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Guarda compartilhada

Guarda compartilhada

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O Artigo faz referência à nova lei da Guarda Compartilhada, trazendo esclarecimentos da mesma.

O grande assunto que rodeia as discussões sociais e populares dentro do Direito de Família é a questão da GUARDA COMPARTILHADA. Este  tema faz com que muitos pais se questionem sobre este grande e relevante progresso trazido pela nova Lei 13.058/2014, diploma legal  que altera, ou que deveria alterar, a REGRA GERAL para a Guarda Compartilhada.

O objetivo do legislador é altamente inteligente e positivo, entretanto a presente publicação tem o condão de esclarecer, ou quem sabe afastar, alguns mitos que estão sendo criados pela cultura popular. Essa lei introduz a regra de que a GUARDA COMPARTILHADA deverá ser aplicada  sempre em que ambos os genitores estiverem aptos ao exercício do poder familiar, a menos, evidente que algum deles se declare formalmente impedido ou impossibilitado e que assim não deseja exercer este direito.

Vamos analisar a redação da nova lei de guarda compartilhada.

Lei 13.058, de 22 de dezembro de 2014

Art. 1.583 CC, § 2º  - Na guarda compartilhada, o tempo de convívio com os filhos deve ser dividido de forma equilibrada com a mãe e com o pai, sempre tendo em vista as condições fáticas e os interesses dos filhos.

Art. 1.584 CC, § 2º - Quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, encontrando-se ambos os genitores aptos a exercer o poder familiar, será aplicada a guarda compartilhada, salvo se um dos genitores declarar ao magistrado que não deseja a guarda do menor.

A partir da data de vigor da lei, então, a nossa legislação passa a prever dois tipos de guarda: Compartilhada - a criança ou adolescente mora com um dos pais, mas não há regulamentação de visitas nem limitação de acesso à criança em relação ao outro, as decisões são tomadas em conjunto e ambos dividem responsabilidades quanto à criação e educação dos filhos.

 Unilateral - a criança mora com um dos pais que detém a guarda e toma as decisões inerentes à criação, o outro passa a deter o direito de visitas, prerrogativa que é regulamentada pelo juiz. A pensão alimentícia, fixada mediante acordo entre as partes ou pelo judiciário, passa a ser obrigação do pai que detém o direito de visita.

A grande confusão que passa a existir diz respeito com quem ficará as crianças, e em quais dias. Essa situação não se trata da GUARDA COMPARTILHADA e sim da GUARDA ALTERNADA. A experiência jurídica e mesmo a opinião de diversos especialistas de outras áreas, tais como na psicologia ou mesmo no Serviço Social, têm tido esta última como extremamente prejudicial aos menores. Tal situação poderia causar uma insegurança e uma instabilidade que atrapalharia a rotina dessas crianças, pois elas acabariam não sabendo onde ficariam no dia seguinte. Certamente, não é este o objetivo do referido e novo dispositivo legal.

Então,  a Guarda Compartilhada parte do pressuposto de que a criança tem em sua mente o seu porto seguro perfeitamente delimitado no que se poderia chamar de residência-base, cabendo ao juiz decidir se é com o pai ou se é com a mãe. O judiciário pode se valer da opinião de especialistas no campo da psicologia ou mesmo do Serviço Social para se melhor investigar qual seria o melhor ponto de referência, ou seja, na casa da mãe ou na casa do pai.

A grande inovação que pensamos que o legislador quis trazer, foi a de  que ao outro genitor, que compartilhará a guarda, caberá exercê-la de forma mais ampla. Poderá ele participar de decisões e de todos os cuidados necessários para uma boa educação dos filhos. A PERMANENTE CONVIVÊNCIA dos filhos é o ponto NUCLEAR da guarda compartilhada e sempre que possível PREDETERMINADA pelo julgador.

A guarda compartilhada não significa que o tempo de convivência dos pais tenha que ser igualitário, mas sim uma melhor divisão dos acontecimentos educacionais dos filhos. Então, poderiam ser mais bem  distribuídos os finais de semana, os eventos escolares, os pernoites e outros eventos educacionais ou mesmo de lazer. É de fundamental importância ressaltar que uma  convivência mais efetiva para aquele que antigamente não possuía a guarda é  essencial para a boa formação psicológica da criança.

É preciso destacar um fato:  sempre que os conflitos entre os pais forem exarcebados, isto AFASTARÁ a possibilidade da Guarda Compartilhada. Essa constatação de relacionamento inconveniente entre os genitores tem sido os fundamentos para que os Tribunais AFASTEM a possibilidade do deferimento da Guarda Compartilhada.

A crítica construtiva que se quer aqui registrar é  a premissa de que a REGRA INICIAL é o deferimento por parte da Justiça da guarda compartilhada, mas tal princípio ainda   não é verdadeiro. Em uma busca nos diversos julgamentos (jurisprudências) de nosso Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, podemos aferir, sem sombra de dúvida, que 95% das decisões afastam a guarda compartilhada  como premissa inicial ou como regra básica a ser aplicada e ainda primam pela guarda unilateral.

Assim, os entendimentos atuais e majoritários somente deferem o pedido da Guarda Compartilhada quando houver CONSENSO entre as partes. Tal situação culmina por ser minoria pelo natural processo de rompimento dos casamentos e mesmo das Uniões Estáveis. As decisões sabiamente norteiam que não é a conveniência dos pais que deve ser levada em conta e sim o bem-estar das crianças.

A título ilustrativo,  reproduzimos aqui as palavras do Eminente Desembargador Sergio Fernando de Vasconcellos Chaves em recente julgamento ocorrido no dia 17 de dezembro de 2014,  que diz respeito à Guarda Compartilhada:

“Para que a guarda compartilhada seja possível e proveitosa para a filha, é imprescindível que exista entre os pais uma relação marcada pela harmonia e pelo respeito, onde não existam disputas nem conflitos, mas, quando o litígio é uma constante, a guarda compartilhada é descabida. Recurso desprovido. (Apelação Cível Nº 70062745229, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, Julgado em 17/12/2014)”.

De fundamental importância ressaltar que sempre que possível, o menor “deve ter sua opinião devidamente considerada”, livre de pressões e influências das partes e eventuais interessados, “respeitado seu estágio de desenvolvimento e grau de compreensão sobre as implicações da medida” (artigos 2º, 15, 16, incisos I e II, 28, parágrafos 1º e 2º, e 83, caput, do Estatuto da Criança e do Adolescente).

Pelas atuais decisões judiciais, a fixação da guarda compartilhada pelo juiz somente ocorrerá quando houver diálogo e civilidade entre os pais. Casais que vivem brigando e que não conseguem dialogar dificilmente estarão aptos a adotar esse tipo de guarda. Então mesmo diante da possibilidade prevista em lei, o juiz acaba não impondo a guarda compartilhada.

Devemos esclarecer que somente o passar do tempo com o aquecimento de decisões adequadas ao espírito da lei é que conseguiremos colocar em prática a literalidade deste dispositivo. Em que pese a regra de aplicação dar a impressão de ser a da guarda compartilhada, nossa experiência faz-nos concluir o contrário. A parte interessada terá de se esforçar muito para que haja o perfeito convencimento do judiciário de que a Guarda Compartilhada é o ideal para o menor, mesmo quando houver conflito.

Não obstante, é absolutamente salutar e digno que o genitor ou genitora lute por uma maior convivência com seu filho (a) e busque, dentro dos princípios verdadeiros e éticos, convencer o judiciário, que a sua convivência irá certamente trazer benesses futuras a boa formação psicológica de seu filho, situação esta que muitas vezes irá se refletir favoravelmente no campo profissional ou mesmo em seu campo pessoal.

Importante destacar que continua valendo a obrigação da pensão alimentícia para os dois tipos de guarda, conforme observou o Juiz Arnaldo Camanho: "A obrigação de sustentar o filho continua existindo". No entanto, os valores poderão ser revistos, diante do aumento ou redução das despesas dos responsáveis.

Absolutamente equivocada  a ideia de que ao garantirem o direito da Guarda Compartilhada ficariam isentos da obrigação alimentar. Como afirmado anteriormente, muito embora as decisões a respeito dos filhos sejam tomadas por ambos os pais, a guarda, evidentemente, fica com apenas um deles. Assim, àquele que não ficou com a guarda cabe a obrigação de ajudar financeiramente.

Porém, há uma divisão proporcional dos gastos na criação dos filhos, na medida das condições financeiras de cada um dos pais, levando em consideração o que foi previamente acordado. Assim, além de dividirem os cuidados e as principais decisões sobre os filhos, os pais também devem dividir as despesas. Mas também não significa que o rateio dessas despesas deva ser igualitário e sim de acordo com as possibilidades de cada um deles.

E as consequências para aquele que descumprir o acordado, deixando de pagar a pensão, são as mesmas da guarda unilateral, “podendo sofrer execução até com a possibilidade de ver sua prisão decretada, além de outras medidas como a inscrição de seu nome no cadastro de devedores de pensão alimentícia, em empresas de proteção ao crédito como SPC e SERASA”, segundo a Assessoria de Comunicação do IBDFAM.

Portanto, ainda que um dos genitores, que não possuía a guarda da criança, faça um pedido de guarda compartilhada ao juiz, e este revisando a decisão anterior a conceda, o pagamento da pensão alimentícia subsistirá. E assim é, pois a mudança da guarda unilateral para a guarda compartilhada trará consequências/benefícios para a criança e para o adolescente, vantagens  que não se confundem com a desobrigação financeira.

Curioso é o entendimento da 7ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Quando pai e mãe divorciados trabalham e os gastos com a filha não são extraordinários, ambos devem arcar com as despesas. Por isso, a 7ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul negou o pedido de pensão alimentícia provisória, no valor de R$ 2,5 mil, feito pela mãe de uma criança cuja guarda é compartilhada com o pai.

Após o divórcio, o Juizado Regional da Infância e Juventude da Comarca de Santa Cruz do Sul determinou, em caráter provisório, a guarda compartilhada da criança de dois anos de idade. Ficou estabelecido, portanto, que ela deveria passar 15 dias do mês com a mãe e outros 15 dias com o pai. O pedido de pagamento de pensão pelo pai foi negado.

A mãe recorreu ao TJ-RS, argumentando que seu salário não possibilita arcar com todos os gastos e que a guarda é, na verdade, por ela exercida. Ela também sustentou que a decisão em caráter provisório da guarda compartilhada não exonera o pai do cumprimento da obrigação alimentar.

Relatora do recurso, a desembargadora Liselena Schifino Robles Ribeiro declarou sem rodeios  que a guarda compartilhada não é motivo suficiente, por si só, para impedir a fixação de pensão alimentícia provisória. Porém, no caso em questão, ela levou em conta que os dois pais trabalham e os gastos com a filha não são extraordinários, cabendo aos dois arcar com as despesas no período em que a menina se encontra sob seus cuidados.

De fundamental importância ressaltar que sempre que possível o Magistrado da Vara de Família poderá ouvir PESSOALMENTE o menor. Com tal procedimento poderá melhor apreciar a VONTADE e os SENTIMENTOS do filho (s) do casal e assim uma mais justa decisão que leve em consideração também o seu BEM-ESTAR. Também poderá contar com o auxílio de Psicólogos ou Assistentente Social para facilitar uma melhor comunicação com o criança ou adolescente.

Por derradeiro, cada caso sempre merece a sua apreciação sempre pensando no INTERESSE DO MENOR e a consagração da Guarda Compartilhada somente ocorrerá quando houver um mínimo de sociabilidade entre os divorciandos.



 



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