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Causas e Efeitos da Deserdação

Causas e Efeitos da Deserdação

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O presente artigo visa expor de forma clara as causas e efeitos geradores da deserdação no sistema jurídico brasileiro.

CAUSAS DA DESERDAÇÃO

Os herdeiros necessários (descendentes, ascendentes e cônjuge) podem ser privados de sua legítima, por meio da deserdação, que ocorre mediante testamento e com expressa manifestação de sua causa, sendo nulo o testamento, a deserdação também será. A deserdação ocorre pelos mesmos casos em que se opera a indignidade, motivos esses descritos no art. 1.814 do Código Civil, diploma que resume casos de atentado contra a vida, honra e liberdade do testador.

"Art. 1.814. São excluídos da sucessão os herdeiros ou legatários:

I - que houverem sido autores, co-autores ou partícipes de homicídio doloso, ou tentativa deste, contra a pessoa de cuja sucessão se tratar, seu cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente;

II - que houverem acusado caluniosamente em juízo o autor da herança ou incorrerem em crime contra a sua honra, ou de seu cônjuge ou companheiro;

III - que, por violência ou meios fraudulentos, inibirem ou obstarem o autor da herança de dispor livremente de seus bens por ato de última vontade."

As causas previstas nos artigos 1.962 e 1.963 do Código Civil, autorizam a deserdação, os referidos artigos, também, estabelecem as causas de deserdação de seus descendentes por seus ascendentes, bem como de ascendentes por seus descendentes.

"Art. 1.962. Além das causas mencionadas no art. 1.814, autorizam a deserdação dos descendentes por seus ascendentes:

I - ofensa física;

II - injúria grave;

III - relações ilícitas com a madrasta ou com o padrasto;

IV - desamparo do ascendente em alienação mental ou grave enfermidade."

Quanto a ofensa física, caracteriza-se causa de deserdação qualquer agressão contra o corpo da vítima, ainda que sejam apenas lesões corporais de natureza leve. Para essa forma de deserdação não é necessária a condenação criminal pelo ato, também não se leva em conta se a ofensa física deixou resquícios ou marcas, e nem ao menos se exige dor.

Não basta que sejam feitas ameaça, intimidação ou promessas de agressão futura. A simples ameaça não constitui ofensa, porém, tais fatos em certas circunstâncias, podem configurar injúria grave, que está prevista no inciso II do artigo supracitado e também é causa que autoriza a deserdação.

"A ofensa física ou sevícia demonstra falta de afetividade, de carinho e de respeito, legitimando por isso a deserdação. Não se exige a reiteração. Basta uma única ofensa física que um filho cometa contra seu pai, ou uma filha contra sua mãe, por exemplo, para que a hipótese de deserdação seja cogitada."

No que diz respeito a injúria grave, ela deve ser feita diretamente ao testador. Não se justifica a deserdação quando a ofensa atinge somente a seus familiares, ainda que entes muito queridos. No entanto o Código Civil de 2002, no art. 1.814, II, já mencionado aqui, estabelece que injúria dirigida a cônjuge ou companheiro, pode servir de fundamento para a deserdação.
A injúria pode exteriorizar-se pela palavra falada, escrita ou mesmo por gestos. Não basta qualquer injúria, exige-se que tenha atingido seriamente a dignidade do testador. E assim como na ofensa física, não é necessária a condenação criminal para que seja passível de deserdação.

As relações ilícitas com a madrasta e com o padrasto que figuram no inciso III, vem como um castigo imposto aos descendentes por criarem um ambiente desrespeitoso e prejudicial a paz familiar. Não é necessário que haja relações sexuais, basta que se envolva namoro, concupiscência, libidinagem, lascívia e luxúria. Também devem ser considerados madrasta ou padrasto, integrantes da família de fato, decorrentes da união estável e do concubinato. Toda vez que se falar em concubinato e união estável, a prova será do caso concreto, pois a construção é eminentemente jurisprudencial.

A quarta hipótese de deserdação é o desamparo do ascendente em alienação mental ou grave enfermidade, abrange a falta de assistência material, moral e espiritual. Porém não se justifica a deserdação se o herdeiro não tem suficiência de recursos, deixa de prestar assistência quando esta acima de suas posses.

"Na hipótese de desamparo do ascendente na alienação mental, alienação será possível se o desassistido recuperar o juízo, uma vez que a deserdação somente pode ser determinada em testamento válido."

O descendente também pode deserdar o ascendente pelas causas do art. 1.963 do Código Civil, essas causas correspondem as do art. 1.962, possuindo poucas diferenças. Que  estão  basicamente na adaptação dos incisos III e IV, com relação ao artigo anterior, que são relativamente relações ilícitas com a mulher  ou companheira do filho ou do neto, ou com o marido ou companheiro da filha ou o da neta  e desamparo do filho ou neto com deficiência mental ou grave enfermidade.

O Código Civil de 2002, elevou o cônjuge a qualidade de herdeiro necessário, porém o legislador não previu nenhuma causa que permita a punição do cônjuge com a deserdação, pelo testador. A natureza restritiva das normas dos artigos 1.962 e 1.963, impedem a aplicação analógica  ao caso. Todavia se o fato se enquadrar em qualquer das hipótese do art. 1.814, o cônjuge pode ser excluído da sucessão por indignidade, sem que seja necessária prévia manifestação do testador.

EFEITOS DA DESERDAÇÃO

O Código Civil, não faz menção aos efeitos da deserdação, apenas aos da indignidade, que estão descritos no art. 1.816. O entendimento é de que os efeitos da deserdação por terem a mesma natureza de penalidade dos casos de indignidade, também são pessoais e não podem ir além do herdeiro que se portou de forma reprovável.

Para afastar qualquer dúvida o Projeto de Lei n. 6.960/02, propôs o acréscimo de novo parágrafo ao art. 1.965, possuindo a seguinte redação: "São pessoais os efeitos da deserdação: os descendentes do herdeiro deserdado sucedem, como se ele morto fosse antes da abertura da sucessão. Mas o deserdado não terá direito ao usufruto ou à administração dos bens que a seus sucessores couberem na herança, nem à sucessão eventual desses bens."

BIBLIOGRAFIA

- Gonçalves, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. vol. 7. Direito das Sucessões. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011.

- Diniz, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. vol. 6. Direito das Sucessões. 22º ed. São Paulo: Saraiva, 2008.

- Venosa, Sívio de Salvo. Direito Civil. vol. 7. Direito das Sucessões. 9ª ed. São Paulo: Editora Atlas, 2009.

- Pereira, Caio Mario da Silva. Instituições de Direito Civil. vol. 6. Direito das Sucessões. 17ª ed. Rio de Janeiro, 2010.


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