaram que: "Ao terminar o primeiro Grau, uma criança norte-americana comum terá visto mais de 8 mil assassinatos e mais de 100 mil outros atos de violência" (CARLSSON e FEILITZEN, 1999 apud BALESTRERI, 2003). Neste sentido, alerta-nos Gerbner: "Um estudo feito nos EUA indica que os programas norte-americanos exportados para outros países contêm mais violência (cerca de 70% mais) que os programas transmitidos nos EUA" (Cf. GERBNER, 1999, apud, BALESTRERI, 2003). E no caso brasileiro (além desses importados norte-americanos), "quando as mortes e as injustiças não estão nos filmes e novelas, estão, a toda hora, no jornal das oito, por exemplo, para incorporarem-se ao universo de "normalidade" de nossos filhos e filhas, alunos e alunas" (Cf. BALESTRERI, 2003). Balestreri tem razão, estamos acostumados com as perversões, com a crueldade de todos os tipos estampadas nos jornais, revista, invadindo nossa sala pela tela da TV, "distraindo-nos" com seus filmes e seus videogames criminosos porque a sociedade brasileira é doente, corrupta, perversa, cruel, e são múltiplos os seus vetores ditos "culturais" que na verdade apenas advogam e banalizam a violência. Por que ainda estranhamos as gangues? Por que ainda estranhamos o crescimento do império das drogas? Fala-se muito das cenas de violência na TV, como se não bastasse a TV liga-se, não raramente, um videogame. E assim, a violência parece não preocupar os jovens que treinados em vídeos-game se sente preparado para enfrentar a ameaça. Os videojogos de maior difusão oferecem campos de batalha onde o jogador é obrigado a atirar primeiro e tornar a atirar depois, sem nunca hesitar, contra tudo que se move. Ou seja, nota Galeano: "Os vídeos-jogo falam uma linguagem que inclui o matraquear de metralhadoras, música terrífica, gritos de agonia e ordens categóricas: Finish him! (acaba com eles), Beat’em up (Bate neles), Shot’em up (Atira neles)" (GALEANO, 2003). Quanto mais os adversários matam o jogador, mais se aproximam do triunfo. Valem mais pontos os goles certeiros, golpes que arrancam a cabeça do inimigo pela raiz ou lhe arrancam do peito o coração sangrento ou lhe arrebentam o crânio em mil pedaços. E aí o horror se completa. Observa Balestressi que há doença social para todos os gostos: game de trânsito onde vence quem dirige sobre as calçadas e mata mais gente da forma mais chocante ("Atropele, mate e não socorra"), games de estriar o inimigo (...), games de assaltar e estuprar as vítimas, games com todas as formas de guerra e com todas as armas imagináveis, games ensinando a dominar cidades através da corrupção. E indaga: "O que acontecerá com quem apertar os botões milhares de vezes, tomando milhares de vezes tal decisão virtual? Em especial, o que acontecerá aos muitos que vem de estruturas familiares destroçadas e de escolas cujo impacto ético é nulo ou insignificante?" (Cf. BALESTRERI, 2003). Como conseqüência, "qual o futuro para o ódio hoje?", propõe Lebrun. E prossegue, longamente, perseguindo a resposta: "Qual o futuro para o ódio, se não reconhecemos mais na diferença de lugar uma maneira de achar uma saída para nossos conflitos? E dou um exemplo disso com algo que acontece na Europa, na Bélgica e na França (no resto do mundo, em todo mundo). As estatísticas são claras: 60% das crianças têm televisão em seu quarto" (LEBRUN, 2008). E atualmente também um videogame ou computador! Esclareço com Lebrun: "ter uma televisão (videogame ou um computador) no quarto para cada um dos filhos é um modo extremamente eficaz de evitar o conflito no seio da família, de dia, de noite, para saber que programa, site ou link se vai escolher. Assim, cada um pode gozar tranqüilo, sozinho. Cada um pode assumir seu Robinson, e tanto melhor quanto é reconhecido por todos os outros que vêem o mesmo programa" (ou acesa os mesmos links de um site, jogando os mesmos jogos pela na internet etc.) "que ele fora do quarto". E deixamos as crianças assim, durante todo esse período dos 2 aos 15 anos, sei lá. Durante uns 15 anos elas são deixadas em seu gozo privado", fazendo sabe lá Deus o que num chat, numa rede social, num site pornô, ou seja, podendo sempre, nas ilusões e seduções geradas nos contatos on line, (contatos impessoal e líquido) evitar o confrontamento" (com o real, o concreto,) "com o outro para saber como, afinal, vão deixá-las seguir seu caminho. E isso num momento durante o qual... justamente durante a infância e a adolescência... alguma coisa deveria ajudá-las a organizar a regulação de sua pulsão mortífera, destruidora, assim que deparam com o outro. É que, num primeiro momento, é muito lógico... Lá onde seria preciso um trabalho de cultura para tentar renunciar, nem que seja um pouco, a essa realização mortífera, geralmente a criança se vê hoje, num tal contexto, entregue a si mesma, abandonada. Literalmente abandonada a seu universo pessoal (Cf. LEBRUN, 2008). Em outras palavras: com a vida sitiada pela violência, o que ela apreendeu assim sozinha? Dificil dizer! Não só a Tv, os vídeos games, os traficantes de drogas etc., cercam os filhos de violência, mas também, vale lembrar, diz Balestreri, "um dos mais difundidos, dissimulados, e por isso mesmo, perigosos, vetores de banalização da violência: a música" (BALESTRERI, 2003). Mesmo porque, podemos conhecer a nossa psique por sua paisagem sonora, ou seja, fico com a proposta inspirada em Murray Schaffer, em "A afinação do mundo": "Que sons queremos preservar, encorajar, multiplicar?", pergunta Schaffer, e responde: "Quando soubermos responder a essa pergunta, os sons desagradáveis ou destrutivos predominarão a tal ponto que saberemos por que devemos eliminá-lo" (SCHAFFER, 2001). Mesmo porque, a meio caminho entre a ciência, a sociedade e as artes têm a acústica e a psico-acústica, e aprendemos as propriedades físicas do som e do modo pelo qual este é interpretado pelo cérebro humano. E sabemos que muitos estilos de músicas são vetores de banalização da violência. São drogas da pesada. Então, como dizer "não" as drogas? É o que diz um texto distribuído pela internet, chamado "Diga não as drogas". Ricardo B. Balestreri, numa conferência da Associação de Educação Católica do Brasil (AEC), em julho de 2001, na cidade de Curitiba, informou-nos da existência do texto da internet. Nele, disse Balestreri, o autor inventa, em geral com fino humor, um sujeito que se confessa usuário de drogas pesadas. Mas não é de substâncias psico-ativas que está falando. Fala de música. O suposto arrependido, ali, confessa ter entrado no mundo das drogas ao receber de presente o CD de uma famosa dupla sertaneja. Gostou , quando percebeu, estava em uma loja comprando um desses pagodes enlatados. Em seu último estágio, já estava consumido a "Equinha Pocotó", "Um tapinha não dói" e similares, e o que é pior, já estava dançando a "dança da garrafa" etc. E ainda estranhamos o crescimento do império das drogas culturais! E ainda estranhamos a violência nas escolas! E acredito que tenha ficado horrorizado com a sua permissividade, com o que estava fazendo quando viu a "dança da garrafa" etc., executada por menininhas de 6, 7 anos, em sumaríssimos trajes, domingo à tarde, em rede nacional, para as embevecidas famílias brasileiras? E agora todos se espantam com o aumento de pedofilia; que cinismo é esse? Evidentemente, se o suposto arrependido tivesse chegado ao rap, funk, e agora, o gospel etc., passando, necessariamente, é claro, pela Banda Calipso, Ivete Sangalo, e, de forma geral a chamada "música baiana" etc., o processo de bestialidade estaria completo. A dupla sertaneja, o funk e o gospel, sem dúvida, são as matrizes perversa da música brasileira. O problema, portanto, se constitui na inexistência de clínicas imaginárias de "limpeza" e "desintoxicação cultural". Como livrar-se, então, da influência das drogas musicais? E para completar este processo de bestialização da cultura brasileira, temos a televisão e sua política perversa de erotização e os BBBs. Como declarou o ator Pedro Cardoso, o "Agostinho" de "A Grande Família", TV Globo, em entrevista a ISTOÉ, 12 de agosto/ 2009: "o empresário que investe em comunicação de massa tem seus capatazes para exigir que as atrizes, muito mais que os atores, façam cenas aparentemente dentro da trama, mas que, na maioria das vezes são simples apêndices de nudez para vender a pornografia", ou, por que não dizer, promover o negócio extremamente lucrativo da prostituição. Como resistir a tal overdose? Seus bailes, suas baladas, seus trios elétricos, seus carnavais, seus bacanais? Como observou Kafka em seu diário: "Depois de certo ponto o retorno é impossível". Mesmo porque, o discurso jurídico deve perceber (e é isso que objetivo, aqui, chamar à atenção) que, atualmente, todas as práticas sexuais perversas (lícitas ou mesmo ilícitas) entre adultos consentâneos são agora autorizadas, uma vez que o Estado não se intrometa mais na intimidade dos cidadãos (por exemplo, CF/88: Art. 5º, VI, VII, IX, X etc.), logo, alerta-nos Roudinesco: "Hoje todo sujeito pode livremente ser praticante de swing, masturbador inveterado, sadomasoquista, incestuoso, coprófilo, coprófago, fetichista, prostituto, travesti, fanático religioso, adepto de tatuagens, dos backrooms, do piercing, dos fist-fucking, da flagelação ou de uma seita satânica, com a condição todavia de não exibir-se na praça pública, não violar as sepulturas, não ocultar cadáveres, não vender seu corpo e seus órgãos para associações com fins lucrativos, não ser antropófago e não maltratar o objeto de sua pulsão no caso de prática sexual com animais)" (ROUDINESCO, 2008). E a questão é sempre a seguinte: diante de tantos e tão variados vetores de violência (alguns de aparência tão angelicais) o que fazer, por exemplo, com a perda da autoridade familiar, e diante das dificuldades dos pais dizerem "Não" aos filhos, com as sugestões, os condicionamentos, as influencia, a educação dos sentidos que ela recebeu assim? O que fazer agora se todos os perversos não são mais vistos como perversos e desde criança não podem levar nem uma palmada? Porque agora são, alerta-nos Roudinesco, "perversos normalizados, autorizados, despenalizados, despsiquiatrizados que reproduzem por sua vez, em livros científicos, eróticos, pornográficos, psicanalíticos, sexológicos, o imenso relato dos prazeres, paixões, transgressões e vicíos elaborado por Sade pelos escritores ou especialistas em história da psicopatologia" ROUDINESCO, 2008). E como alerta Lebrun: "De tal modo que, quando tiver 16, 17, 18 anos, o que acontecerá por ocasião de um desgosto amoroso, um desgosto de estudante ou de profissão? Um desgosto, assinalo, que os pais com certeza não poderão evitar. Pois podem estar certos que isso acontecerá. Então, como diz uma frase que gosto muito de Samuel Backett, "há uma meio de falhar melhor". Mas é sempre de uma falha que se trata. E, assim, como se surpreender que adolescentes que durante 15 anos puderam escapar de todo trabalho sobre seu próprio mundo pulsional, de todo trabalho cultural para assumir e elaborar psiquicamente essa alteridade, como se surpreender que, quando um desgosto assim acontece (estou caricaturando, é claro), não encontrem nada melhor a fazer senão se jogar pela janela ou sair dando tiros ao acaso? Ou seja, regular a violência de uma maneira ainda mais violenta? (CF. LEBRUN, 2008). Concluindo: "Pois bem, são essas as questões que eu gostaria de deixar a fim de fazê-los compreender um pouco a mutação do vínculo social para o qual somos literalmente arrastados e que exige uma extrema vigilância para que tentemos, com o maior rigor possível, compreender do que se trata, para que possamos... é o que sempre se faz em medicina... começar com um bom diagnóstico que nos permita ver se há ou não um meio de encontrar respostas judiciosa a isso". (LEBRUN, 2008). E me parece que o STF tem fugido por algum interesse não confessado, talvez inconfessável, justamente, da busca de respostas judiciosas diante da profundidade do fosso que se abre na realidade, e, "sanciona" tudo por via das dúvidas.


A PROFUNDIDADE DO FOSSO

O problema para a "sociedade concreta" é que, segundo Lebrun, se "há ruptura quanto à necessidade da perda, então, a noção de proibição (...) se revela também completamente caduca. Por que uma proibição? Para que servem as proibições? Não há mais razão de proibir" (LEBRUN, 2008). Então, cada um faz o que quer, diz o que quer dizer... Que importam os outros? "Nada de regulação necessária", portanto. "Aliás, vocês percebem o quanto isso é muito proveitoso para o mercado, para a economia de mercado?" (LEBRUN, 2008). E assim, conclui: "fora do mercado não há mais transcendência, nem posição de exterioridade" (LEBRUN, 2008). O mercado é um buraco negro. Não há mais nem mesmo "a necessidade da palavra", porque, segundo Lebrun, "isso deslegitima todos os que têm a tarefa de preservar a necessidade de subtração do gozo" para poder fazer crescer, para "haver crescimento na mente de uma criança". Em outras palavras, deslegitima em primeiro lugar os pais (diante de uma solicitação dos filhos, uma pirraça, um choro diante de uma frustração das expectativas de um desejo de gozo etc.), que então se perguntam: "por que dizer não?"En passant, podemos afirmar que, no direito brasileiro, a deslegitimação dos pais recebe sua forma legal no "Estatuto da Criança e do Adolescente", Lei federal nº 8.069, de 13 de julho de 1990, etc., e, mais recentemente na "Lei da Palmada" (trata-se do projeto de Lei nº 2654/2003 da deputada Maria do Rosário, aprovado recentemente pela Câmara Federal), e que propiciam que vejamos emergir na forma de leis, clara e paradoxalmente, a dificuldade para os pais "dizer não a seus filhos". Evidentemente, parafraseando (ou melhor, contextualizando aqui), uma observação de Donzelot, podemos dizer: "E, naturalmente, como outrora, é nas famílias operárias, nas famílias "desprovidas" que irão exercer a missão de propagação dessas novas normas que a fazem viver tão bem" (DONZELOT, 1986). Assim, as "noções de paternidade e de maternidade encontram-se em crise, ocasionando um mal-estar social, psíquico e biológico provocado pela falta de contornos e de limites, o que ocasiona a força da violência pulsional. O estoque identificatório de que o sujeito atual dispões é quase nenhum" (DA POIAN, 2001). Para uma boa avaliação do perigo real que representa o vazio das normas (ou as normas vazias), alerta-nos Helmut Schelsky: "Viver afastado das normas em qualquer terreno leva ao deboche e aumenta a fraqueza do homem diante da tentação em todo seu comportamento, o sexual inclusive" (SCHELSKY, 1968). Se há, portanto, ruptura quanto à necessidade da perda, continua Lebrun, isso deslegitima também "o professor, que se sente mal" (ou sente medo de ser agredido ou assassinado, já que não há mais limites e a violência ocorre inesperadamente), "quando deve avaliar negativamente o trabalho de um aluno. Deslegitima o político. Por que o político, no fundo, também não faz outra coisa senão precisar dizer não. Em todo caso, dizer não a muita gente para poder dizer sim a alguns. Deslegitima todos que tem em seus cargos, que tinha em seus cargos a necessidade de assumir, de assumir algo impossível de ser inteiramente justo, de curar inteiramente, de educar adequadamente, mais que mesmo assim assumiam a dificuldade de dizer não, de poder dizer não para que o sim se realizasse" (Cf. LEBRUN, 2001). E assim, para Lebrun, "lá onde havia, ontem, um discurso social que dizia, acerca das limitações de gozo: "Não há outro jeito, você tem que aceitar isso, é um imposição da qual não se pode escapar", eis que hoje se faz o seguinte discurso: "Há um meio de evitar isso, um meio de contornar o obstáculo. De você cair fora e se safar, de modo que não precise assumir, interiorizar, subjetivar essas leis da condição humana. É possível você passar sem isso "" (LEBRUN, 2001). Não é o que diz o discurso rap de Mano Brow? Se for possível, não o é sem conseqüência, "como podem imaginar, para a subjetividade, para a construção dos sujeitos que estamos introduzindo em nossas sociedades. E isso por meio do processo de educação, da maneira como os pais lidam com a criança, deslegitimados nesse lugar – portanto, não se sentindo mais com competência suficiente para poder intervir. De modo que a jovem criança, esse futuro adulto, não fará verdadeiramente o trabalho que é necessário. E num tal contexto, sem que ninguém perceba, isso produz um tipo de sujeito que não é mais exatamente o mesmo que o mundo de ontem produzia" (LEBRUN, 2001). E o homossexualismo de "perversão" passa a ser "virtude", de exceção passa a ser a regra de formação do ser humano. Com efeito, diz Alan Finkielkraut, "a pretensa emancipação do indivíduo seria, na realidade uma despersonalização, a destruição da pessoa que está em nós em benefício da reanimalização do homem que, ao reinscrever o humano no biológico, parece negar em si a cultura em benefício da natureza" (FINKIELKRAUT, 1987, p. 146, apud RENAUT, 1998). O indivíduo será um sujeito, portanto, afirma Lebrun, "sem apoio, sem lugar, vazio". E assim, "não estando apoiado em lugar nenhum, ele se torna um "sujeito flutuante"", ou seja, "um sujeito sem gravidade. Um sujeito flexível. Um sujeito que se deve moldar a situação. Um sujeito essencialmente oportunista". "Mas, em todo caso, um sujeito que está sempre em busca de oportunidade", o que, "corresponde muito bem ao sujeito do mercado, tal como se busca produzir hoje" (Cf. LEBRUN, 2001), cujo modelo é o homossexual. E, coisa sinistra, as pessoas dizem: "É preciso ser flexível". Sim, é preciso saber dobrar a espinha, colocar-se de quatro, concordar com a nova forma de servidão para que ela seja, diria Etienne de La Boétie, "Servidão voluntária". Mas, esse sujeito flexível, modelar, também, continua Lebrun, está em busca incessante de alguma coisa que lhe dê gravidade, que lhe dê amarras, que lhe dê apoio, e, assim, "ele embarca numa corrida desenfreada atrás de uma identidade. E evidentemente, não consegue encontrá-la. Pois quanto mais a procura à sua frente, mas ele se afasta de onde ela poderia estar apoiada às suas costas. Não é mais um sujeito organizado como era o da neurose de ontem, da neurose freudiana, da neurose que conhece recalque. Justamente pela perda que o recalque vinha lembrar maneira incessante, podemos dizer. Ao contrário, é um sujeito que hoje denega. Ele está organizado pela denegação. Ele não quer escolher, ele quer ser hetero, plural, múltiplo. Compreendeu bem que escolher significa assumir, ter responsabilidade, aceitar a perda do que não escolhe. Ele não está habituado a ter que perder, a ser responsável etc. Assim, ele se opõe mesmo a ter que escolher. É um sujeito que, nesse caso, nesse contexto, é paradoxalmente um adulto bastante curioso. Porque não é realmente um adulto, é antes uma criança grande. Há um texto de Lacan (...) que fala – a partir de uma observação de André Malraux em suas memórias, em que ele dizia não haver mais grandes pessoas hoje – do mundo da criança generalizado, a propósito de nosso mundo" ( Cf. LEBRUN, 2001). Um mundo, portanto, de pessoas, homens e mulheres, perversas e polimorfas. É preciso, então, muito cuidado ao conceder direitos como se fossem remédios alopáticos para diagnósticos sociológicos equivocados e decisões jurídicas intempestivas...


CONCLUSÃO

Foucault, enquanto profeta anunciou que "o século XXI será deleuziano". Ledo engano! O século XXI será sadiano. E veremos vagar em todas as cidades do mundo os personagens saídos das páginas de "120 dias de Sodoma" e da "A marquesa de Ganges", etc. do Marquês de Sade, os da "História do Olho" de Georges Bataille entre outros personagens igualmente perversos e polimorfos, ou mais... A arte reinventa a vida. Quem viver verá! A imagem é hiperbólica, é verdade, mas, infelizmente, já desponta, aqui e ali, lá e acolá, como reais e muitas já se revelam nos jornais, por enquanto, como caso de polícia, e muitos outros, não mais. É que "uma vez que o Estado não se intromete mais na intimidade dos cidadãos (...), todas as práticas perversas entre adultos consentâneos são agora autorizadas" (ROUDINESCO, 2008). A família torna-se desnecessária e, mesmo, supérflua, mas sempre um empecilho. Tal qual e tanto quanto o casamento é bom que não exista, e se existir, que seja em simulacro (na forma líquida, nômade e espectral) E quando todos os valores estiverem no lixo; o campo estará livre! E tudo será direito. -- WALTER AGUIAR VALADÃO, Venda Nova do Imigrante, ES, Nov/Dez, 2011.


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Autor

  • Walter Aguiar Valadão

    Professor universitário. Bacharel em História (UFES). Pós-Graduado "lato sensu" em Direito Público (UFES). Mestre em Direito Internacional pela UDE (Montevidéu, Uruguai). Editor dos Cadernos de Direito Processual do PPGD/UFES.

    Textos publicados pela autora


Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VALADÃO, Walter Aguiar. A desordem do discurso jurídico. Reflexões intempestivas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3126, 22 jan. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20902. Acesso em: 25 abr. 2024.