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A inconstitucionalidade do IPTU progressivo cobrado pelo Município de Piracicaba

A inconstitucionalidade do IPTU progressivo cobrado pelo Município de Piracicaba

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O proprietário de bem imóvel em Piracicaba pode recorrer ao Judiciário para requerer a restituição do IPTU de 2008 e 2009, eis que inconstitucional a progressividade de alíquotas instituída por lei municipal. Isso vale também para leis de alguns outros municípios.

1. Introdução

O Sistema Tributário Nacional tem seu delineamento iniciado a partir do próprio Texto Constitucional promulgado em outubro de 1988, impondo ao legislador infraconstitucional a observância das normas e princípios tributários ali inseridos, sob pena de incidir em vício de inconstitucionalidade.

A Constituição Federal de 1988, como é cediço, não cuidou de “criar” impostos, mas tão somente de outorgar competência aos entes federativos para realizar a sua instituição por meio do veículo adequado (lei), em respeito ao princípio da legalidade tributária contido no inciso I do art. 150 do Diploma Máximo.

A discriminação rígida das competências tributárias culminou por permitir aos municípios a instituição de imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana – IPTU, nos termos do art. 156, I, assim redigido:

Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:

I - propriedade predial e territorial urbana.

Assim, cabe ao legislativo municipal a instituição da regra-matriz do tributo, com a especificação de seus critérios material, temporal, espacial, quantitativo e pessoal, por meio, é claro, da lei.

Foi o que fez a Câmara dos Vereadores do Município de Piracicaba/SP, ao editar a Lei Municipal nº 3.264 de 21 de dezembro de 1990 (Código Tributário Municipal), no qual instituiu os tributos de sua competência.

Esta lei, no entanto, previu que as alíquotas a serem aplicadas para o IPTU variariam de acordo com o valor venal do imóvel, que corresponde à base de cálculo do gravame, ou seja, quanto maior o valor venal do imóvel, maior seria a alíquota a ser aplicada e, consequentemente, maior seria o valor do IPTU.

Esta prática, até o ano de 2000 era flagrantemente inconstitucional, inclusive com pronunciamento do STF – Supremo Tribunal Federal.

Este breve texto, tem por objetivo demonstrar as razões da inconstitucionalidade e a possibilidade não só de recuperação do valor pago a maior pelos contribuintes, mas também a diminuição de valores que estejam sendo cobrados pelo Fisco em execução fiscal.


2. A progressividade no tempo

O texto original da Constituição de 1988 previu no §1º do art. 156, a possibilidade de que o IPTU fosse progressivo, visando assegurar o cumprimento da função social da propriedade. Este dispositivo guardava consonância com o art. 182, §4º, II, da Lei Maior de 1988, que também chancelou a progressividade do IPTU no tempo, a fim de obrigar o proprietário de imóvel mal utilizado a promover o seu adequado aproveitamento, vejamos:

Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes.

§ 4º - É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de:

I - parcelamento ou edificação compulsórios;

II - imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo;

III - desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais. (destacamos)

Permitiu-se a utilização do IPTU progressivo no tempo, como forma de forçar o proprietário a utilizar seu imóvel em consonância com sua função social, certo que, persistindo a inércia, estaria sujeito à desapropriação do bem. O tributo, portanto, teria um viés sancionatório, voltado ao resguardo do meio ambiente artificial.

Esta, portanto, era a única progressividade aceita pela Constituição da República de 1988, restando vedada qualquer possibilidade de progressividade fiscal do IPTU em razão do valor do imóvel.

A Lei Municipal nº 3.264/1990, no entanto, previu, em seus arts. 12 e 40, uma progressividade em razão do valor venal do imóvel, sem qualquer respaldo constitucional, o que torna o pagamento do IPTU em alíquotas diferenciadas inconstitucional.


3. A Progressividade Fiscal Do IPTU e a EC nº 29/2000

Conforme mencionado em tópico precedente, a Carta Magna de 1988 não previu a possibilidade de que o IPTU pudesse ter alíquotas variadas de acordo com o valor venal do imóvel, o que tornava inconstitucionais as leis municipais que traziam esta previsão.

Outrossim, como já mencionamos, os arts. 12 e 40 da Lei Municipal nº 3.264/1990 previu justamente a progressividade fiscal, sem respaldo constitucional, nos seguintes temos:

Artigo 12 – A base de cálculo do imposto sobre a propriedade territorial urbana é o valor venal do imóvel.

§1º. O montante do imposto será apurado aplicando-se sobre o valor venal do imóvel , compreendido nas classes abaixo discriminadas, as seguintes alíquotas:

CLASSE DE VALOR VENAL (Cr$)

ALÍQUOTA (%)

De 1,00 a 5.000,00

2,0

De 5.000,01 a 10.000,00

2,2

De 10.000,01 a 20.000,00

2,5

De 20.000,01 a 40.000,00

2,8

De 40.000,01 a 70.000,00

3,2

De 70.000,01 a 140.000,00

3,6

De 140.000,01 a 250.000,00

4,0

De 250.000,01 a 400.000,00

4,5

De 400.000,01 a 600.000,00

5,0

Acima de 600.000,01

5,5

O contribuinte, portanto, estaria sujeito a alíquotas que poderiam variar de 2,2% a 5,5%, tudo a depender do valor venal de seu imóvel, discriminado na planta genérica de valores divulgada pelo município.

Importante notar que o art. 40, §1º, da mesma Lei Municipal ao regulamentar o Imposto sobre a propriedade predial, também trouxe alíquotas progressivas.

A progressividade de alíquotas tinha como suposto fundamento o princípio da capacidade contributiva, insculpido no §1º do art. 145 da Carta Magna de 1988, que dispõe:

Art. 145. (…)

§ 1º - Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte. (g.n.)

O princípio da capacidade contributiva, corolário do princípio da igualdade, impõe ao legislador que os impostos dirijam-se às condições pessoais do contribuinte e possam ser graduados de acordo com a sua capacidade econômica. Isso quer dizer, em linhas resumidas, que quanto maior for a riqueza do contribuinte, maior deve ser a sua tributação  e, ao contrário, quanto menor a sua riqueza, menor deve ser a tributação sofrida.

Com esta ideia, o princípio da capacidade contributiva busca conferir igualdade e isonomia aos contribuintes, lembrando que a igualdade, nada mais é do que “tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais na medida em que eles se desigualam”.

O IPTU, contudo, é um imposto real, que ao contrário dos impostos pessoais, não levam em consideração as condições particulares do contribuintes, mas a própria matéria tributável. No caso do IPTU, a matéria tributável é o próprio imóvel.

A tese desenvolvida, portanto, foi no sentido de que não se poderiam aplicar alíquotas progressivas em razão do valor venal do imóvel, eis que não se aplicaria o princípio da capacidade contributiva, dado justamente o seu caráter de imposto real.

Este sempre foi o posicionamento do STF, conforme julgado abaixo transcrito:

IPTU. Progressividade.

- No sistema tributário nacional é o IPTU inequivocamente um imposto real.

- Sob o império da atual Constituição, não é admitida a progressividade fiscal do IPTU, quer com base exclusivamente no seu artigo 145, § 1º, porque esse imposto tem caráter real que é incompatível com a progressividade decorrente da capacidade econômica do contribuinte, quer com arrimo na conjugação desse dispositivo constitucional (genérico) com o artigo 156, § 1º (específico).

- A interpretação sistemática da Constituição conduz inequivocamente à conclusão de que o IPTU com finalidade extrafiscal a que alude o inciso II do § 4º do artigo 182 é a explicitação especificada, inclusive com limitação temporal, do IPTU com finalidade extrafiscal aludido no artigo 156, I, § 1º.

- Portanto, é inconstitucional qualquer progressividade, em se tratando de IPTU, que não atenda exclusivamente ao disposto no artigo 156, § 1º, aplicado com as limitações expressamente constantes dos §§ 2º e 4º do artigo 182, ambos da Constituição Federal. Recurso extraordinário conhecido e provido, declarando-se inconstitucional o sub-item 2.2.3 do setor II da Tabela III da Lei 5.641, de 22.12.89, no município de Belo Horizonte.[1] (g.n.)

Em 13 de setembro de 2000, foi aprovada a Emenda Constitucional nº 29, que modificou a redação do §1º do art. 156, da Lei Maior de 1988, passando a permitir a progressividade fiscal do IPTU, bem como alíquotas diferenciadas de acordo com a localização e o uso do imóvel:

Art. 156. (…)

§ 1º Sem prejuízo da progressividade no tempo a que se refere o art. 182, § 4º, inciso II, o imposto previsto no inciso I poderá:

I - ser progressivo em razão do valor do imóvel; e

II - ter alíquotas diferentes de acordo com a localização e o uso do imóvel. (destacamos)

Os ataques à EC nº 29/2000 continuaram sob os mesmos fundamentos acima transcritos, todavia, o STF passou a entender que, após a edição desta modificação no Texto Constitucional, a progressividade seria plenamente viável.

Os reiterados entendimentos, ademais, culminaram na edição da Súmula nº 668, assim redigida:

É inconstitucional a Lei Municipal que tenha estabelecido, antes da Emenda Constitucional 29/2000, alíquotas progressivas para o IPTU, salvo se destinada a assegurar o cumprimento da função social da propriedade urbana.

Assim, as Leis Municipais que tenham estabelecido a progressividade de alíquotas em função do aumento do valor venal do imóvel antes da Emenda Constitucional nº 29/2000, eram tidas por inconstitucionais, em consonância com a jurisprudência do STF.

Após a EC nº 29/2000, passou-se a permitir a dita progressividade, desde que fosse editado um novo veículo normativo municipal. Quer dizer que as leis promulgadas antes desta modificação constitucional continuaram inválidas e sujeitas à declaração de inconstitucionalidade.

Isto se deve ao fato de nosso ordenamento jurídico não permitir a chamada constitucionalização superveniente, ou seja, modificação constitucional posterior à uma lei inconstitucional não tem o condão de torná-la constitucional, o que impõe a revogação deste diploma e a aprovação de um novo, conformando-o à ordem constitucional.

O STF também já reconheceu esta impossibilidade, veja-se:

CONSTITUCIONALIDADE SUPERVENIENTE - ARTIGO 3º, § 1º, DA LEI Nº 9.718, DE 27 DE NOVEMBRO DE 1998 - EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 20, DE 15 DE DEZEMBRO DE 1998. O sistema jurídico brasileiro não contempla a figura da constitucionalidade superveniente.

TRIBUTÁRIO - INSTITUTOS - EXPRESSÕES E VOCÁBULOS - SENTIDO. A norma pedagógica do artigo 110 do Código Tributário Nacional ressalta a impossibilidade de a lei tributária alterar a definição, o conteúdo e o alcance de consagrados institutos, conceitos e formas de direito privado utilizados expressa ou implicitamente. Sobrepõe-se ao aspecto formal o princípio da realidade, considerados os elementos tributários.

CONTRIBUIÇÃO SOCIAL - PIS - RECEITA BRUTA - NOÇÃO - INCONSTITUCIONALIDADE DO § 1º DO ARTIGO 3º DA LEI Nº 9.718/98. A jurisprudência do Supremo, ante a redação do artigo 195 da Carta Federal anterior à Emenda Constitucional nº 20/98, consolidou-se no sentido de tomar as expressões receita bruta e faturamento como sinônimas, jungindo-as à venda de mercadorias, de serviços ou de mercadorias e serviços. É inconstitucional o § 1º do artigo 3º da Lei nº 9.718/98, no que ampliou o conceito de receita bruta para envolver a totalidade das receitas auferidas por pessoas jurídicas, independentemente da atividade por elas desenvolvida e da classificação contábil adotada.[2] (g.n.)

Este é o caso da Lei Municipal de nº 3.264/90 do Município de Piracicaba/SP. Mesmo após a decisão do STF, o fisco municipal piracicabano continuou a valer-se da progressividade fiscal do IPTU estabelecida nos arts. 12 e 40, sujeitando proprietários de imóveis urbanos da cidade à alíquotas de até 5,5%.

De acordo com as decisão do STF de vedar até a EC nº 29/2000 a tributação pelo IPTU em alíquotas progressivas, os contribuintes piracicabanos deveriam recolher o tributo sob a alíquota mínima de 2,0%. Os valores eventualmente pagos a maior caracterizam pagamento indevido de tributo, o que enseja a repetição do indébito.

Note-se que o Poder Legislativo não corrigiu o vício demonstrado até o ano de 2008, quando foi promulgada a Lei Complementar nº 224/2008 em 13 de novembro de 2008, valendo apenas para o exercício de 2009


4. A Lei Complementar nº 224/2008 em face da anterioridade tributária

A Lei Complementar nº 224/2008, entrou em vigor na data de sua publicação, considerando aqui o dia 13.11.2008, no entanto, em relação à progressividade instituída, que culminou na majoração de alíquotas do IPTU, somente poderia produzir efeitos para o exercício de 2010.

A Constituição Federal de 1988, não obstante tenha outorgado competência ao legislador infraconstitucional para a instituição de tributos, também criou limitações ao poder de tributar, que consubstanciam garantias fundamentais do contribuinte, não sendo passíveis de modificação ou supressão, eis que verdadeiras cláusulas pétreas (art. 60, §4º, IV).

Dentre as limitações ao poder de tributar, encontra-se a impossibilidade de se cobrar tributos no mesmo exercício em que a lei que aumentou o tributo tenha sido publicada, bem como antes de decorridos 90 (noventa) dias da data em que haja sido publicada a lei do tributo.

São os princípios da anterioridade anual e nonagesimal, previstos nas alíneas “a” e “c” do inciso III do art. 150:

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

III - cobrar tributos:

(...)

b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou;

c) antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou, observado o disposto na alínea b. (destacamos).

A alínea “c” foi acrescentada pela Emenda Constitucional nº 42/2003, determinando que sua aplicação se dê conjuntamente com a alínea “b”, que cuida da anterioridade anual.

Existem exceções a estes princípios, previstas no §1º do art. 150, dentre as quais não se encontra a majoração de alíquotas do IPTU. É certo que a modificação da base de cálculo deste tributo não se submete à anterioridade nonagesimal, o que não é o caso em estudo.

A progressividade fiscal trazida pela Lei Complementar Municipal nº 224/2008, evidentemente acarretou aumento de alíquota para grande parte dos contribuintes, sujeitando as alterações em questão aos princípios constitucionais em estudo.

A aplicação das alíneas “b” e “c” deve ser cumulativa. Assim, o tributo não pode ser cobrado no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que o aumentou e também deve ser respeitado o período de 90 (noventa) dias, contados da publicação do veículo normativo. Prevalece a data que for mais distante.

No caso da LC nº 224/2008, promulgada em 13.11.2008, temos que, projetando a incidência da norma para o exercício seguinte (01.01.2009) e após o 91º (nonagésimo primeiro) dia de sua publicação (aproximadamente 12.02.2009), certamente prevalece a segunda data.

Por força do disposto no parágrafo único do art. 121 da LC nº 224/2008 (com redação idêntica a do parágrafo único do art. 6º da Lei nº 3.264/90), delimitou-se que o critério material do IPTU seria a propriedade, o domínio útil ou a posse de terreno localizado na zona urbana do Município, considerando-se ocorrido “em 1º de janeiro de cada ano, para todos os efeitos legais”.

Assim, pela regra da anterioridade tributária, a progressividade de alíquotas instituída pela LC nº 224/2008 somente poderia ser aplicada a partir do exercício de 2010. Pretender a sua aplicação para o exercício de 2009 configuraria violação ao princípio da anterioridade.


5. Prazo prescricional para a repetição do indébito

O prazo prescricional para se solicitar a restituição de tributo pago indevidamente ou a maior é regulamentado pelo CTN – Código Tributário Nacional, nos termos do art. 165, I combinado com o art. 168, I:

Art. 165. O sujeito passivo tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial do tributo, seja qual for a modalidade do seu pagamento, ressalvado o disposto no § 4º do artigo 162, nos seguintes casos:

I - cobrança ou pagamento espontâneo de tributo indevido ou maior que o devido em face da legislação tributária aplicável, ou da natureza ou circunstâncias materiais do fato gerador efetivamente ocorrido.

(…)

Art. 168. O direito de pleitear a restituição extingue-se com o decurso do prazo de 5 (cinco) anos, contados:

I - nas hipótese dos incisos I e II do artigo 165, da data da extinção do crédito tributário;

A extinção do crédito tributário, no caso do IPTU, se dá com o seu pagamento, nos termos do art. 156, I, do CTN, fluindo, a partir desta data, o prazo prescricional.

Há, portanto, a possibilidade de se recuperar IPTU pago a maior do exercício de 2008 e 2009, eis que os exercícios anteriores encontra-se fulminados pela prescrição. De qualquer forma, se o contribuinte pagou IPTU à uma alíquota de 5,5%, poderá obter, judicialmente, a devolução do equivalente a 3,5%, por exemplo.

Por exemplo: se o contribuinte possui imóvel cujo valor venal corresponde a R$ 1.000.000,00, no ano de 2008, pagou o IPTU sob a alíquota máxima de 5,5%, ou seja, R$ 55.000,00 (cinquenta e cinco mil reais). Medida judicial cabível poderá reduzir a alíquota para o mínimo legal (2%), permitindo recuperação da quantia equivalente a 3,5% (valor que excede à alíquota mínima), resultando em economia de R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais).


6. Redução dos créditos tributário de IPTU cobrados em execução fiscal

Conquanto já não seja mais possível recuperar o IPTU pago nos exercícios anteriores ao ano de 2008, ainda assim é possível que o contribuinte possa obter em juízo uma redução do passivo tributário quanto às execuções fiscais em trâmite.

O IPTU é tributo sujeito ao lançamento de ofício, cabendo a autoridade administrativa verificar a ocorrência do fato jurídico tributário, apurar o valor devido e, se o caso, aplicar a penalidade cabível. O ato administrativo de lançamento, portanto, constitui o crédito tributário e é notificado ao contribuinte.

Inadimplido o tributo, a Fazenda Municipal inscreve o débito em dívida ativa, extrai um título executivo extrajudicial denominado “Certidão de Dívida Ativa” e busca a satisfação de seu crédito tributário por meio de execução fiscal.

Ocorre que, como já demonstrado, o Município de Piracicaba, desde os idos de 1990, lança o tributo – e, portanto, o calcula – com base na progressividade fiscal estabelecida pela Lei nº 3.264/90, sendo esta prática inconstitucional antes do advento da EC nº 29/2000, como já salientado.

Se o contribuinte deixou de pagar o IPTU e está sofrendo execução fiscal, pode-se opor à cobrança judicial, eis que os lançamentos realizados com base no Código Tributário Municipal são nulos, por se basearem em lei flagrantemente inconstitucional.

Queremos dizer, com isto, que eventual débito tributário sendo cobrado em execução fiscal poderá ser reduzido, se o IPTU foi calculado com base em alíquotas progressivas.

Nesse sentido, trazemos à baila precedente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo:

(...)

Imposto predial e territorial urbano. Exercícios de 1995 a 2002. Progressividade segundo o valor venal do imóvel. Inadmissibilidade. Lei Municipal anterior à Emenda Constitucional 29/00. Progressividade não destinada a assegurar o cumprimento da função social da propriedade. Inteligência da Súmula 668 do Supremo Tribunal Federal. Nulidade dos lançamentos no tocante à parcela progressiva.

(...)[3]

Por exemplo, se o contribuinte está sofrendo execução referente aos exercícios de 2008, 2007 e 2006, sendo que o valor venal do imóvel neste período sofreu tributação às alíquotas de 5,5%, caberá pedido para que seja declarada a nulidade de parte do lançamento realizado pela Fazenda Municipal determinando-se seja realizado um novo cálculo, com base na alíquota mínima de 2,0%.

Estas medidas judiciais, portanto, tem o condão de auxiliar o contribuinte que não efetuou o pagamento do IPTU e está sofrendo ação judicial tendente a cobrá-lo. Da mesma forma que há o direito de receber valores pagos indevidamente, também não pode o contribuinte ser obrigado a pagar tributo que esteja fundamentado em lei flagrantemente inconstitucional.


7. Conclusão

Em conclusão ao exposto, verifica-se que o contribuinte que seja proprietário de bem imóvel na cidade de Piracicaba ainda pode recorrer ao Poder Judiciário para requerer a restituição do IPTU pago nos anos de 2008 e 2009, eis que inconstitucional a progressividade de alíquotas instituída pela Lei Municipal nº 3.264/90.

Isto vale, naturalmente, para leis municipais editadas por outros municípios que estejam em desacordo com a tese exposta.

Ademais, as execuções fiscais que tenham por objeto a cobrança do IPTU inadimplido, podem ser reduzidas, eis que o lançamento tributário realizado pela Fazenda Municipal em desacordo o Texto Constitucional anterior à EC n° 29/2000, impõe a aplicação da alíquota mínima.


Notas

[1]STF – Plenário. Recurso Extraordinário nº 153.771/MG. Rel. Min. Moreira Alves. DJU: 20.11.1996.

[2]STF – Plenário. Recurso Extraordinário nº 390.840-5/MG. Rel. Min. Marco Aurélio. DJU: 09.11.2005.

[3]TJSP – 14ª Câmara de Direito Público. Apelação nº 9108731-35.2003.8.26.0000. Rel. Des. Geraldo Xavier. DJU: 20.10.2011.


Autor

  • José Luiz Crivelli Filho

    José Luiz Crivelli Filho

    Graduado em Ciências Jurídicas pela UNIMEP - Universidade Metodista de Piracicaba. Pós-graduando em Direito Tributário pelo IBET/SP - Instituto Brasileiro de Estudos Tributários. Advogado, sócio da W. Ramos Sociedade de Advogados - Piracicaba/SP. Atuação com ênfase em direito tributário, empresarial, administrativo e bancário.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CRIVELLI FILHO, José Luiz. A inconstitucionalidade do IPTU progressivo cobrado pelo Município de Piracicaba. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3163, 28 fev. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21175. Acesso em: 19 abr. 2024.