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Despedida arbitrária: uma violação ao direito fundamental do trabalhador

Despedida arbitrária: uma violação ao direito fundamental do trabalhador

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A importância da Convenção 158 da OIT para a relação de emprego no Brasil que defende o direito fundamental ao trabalho frente à despedida arbitrária no ordenamento jurídico brasileiro.

RESUMO:Este trabalho tem como pretensão discutir a importância da Convenção 158 da OIT para a relação de emprego no Brasil. Pretende também, abordar o direito fundamental ao trabalho frente à despedida arbitrária no ordenamento jurídico brasileiro. Aborda ainda, algumas questões associadas ao desemprego no Brasil, suas conseqüências e possíveis soluções.

Palavras-Chave: Convenção 158, despedida arbitrária, emprego, dispensa arbitrária.


INTRODUÇÃO

O maior problema social da atualidade é o desemprego. O desemprego em uma sociedade marcadamente capitalista destrói a auto-estima, aniquilando o ser humano, e, ao mesmo tempo, é causa de uma série enorme de problemas que atingem toda a sociedade. O medo de ser conduzido ao desemprego, sem qualquer motivação, gera, inclusive, uma enorme fragilidade do empregado enquanto ainda ostenta tal condição. A facilidade jurídica conferida aos empregadores para “dispensarem” seus empregados provoca uma grande rotatividade de mão-de-obra, que tanto impulsiona o desemprego quanto favorece a insegurança nas relações trabalhistas, e, ainda, fragiliza a situação do trabalhador, provocando a precarização das condições de trabalho. (SOUTO MAIOR, 2008)

A proteção contra a despedida arbitrária e a garantia do emprego é o tema central do Direito Individual do Trabalho. A dispensa imotivada equipara-se à dispensa arbitrária e é proibida constitucionalmente. Em 14 de fevereiro de 2008, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva encaminhou para apreciação do Congresso Nacional as convenções 151 e 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). A Convenção 151 fala da organização sindical e do processo de negociação dos trabalhadores do serviço público. Já a Convenção 158 tem como tema a garantia do emprego contra a dispensa imotivada ou arbitrária. No Brasil, os termos da Convenção 158, ainda que com imperfeições de tradução, foram tornados públicos pelo Decreto n. 1.855, de 11 de abril de 1996.

Todos os trâmites de validade, portanto, foram cumpridos com relação à Convenção 158, da OIT: a Convenção foi aprovada pelo Congresso Nacional, mediante Decreto Legislativo n. 68, de 16 de setembro de 1992; o depósito da carta de ratificação foi efetuado na RIT (da OIT), em 05 de janeiro de 1995 e o Decreto de promulgação n. 1.855, foi publicado em 11 de abril de 1996.

Doze meses após o depósito da ratificação, a Convenção entra em vigência no ordenamento interno. Assim, vigente a Convenção 158 da OIT no Brasil desde 06 de janeiro de 1996. E, mesmo que considerada a necessidade de sua publicação no âmbito interno, esta exigência se cumpriu com a publicação do Decreto n.1.855, em 11 de abril de 1996. (SOUTO MAIOR, 2008)

Pela Convenção 158, portanto, existem três situações diferentes, relacionadas à possibilidade de término da relação de emprego: 1) o término por motivo relacionado ao comportamento do empregado (o que, equivaleria à “justa causa”); 2) o término por motivos econômicos, tecnológicos, estruturais  ou análogos, a serem previstos na regulamentação da Convenção; 3) o término injustificado, que não atende aos quesitos anteriores e que, portanto, deveria levar à readmissão do empregado ou ao pagamento de indenização adequada ou outra reparação que se considerar apropriada.

Este trabalho procura através de um levantamento bibliográfico abordar questões como desemprego e direitos constitucionais trabalhistas. Para tanto, foram levantados alguns dados estatísticos apontando como anda o desemprego no Brasil e ainda, quais direitos constitucionais trabalhistas estão previstos no ordenamento jurídico brasileiro.

Para contribuir com o debate envolvendo tais questões, o trabalho foi estruturado da seguinte forma: No primeiro capítulo intitulado: “O Direito ao Trabalho e a Constituição de 1988”, analisa-se o Direito ao Trabalho como um direito Social, mostrando que a Constituição de 1988 inovou ao deixar claro no texto constitucional direitos antes inimagináveis. No segundo capitulo, intitulado o “desemprego no Brasil”, é feito uma breve análise da situação trabalhista no Brasil, apontando alguns dados estatísticos associados ao desemprego. No terceiro capítulo é analisado o Artigo 7º, inciso I, da CF/88, que trata da proteção do emprego contra a despedida arbitrária. A Convenção 158 da OIT que trata da proteção contra a despedida arbitrária é abordada no quarto capítulo, neste analisa-se os argumentos contra e a favor da ratificação da convenção. Por fim, o trabalho se encerra analisando um fato histórico brasileiro, o inicio do movimento grevista no período da Ditadura Militar. Neste capítulo, o pano de fundo é o filme de Gianfrancesco Guarnieri intitulado: “Eles não usam black-tie”. Neste capítulo é feito uma associação entre as dificuldades encontradas no período ditatorial e os direitos sociais trabalhistas constantes na Constituição Federal de 1988.


1. O DIREITO AO TRABALHO E A CONSTITUIÇÃO DE 1988

A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 6º, definiu o trabalho como direito social, no entanto, nem o citado artigo, nem o seguinte, artigo 7º, trazem norma expressa conferindo o direito ao trabalho. Este ressai do conjunto de normas da Constituição sobre o trabalho. (SILVA, 2002, p. 288).  O legislador constituinte dispôs, também, que a República Federativa do Brasil tem como um de seus fundamentos o valor social do trabalho (art. 1º, IV), bem como a valorização do trabalho humano como fundamento da ordem econômica e a busca do pleno emprego (art. 170) e o trabalho como base da ordem social (art. 193), com o objetivo de assegurar a todos uma existência digna, promover o bem de todos, reduzir as desigualdades sociais e construir uma sociedade livre justa e solidária. (GODINHO, 2007, p.16). Tudo isso tem o sentido de reconhecer o direito social ao trabalho, como condição da efetividade da existência digna e, pois, da dignidade da pessoa humana, fundamento, também, da República Federativa do Brasil. (SILVA, op. cit. p. 289).[1]

Inovações e alterações importantes surgiram no texto constitucional, a começar pela equiparação entre empregados urbanos e rurais. O FGTS, estendido ao empregado rural, passou a ser a regra, tal como ocorreu no caso do trabalhador urbano; logo independe de opção do empregado seu ingresso nesse regime; desaparece do cenário jurídico a estabilidade decenária. O salário mínimo, antes regionalizado, foi unificado no território nacional. As necessidades vitais básicas a que o salário mínimo deve atender foram ampliadas, passando a englobar educação, saúde, lazer e previdência social. O piso salarial antes considerado inconstitucional foi contemplado na Constituição. (BARROS, 2012. p. 63)

O Salário continua sendo irredutível, exceto ACT e CCT. A retenção dolosa foi tipificada como crime. A participação nos lucros, que antes possuía feição salarial, foi desvinculada da remuneração, mantida, excepcionalmente, a participação do empregado na gestão. O salário-família é agora assegurado apenas ao trabalhador de baixa renda, estendendo-se ao rurícola. A jornada do empregado continua sendo de 8 horas, mas a carga horária semanal que antes era de 48 passou para 44 horas.

O adicional de horas extras, que antes era de 20% ou 25%, dependendo da situação, passou a ser de 50% no mínimo; nada impede que as partes estipulem em normas coletivas percentual mais elevado. Facultou-se o regime de compensação. Foi conferido ao trabalhador que labora em turno ininterrupto de revezamento a jornada de seis horas, facultando a majoração mediante negociação coletiva. Assegurou-se o repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos.  As férias tiveram sua remuneração majorada em 1/3.

A licença maternidade foi alongada de 84 dias para 120 dias, e introduziu-se a licença paternidade de cinco dias. E ainda, a proteção do mercado de trabalho da mulher mediante incentivos específicos. Revogou o preceito legal que permitia o aviso-prévio de oito dias e o fixou em 30 dias no mínimo, criando o aviso prévio proporcional. Previu também um adicional de penosidade, no entanto, ainda falta lei regulamentadora para definir as atividades penosas. (BARROS, 2012. p. 64)

A Constituição também proibiu a diferença de salário, de exercício de função e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil. Proibiu também, qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de necessidades especiais. Fixou em 14 anos a idade para o trabalho, ainda assim na condição de aprendiz. A partir de 16 até 18 anos, o trabalhador poderá ser destinatário do contrato de aprendizagem ou de contrato de trabalho normal. O texto constitucional equiparou os trabalhadores avulsos aos empregados e estendeu a doméstica vários direitos sociais. (BARROS, 2012. p. 65)


2. DESEMPREGO NO BRASIL

Conforme visto no capítulo anterior, o direito ao emprego é um direito social e como tal é protegido pelo ordenamento jurídico brasileiro. No entanto, no Brasil somente 22 milhões possuem emprego formal. Aproximadamente 50 milhões de homens e mulheres desta população ativa, estão sem carteira de trabalho, vivendo de atividades informais. Ora, se não existe o emprego formal, o trabalhador não é atingido pelos direitos sociais previstos no ordenamento jurídico brasileiro. (Dieese NT, 2008).

Durante vários anos, a maior parcela da sociedade brasileira não se apropriou do crescimento econômico do país, gerando uma economia com enorme concentração de renda. Na década de 1990, esse quadro se agravou com sucessivas crises econômicas e redução do nível de emprego. E como sempre, os trabalhadores pagaram a conta, com a elevação do desemprego e redução do rendimento do trabalho.  (Dieese NT, 2008)

O crescimento econômico a partir de 2004 trouxe a melhora da taxa média de desemprego nas seis regiões metropolitanas, onde a Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED) é realizada pelo DIEESE, Fundação Seade, com apoio do Ministério do Trabalho e Emprego e parceria com instituições e governos regionais. (Dieese NT, 2008)

De acordo com Jorge Luiz Souto Maior (2008), em uma sociedade capitalista, o desemprego, destrói a auto-estima, aniquilando o ser humano, e, ao mesmo tempo, é causa de uma série de problemas que atingem toda a sociedade. Contudo, evidentemente, observa-se que isto está ligado, de forma mais precisa, às políticas de macro-economia, considerados os arranjos comerciais e produtivos em escala mundial.

Entretanto, tem também ligação com a forma de regulação das relações de trabalho. A facilidade jurídica conferida aos empregadores para dispensarem seus empregados provoca uma grande rotatividade de mão-de-obra, que tanto impulsiona o desemprego quanto favorece a insegurança nas relações trabalhistas, e, ainda, fragiliza a situação do trabalhador, provocando a precariedade das condições de trabalho.

Ressalta ainda, o autor acima citado, que, se o Direito do Trabalho não pode gerar bens à satisfação do incremento da economia, pode, por outro lado, fixar um parâmetro de segurança e dignidade nas relações de trabalho, que tanto preserve o homem no contexto produtivo quanto, de certa forma, acaba beneficiando as políticas econômicas.

O principal papel a ser cumprido pelo Direito do Trabalho nos tempos presentes, segundo Souto Maior, é o de evitar o desemprego demasiado e despropositado, que apenas serve para incrementar a utilização de contratos que desconsideram os seus fins sociais e geram insegurança na sociedade.


3. ARTIGO 7º, INCISO I DA CF/88

Conforme abordagem anterior foi possível notar que o direito ao trabalho é um direito social de todo cidadão brasileiro. E que a informalidade é razão para que o cidadão não seja atingido pelos direitos sociais trabalhistas previstos na Constituição Federal. Por ser um direito Social, a rescisão do contrato de trabalho por vontade unilateral do empregador, atenta contra um direito fundamental do ser humano, o direito à relação de emprego. A própria Constituição Federal fez questão de deixar expresso no Título II, denominado dos Direitos e Garantias Fundamentais, o referido direito. Reza o artigo 7º da Carta Magna:

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: I – relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos.

Analisando o referido artigo, entende-se como “relação de emprego protegida” o direito do trabalhador conservar sua relação de emprego contra despedida arbitrária ou sem justa causa. A Constituição da República não conferiu uma garantia absoluta do emprego, deixando a cargo de lei complementar sua regulamentação. (SILVA, 2002), entende que a garantia do emprego é um direito, por si só, suficiente, nos termos da Constituição, para gerar o direito nela previsto.

A Constituição de 1988 obteve um grande avanço na área trabalhista como expressa (GODINHO, 2007, p. 14):

O princípio da dignidade da pessoa humana– com necessária dimensão social, da qual é o trabalho seu mais relevante aspecto –, ao lado do princípio da subordinação da propriedade à sua função socioambiental, além do princípio da valorização do trabalho e, em especial, do emprego, todos expressam o ponto maior de afirmação alcançado pelo Direito do Trabalho na evolução constitucional dos últimos séculos. No Brasil, esse ápice de afirmação constitucional encontra-se na Carta de 1988, como se sabe. Ali todos esses princípios, a par de outros também relevantes, espraiam-se pelo corpo constitucional, conferindo uma das marcas mais distintivas de tal constituição perante as demais já existentes na História do País.

No entanto, o artigo 7º, inciso I da Constituição, prevê indenização compensatória, caso seja violado o referido artigo. Ora, indenização não garante emprego. Pelo contrário, permite ao empregador despedir e pagar por esta dispensa de forma imotivada. Se a Constituição garante a relação de emprego, este deve ser preservado, não recaindo sobre ele qualquer substituição. Mas, a interpretação do referido artigo, remete a duas situações: primeiramente dá uma idéia de estabilidade absoluta e segundo, indica a possibilidade de rescisão do vinculo empregatício com a possibilidade de indenização.

A lei complementar que estava prevista no artigo 10, inciso I, das Disposições Constitucionais Transitórias, não solucionou o problema. O texto ficou como editado, não conferindo estabilidade, resolvendo-se os casos particulares via indenização. Esta suposta proteção ao direito citado, não se tornou efetivo na sociedade brasileira no decorrer dos anos desde a promulgação da Constituição de 1988. O sistema trabalhista brasileiro ainda continua desprovido de garantias para o trabalhador. Basta qualquer “marolinha”, como afirmou o ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva, para os mercados se agitarem e os trabalhadores na “corda-bamba” se verem à mercê da boa vontade de seus senhores (patrões), serem demitidos ou não.  


4. A CONVENÇÃO 158 DA OIT NO BRASIL

A Organização Internacional do Trabalho (OIT), reconhecida mundialmente por ser uma organização de vanguarda na defesa dos interesses dos trabalhadores, aprovou na 68ª reunião da Conferência Internacional do Trabalho, em Genebra (1982), a Convenção 158, a qual entrou em vigor no plano internacional em 23 de novembro de 1985 e teve como antecedentes a Recomendação 119, de 1963, que adotou proposições sobre a terminação da relação de trabalho, e a Convenção 142, de 1975, dispondo sobre desenvolvimento dos recursos humanos. Nessa mesma Conferência, também foi aprovada a Recomendação 166, que trata do término da relação de trabalho por iniciativa do empregador.  

A parte central dessa Convenção, que se aplica aos empregados de entidades que exerçam atividade econômica (art. 2º), encontra-se ao condicionar a validade da resilição unilateral do empregador a uma justificação, que se pode pautar somente na capacidade/comportamento do trabalhador ou nas necessidades empresariais (art.4º). (VIANA, 2009)

Ainda segundo VIANA, a Convenção n. 158 da OIT objetiva diminuir os efeitos do exercício do direito potestativo do poder empregatício, uma vez que não há na rescisão unilateral do contrato de trabalho uma repercussão isonômica desses efeitos para as partes envolvidas, ou seja, a demissão acarreta ao empregador uma contrariedade, enquanto a dispensa coloca o trabalhador numa situação até de pobreza.

Tentou-se no Brasil implementar a convenção em duas oportunidades: Na primeira, a Convenção foi ratificada, mas logo depois foi, de forma inconstitucional, denunciada. A segunda, em fevereiro de 2008, o Presidente Lula encaminhou ao Congresso mensagem para nova ratificação da Convenção. Em julho do mesmo ano, por 20 votos a 1, os parlamentares, na Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional, aprovaram parecer do deputado Júlio Delgado (PSB/MG) contrário à ratificação, sendo encaminhado pedido de arquivamento da mensagem presidencial à mesa da Câmara de Deputados. (SOUTO MAIOR, 2008).

Segundo o aludido autor, existem alguns argumentos contra a ratificação da referida convenção no Brasil, são eles: a criação do emprego vitalício; a instalação de um clima de conflito permanente entre empresa e empregado e por fim, a ratificação constituiria um óbice à criação de empregos e obstáculo ao desenvolvimento econômico.

 Tais argumentos não são suficientes para impedir a ratificação da convenção 158 da OIT, pois, não há atividade econômica sem pessoas. As empresas por mais importantes que sejam nada representam, se não forem aptas a contribuir para a construção da justiça social. E justiça social é evitar que pais de família percam seu sustento de forma imotivada e sem uma razão suficiente para tanto. Alguns segmentos empresariais não estabelecem um diálogo aberto e franco com os trabalhadores e com a sociedade em geral. Procuram apresentar para a sociedade como segmento que preza a “responsabilidade social” e, ao mesmo tempo, não respeitar esse valor com relação aos trabalhadores. (SOUTO MAIOR, 2008)

Reclamam de que cessando o vinculo empregatício, mesmo com um fundamento, a Convenção 158 da OIT obriga que a lide seja submetida ao crivo do judiciário o que acarretaria uma demora processual e uma situação de incerteza. No entanto, conforme citado por SOUTO MAIOR, este argumento apresentado não condiz com a realidade atual do pais, pois nos processos que correm na Justiça do Trabalho sempre há menção à Comissão de Conciliação Prévia, sinônimo  de agilidade e eficiência. Este segmento empresarial vislumbra a “modernidade” apenas para implementar convenções que reduzam direitos trabalhistas e para instituir Comissões de Conciliação Prévia que favoreçam a prática de fraude aos direitos constituídos, forjando acordos com base na necessidade do trabalhador, já conduzido à condição de desemprego, sem qualquer motivação.

É importante destacar, segundo VIANA, que sendo considerada injustificada a dispensa do trabalhador e, não for possível/aconselhável a sua reintegração, há determinação de pagamento de indenização ou outra reparação apropriada (arts. 10 e 12). Entende-se com isto, a solução natural dada pela Convenção, em caso de despedida imotivada, encontra-se na reintegração do trabalhador (sanção reconstitutiva), ou seja, na "anulação do ato patronal que não se fundar, comprovadamente, em qualquer dos motivos relacionados no art. 4º". (SÜSSEKIND, apud VIANA, 2004, p. 142).

Ajustado com a melhor interpretação, a sanção compensatória, prevista no supracitado art. 10 da Convenção n. 158 da OIT, representa uma "fórmula flexível", de forma a atender a países que consideram inviável o retorno do trabalhador ao emprego, quando imotivadamente dispensado. (VIANA, 2009)

O que se pretende com os argumentos contrários à concessão de um mínimo de segurança jurídica aos trabalhadores é a manutenção de um sistema perverso que suga o trabalhador, explorando sua mão de obra ao extremo e depois o jogando fora como se fosse um nada, demitindo-o sem qualquer motivação e substituindo-o como se fosse apenas número e não pessoa. O que as empresas desejam é a liberdade de descontratar quando quiserem sem qualquer ônus. Sem a necessidade de dar explicações a ninguém ou utilizando da prepotência que lhe é peculiar, violar direitos trabalhistas de seus empregados.

O certo é que a defesa da não ratificação da Convenção da OIT está envolta em retóricas, que servem apenas para esconder propósitos não declarados de manutenção e aprofundamento de uma lógica de exploração e exclusão.

Em síntese, a Convenção 158 proíbe a demissão desmotivada de um trabalhador, “a menos que exista para isso uma causa justificada, relacionada com sua capacidade ou seu comportamento, ou baseada nas necessidades de funcionamento da empresa, estabelecimento ou serviço”. Mesmo assim, a relação de emprego não deverá ser finalizada antes que tenha sido dada ao trabalhador a chance de se defender das acusações formuladas contra ele. (Dieese – NT, 2008)


5. RELAÇÃO ENTRE O FILME ELES NÃO USAM BLACK-TIE DE 1981 E A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988.

O filme baseado no livro de Gianfrancesco Guarnieri, intitulado “Eles não usam Black-tie de 1981”, apresenta alguns aspectos da Sociedade brasileira que ainda no ano de 2012, são fáceis de serem identificados como, a luta de classes, a desigualdade social e a má distribuição de renda. Faz também referência a um dos episódios mais tristes da história do Brasil, a repressão pelo regime militar.

O filme conta a história de um pai por nome Otávio, a personificação do brasileiro que luta, sofre, mas não desiste de seus ideais. Otávio é líder de um movimento grevista e possui o respeito de seus companheiros de trabalho. Na fábrica onde trabalha, outros operários injustiçados por serem demitidos, desejam iniciar a grave antes do combinado.

Otávio possui um filho por nome Tião, que não vê o movimento grevista da mesma forma que o Pai. A infância de Tião foi longe do pai, residindo com padrinhos na cidade, enquanto o pai estava preso. Tal situação não entrava na cabeça de Tião e o espírito de luta do pai não se amoldava ao seu estilo de vida. Outro personagem que aparece no filme é Romana, mãe de Tião e esposa de Otávio. Na casa ela é considerada o alicerce da família, alguém que é possível contar nos momentos difíceis.

 No filme é possível notar de maneira clara, os sujeitos em conflito, o sindicato e a indústria. Estes sujeitos são inseridos dentro de um processo de transição, do regime militar ditatorial para o sistema capitalista. Para a consolidação do sistema, era necessário a fixação de preços e o controle sobre o emprego. As fábricas possuíam policiais e vigias que detinham a obrigação de manterem a ordem e a disciplina. Instituições estatais e não-estatais, como a Igreja, a escola e o próprio Estado, utilizando do Controle Social Formal e Informal, procuravam incutir nas pessoas sentimentos sociais e éticos associados ao trabalho.

Diante de uma situação insustentável, os trabalhadores se reúnem através de sindicatos e se organizam na busca de melhores condições de trabalho e direitos trabalhistas. Não podendo ficar inerte à situação, o Estado adota algumas posturas como políticas fiscais de transporte, equipamentos públicos, assistência médica, educação e habitação. Em virtude da falta de planejamento, os gastos começaram a gerar um déficit na economia pública. (GUARNIERE, 1981)  

O personagem Tião, filho de Otávio, que não via o movimento grevista com bons olhos, após engravidar sua namorada Maria, decide casar com ela. Por medo de represálias e perder seu emprego, Tião desiste da grave, decepcionando todos de sua família, inclusive sua namorada. Em virtude da conduta de Tião, o movimento dos operários perde controle e se desestabiliza. Para manter a ordem, os militares intervêm no movimento causando a morte de um dos lideres sindicais. Com a morte do líder sindical o movimento ganha força, a esperança renasce e a vontade de continuar lutando por democracia e melhores condições de vida e trabalho passa ser a tônica do movimento sindical. (GUARNIERE, 1981)  

Diferentemente do episódio fatídico citado, em que trabalhadores eram tratados como se fossem infratores da lei e vigiados como se fossem baderneiros em potencial, a Constituição de 1988, redimensionou as relações entre os sindicatos e o Estado através da adoção de dois princípios básicos, o da auto-organização sindical e da autonomia de administração dos sindicatos, o primeiro permitindo a livre criação dos sindicatos, sem a necessidade de prévia autorização do Estado, o segundo assegurando aos sindicatos liberdade para que pudessem praticar, segundo as próprias decisões, os atos de interesse interno com liberdade de administração[2].

A negociação coletiva foi incentivada como meio apto para a solução de questões como as novas condições de trabalho resultantes da diminuição da jornada sob a forma de turnos ininterruptos de revezamento e a redução geral dos salários. (NASCIMENTO, 2009. p. 75).           

A ampliação do direito de greve assumiu dimensão até então desconhecida no ordenamento jurídico pátrio, combinada, no entanto, com uma nova figura, de finalidade limitativa dessa amplitude, o abuso de direito, que, uma vez configurado, autoriza a responsabilização daquele que nele incorre. (NASCIMENTO, 2009. op. Cit. p. 75)

Embora o inciso I do artigo 8º vede ao Poder Público a interferência e a intervenção na organização sindical, mantém a contribuição sindical obrigatória a todos os que exercem uma atividade econômica, profissional ou autônoma, independentemente de serem ou não filiados ao sindicato. Manteve também a unicidade sindical, a obrigatoriedade da participação dos sindicatos nas negociações coletivas e estendeu ao aposentado o direito a ser votado nas organizações sindicais, pois antes lhe era conferido apenas o direito ao voto. (BARROS, 2012. p. 66)

Por fim, assegurou a garantia de emprego provisória ao dirigente sindical desde o registro de sua candidatura ao cargo de direção ou representação sindical e, se eleito, ainda que suplente, até um ano após o final do mandato, salvo se cometer falta grave, nos termos da lei[3].


6. CONCLUSÃO

O desemprego no Brasil é um grande problema social e deve ser visto como tal. O medo de ser conduzido ao desemprego injustificadamente gera fragilidade e propicia um clima de incerteza na vida do trabalhador. Preocupado com essa situação, o Constituinte originária deixou expresso na Constituição da República a proteção ao trabalho contra despensa arbitrária, o que garantiria ao trabalhador uma estabilidade. No entanto, deixou para lei complementar a regulamentação do referido assunto e permitiu ao empregador, a indenização quando o vinculo empregatício fosse cessado de forma injustificada. A lei complementar foi omissa e o problema somente se resolve se o Brasil ratificar a convenção 158 da OIT. Como foi possível notar ao longo do trabalho, existem entreves políticos e econômicos que impedem a aprovação da referida convenção. Foi possível perceber também, que a Constituição de 1988, trouxe avanços significativos aos trabalhadores formais brasileiros e que a informalidade afasta do trabalhador a possibilidade de gozar de direitos constitucionais trabalhistas.     


7. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988: atualizada até a Emenda Constitucional número 66, de 13-07-2010. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.

BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 8 ed. São Paulo: LTR, 2012.

BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 27 ed. atual. São Paulo: Malheiros Editores LTDA, 2012

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FONSECA, Maria Emília. Direito ao trabalho: um direito fundamental no ordenamento jurídico brasileiro. São Paulo: Ed. LTR, 2009.

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GUERRA, Rogéria Gladys Sales. O Direito Fundamental ao Trabalho e o Papel da Empresa na Sociedade Pós-Moderna. Disponível em <http://www.asces.edu.br/publicacoes/revistadireito/edicoes/2011-1/gladys-novo.pdf> Acesso em 28 de Setembro de 2012.

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NOTAS:

[1] Estes princípios citados de proteção do trabalhador nem sempre estiveram constitucionalmente protegidos, tal conquista foi produto de uma evolução da sociedade e da legislação brasileira. Cf. BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. p. 541 a 571.

[2] Esta não intervenção estatal permitirá aos Sindicatos definirem seus estatutos, os órgãos  de sua direção, as deliberações em assembléia, as eleições. Cf. NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito do Trabalho. p. 75-76.

[3] A CF 88 ainda inovou em outros aspectos. Para saber mais Cf. BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. p. 62-67; Cf. BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. p. 541-571; Cf. NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito do Trabalho. p. 75-87; Cf. DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. p. 114-126.


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