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Prazo para requerer isenção do IPVA

Prazo para requerer isenção do IPVA

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O prazo para requerer a primeira isenção do IPVA não está previsto no Código Tributário Nacional, nem na legislação paulista. A Fazenda do Estado de São Paulo, porém, entende que o prazo é de 30 dias após a data de aquisição de veículo novo ou antes do primeiro fato gerador.

1.    Resumo

Qual o prazo para o interessado requerer a primeira isenção do IPVA de veículo de sua propriedade ou posse? Ele não está previsto no Código Tributário Nacional (CTN). Também não está fixado na legislação do IPVA do Estado de São Paulo. A Administração Tributária desse Estado, porém, entende que o interessado deve requerer a isenção em até 30 (trinta) dias após a data de aquisição de veículo novo ou antes da data do primeiro fato gerador do imposto que ocorrer após a aquisição de veículo usado. Por discordar do termo inicial de fruição da isenção fixado pela Administração, não é raro o interessado impetrar mandado de segurança contra ato da autoridade administrativa que deferiu a isenção a partir de exercício posterior ao do pedido ou ao primeiro exercício deste. Apesar da natureza declaratória do ato de concessão de isenção do IPVA, apresentamos razões para o Estado impor prazo para o interessado requerer a isenção, mas desde que o faça por meio de lei.

2.    Palavras-chave

IPVA; isenção; natureza do ato concessivo de isenção; prazo para requerer isenção; condições; requisitos.


3.    Natureza do ato concessivo da isenção tributária

De acordo com Hugo de Brito Machado, em face da natureza declaratória do ato de reconhecimento da isenção, ele deve retroagir à data de ocorrência do fato que seria tributado na ausência da norma de isenção, se naquela data já estavam preenchidas as condições para a fruição do benefício.

Segundo preleção do ilustre jurista:

“o ato administrativo que defere o pedido de isenção tributária apenas reconhece que a norma isentiva incidiu, ou que as condições de fato, anunciadas para futura ocorrência, configuram sua hipótese de incidência, e que, portanto, uma vez concretizadas, ela incidirá. Esse ato administrativo tem, assim, natureza simplesmente declaratória, tal como ocorre com o lançamento tributário. Por isso, se uma norma isentiva incidiu, fez nascer o direito à isenção, de sorte que haverá de ser aplicada aos fatos contemporâneos à sua vigência, ainda que posteriormente modificada ou revogada”.

[...]

“O ato administrativo que defere isenção é, em princípio, meramente declaratório. Assim já entendeu, com razão, o antigo Tribunal Federal de Recursos quando disse ter direito à isenção do imposto de renda a empresa que havia obtido o reconhecimento, pela SUDENE, de que preenchia os requisitos do art. 13, da Lei nº 4.239/1963 algum tempo depois da ação fiscal”.

“Sendo meramente declaratório o ato administrativo que defere isenção, ou reconhece existentes as condições que a lei estabelece para o gozo desta, os seus efeitos retroagem à data dos fatos sobre os quais incidiu a norma isentiva” (MACHADO, 2009, p. 233-234).

Dos trechos transcritos infere-se que: a norma de isenção incide “por força própria”, desde que, na data de ocorrência do fato que seria tributado na ausência daquela norma, estivessem preenchidas as condições para a isenção do tributo; “aplicar” norma isentiva (que já “incidira automaticamente”) é a autoridade administrativa “reconhecer” configuradas naquela data as condições para a isenção (ou seja, que a norma de isenção incidiu) e “declarar” o direito, do sujeito passivo, à isenção do tributo a partir de referida data[1]. De acordo com Becker (1998, p. 306), “a regra jurídica da isenção incide para que a de tributação não possa incidir”. Carvalho (2008, p. 522-523) critica esse entendimento, pois, na dinâmica de atuação das normas, ele não explica por que a norma de isenção tem de incidir antes da de tributação.

A natureza declaratória do ato de concessão de isenção do IPVA foi adotada nos julgamentos, pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, das apelações 994.07.048611-2, 994.09.236637-9, 994.09.265452-2 e 994.08.147921-8, a terceira delas, em ação declaratória de inexistência de relação jurídica, com pedido de tutela antecipada; as demais, em ações mandamentais (disponíveis em:<https://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/consultaCompleta.do> Acesso em: 04/02/2012). Em pesquisa no sítio do Superior Tribunal de Justiça, encontramos apenas a decisão prolatada no AgRg no REsp 1170008 / SP, em que também se entendeu ser de natureza declaratória o ato de concessão de isenção do IPVA (disponível em: <http://stj.jus.br/SCON/> Acesso em: 03/02/2012).

Por essa corrente, o contribuinte pode requerer isenção do IPVA para exercício em que já ocorreu o fato que seria tributado na ausência da norma de isenção. Isso não significa que o prazo para o contribuinte requerer isenção do IPVA seja indeterminado. Na realidade, para cada exercício, ele coincide com o prazo que a Fazenda Pública do Estado ou do Distrito Federal tem para exercer seu direito de crédito. Com efeito, escoado o prazo decadencial sem que a Fazenda tenha lançado o IPVA de determinado exercício, o contribuinte não mais terá interesse jurídico em requerer isenção do IPVA daquele exercício, uma vez que a Fazenda perdeu o direito de lançar o respectivo imposto.


4.    A disciplina das isenções no CTN, para tributo lançado por período certo de tempo

No desenvolvimento do raciocínio, iremos utilizar as seguintes regras do CTN:

“Art. 97. Somente a lei pode estabelecer:

( . . . )

VI - as hipóteses de exclusão, suspensão e extinção de créditos tributários, ou de dispensa ou redução de penalidades.

 . . . ”.

“Art. 176. A isenção, ainda quando prevista em contrato, é sempre decorrente de lei que especifique as condições e requisitos exigidos para a sua concessão, os tributos a que se aplica e, sendo caso, o prazo de sua duração.

 . . . ”.

“Art. 178. A isenção, salvo se concedida por prazo certo e em função de determinadas condições, pode ser revogada ou modificada por lei, a qualquer tempo, observado o disposto no inciso III do art. 104”.

“Art. 179. A isenção, quando não concedida em caráter geral, é efetivada, em cada caso, por despacho da autoridade administrativa, em requerimento com o qual o interessado faça prova do preenchimento das condições e do cumprimento dos requisitos previstos em lei ou contrato para concessão.

§ 1º Tratando-se de tributo lançado por período certo de tempo, o despacho referido neste artigo será renovado antes da expiração de cada período, cessando automaticamente os seus efeitos a partir do primeiro dia do período para o qual o interessado deixar de promover a continuidade do reconhecimento da isenção.

 . . . ” (grifamos).

De acordo com a regra do inc. VI do art. 97 do CTN, isenção (hipótese de exclusão do crédito tributário, segundo a doutrina prevalecente na época em que o Código foi editado – vide inc. I do art. 175) é matéria de lei, o que é confirmado pela norma do caput do art. 176 do Código. Esta norma prevê que condições e requisitos exigidos para a concessão de isenção devem estar especificados em lei. Trata-se de norma de estrutura que prescreve como deve ser produzida norma legal de conduta que especifique “condições” que o interessado deve provar estarem “preenchidas” e “requisitos” que ele deve provar que “cumpriu”, para obter a concessão de isenção de tributo.

Note-se que o legislador distingue o termo “condições” do termo “requisitos”. Na linguagem corrente, eles são usados como sinônimos. Na literatura jurídica, os autores não se preocupam em conceituar de forma precisa cada termo. No entanto, como a lei não contém palavras inúteis, é necessário perquirir o significado que o legislador quis dar a cada termo. O caput do art. 179 do CTN reforça a distinção ao dispor que “condições” devem ser “preenchidas” e “requisitos” devem ser “cumpridos”, o que remete à ideia de que “condições” são situações de fato ou de direito já configuradas (“preenchidas”) no momento em que ocorre o evento[2] cujo relato se subsome ao fato descrito na norma de isenção, enquanto “requisitos” exigem ulterior ação (“cumprimento”) por parte do interessado. Em face disso, elaboramos possíveis construções de sentido para os termos “condições” e “requisitos”.

Note-se ainda que, ao se referir à isenção, o legislador do CTN não adotou terminologia uniforme: usou “concessão” no caput do art. 176; “concedida”, no art. 178; “concedida” e “concessão”, no caput do art. 179; mas “reconhecimento”, no § 1º do art. 179.

A legislação do IPVA do Estado de São Paulo, porém, é mais precisa: o termo “reconhecimento” é usado para as imunidades, enquanto o termo “concessão” é usado para as isenções[3].

De fato, as condições para a imunidade estão previstas na Constituição Federal, não podendo o legislador ordinário especificar condições ou requisitos para a fruição do benefício. Preenchidas as condições previstas na Constituição, deve a autoridade administrativa deferir o pedido do interessado, para “reconhecer” a imunidade da relação de propriedade de seu veículo. No entanto, pode o Estado ou o Distrito Federal, por meio de lei, especificar condições que devem estar preenchidas e requisitos que o interessado deve cumprir, para ter direito à isenção. Preenchidas as condições e cumpridos os requisitos, deve a autoridade administrativa deferir o pedido, para “conceder” a isenção do IPVA, o que equivale a proibir a autoridade administrativa de fazer incidir a regra-matriz do IPVA sobre a relação de propriedade do veículo do interessado.

4.1.    Natureza da isenção do IPVA

Análise das regras do art. 179 do CTN permite concluir que a isenção do IPVA é:

a) relativa ou em caráter específico, visto que concedida por lei mas efetivada mediante despacho da autoridade administrativa;

b) e onerosa ou condicionada, porquanto concedida sob condição que implica ônus para o interessado (MACHADO, 2009, p. 234).

No caput do art. 179 do CTN, o legislador refere-se a “prova do preenchimento das condições e do cumprimento dos requisitos previstos em lei”. São possíveis as seguintes construções de sentido:

a) “condições” são situações de fato[4] ou de direito[5] previstas na lei de isenção, que, em geral, devem estar materializadas (preenchidas) antes de ocorrer o evento que seria tributado na ausência da norma de isenção;

b)“requisitos” são exigências de interesse da Administração que o sujeito passivo deve cumprir para obter a isenção, tais como:

b.1) apresentar documento que comprove o preenchimento de “condição”[6];

b.2) comprometer-se a praticar ato que preenche ou perfaz “condição”[7] ou a não praticar ato que vai de encontro à finalidade da isenção[8];

b.3)requerer a isenção antes do início do prazo para o agente credenciado pelo sistema por no ordenamento jurídico norma individual e concreta de lançamento do tributo.

4.2.    A regra do § 1º do art. 179 do CTN

O caput do art. 179 cuida do despacho de autoridade administrativa, que pode deferir, ou não, pedido de isenção de tributo, apresentado pelo interessado. No caso de impostos lançados por período certo de tempo, como o imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana (IPTU), o imposto sobre a propriedade territorial rural (ITR) ou o imposto sobre a propriedade de veículos automotores (IPVA), o pedido de isenção pode ser o primeiro ou de renovação, para o exercício seguinte, de isenção já em gozo no exercício corrente.

No entanto, o § 1º do art. 179 fixa prazo apenas para a apresentação do pedido de renovação de isenção do imposto para o próximo exercício, nada dispondo sobre o prazo para apresentação do primeiro pedido de isenção de imposto sobre o bem imóvel ou móvel adquirido pelo contribuinte. Com efeito:

a)            se o pedido de concessão de isenção é o primeiro de uma série, o despacho a ele relativo nada renova:

b)            se a isenção ainda não foi deferida, não há despacho que esteja a produzir efeitos jurídicos, de modo que efeito algum pode cessar;

c)            só se pode deixar de promover a continuidade de concessão (reconhecimento, na linguagem adotada pelo CTN) da isenção que está em gozo.

Após analisar a regra do § 1º do art. 179 do CTN, Baleeiro (1999, p. 953-954) elaborou a seguinte construção de sentido:

“Se a isenção é relativa ou de caráter especial, condicionada portanto, e o tributo a que ela se refere está sujeito a lançamento por períodos certos definidos, como o exercício financeiro ou um ano, o beneficiário deverá promover, mediante novo requerimento, antes do fim de cada prazo, a continuidade ou reconhecimento, do benefício legal, pena de este ser considerado extinto automaticamente ao termo daquele prazo”.

[...]

“O art. 179 diz que ‘o despacho referido neste artigo será renovado antes da expiração de cada período, cessando automaticamente os seus efeitos a partir do primeiro dia do período imediato’. Evidentemente, o beneficiário da isenção não poderá ser responsabilizado pela autoridade remissa, negligente ou maliciosa, (sic) que não despachou no prazo, se o requerimento foi apresentado antes de o mesmo esgotar-se”.

Apesar de o Código ter fixado prazo para a autoridade administrativa renovar, para o exercício seguinte, despacho relativo ao reconhecimento de isenção de tributo lançado por período certo de tempo, para que o interessado não seja prejudicado pela inércia da autoridade administrativa, o prazo deve ser entendido como o fixado para o interessado requerer, para o exercício seguinte, a renovação do “reconhecimento” de isenção de que goza no exercício corrente.

Conforme afirmamos, o Código não fixou prazo para o interessado requerer a primeira isenção do IPVA. Pode-se presumir, portanto, que essa faculdade foi deixada ao legislador competente para instituir o tributo.

O sentido, construído por Baleeiro, para a regra do § 1º do art. 179 do CTN foi o fundamento jurídico das decisões prolatadas nos julgamentos, pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, das apelações 990.10.199910-2, 994.08.192702-7 e 994.08.189249-4, todas em ações mandamentais (disponíveis em:<https://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/consultaCompleta.do> Acesso em: 04/02/2012).

No entanto, o entendimento de Baleeiro não é compartilhado por todos os cultores do direito, conforme se vê no texto seguinte:

“O despacho que reconhece o direito à isenção tem, em princípio, natureza meramente declaratória. Assim, mesmo que não tenha sido renovado o pedido, nem o despacho de reconhecimento, e por isto mesmo seja lançado o tributo desconsiderando a isenção, pode o interessado argüi-la utilmente em impugnação ao lançamento. Provará, então, a subsistência das condições e dos requisitos para a isenção”.

“Realmente, o requerimento não passa de forma de exercício do direito à isenção. Direito que decorre sempre da lei e da ocorrência de fato das condições nela previstas para que exista o direito à isenção” (MACHADO, 2005, p. 625).

Se o § 1º do art. 179 do CTN fixa prazo para o interessado apresentar pedido de renovação do “reconhecimento” de isenção do IPVA, não pode a natureza declaratória desse “reconhecimento” tornar “letra morta” a prescrição contida no consequente daquela regra. A observância do prazo, além de lógica, deve ter uma finalidade. A finalidade da regra é, nos termos no disposto no parágrafo único do art. 142 do CTN, obrigar a autoridade administrativa a efetuar o lançamento do imposto, uma vez constatado que o prazo fluiu sem que o interessado tenha recolhido espontaneamente o IPVA devido ou tenha apresentado pedido de renovação do “reconhecimento” da isenção do imposto.

Ante o exposto, escoado o prazo para recolhimento espontâneo do IPVA do exercício sem que o contribuinte tenha efetuado o recolhimento ou apresentado pedido de isenção do IPVA ou de renovação dessa isenção, deve a autoridade administrativa lançar o imposto, sem ter de se preocupar se o contribuinte irá apresentar pedido de “concessão” de isenção do imposto ou de renovação dessa “concessão”.

A sanção pela apresentação de pedido intempestivo de isenção do IPVA é o indeferimento do benefício para o exercício em que a autoridade fiscal efetuou o lançamento do imposto ou, mesmo não o tendo efetuado, não estava impedida de fazê-lo. Se pedido de isenção intempestivo fosse deferido por causa da natureza declaratória do despacho que “reconhece” o direito à isenção, teriam sido inúteis os custos que a Administração teve para lançar o imposto e para fazer tramitar o processo administrativo tributário formado em razão de impugnação ao lançamento, pelo sujeito passivo.

Por tais razões, se o contribuinte apresentar pedido extemporâneo de reconhecimento de isenção do IPVA, deverá a autoridade competente indeferir o pedido para os exercícios cujos fatos jurídicos tributários já ocorreram. Afinal, o prazo não é para o contribuinte cumprir obrigação de interesse da Fazenda, mas sim para ele exercer direito seu (de pedir que a regra-matriz do IPVA não seja incidida sobre a relação de propriedade de seu veículo).

Isenção, entendida como caso de não-incidência da regra-matriz tributária, é mais bem explicada pelo conceito de norma de isenção formulado por Carvalho. Para esse Autor, norma de isenção é de estrutura, enquanto norma de tributação é de conduta. Na norma de estrutura o mandamento atinge outras normas, e não a conduta diretamente considerada. Normas de estrutura regulam a produção de outras normas, a expulsão de norma do sistema e a modificação de regras existentes no sistema (CARVALHO, 2008, p. 524). No caso, a regra de isenção modifica a regra-matriz de incidência ao investir contra um ou mais de seus critérios, mutilando-os parcialmente. Não pode haver supressão total do critério, pois a regra-matriz não mais poderia ser incidida e assim produzir efeitos jurídicos. O que a regra de isenção faz “é subtrair parcela do campo de abrangência do critério do antecedente ou do consequente” (CARVALHO, 2008, p. 525). A mutilação de parte de critério da regra-matriz não a extingue, mas é um comando para que a autoridade administrativa não faça incidir a regra-matriz sobre a situação prescrita no consequente da regra de isenção.

Considerada como “de estrutura”, a norma de isenção tem como antecedente o fato da existência da regra-matriz de incidência tributária (norma de conduta) no ordenamento em vigor, e como “consequente” o comando modificativo que subtrai parcela do campo de abrangência de critério do antecedente ou do consequente da regra-matriz (CARVALHO, 2008, p. 524-525). No entanto, para Lunardelli (1999, p. 75), o fato-tipo isento está na “hipótese” da norma de isenção. O Autor dissente de seu mestre (Paulo de Barros Carvalho), pois entende a norma de isenção como “de conduta”. No critério material da hipótese dessa norma, também formado por um verbo pessoal e por seu complemento, há uma conduta-tipo, com suas coordenadas abstratas de tempo e de espaço (critérios temporal e espacial); no consequente, a relação jurídica de isenção (com critério pessoal), prescrevendo o dever subjetivo do fisco (agora como sujeito passivo) de não exigir prestação pecuniária, igual ao produto de uma base de cálculo por uma alíquota[9] (critério quantitativo), e o correspectivo direito subjetivo do contribuinte (agora como sujeito ativo) de não ser exigido (LUNARDELLI, 1999, p. 75-76, 94-95)[10]. Ambas as conceituações da norma de isenção resultam no mesmo efeito jurídico: a regra-matriz tributária não poder ser incidida sobre o fato isento.

Em face do disposto no caput do art. 176 e no caput do art. 179, ambos do CTN, ao analisar pedido de isenção de tributo, a autoridade administrativa deverá verificar se: na data de ocorrência do evento que seria tributado na ausência da norma de isenção, estavam preenchidas as condições (especificadas em lei) para a concessão da isenção; o interessado cumpriu os requisitos (especificados em lei) para a concessão, com especial atenção para a data em que o pedido foi apresentado. Preenchidas as condições e cumpridos os requisitos, a isenção deve ser declarada a partir da data do evento cujo relato se subsome ao fato descrito na norma de isenção.

4.3.    Do procedimento para requerer isenção do IPVA de veículo no Estado de São Paulo

De acordo com o magistério de Machado (2009, p. 233), a regra do § 1º do art. 179 do CTN parece aplicar-se somente “aos casos de isenção concedida em função de condições especiais cuja continuidade deva ser comprovada periodicamente”.

Em caso de isenção subjetiva[11] do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana (IPTU) ou do imposto sobre a propriedade territorial rural (ITR), é mais estável a mantença de condição para a continuidade da isenção, visto que são menos frequentes as mudanças de titularidade do bem imóvel. No caso de isenção subjetiva do IPVA, porém, é menos estável a mantença de condição para a continuidade da isenção, visto que são bem mais frequentes as mudanças de titularidade do veículo automotor.

Durante a vigência da Portaria CAT 12, de 17/03/1988, a Fazenda Pública do Estado de São Paulo exigia pedido de renovação anual da concessão de isenção do IPVA. Não exigia que o interessado renovasse o pedido de concessão de isenção para o próximo exercício antes de ocorrer o respectivo fato jurídico tributário, conforme dispõe o § 1º do art. 179 do CTN, mas que ele preenchesse uma guia de recolhimento do IPVA, em 2 vias, e a apresentasse ao órgão competente do DETRAN, na Capital, ou CIRETRAN, no Interior, por ocasião do licenciamento do veículo (caput do art. 4º da Portaria CAT 12/1988). De acordo com o disposto no § 1º do art. 4º, em campos da guia de recolhimento deveria constar: na linha reservada ao “imposto”, a expressão “isento”; na linha reservada à “multa”, o número do processo em foi concedida a isenção do IPVA; na linha reservada ao “total”, o motivo legal da isenção do IPVA (o inciso do art. 2º da citada Portaria)[12]. O procedimento era adequado porque, durante a vigência da Portaria CAT-12/1988, a Administração não efetuava o lançamento no mesmo exercício em que o IPVA devia ser recolhido espontaneamente.

Com a edição da Portaria CAT 39, de 07/05/1996, que revogou a Portaria CAT 12/1988, deixou a Fazenda de exigir a renovação anual da concessão de isenção do IPVA, de modo que o benefício fiscal passou a ser automaticamente estendido aos próximos exercícios, exceto na hipótese de pedido de “baixa” da isenção ou de o fisco apurar que o beneficiário deixou de preencher condição.

Na realidade, a Administração presume que o alienante de veículo com isenção do IPVA terá interesse em requerer a “baixa” da isenção. A razão é simples: se ele não fornecer os dados necessários à alteração no Cadastro de Contribuintes do IPVA – o que hoje equivale a comunicar a alienação do veículo ao DETRAN[13] – no prazo de 30 (trinta) dias, responderá como responsável solidário pelo pagamento do imposto e acréscimos legais, em relação aos fatos jurídicos tributários ocorridos entre o momento da alienação e o do conhecimento desta pela autoridade responsável (inc. II do art. 6º da Lei 13.296/2008[14], combinado com o § 2º do artigo).

Note-se que:

a)            há novo fato jurídico tributário do IPVA na data em que deixa de ser preenchida condição que tiver dado causa à isenção[15];

b)            verificado que o adquirente do veículo não preenche as condições exigidas para a isenção que estava em gozo, o imposto deverá ser recolhido no prazo de 30 (trinta) dias contados da data da ocorrência do novo fato jurídico tributário (art. 16 da Lei), sendo que no exercício da aquisição o imposto será calculado de forma proporcional ao número de meses restantes do ano civil, incluído o mês da aquisição do veículo (artigo 11 da Lei).

A Portaria CAT 56[16], de 21/08/1996, revogou a Portaria CAT 39/1996. Embora alterada por portarias posteriores, a Portaria CAT 56/1996 ainda está vigente para as disposições que não forem incompatíveis com as da Lei 13.296/2008, que revogou a Lei 6.606/1989, e com as do Decreto 56.561/2010, que disciplina a concessão de isenção do IPVA nas hipóteses em que especifica.

A Portaria CAT 58, de 03/07/1997, alterou o art. 1º das Disposições Transitórias da Portaria CAT 56/1996, produzindo efeitos a partir de 24/08/1996, ou seja, desde a data de publicação desta portaria. Segundo o art. 1º, os termos da Portaria CAT 56/1996 aplicam-se aos pedidos apresentados a partir de sua publicação, ainda que relativos a exercícios anteriores. Em outras palavras: estava permitida a concessão de isenção para exercícios anteriores ao de apresentação do pedido.

Algumas Delegacias Regionais Tributárias do Estado de São Paulo passaram então a conceder isenção com data retroativa, até que, por volta de 2004, a Administração Tributária passou a adotar os seguintes critérios para conceder a isenção do IPVA de veículo:

a)            novo: no exercício da aquisição, se o pedido for protocolado dentro do prazo de 30 (trinta) dias, contados da data de emissão da Nota Fiscal; fundamento: é de 30 (trinta) dias contados da data de emissão da Nota Fiscal relativa à aquisição do veículo o prazo para recolher todo o IPVA (inc. I do art. 22 da Lei 13.296/2008) ou a primeira parcela deste (§ 2º do mesmo artigo);

b)            usado: em exercício subsequente ao de aquisição, se o pedido for protocolado antes da data do fato jurídico tributário relativo àquele exercício; fundamento: de acordo com a regra do § 1º do art. 179 do CTN, a isenção só pode ser concedida para fatos geradores que ocorrerem após a data de protocolização do pedido; note-se, porém, que se o veículo for adquirido poucos dias antes do último do exercício, o prazo para apresentação de pedido de isenção do IPVA para o exercício seguinte será muito curto, o que é mais uma razão para se adotar o prazo que propomos em “a.1”, da letra “a”, do subitem 5.4.

4.4.    Primeiro requerimento de isenção do IPVA para o veículo

Na época de cada pedido relativo a decisão citada no subitem 4.2, a Fazenda do Estado não mais exigia renovação de isenção do IPVA para o exercício seguinte. Logo, os interessados pediram isenção para mais de 1 (um) exercício e não renovação de “reconhecimento” de isenção. Mesmo assim, os relatores aplicaram a regra do § 1º do art. 179 do CTN. Talvez tivessem utilizado o seguinte raciocínio: ainda que houvesse isenção para o primeiro exercício do pedido, a concessão de isenção não poderia ser renovada para exercício subsequente, porque já havia ocorrido o respectivo fato jurídico tributário; ora, se para exercício subsequente ao primeiro do pedido, mais recente, não se poderia renovar a concessão de isenção em face da intempestividade do pedido, com mais razão não se pode conceder isenção do IPVA para exercício anterior àquele, no caso o primeiro do pedido.

Note-se que, na hipótese da regra do § 1º do art. 179 do CTN está implícito que o interessado deve ser contribuinte do IPVA antes de ocorrer o fato jurídico tributário do exercício (ou do primeiro exercício) objeto do pedido, o que poderá não acontecer em alguns casos, conforme veremos.

Com efeito, se o veículo adquirido for novo, o fato jurídico tributário ocorrerá na data de sua primeira aquisição pelo consumidor (inc. II do art. 3º da Lei 13.296/2008), de modo que não faz sentido este apresentar pedido de isenção de IPVA de veículo antes de adquiri-lo. Antes da aquisição, o interessado não é contribuinte do imposto (por interpretação a contrario sensu da regra do caput do art. 5º da Lei). Conforme se sabe, o fato descrito no antecedente da norma geral e abstrata (ou a construção de sentido que o intérprete faz desse fato) tem de estar no campo do possível, pois não faz sentido a norma regular eventos que jamais irão ocorrer no mundo real-social.

Se o veículo adquirido for usado, haverá duas hipóteses: ele não era isento do IPVA; ou já era isento, em função de condição pessoal de seu anterior proprietário (isenção subjetiva). Na primeira hipótese, o pedido de isenção será para o próximo exercício e seguintes; para o exercício atual ou anterior a este, o interessado deveria ter verificado se o veículo apresentava débito do IPVA, uma vez que, se adquirisse veículo nessa condição, seria responsável solidário pelo pagamento do imposto e acréscimos legais (nos termos do que dispõe o inc. I do art. 6º da Lei 13.296/2008, combinado com o § 2º do artigo). Além disso, sem o pagamento do IPVA devido, o adquirente não poderia licenciar o veículo.

Se o veículo já era isento do IPVA, em face da “baixa” de isenção, que deve ser solicitada pelo alienante, o adquirente teria de requerer nova isenção do IPVA para o período restante do exercício fiscal e para os exercícios seguintes. De fato, com a alienação de veículo com isenção subjetiva do IPVA deixa de ser preenchida condição que tinha dado causa a isenção, ocorrendo novo fato jurídico tributário do IPVA no mesmo exercício (inc. V do art. 3º da Lei). Mais uma vez, não faz sentido o interessado apresentar pedido de isenção de IPVA de veículo antes de adquiri-lo. Antes da aquisição, o interessado não é contribuinte do imposto.


5.    Estabelecimento de requisitos para se requerer isenção de imposto

Diversamente do que ocorre com a imunidade, o legislador ordinário pode especificar condições e requisitos para a concessão de isenção.

5.1.    Estabelecimento de prazo

O legislador pode estabelecer prazo para que o interessado apresente o pedido de isenção a que entende ter direito. Trata-se de requisito que o interessado deve cumprir. No entanto, esse prazo tem de estar previsto em lei e não em norma geral e abstrata infralegal. Com mais razão, não pode o interessado ter ciência do prazo apenas na motivação do ato administrativo que indeferiu seu pedido. Por mais lógicos e justos que sejam os argumentos expendidos pela autoridade, eles não serão jurídicos, porquanto o prazo não está prescrito no consequente de norma geral e abstrata.

5.2.    Estabelecimento de requisito não específico para o IPVA

Lei ordinária editada por Estado ou pelo Distrito Federal pode estabelecer requisito genérico para a concessão de isenção de tributo estadual ou distrital.

Por exemplo, a Lei do Estado de São Paulo 12.799[17], de 11/01/2008, que dispõe sobre o Cadastro Informativo dos Créditos não Quitados de órgãos e entidades estaduais – CADIN ESTADUAL – e dá outras providências, no inc. IV do art. 6º, exige que órgãos e entidades da administração direta e indireta consultem o CADIN ESTADUAL, para conceder incentivos fiscais e financeiros. A existência de registro em referido Cadastro constituirá impedimento à concessão de incentivo fiscal ou financeiro (§ 1º do art. 6º).

Incentivos fiscais abrangem as isenções tributárias? Borges (1980, p. 68-69) fala na possibilidade de utilizar a isenção tributária para fins de intervencionismo econômico e social. Nesse caso, a exoneração tributária passa a exercer função regulatória, extrafiscal e intervencionista, de setores da vida social. Utilizadas a serviço de uma política econômico-social (ou seja, como estímulo fiscal), as isenções são denominadas de extrafiscais.

Há extrafiscalidade quando a composição da legislação de um tributo vem pontilhada de providências para prestigiar certas situações, tidas como social, política ou economicamente valiosas, a que o legislador dispensa tratamento mais confortável ou menos gravoso, perseguindo objetivos alheios aos meramente arrecadatórios (CARVALHO, 2008, p. 251-252).

Tanto a isenção de um único veículo utilizado no transporte público de passageiros na categoria aluguel (táxi), de propriedade de motorista profissional autônomo, por ele utilizado em sua atividade profissional (inc. IV do art. 13 da Lei 13.296/2008), quanto a isenção de ônibus ou microônibus empregados exclusivamente no transporte público de passageiros, urbano ou metropolitano, devidamente autorizados pelos órgãos competentes (inc. VI do art. 13), têm por objetivo reduzir o custo e, portanto, o preço do transporte público de passageiros (fins econômico e social). Isenção de um único veículo adequado para ser conduzido por pessoa com deficiência física (inc. III do art. 13) tem por objetivo incentivar o deficiente físico a adquirir veículo a ele especialmente adaptado e dirigi-lo para poder deslocar-se de um ponto a outro (fins econômico e social[18]).

Conforme se vê, várias isenções do IPVA são incentivos fiscais. Por essa razão, a Administração não tem concedido isenção do IPVA a interessado com débito registrado no CADIN ESTADUAL.

5.3.    Fixação de requisito necessário ao preenchimento de condição

Também tem de estar previsto em lei requisito que o interessado deve cumprir a fim de preencher condição necessária à isenção. Por exemplo, na aquisição de veículo automotor novo, para obter isenção de ICMS prevista no art. 19 do Anexo I – Isenções – do RICMS/2000 (Decreto 45.490/2000), deve o interessado preencher duas condições: ser motorista portador de deficiência física, mas apto a dirigir veículo a ele especialmente adaptado; o veículo estar adaptado às suas condições. No entanto, se o veículo não sair de fábrica com as características discriminadas no laudo de perícia médica fornecido pelo DETRAN, a colocação do acessório ou a adaptação necessária deverá ser efetuada por oficina especializada ou por concessionária autorizada.

Requisito que o interessado deve cumprir para preencher a segunda condição é, no prazo de 180 (cento e oitenta) dias, apresentar à repartição fiscal da área de seu domicílio cópia autenticada da Nota Fiscal referente à colocação do acessório ou à adaptação efetuada (alínea “b” do item 2 do § 6º do art. 19).

Note-se que, embora a redação do art. 19 tenha sido dada pelo inc. II do art. 1º do Decreto Estadual 51.639, de 12/03/2007, o texto desta norma é a reprodução do da alínea “b” do inc. II do § 8º da Cláusula primeira do Convênio ICMS 3/2007, que tem força de lei[19].

5.4.    Fixação de prazos para requerer isenção do IPVA

Há razão para a Administração fixar prazos para o interessado requerer isenção do IPVA de determinado veículo? Sim. É que, sem a apresentação do pedido, não tem a Administração como saber se determinado veículo tem ou não direito à isenção, de modo que, vencido o prazo para pagamento espontâneo do imposto sem que o contribuinte tenha efetuado o recolhimento, a autoridade administrativa terá de providenciar o lançamento do imposto. Afinal, não se pode ficar aguardando a boa vontade do interessado em requerer a isenção, se a atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional (parágrafo único do art. 142 do CTN).

Em face de normas da Lei 13.296/2008 abaixo transcritas:

“Art. 16 - Verificado que o beneficiário não preenchia ou deixou de preencher as condições exigidas para a imunidade, isenção ou dispensa, o imposto deverá ser recolhido no prazo de 30 (trinta) dias contados da data da ocorrência do evento, observado o disposto no parágrafo único do artigo 11, e a base de cálculo do imposto será definida em conformidade com os artigos 7º ou 8º, todos desta lei”.

 “Art. 21 - O imposto do veículo usado será devido anualmente na data da ocorrência do fato gerador, e deverá ser pago à vista no mês de fevereiro ou em três parcelas mensais, iguais e consecutivas, vencíveis nos meses de janeiro, fevereiro e março, desde que a primeira seja recolhida integralmente no respectivo vencimento no mês de janeiro e o valor de cada parcela seja equivalente a, no mínimo, 2 (duas) UFESPs do mês do recolhimento.

 . . . ”.

“Art. 22 - O recolhimento do imposto, relativamente a veículo novo, deverá ser efetuado integralmente no prazo de 30 (trinta) dias contados:

I - da data da emissão da Nota Fiscal referente à sua aquisição;

( . . . )

§ 1º - Sobre o valor do imposto recolhido integralmente até o 5º (quinto) dia útil posterior à data da emissão da Nota Fiscal referente à aquisição do veículo novo, ou à data em que o mesmo tenha sido incorporado ao ativo permanente, poderá ser concedido desconto a ser fixado pelo Poder Executivo.

§ 2º - O imposto relativo a veículo novo poderá ser pago em 3 (três) parcelas mensais, iguais e consecutivas, desde que a primeira seja paga no prazo previsto no “caput” deste artigo, vencendo as demais no mesmo dia dos meses subseqüentes ao do vencimento da primeira”;

podemos construir logicamente as seguintes regras com a fixação de prazos para o interessado requerer isenção do IPVA:

a)            aquisição de veículo usado:

a.1)                   sem isenção do IPVA na anterior relação de propriedade: pedido de isenção para o exercício seguinte ao de aquisição deverá ser protocolado até o último dia do mês de fevereiro daquele exercício; fundamento: como a data de vencimento do IPVA para pagamento à vista, sem desconto, é dia de fevereiro que varia de acordo com o final da placa do veículo (caput do art. 21 da Lei 13.296/2008, combinado com o art. 2º do Decreto Estadual 57.517[20], de 11/11/2011), certamente a autoridade administrativa não efetuará o lançamento antes de março do exercício seguinte ao de aquisição;

a.2)                   com isenção do IPVA na anterior relação de propriedade: pedido de isenção para o exercício de aquisição deverá ser protocolado no prazo de 30 (trinta) dias contados da data da aquisição, data em que cessa a isenção (subjetiva) relativa ao anterior proprietário do veículo; fundamento: após esse prazo, se não houver recolhimento do IPVA relativo aos meses restantes do exercício, a autoridade administrativa deverá efetuar o lançamento do IPVA (art. 16 da Lei 13.296/2008, combinado com o art. 11 desta);

b)            aquisição de veículo novo: pedido de isenção para o exercício de aquisição deverá ser protocolado no prazo de 30 (trinta) dias contados da data da emissão da Nota Fiscal referente à aquisição; fundamento: após esse prazo, se não houver recolhimento do imposto ou da primeira parcela deste, a autoridade administrativa deverá efetuar o lançamento do IPVA (inc. I do art. 22 da Lei 13.296/2008, combinado com o § 2º do artigo);

Cada uma dessas regras fixa prazo que o interessado deve observar (requisito que ele deve cumprir, na denominação do CTN), pena de ser negado seu pedido de concessão de isenção do IPVA. Embora lógicas, as regras devem ser postas no ordenamento jurídico por meio de lei ordinária, conforme está prescrito no caput do art. 176 do CTN.

5.5.    Estabelecimento de requisito por norma infralegal

Se contribuinte cumprir requisito para a concessão de isenção do IPVA fixado por norma infralegal, não terá interesse jurídico em questionar o meio pelo qual a norma foi posta no ordenamento. No entanto, se o requisito for prazo para apresentação do pedido de isenção e ele não observá-lo, certamente verá indeferido o pedido para um ou mais exercícios. Inconformado, ele poderá questionar a validade da norma. O inconformismo será maior ainda se o prazo, que deveria estar previsto em norma legal, for indicado apenas na motivação do ato administrativo que indeferiu o pedido.

A Lei do IPVA do Estado de São Paulo (Lei 13.296/2008) não fixa prazo para o interessado requerer isenção do IPVA. O prazo não consta também de diploma normativo infralegal do Estado de São Paulo. Analogamente, leis do IPVA de outros Estados da Federação também não fixam esse prazo, como, por exemplo, a do Rio Grande do Sul (Lei 8.115, de 30/12/1985), a de Santa Catarina (Lei 7.543, de 30/12/1988), a do Paraná (Lei 14.260, de 22/12/2003), a de Minas Gerais (Lei 14.937, de 23/12/2003), a do Rio de Janeiro (Lei 2.877, de 22/12/1997).

Conforme vimos, ações ajuizadas por contribuintes paulistas (mandamentais, em sua maioria) serão favoráveis ora a estes, ora à Fazenda Pública do Estado de São Paulo. Assim, para haver segurança jurídica, os prazos para requerer isenção do IPVA em situações específicas deveriam estar previstos em normas legais, conforme determina a regra do caput do art. 176 do CTN. As razões que a autoridade tem invocado para indeferir pedido de isenção do IPVA para um ou mais exercícios não deveriam estar na motivação do ato administrativo, mas sim na exposição de motivos da lei que fixasse os prazos para o interessado requerer a isenção do IPVA.


6.    Conclusões

A legislação do IPVA do Estado de São Paulo não fixa prazo para o interessado requerer a primeira isenção do IPVA de veículo de sua propriedade ou posse. No entanto, a Administração Tributária somente tem deferido isenção do IPVA: de veículo novo, para o exercício de aquisição, se o pedido foi protocolado até a data de vencimento do IPVA daquele exercício (como se a relação de propriedade fosse normalmente tributada); de veículo usado, com isenção do IPVA na anterior relação de propriedade, para o próprio exercício de aquisição, se o pedido foi protocolado no prazo de 30 (trinta) dias contados da data de aquisição; de veículo usado, sem isenção do IPVA na anterior relação de propriedade, para o exercício seguinte ao de aquisição, se o pedido foi protocolado antes de ocorrer o fato jurídico tributário relativo àquele exercício.

Apesar da natureza declaratória do ato administrativo que concede isenção do IPVA, entendemos que a Administração não só pode mas também deve fixar prazo para o interessado apresentar seu pedido de isenção, sob pena de este ver indeferido o benefício para o(s) primeiro(s) exercício(s) do pedido. Mostramos que a inércia do interessado traz prejuízos à Administração, que, de forma diligente, providencia o lançamento do imposto uma vez constatado o não-recolhimento espontâneo do IPVA pelo contribuinte no prazo previsto, e que tem ainda de arcar com o custo de tramitação do processo administrativo tributário formado em razão de eventual impugnação ao lançamento.

Demonstramos por que são adequados os prazos que a Administração tem exigido para a concessão de isenção do IPVA de veículo novo, para o exercício de aquisição, e de veículo usado, com isenção do IPVA na anterior relação de propriedade, para o próprio exercício de aquisição. No entanto, no caso de veículo usado, sem isenção do IPVA na anterior relação de propriedade, demonstramos não haver prejuízo à Fazenda do Estado se o termo final do prazo para requerer isenção do IPVA para o exercício seguinte ao de aquisição for o último dia do mês de fevereiro daquele exercício.

Não obstante a Administração tenha boas razões para fixar prazos para o interessado requerer a isenção do IPVA de veículo de sua propriedade ou posse, isso não basta. Para que os lógicos e justos fundamentos que a autoridade administrativa utiliza na motivação de seus atos sejam também jurídicos, os prazos para requerer concessão de isenção do imposto têm de estar previstos em lei, conforme determina a regra do caput do art. 176 do CTN. Somente com a fixação desses prazos por meio de lei haverá redução da quantidade de litígios sobre o termo inicial para fruição da isenção fixado pela autoridade administrativa, e segurança jurídica nas relações entre a Fazenda Pública do Estado e contribuintes interessados em requerer isenção do IPVA.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. Obra revista e complementada, à luz da Constituição de 1988 até a Emenda Constitucional 10/96, pela Professora Mizabel Abreu Machado Derzi, Rio de Janeiro: Forense, 1999.

BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário. São Paulo: Lejus, 1998.

BORGES, José Souto Maior. Isenções Tributárias. São Paulo: Sugestões Literárias, 1980.

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2008.

LUNARDELLI, Pedro Guilherme Accorsi. Isenções Tributárias. São Paulo: Dialética, 1999.

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Malheiros, 2009.

______________________. Comentários ao Código Tributário Nacional (Vol. III). São Paulo: Atlas, 2005.


Notas

[1] Para Carvalho (2008, p. 90), porém, somente com a aplicação da norma vigente é que surdem à luz os efeitos que a ordem jurídica previu. Para o emérito Autor: “aplicar o direito é dar curso ao processo de positivação, extraindo de regras superiores o fundamento de validade para a edição de outras regras”; “é o ato mediante o qual alguém interpreta a amplitude do preceito geral, fazendo-o incidir no caso particular e sacando, assim, a norma individual”; “a aplicação das normas jurídicas se consubstancia no trabalho de relatar, mediante o emprego de linguagem competente, os eventos do mundo real-social (descritos no antecedente das normas gerais e abstratas), bem como as relações jurídicas (prescritas no consequente das mesmas regras)”. O Autor utiliza “‘linguagem competente’ como aquela exigida, coercitivamente, pelo direito posto”. Conclui a final que “isso significa equiparar, em tudo e por tudo, aplicação à incidência, de tal modo que aplicar u’a norma é fazê-la incidir na situação por ela juridicizada”.

[2] Sempre que possível, utilizaremos denominação adotada por Carvalho (2008, p. 275-276), que distingue “evento” de “fato”. O ilustre Autor denomina evento jurídico tributário o “fato que realmente sucede no quadro do relacionamento social, dentro de específicas condições de espaço e de tempo, que podemos captar por meio de nossos órgãos sensoriais, e até dele participar fisicamente”. O Autor reserva “a locução fato jurídico tributário para o relato lingüístico desse acontecimento”. “Fato jurídico porque tem o condão de irradiar efeitos de direito. E tributário pela simples razão de que sua eficácia está diretamente ligada à instituição do tributo”.

[3] É a seguinte a redação do art. 12 da Lei 13.296/2008:

 “Art. 12 - O Poder Executivo disciplinará procedimento para o reconhecimento das imunidades, para a concessão das isenções e para a dispensa do pagamento do imposto” (grifamos).

[4] Exemplos de situação de fato são:

a)       de o interessado exercer a atividade de condutor autônomo de passageiros na categoria de aluguel (táxi), condição prevista no inc. IV do art. 13 da Lei 13.296/2008;

b)       de o interessado ser portador de deficiência física, mas estar apto a dirigir veículo a ele especialmente adaptado, condição prevista no inc. III do art. 13 da citada Lei.

[5] Exemplo de situação de direito é a relação de propriedade do veículo para a qual o interessado requereu a isenção.

[6] Antes de 29/05/2002, data em passou a produzir efeitos a nova regra do § 4º do art. 1º da Portaria CAT 56/1996 (com a redação dada pelo art. 1º da Portaria CAT 43, de 28/05/2002), o interessado comprovava exercer a atividade de condutor autônomo de passageiros na categoria de aluguel (táxi), mediante cópia do documento fornecido pelo órgão municipal competente (alínea “a”, do inc. IV do art. 3º da Portaria CAT 56/1996); de acordo com o inc. I do art. 2º do Decreto 56.561/2010, a isenção do IPVA poderá ser concedida com base nos dados constantes do Cadastro de Contribuintes do IPVA, conforme disciplina estabelecida pela Secretaria da Fazenda; no entanto, como esse Cadastro ainda não foi implantado, deve-se aplicar a atual regra do § 4º do art. 1º da Portaria CAT 56/1996.

O interessado comprova: 

a) ser deficiente físico, mediante cópia do laudo de perícia médica fornecido exclusivamente pelo DETRAN, com especificação do tipo de defeito físico e do tipo de veículo que ele pode conduzir (alínea “a” do inc. VII do art. 3º da Portaria);

b) estar apto a dirigir veículo com adaptações especiais discriminadas em laudo referido na letra anterior, mediante cópia da Carteira Nacional de Habilitação, na qual conste estar ele (interessado) autorizado a dirigir tal veículo (alínea “b” do inc. VII do art. 3º da Portaria);

c) a relação de propriedade do veículo: por meio de cópia da nota fiscal de aquisição, em caso de veículo novo; ou mediante cópia de Certificado de Registro de Veículo emitido em seu nome, na aquisição de veículo usado.

[7] Exemplo de obrigação de fazer, mas que não foi posta por lei, é a do deficiente físico que, ao requerer isenção do IPVA de veículo novo por ele adquirido, ou após esse requerimento, deverá apresentar cópia da nota fiscal referente às adaptações realizadas no veículo por empresa especializada (alínea “c” do inc. VII do art. 3º da Portaria CAT 56/1996).

[8] Exemplo de obrigação de não fazer é a do taxista que, ao adquirir veículo novo com isenção do ICMS nos termos do disposto no art. 88 do Anexo I – Isenções – do RICMS/2000 (Decreto 45.490/2000 – Disponível em: <http://www.pfe.fazenda.sp.gov.br/> / Legislação / Tributária / Atalhos Regulamento do ICMS / Tabela de artigos / ANEXO I – Isenções Lista das Isenções / 88 Acesso em 19/04/2012), não poderá nos primeiros dois anos alienar o veículo sem autorização do fisco (conforme se depreende do disposto na alínea “b” do item 1 do § 2º do art. 88 do Anexo I).

[9] Note-se que, com esse conceito de norma de isenção, pode-se também explicar a “redução da base de cálculo” como “isenção parcial”, em que a regra-matriz de isenção tem base de cálculo igual à parcela da base de cálculo da regra-matriz tributária que se quer ver desonerada (ou reduzida) e alíquota igual à da regra-matriz tributária. Já na “alíquota zero”, que ocorre na legislação do IPI, a regra-matriz de isenção tem base de cálculo igual à da regra-matriz tributária e alíquota igual à do produto industrializado, antes de ela ter sido anulada.

[10] No encontro lógico entre a norma tributária e a de isenção, “as propriedades do evento tributário deixam de integrar a hipótese da respectiva regra-matriz, para compor a hipótese da norma de isenção”. A concretização em enunciado protocolar da conduta prevista na hipótese da norma de isenção dará ensejo ao fato isento e não mais ao fato pertencente à regra-matriz tributária. Pela causalidade jurídica surgirá a relação jurídica de isenção (LUNARDELLI, 1999, p. 96). Assim, a regra-matriz não poderá ser incidida sobre evento tributário que, pela incidência da norma de isenção, tornou-se fato tributário isento.

[11] Isenções subjetivas são as “concedidas em função de condições pessoais de seu destinatário, isto é, daquele que, se inexistente a isenção, seria o sujeito passivo da obrigação tributária” (MACHADO, 2009, p. 235).

[12] Embora tenha sido posta por portaria a norma que tratou da renovação do pedido de concessão da isenção do IPVA mediante apresentação, no licenciamento, de guia de recolhimento do IPVA preenchida de acordo com as disposições do § 1º do art. 4º da Portaria CAT 12/1988, não vislumbramos interesse jurídico de o contribuinte requerer a declaração de nulidade da norma porque ela não foi posta por lei, conforme determina a regra do caput do art. 176 do CTN. Isso porque, se referida norma fosse declarada nula, prevaleceria a norma do § 1º do art. 179 do CTN, cujo prazo para renovação do pedido é mais exíguo.

[13] Com efeito, de acordo com o art. 3º das Disposições Transitórias da Lei 13.296/2008, enquanto não for instituído o Cadastro de Contribuintes do IPVA a que se referem os artigos 30 e 31 da Lei, “serão utilizadas as informações constantes do cadastro de veículos do Departamento Estadual de Trânsito – DETRAN”.

[14] Disponível em: <http://www.pfe.fazenda.sp.gov.br/> / Legislação / Tributária / Atalhos IPVA / Lei 13.296/08 Acesso em 03/02/2012.

[15] Não foi precisa a redação do inc. V do art. 3º da Lei 13.296/2008 ao se referir à data em que deixar de ser preenchido requisito que tiver dado causa à isenção. Na realidade, o que deixa de ser preenchida é condição que deu causa à isenção. Deixaria de ser “cumprido” requisito se a lei estabelecesse prazo para o interessado requerer a continuidade da isenção e ele não tivesse observado o prazo.

[16] Disponível em: <http://www.pfe.fazenda.sp.gov.br/> / Legislação / Tributária / Atos anteriores a 2002 / Ato: “Portarias CAT”, Ano: “1996” / 56, de 12-08 Acesso em 03/02/2012.

[17] Disponível em: <http://www.pfe.fazenda.sp.gov.br/> / Legislação / Tributária / Ato: “Leis”, Ano: “2008” / 12.799 de 11-01 Acesso em 19/04/2012.

[18] Permite que o deficiente possa integrar-se à sociedade, em particular ao mercado de trabalho. De fato, “compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre proteção e integração social das pessoas portadoras de deficiência” (inc. XIV do art. 24 da CF).

[19] Com efeito:

a)       relativamente ao ICMS, cabe à lei complementar regular a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados (alínea “g” do inciso XII do § 2º do art. 155 da CF);

b)       a Lei Complementar 24/1975, que foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988 e que dispõe sobre os convênios para a concessão de isenções do imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias, e dá outras providências, tem a seguinte redação em seu art. 1º:

“Art. 1º - As isenções do imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias serão concedidas ou revogadas nos termos de convênios celebrados e ratificados pelos Estados e pelo Distrito Federal, segundo esta Lei.

 . . . ”.

[20] O Decreto 57.517/2011 fixa o calendário para pagamento do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores - IPVA relativamente ao exercício de 2012 e o percentual de desconto para pagamento antecipado. É a seguinte a redação do seu art. 2º:

“Art. 2° - O contribuinte poderá efetuar o pagamento do imposto referido no artigo 1° integralmente, pelo valor nominal, sem qualquer desconto, no mês de fevereiro, até os dias a seguir indicados, observado o número final da placa:

final 1: 13 (treze);

final 2: 14 (catorze);

final 3: 15 (quinze);

final 4: 16 (dezesseis);

final 5: 17 (dezessete);

final 6: 23 (vinte e três);

final 7: 24 (vinte e quatro);

final 8: 27 (vinte e sete);

final 9: 28 (vinte e oito);

final 0: 29 (vinte e nove)”.


Autor

  • Wagner Pechi

    Agente Fiscal de Rendas do Estado de São Paulo aposentado. Ex-Delegado Tributário de Julgamento de São Paulo. Ex-integrante do Tribunal de Impostos e Taxas. Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.

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Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PECHI, Wagner. Prazo para requerer isenção do IPVA. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3246, 21 maio 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21819. Acesso em: 10 maio 2024.