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IPTU progressivo

IPTU progressivo

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O artigo aborda a progressividade da alíquota do IPTU extrafiscal e a fiscal.

  1. IPTU PROGRESSIVO

Concluído o estudo do princípio da capacidade contributiva e os aspectos gerais do IPTU no capítulo anterior, será visto agora a progressividade desde sua conceituação até o seu caráter extrafiscal, analisando-se também as medidas de desenvolvimento urbano previstas no Estatuto da Cidade, a aplicação do IPTU progressivo no tempo como instrumento de política urbana no Plano Diretor da cidade de Fortaleza e por último a possibilidade de progressividade fiscal do IPTU após a mudança do texto constitucional.

3.1 Conceito de progressividade

A progressividade no Direito Tributário brasileiro é uma modalidade de tributação segundo a qual, na medida em que aumenta a base de cálculo do tributo, aumenta também a alíquota sobre esta incidente.

Hugo de Brito Machado[1] leciona que a progressividade é o imposto, cuja alíquota cresce em função do crescimento de sua base de cálculo. Essa é a progressividade ordinária, que atende ao princípio da capacidade contributiva.

A progressividade almeja a justiça fiscal, estando, portanto, ligado aos princípios da isonomia e da capacidade contributiva, já abordado no capítulo anterior. 

Já a relação com o princípio da isonomia está ligada à redistribuição de riquezas mais justa no Brasil, posto que igualdade é tratar os iguais igualmente e os desiguais desigualmente. Por sua vez, a correlação entre o princípio da capacidade contributiva com a progressividade está ligada ao fato do aumento proporcional à riqueza do contribuinte.

Mizabel Derzi e Sacha Calmon Navarro Coelho[2] lecionam que:

Por progressividade entende-se a majoração da alíquota à medida que cresce o valor da matéria tributável. Não é incompatível com o princípio da igualdade e da proporcionalidade. Ao contrário, é hoje aceita, e segundo relata Uckmar, da Alemanha à Áustria, da França à Itália, da Holanda à Suíça, à Noruega, à Espanha, aos Estados Unidos, ao Canadá, ao México, à Austrália, ao Japão, pode-se dizer que não existiu um Estado onde no fim do século passado ou no princípio presente, não existissem impostos com alíquotas progressivas.

Além da possibilidade de aplicação progressiva ao IPTU, a progressividade é aplicável também ao Imposto de Renda – IR, Imposto Territorial Rural – ITR, Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores – IPVA.

Cumpre ressaltar que a progressividade deve ser aplicada de forma a não adotar infringir o princípio do não confisco, visto que a Constituição Federal de 1988 veda o ato confiscatório em seu artigo 150, inciso IV[3].

Existem duas formas de progressividade a ser aplicada: simples ou graduada. Hugo de Brito Machado (2012, pág. 306) leciona que a progressão simples é aquela em que cada alíquota aplica-se a toda a matéria tributável.

Quanto à forma de tributação progressiva graduada, este mesmo autor (2012, pág. 306) cita Rubens Gomes de Sousa:

Graduada é aquela em que cada alíquota maior aplica-se apenas sobre a parcela de valor compreendida entre um limite inferior e outro superior, de modo que é preciso aplicar tantas alíquotas quantas sejam as parcelas de valor e depois somar todos esses resultados parciais para obter o imposto total a pagar.

Mesmo com a existência dessas duas formas de progressão, Hugo de Brito entende que apenas a progressividade graduada é compatível com a Constituição Federal de 1988, sendo a progressividade simples lesiva ao princípio da capacidade contributiva.

Por fim, cumpre frisar que a progressividade não pode ser confundida com a seletividade. Segundo Machado (2012, pág. 403) leciona que:

Seletivo, por sua vez, é o imposto cujas alíquotas são diversas em razão da diversidade do objeto tributado. Assim, o IPTU será seletivo se as suas alíquotas forem diferentes para imóveis diferentes, seja essa diferença em razão da utilização, ou da localização, ou de um outro critério qualquer, mas sempre diferença de um imóvel para outro imóvel. [4]

Portanto, com estas linhas explanadas, cumpre encerrar este conceito e assinalar que a progressividade do IPTU tem duas funções a serem estudadas nos próximos tópicos: a fiscal e a extrafiscal.

3.2 Progressividade Extrafiscal do IPTU

A progressividade extrafiscal do IPTU tem como objetivo, aplicar os comportamentos e diretrizes que o Poder Público municipal considera fundamental para o bem-estar da sociedade tendo como fundamento o exercício do poder de polícia. 

Harada (2010, pág. 434) trata do poder de polícia, disciplinado no artigo 78 do Código Tributário Nacional, em relação à progressividade extrafiscal do IPTU da seguinte maneira:

O poder de polícia, tal qual conceituado pelo art. 78, do CTN, nada mais é do que a atividade inerente do poder público que objetiva, no interesse público, intervir na propriedade e na liberdade dos indivíduos, impondo-lhes comportamentos comissivos ou omissivos. Incogitável a ideia de Estado despido do poder de polícia.

Com este raciocínio, é imprescindível entender que neste caso o poder de polícia, o mesmo utilizado no Direito Administrativo, é aplicado também no Direito Tributário de forma discricionária e sem o exercício da função arrecadatória, pois o Estado visa o fim social e político no poder regulatório.

A progressividade extrafiscal se difere da progressividade fiscal justamente pela sua aplicação não ser através da capacidade contributiva do contribuinte, disciplinado no §1º do artigo 145 da CF/88. Na extrafiscalidade o objetivo é aplicar a progressividade da alíquota em decorrência do descumprimento da função social da propriedade.

A progressividade prevista no §1º do artigo 156 e o §4º, inciso II do artigo 182 da CF/88 são os dispositivos constitucionais que estabelecem a função extrafiscal do IPTU.

Mesmo antes da EC/2000, a Carta Magna já previa desde logo a possibilidade de alíquotas progressivas com a finalidade extrafiscal utilizada como instrumento urbanístico e para assegurar o cumprimento da função social da propriedade.

Portanto, após esta breve explanação acerca da progressividade extrafiscal é possível adentrar o tópico que irá tratar do IPTU progressivo no tempo como instrumento de política urbana.

3.3 O IPTU progressivo como instrumento de efetivação da função social da propriedade urbana

Demonstrado anteriormente o Estatuto da Cidade como um balizador do princípio da função social da propriedade, resta analisar os principais instrumentos de política urbana previstos no Estatuto, especialmente quanto a progressividade do IPTU.

3.3.1 As medidas de desenvolvimento urbano previstas no Estatuto da Cidade

A Lei 10.257, promulgada em 10 de julho de 2001, foi criada com o objetivo de viabilizar mais concretamente o desenvolvimento urbano das cidades pelo Poder Público municipal. Elaborada para a regularização do uso da propriedade urbana em prol do bem-estar coletivo, referida legislação também é utilizada para o estudo da progressividade da alíquota do IPTU.

De acordo com Mariana Moreira (2010 págs. 27-43):

O Estatuto da Cidade oferece diretrizes gerais para a fixação da política urbana e, também instrumentos capazes de garantir o atendimento dessas postulações, condicionando o exercício do direito de propriedade, bem como elegendo institutos jurídicos e administrativos facilitadores da ação estatal em matéria de urbanismo.

O art. 4º do Estatuto traz o rol de instrumentos colocados à disposição dos municípios para que organize e faça ser cumprida a função social da propriedade com o objetivo de um melhor desenvolvimento econômico e social das cidades.

O referido diploma infraconstitucional, através do dispositivo supracitado, deu cumprimento ao artigo 182 da Constituição Federal de 1988, pois está elencado como instrumento de planejamento municipal o plano diretor.

Desta feita, importa estudar o art. 7º do Estatuto[5] que traz a seguinte redação:

Art. 7o Em caso de descumprimento das condições e dos prazos previstos na forma do caput do art. 5o desta Lei, ou não sendo cumpridas as etapas previstas no § 5o do art. 5o desta Lei, o Município procederá à aplicação do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana (IPTU) progressivo no tempo, mediante a majoração da alíquota pelo prazo de cinco anos consecutivos.

§ 1o O valor da alíquota a ser aplicado a cada ano será fixado na lei específica a que se refere o caput do art. 5o desta Lei e não excederá a duas vezes o valor referente ao ano anterior, respeitada a alíquota máxima de quinze por cento.

§ 2o Caso a obrigação de parcelar, edificar ou utilizar não esteja atendida em cinco anos, o Município manterá a cobrança pela alíquota máxima, até que se cumpra a referida obrigação, garantida a prerrogativa prevista no art. 8o.

§ 3o É vedada a concessão de isenções ou de anistia relativas à tributação progressiva de que trata este artigo.

Para compelir o proprietário a obrigação estabelecida, seja parcelamento, edificação ou utilização compulsórios, o Estatuto da Cidade forneceu ao Município o IPTU progressivo no tempo.

É válido destacar que neste dispositivo o legislador impôs o percentual a ser aplicado à base de cálculo do IPTU seja aumentado anualmente, limitando-se ao prazo de 5 (cinco) anos.

Para melhor entendimento do assunto, colaciona-se decisão do Supremo Tribunal Federal interpretando pela utilização de técnica de tributação progressiva do IPTU cabível para assegurar a eficácia da função social da propriedade e atendendo os requisitos do Plano Diretor da cidade do Rio de Janeiro[6]:

TRIBUTÁRIO. IPTU. PROGRESSIVIDADE. CARACTERIZAÇÃO DO ESCALONAMENTO DA CARGA TRIBUTÁRIA DE ACORDO COM A DESTINAÇÃO DADA AO IMÓVEL. ACÓRDÃO RECORRIDO QUE AFIRMA HAVER PROGRESSIVIDADE. RAZÕES DE AGRAVO REGIMENTAL INSUFICIENTES PARA AFASTAR A CONCLUSÃO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL.

 

1. Esta Corte interpretou os arts. 145, § 1º, 156, § 1º e 182, §§ 2º e 4º da Constituição, na redação anterior à Emenda Constitucional 29/2000, para fixar que a utilização da técnica de tributação progressiva para o Imposto sobre a Propriedade Territorial e Urbana – IPTU somente era cabível para assegurar a eficácia da função social da propriedade, atendidos os requisitos estabelecidos em Plano Diretor compatível com lei federal (cf. o RE 394.010-AgR, rel. min. Carlos Velloso, Segunda Turma, DJ de 28.10.2004 e o RE 153.771, red. p/ acórdão min. Moreira Alves, Pleno, DJ de 05.09.1997). Súmula 668/STF.

2. O efeito extrafiscal ou a calibração do valor do tributo de acordo com a capacidade contributiva não são obtidos apenas pela modulação da alíquota. O escalonamento da base de cálculo pode ter o mesmo efeito. 3. As razões de agravo regimental não infirmam a conclusão a que chegou o Tribunal de origem quanto à utilização da técnica de progressividade. Agravo regimental ao qual se nega provimento.

Para finalizar este tema, Aliomar Baleeiro (2000, pág. 256) estabelece como regras da progressividade extrafiscal progressiva no tempo do IPTU estabelecida na Constituição Federal de 1988:

Tributação progressiva no tempo, que, de forma gradual, imponha encargos cada vez mais gravosos à medida que persistam os comportamentos contrários ao pleno desenvolvimento da política urbana, definida em lei. Ressalta o caráter pedagógico ou reeducativo do art. 182.

Portanto, faculta ao Poder Público municipal, mediante lei específica para a área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei, que o proprietário promova adequadamente o efetivo aproveitamento de propriedade não edificada, subutilizada ou não utilizada, sob pena sucessiva de parcelamento, edificação compulsória ou a progressividade no tempo da alíquota do IPTU, conforme o §4º inciso I e II do artigo 182 da CF/88.

3.3.2 A aplicação do IPTU progressivo no tempo como instrumento de política urbana do Plano Diretor da cidade de Fortaleza

A Constituição Federal elencou no título pertencente à ordem econômica e financeira um capítulo tratando da política urbana, o qual traz o artigo 182 abordando a política de desenvolvimento urbano aplicada pelo Poder Público municipal.

Segundo Regina Helena Costa[7] o IPTU progressivo no tempo tem caráter sancionatório, uma vez que se volta à punição do proprietário do imóvel que insiste em não ajustá-lo à função social da propriedade e às diretrizes do Plano Diretor.

O que ocorre para que decorra a progressividade da alíquota do IPTU no tempo é que existem na grande maioria das cidades brasileiras terrenos ociosos, sem qualquer utilização e, muitas vezes, o motivo desse desprezo, pode-se dizer assim, é que os proprietários aguardam a valorização do lugar a partir das intervenções realizadas pelo Poder Público municipal para o desenvolvimento da região.

Exemplos práticos de intervenção do Poder Público municipal para o desenvolvimento do local é a instalação de infraestrutura básica e implantação de equipamentos urbanos essenciais como iluminação pública, asfaltamento, transporte público, saneamento básico, coleta de lixo, dentre outros.

É muito comum em grandes cidades a presença de investidores que compram imóveis almejando sua valorização futura em decorrência da especulação imobiliária e das melhorias promovidas pelo poder público com o fito de desenvolver a região. Consequentemente, as cidades acabam sofrendo com o esgotamento da possibilidade de crescimento dessa área, fazendo com que novas regiões da cidade menos povoadas sejam habitadas somente no futuro.

Para estes casos, portanto, o ordenamento jurídico pátrio prevê a possibilidade de majoração da alíquota do IPTU de forma progressiva no tempo como medida sancionatória. Desta feita, o Poder Público municipal deverá forçar o proprietário do imóvel a dar a utilidade ao imóvel cumprindo a devida função social da propriedade ou simplesmente vende-la.  

 Visto isso, é merecedor a transcrição do art. 182 da CF/88:

Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei tem objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes.

§1º. O plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para cidades com mais de vinte mil habitantes, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana.

§2º. A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor.

[...]

§4º. É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal , do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de:

I – parcelamento ou edificação compulsórios;

II – Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana progressivo no tempo;

III – desapropriação com pagamento mediante títulos públicos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real daindenização.

Logo no caput do artigo supracitado, o texto constitucional prescreve que a política urbana a ser executada pelos municípios objetiva aplicar o desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar coletivo.

 O §1º se destaca ao ver que o legislador instituiu como instrumento básico de política de desenvolvimento e de expansão urbana o plano diretor, que é instituído para aqueles municípios com mais de 20.000 (vinte mil) habitantes. 

Em conformidade com este parágrafo, deve-se analisar que o legislador constitucional, por entender que o Município está mais próximo da realidade da sua comunidade, deverá criar seu plano diretor. Portanto, caberá ao plano diretor dizer se a propriedade está cumprindo ou não a função social da propriedade e aplicar as medidas cabíveis.

Tomando agora como exemplo o Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano da cidade de Fortaleza, instituído pela Lei Complementar 62, datada de 13 de março de 2009, estabelece em seu artigo 3º, inciso II, como princípio de política urbana a função social da propriedade[8].

Ainda neste mesmo Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano, estabelece o que segue abaixo[9]:

Art. 3º São princípios da Política Urbana:

[...]

§ 2º A função social da propriedade é cumprida mediante o pleno desenvolvimento da sua função socioambiental.

§ 3° A propriedade cumpre sua função socioambiental quando, cumulativamente:

 

I — for utilizada em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental;

 

II — atenda às exigências fundamentais deste Plano Diretor;

 

III — assegurar o atendimento das necessidades dos cidadãos quanto à qualidade de vida, à justiça socioambiental e ao desenvolvimento das atividades econômicas;

 

IV — assegure o respeito ao interesse coletivo quanto aos limites, parâmetros de uso, ocupação e parcelamento do solo, estabelecidos nesta Lei e na legislação dela decorrente;

 

V — assegurar a democratização do acesso ao solo urbano e à moradia;

 

VI — não for utilizada para a retenção especulativa de imóvel.

 

Percebe-se que neste artigo foi estabelecido também como cumprimento da função social da propriedade os cuidados de desenvolvimento da função socioambiental, que compreenderá o uso e o gozo da propriedade privada em consonância com os direitos e deveres para com o meio ambiente.

Ainda de extrema importância a leitura do artigo 216 do referido Plano Diretor, o qual é inserido no capítulo dos instrumentos de política urbana[10]:

Art. 216. Em caso de descumprimento das obrigações, etapas e prazos estabelecidos no art. 213 desta Lei, o Município deverá aplicar nessas propriedades alíquotas progressivas do IPTU, majoradas anualmente, pelo prazo de 5 (cinco) anos consecutivos, e até que o proprietário cumpra com a obrigação de parcelar, edificar ou utilizar, conforme determinação de lei específica.

 

§ 1º O valor da alíquota a ser aplicado a cada ano será fixado em lei específica e não excederá a 2 (duas) vezes o valor referente ao ano anterior, respeitada a alíquota máxima de 15% (quinze por cento).

 

§ 2º O Município manterá a cobrança pela alíquota máxima, até que se cumpra a referida obrigação, garantida a prerrogativa de proceder à desapropriação do imóvel, mediante pagamento em títulos da dívida pública.

 

§ 3º É vedada a concessão de isenções ou de anistia relativas à tributação progressiva de que trata este artigo.

 

 

Importante ressaltar o prazo máximo estipulado pelo artigo supracitado de 5 (cinco) anos consecutivos de majoração de alíquota do IPTU até que o proprietário se regularize perante o Poder Público municipal, não podendo a alíquota ultrapassar o limite máximo de 15% (quinze por cento).

Por sua vez, ainda assim não sendo cumprida a obrigação legal do proprietário, prescreve o artigo 217 do Plano Diretor da cidade de Fortaleza[11]:

 

 

Art. 217. Decorridos 5 (cinco) anos de cobrança do IPTU progressivo no tempo, sem que o proprietário tenha cumprido a obrigação de parcelar, edificar ou utilizar, o Município poderá proceder à desapropriação do imóvel, com pagamento em títulos da dívida pública.

 

§ 1º Os títulos da dívida pública terão prévia aprovação pelo Senado Federal e serão resgatados no prazo de até 10 (dez) anos, em prestações anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais de 6 (seis por cento) ao ano.

 

§ 2 O valor real da indenização:

 

I — refletirá o valor da base de cálculo do IPTU, descontado o montante incorporado em função de obras realizadas pelo Poder Público, na área onde o mesmo se localiza, após a notificação de que trata o art. 212 desta Lei;

 

II — não computará expectativas de ganhos, lucros cessantes e juros compensatórios.

 

§ 3º Os títulos de que trata este artigo não terão poder liberatório para pagamento de tributos.

 

§ 4º O Município procederá ao adequado aproveitamento do imóvel no prazo máximo de 5 (cinco) anos, contados a partir de sua incorporação ao patrimônio público.

 

§ 5º O aproveitamento do imóvel poderá ser efetivado diretamente pelo Poder Público ou por meio de alienação ou concessão a terceiros, observando-se, nesses casos, o devido procedimento licitatório.

 

§ 6º Ficam mantidas para o adquirente de imóvel nos termos do parágrafo anterior as mesmas obrigações de parcelamento, edificação ou utilização previstas no art. 208 desta Lei.

 

§ 7º Não cumprindo o adquirente a obrigação do parágrafo anterior no prazo de 5 (cinco) anos, o Município poderá desapropriar o imóvel nos termos do caput.

Sendo assim, tomado como exemplo o caso do investidor que compra terreno urbano e não cumpre a função social da propriedade, ou seja, deixa o imóvel subutilizado ou sem utilização nenhuma, decorridos 5 (cinco) anos de aplicação de IPTU com alíquota progressiva a cada ano, o Município poderá desapropriar o imóvel com pagamento em títulos da dívida pública sendo resgatados no prazo máximo de 10 (dez) anos.

Importante também destacar que no §4º do artigo 217 do Plano Diretor de Fortaleza, está previsto que o Município deverá proceder ao adequado uso da propriedade no prazo de 5 (cinco) anos podendo até após este prazo o proprietário reaver o seu imóvel. 

3.4 Progressividade fiscal do IPTU

A progressividade fiscal do IPTU é aquela organizada para majorar as alíquotas conforme o Poder Público aumente a base de cálculo do imposto.

Para Harada[12] a progressividade fiscal decretada no interesse único da arrecadação tributária tem seu fundamento no preceito programático representado pelo §1º do artigo 145 da CF, segundo o qual, sempre que possível, o imposto será graduado conforme a capacidade econômica do contribuinte.

A modalidade da progressividade fiscal vem sendo considerada constitucional pelo Supremo Tribunal Federal, embora boa parte da doutrina discorde e esta é decorrente da aplicação do princípio da capacidade contributiva. Esta modalidade poderá ser executada pelos municípios, sob pena de lesão à isonomia e descumprimento dos objetivos do Estado Democrático de Direito.

 Portanto, pode-se dizer que a progressividade fiscal do IPTU tem como resultado primordial a arrecadação de recursos financeiros para os municípios.

Cumpre destacar inicialmente que a progressividade fiscal tem como fundamento no preceito programático representado no §1º do artigo 145 da CF/88. Segundo o texto constitucional expressa que sempre que possível, o imposto será graduado conforme a capacidade econômica do contribuinte.

Entretanto, a progressividade fiscal do IPTU está disciplinada no artigo 156 §1º da Constituição Federal de 1988. É importante ressaltar a diferença da redação deste parágrafo antes e depois da Emenda Constitucional n° 29/2000.

Antes da referida Emenda a redação do §1º do artigo 156 da CF/88 previa somente a utilização da técnica progressiva extrafiscal do IPTU de modo expresso. Esta modalidade não tinha como objetivo o alcance de finalidade meramente arrecadatória, visto que poderia ser progressivo nos termos de lei municipal para o cumprimento do princípio da função social da propriedade. 

No entanto, com o advento da EC n° 29/2000 foi criada a chamada progressividade fiscal do IPTU. Antes da aprovação dessa emenda, geraram-se inúmeras discussões doutrinárias em virtude da capacidade contributiva do contribuinte.

Tendo em vista o IPTU ser entendido como um imposto de natureza real o STF entendia que não seria possível a cobrança progressiva do imposto em virtude da capacidade contributiva do contribuinte. Sendo assim, a Suprema Corte admitia somente a progressividade do IPTU para fins extrafiscais, isto é, para o efetivo cumprimento da função social da propriedade.

Nesse contexto, antes da EC n° 29/2000 o STF entedia ser inconstitucional qualquer lei municipal que trouxesse o IPTU progressivo de maneira diferente que não fosse para assegurar o cumprimento da função social da propriedade, conforme segue decisão abaixo.

IPTU. PROGRESSIVIDADE.

 

1. No sistema tributário nacional é o IPTU inequivocamente um imposto real.

2. Sob o império da atual Constituição, não é admitida a progressividade fiscal do IPTU, quer com base exclusivamente no seu artigo 145, § 1º, porque esse imposto tem caráter real que é incompatível com a progressividade decorrente da capacidade econômica do contribuinte, quer com arrimo na conjugação desse dispositivo constitucional (genérico) com o artigo 156, § 1º (específico).

3. A interpretação sistemática da Constituição conduz inequivocamente à conclusão de que o IPTU com finalidade extrafiscal a que alude o inciso II do § 4º do artigo 182 é a explicitação especificada, inclusive com limitação temporal, do IPTU com finalidade extrafiscal aludido no artigo 156, I, § 1º.       4. Portanto, é inconstitucional qualquer progressividade, em se tratando de IPTU, que não atenda exclusivamente ao disposto no artigo 156, § 1º, aplicado com as limitações expressamente constantes dos §§ 2º e 4º do artigo 182, ambos da Constituição Federal.

5. Recurso extraordinário conhecido e provido, declarando-se inconstitucional o subitem 2.2.3 do setor II da Tabela III da Lei 5.641, de 22.12.89, no município de Belo Horizonte.[13]

Este entendimento foi antes da existência da EC 29/200. Em outro entendimento jurisprudencial o Ministro relator Moreira Alves do STF julgou o Recurso Extraordinário nº 199281.

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE DE LEI MUNICIPAL. IPTU. PROGRESSIVIDADE.

 

1. O Plenário desta Corte, ao julgar o RE 153.771, relativo à progressividade do IPTU, firmou o entendimento que "no sistema tributário nacional é o IPTU inequivocamente um imposto real", e, assim sendo, "sob o império da atual Constituição, não é admitida a progressividade fiscal do IPTU, quer com base exclusivamente no seu artigo 145, § 1º, porque esse imposto tem caráter real, que é incompatível com a progressividade decorrente da capacidade econômica do contribuinte, quer com arrimo na conjugação desse dispositivo constitucional (genérico) com o artigo 156, § 1º (especifico). 

2. O acórdão recorrido julgou improcedente a ação direta de inconstitucionalidade em causa, porque deu ao artigo 160, §1º, da Constituição do Estado de São Paulo (que reproduz o artigo 145, §1º, da Carta Magna Federal) interpretação diversa da que esta Corte tem dado ao princípio constitucional federal reproduzido pela Constituição Estadual.

3.  Recurso extraordinário conhecido e provido, para julgar procedente a ação direta de inconstitucionalidade, declarando, com eficácia erga omnes, inconstitucional o artigo 1º da Lei 11.152, de 30 de dezembro de 1991, do Município de São Paulo, na parte que altera a redação dos artigos 7º e 27 e respectivos parágrafos da Lei 6.989, de 29 de dezembro de 1966, com a redação que lhes foi conferida pelas Leis nºs 10.394, de 20 de novembro de 1987, 10.805, de 27 de dezembro de 1989, e 10.921, de 30 de dezembro de 1990.[14]

A citada ementa modificou a interpretação anterior da Corte Maior no que tange ao artigo 156 da Carta Magna de 1988, impondo, vale ressaltar, sem prejuízos da progressividade no tempo a que se refere o artigo 182, §4º, inciso II, a progressividade do IPTU em razão do valor venal do imóvel, além de permitir alíquotas diferentes de acordo com a localização e o uso do imóvel.[15]

Conforme apresentado anteriormente jurisprudências contendo decisões do Supremo declarando inconstitucional a progressão fiscal do IPTU, segue abaixo uma das inúmeras decisões contendo o entendimento contrário e mais atual da Suprema Corte.

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. IPTU. PROGRESSIVIDADE. LEI LOCAL INSTITUÍDA APÓS A EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 29/2000. CONSTITUCIONALIDADE. CONDIÇÕES PREVISTAS PELO ESTATUTO DA CIDADE. INAPLICABILIDADE.

 

1. A progressividade extrafiscal, baseada na função social da propriedade, sempre foi permitida pelo texto Constitucional. Esta é a modalidade de progressividade que se opera conforme as condições previstas pelo Estatuto da Cidade.

2. A progressividade fiscal, dita arrecadatória, só foi viabilizada após constar da Constituição Federal o permissivo trazido pela Emenda Constitucional nº 29/2000. Nesse caso, a progressividade é mecanismo de concreção da capacidade contributiva e opera-se com a majoração de alíquotas em relação diretamente proporcional ao aumento da base de cálculo.

3. Agravo regimental a que se nega provimento.[16]

Os incisos I e II do artigo supracitado simplesmente criou a possibilidade de aplicação de técnicas progressivas de alíquotas, almejando a fiscalidade e extrafiscalidade, sendo esta última reconhecida para o cumprimento do princípio da função social da propriedade e que já existia no texto constitucional anterior.

Harada (2010, pág. 432) no tocante ao inciso I do artigo 156 da CF/88 leciona.

É bem de ver que, no caso, só o valor venal do imóvel poderá ser tomado como parâmetro para a progressão das alíquotas, na medida em que apenas ele espelha, objetivamente, a capacidade econômica do proprietário-contribuinte. A consideração de qualquer outro fator ou elemento retira a natureza fiscal da progressividade.

Com a edição do inciso II, surge uma problemática no tocante à progressão aplicada à localização do imóvel, para isso Harada (2010, pág. 434) pontifica que:

Entretanto, a distinção de alíquota em função da localização do imóvel não encontra justificativa plausível, podendo gerar distorções na política tributária municipal. Atenuar a carga tributária dos imóveis situados nas periferias poderá atrair poderosos especuladores imobiliários, que acabarão empurrando os pobres para locais cada vez mais distantes. Outrossim, imóveis situados em zonas nobres já têm valores venais elevados sobre os quais poderá incidir a tributação progressiva.

A questão a respeito da progressividade em razão do valor venal do imóvel se dá em razão da hipótese de certo contribuinte possuir um único imóvel com valor estimado de R$ 1.000.000,00 (hum milhão de reais) e outro contribuinte possuir 10 (dez) imóveis em localidades diferentes e com valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais).

Seguindo, portanto pelo entendimento de quem possuir o imóvel de valor mais elevado irá contribuir mais do que o que possuir 10 (dez) imóveis que somando dariam o mesmo valor daquele que possui somente um, pode-se concluir que com este raciocínio enfrenta-se um imenso debate por estar em confronto com o princípio da capacidade contributiva e o princípio da isonomia.

O entendimento é discutível, porém pacificado pelo STF, dando ensejo a aplicação progressiva fiscal do IPTU e, sendo, portanto constitucional o §1º do artigo 156 da CF/88 e válida sua instituição com base na capacidade contributiva do contribuinte no caso de legislações posteriores à EC n.° 29/2000.

Para firmar a decisão de constitucionalidade da progressividade fiscal, o Supremo, na vigência da aludida emenda editou a Súmula 668 que traz com clareza a seguinte redação: “É inconstitucional a lei municipal que tenha estabelecido antes da Emenda Constitucional 29/2000, alíquotas progressivas para o IPTU, salvo se destinada a assegurar o cumprimento da função social da propriedade urbana.”

Com isso, conclui-se que o STF modificou o seu entendimento devido a nova redação do artigo 156 em combinação com o §1º do artigo 145 da CF/88 e que se tornou possível a aplicação do IPTU progressivo com base no valor venal do imóvel e a sua localização, tendo em vista a Suprema Corte entender constitucional a aplicação progressiva fiscal do IPTU.

Entretanto, esse entendimento não merece ser visto de forma correta, pois se trata de um imposto real não sendo possível aplicar a progressividade de acordo com a capacidade contributiva do contribuinte.

A hipótese de um contribuinte pagar mais imposto por possuir um único imóvel avaliado em R$ 1.000.000,00 (hum milhão de reais) do que o contribuinte que possui 10 (dez) imóveis de R$ 100.000,00 (cem mil reais) cada é uma afronta ao Estado Democrático de Direito.

Importante deixar claro que este entendimento não é o mais razoável de ser aceito, mesmo sendo considerado pela Suprema Corte deste país um dispositivo legal. Este entendimento não é acatado pela maioria dos doutrinadores.

Há quem entenda que não deve ser aplicada a progressividade em hipótese alguma, seja a extrafiscal ou a fiscal, pois para esses juristas caso ele tenha um determinado imóvel enorme, sem utilização nenhuma, descumprindo, portanto, a função social da propriedade, e seja lá onde for a localização deste imóvel ou o valor venal dele não deve pagar a alíquota progressiva do IPTU, podendo-se concluir um entendimento absoluto da propriedade.  


[1]MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 33ª ed. São Paulo: Malheiros. 2012. p. 403

[2]DERZI, Mizabel apud MACHADO, Hugo de Brito. Progressividade do IPTU. Disponível em: http: //www.hugomachado.adv.br/parreceres/IPTU for. Html.

[3]Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado á União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: [...] IV – utilizar tributo com efeito de confisco;

[4]MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 33ª ed. São Paulo: Malheiros. 2012. p. 403 a 404

[5] Lei 10.257, de 10 de julho de 2001. Regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais de política urbana e dá outras providências. Brasília, DF: Poder Executivo, 2001. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LEIS_2001/L10257.htm>. Acesso em: 30 mar. 2014.

[6]RE 466312 Ministro Relator Joaquim Barbosa. Julgado em 01/03/2011

[7]COSTA, Regina Helena. Curso de Direito Tributário: Constituição e Código Tributário Nacional. 1ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p.101.

[8]Lei Complementar 62 de 13/03/2009 - Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano da cidade de Fortaleza: Disponível em: http://cmfor.virtuaserver.com.br/Leis_Brasil/Plano_Diretor/plano_diretor.htm

[9]Lei Complementar 62 de 13/03/2009 - Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano da cidade de Fortaleza: Disponível em: http://cmfor.virtuaserver.com.br/Leis_Brasil/Plano_Diretor/plano_diretor.htm

[10]Lei Complementar 62 de 13/03/2009 - Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano da cidade de Fortaleza: Disponível em: http://cmfor.virtuaserver.com.br/Leis_Brasil/Plano_Diretor/plano_diretor.htm

[11]Lei Complementar 62 de 13/03/2009 - Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano da cidade de Fortaleza: Disponível em: http://cmfor.virtuaserver.com.br/Leis_Brasil/Plano_Diretor/plano_diretor.htm

[12]HARADA, Kyoshi. Direito Financeiro e Tributário. 20ª ed. São Paulo: Atlas, 2011. p. 448

[13]RE 153771 MG 1996 Ministro Relator Carlos Velloso, julgado em 20/11/1996.

[14]RE 199281 SP 1999 Ministro Relator Moreira Alves, julgado em 11/11/1998

[15]Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes. [...] §4ºÉ facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de: [...] II – imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo;

[16] ARE 639632 MS 2013 Ministro Relator Roberto Barroso, julgado em 22/10/2013.



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