Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/36884
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

O regime jurídico administrativocomo instrumento de controle da atividade administrativa

O regime jurídico administrativocomo instrumento de controle da atividade administrativa

||

Publicado em . Elaborado em .

Por consistir em um sistema coerente e lógico, considerado a principal ferramenta para gerenciar a atividade administrativa, conceitua-lo e compreender como controla a atividade administrativa e seus princípios, são os objetivos dessa pesquisa.

 O artigo trata da importância do Regime Jurídico Administrativo como instrumento de controle da atividade administrativa. Por consistir em um sistema coerente e lógico, considerado a principal ferramenta para gerenciar a atividade administrativa, conceituá-lo, compreender como controla a atividade administrativa e a importância dos princípios como pedras toque dessa atividade, são os objetivos desta pesquisa. Para alcança-los a pesquisa será de tipo bibliográfica.


Introdução


            Compreender como funciona o controle da atividade administrativa dentro do regime jurídico administrativo, deveria ser uma tarefa não só dos acadêmicos de Direito, mas também, dos cidadãos em geral, pois todos encontram-se sob a égide do plexo normativo no qual se estrutura a administração pública.
A visão leiga que se tem dessa atividade sobrepujante, na qual encontra-se inserido os cidadãos, muitas vezes deturpa a compreensão destes e os deixam atônitos diante de determinados atos de Poder Público. Reclamam quando não o poderiam reclamar e, calam-se quando não deveriam calar. Por isso, o regime jurídico administrativo atua imperativamente de forma a coibir ou proibir os atos em desconformidade com a lei estando dessa forma de encontro com as funções que são pertinentes à sociedade. Há na verdade, a predominância do interesse~coletivo. Para entender como isso ocorre é necessário compreender como se estrutura o regime administrativo, seus princípios como forma de controle.
A pesquisa, foi do tipo bibliográfica, possibilitando aos autores do presente trabalho um maior panorama do assunto estudado, que devido a sua amplidão necessitaria de mais recursos para ser completo. O método de procedimento utilizado, por sua vez, foi histórico e conceitual, isso porque para entender a essência do trabalho, do objeto em estudo, é imprescindível o reconhecimento da evolução que o segue.
1  Regime jurídico administrativo
          Ao discorrer sobre Direito Administrativo que é segundo Celso Antônio Bandeira de Mello “uma disciplina jurídica autônoma”, é indispensável que se discuta sobre elementos inerentes a essa disciplina, como por exemplo: o conceito moderno de Estado, sua estrutura, seus poderes e suas respectivas funções, e ainda o conceito de Direito Administrativo, sua evolução e importância para a atividade administrativa. Ele nasce com o Estado de Direito. Não se pode falar em Direito Administrativo se referindo a algo semelhante aquilo que existia no período histórico que preceda a submissão do Estado à ordem jurídica (MELLO. 2011:47). Com o Estado de Direito, noção que se baseia na regra de que, ao mesmo tempo em que o Estado cria o direito deve sujeitar-se a ele, não há como continuar com a vinculação que havia com o regime jurídico que predominava naquela época. A expressão “Estado de Direito”, foi cunhada na Alemanha e significa a exteriorização de um ente que, segundo o direito brasileiro:
“... o Estado é um ente personalizado, apresentando-se não apenas exteriormente, nas relações internacionais, como internamente, neste caso como pessoa jurídica de direito público, capaz de adquirir direitos e contrair obrigações na ordem jurídica.” (CARVALHO FILHO, 2011:1)
Esse ente compõe-se de poderes, que são segmentos estruturais em que se divide o poder geral e abstrato, (porque ao que estamos tratando é uma pessoa jurídica, segundo a teoria da ficção idealizada por Savigny). Os poderes de Estado, no art. 2º da nossa Constituição, figuram de forma expressa na seguinte redação: são Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. A cada Poder foi atribuída determinada função. Ao Legislativo cabe a função normativa; ao Executivo a função administrativa, e ao Judiciário, a função jurisdicional. É importante que se frise a respeito das~funções dos poderes. Não há, exclusividade no exercício das funções pelos poderes, o que há, na verdade, é preponderância. Conforme a Constituição, deve haver independência e harmonia entre eles, porque cada qual possui sua própria estrutura, não se subordinando dessa forma a nenhum outro, mas naquilo que lhe couber, poderá desempenhar uma função que normalmente é desempenhada por outro poder, inclusive acredita-se que assim seja uma forma de limitar ou diminuir os excessos de um ou outro poder. Pois bem, embora eles tenham função normal, ou seja, a função que lhe é atribuída (funções típicas), desempenham funções de responsabilidade de outro Poder, ou melhor, que deveriam ser executadas pelo poder respectivo, desempenhando agora funções atípicas. Com previsão legal vê-se o Legislativo atuando na função jurisdicional quando o art. 52º, da Constituição Federal diz que o Senado poderá processar e julgar o Presidente da República nos crimes de responsabilidade; há inclusive previsão legal para que Ministros do STF também o façam pro crimes de responsabilidade, conforme está expresso no artigo supracitado.
O Judiciário, também pratica atos de função legislativa ou normativa, quando da elaboração de regimentos internos dos tribunais, conforme o art. 96º, I “a”, da Constituição Federal. O Legislativo e o Judiciário também exercem função administrativa, quando na organização dos serviços, conforme previsto na Constituição. Quanto à função jurisdicional, o atual sistema constitucional brasileiro não prevê que seja exercido pelo Executivo. O sistema jurisdicional brasileiro segue caminho diferente do que foi adotado pela França, que é o do contencioso administrativo. No Brasil segue aquele caracterizado pela jurisdição única. Antes de falar sobre essa particularidade, é importante que seja tratado outro tema que foi muito discutido no final do século passado e que no Brasil, foi alvo de grande divergência, que é a autonomia do Direito Administrativo em face do Direito Constitucional. Para Hely Lopes Meirelles o Direito Administrativo no Brasil não se atrasou cronologicamente das demais nações. No entanto, adquiriu particularidades que lhe atribuíram características típicas deixando difícil uma conceituação que se aproxime das conotações internacionais (MEIRELLES. 2008:52). A doutrina estrangeira não é mais a fornecer o conceito exato de Direito Administrativo Brasileiro porque a concepção desse ramo do Direito é diversa.
Para Carlos de Barros Júnior, ele “abrangerá, entre nós, todas as funções exercidas pelas autoridades administrativas de qualquer natureza que sejam” (BARROS JUNIOR. 1993:11); e mais, as atividades que, pela sua natureza e forma de efetivação, possam ser consideradas como tipicamente administrativas. ~Um elemento também passível de discussão é quanto a codificação do Direito Administrativo, que tem colocado doutrinadores em posições diversas, constituindo uma parte por aqueles por negam suas vantagens, os que admitem a codificação parcial e por aqueles que propugnam pela codificação total. Para Hely Lopes Meirelles “a reunião dos textos administrativos em que um só corpo de Lei não só é perfeitamente exequível, como proporcionará à Administração e aos administrados maior segurança na observância e aplicação das normas administrativas” (MEIRELLES. 2008:48), consequentemente facilitará uma compreensão concernente a essas normas. Para o renomado autor, os estágios que antecediam a codificação administrativa. A codificação facilitará o trabalho, no tocante a aplicabilidade daqueles que queiram ou sintam a necessidade de lidar com tal regime.
2 O sistema administrativo
O sistema de controle jurisdicional da administração é o regime adotado pelo Estado para a correção de atos administrativos ilegais e ilegítimos praticados pelo Poder Público em qualquer departamento de governo. Ilegais, quando praticados em desconformidade com as prescrições jurídicas e, ilegítimos aqueles praticados por quem não tem a competência para tal atividade. Há dois sistemas de controle jurisdicional bem diferentes: o do contencioso administrativo, denominado também de sistema francês e, o sistema judiciário ou de jurisdição única chamado também de sistema inglês. Para Hely Lopes Meirelles, atualmente “nenhum país aplica um sistema de controle puro, seja, através do Poder Judiciário, ou através de tribunais administrativos” (MEIRELLES. 2008:54). A predominância da jurisdição comum ou especial, é o que caracteriza um ou sistema, e não a exclusividade de qualquer deles, para “o delinde contencioso das questões afetas à administração.”
O Brasil adotou o sistema da jurisdição única, ou seja, do controle administrativo pela justiça comum. Essa opção vem desde a instauração de sua primeira República. Desde o início manteve-se vinculado ao sistema Anglo-Saxônico, que é a separação entre o administrativo e o judiciário. Conclui-se que é inconcebível uma aproximação do contencioso administrativo e o que se tem na legislação brasileira, porque todos os interesses do particular o do Poder Público, se sujeitaram a uma única jurisdição: a do Poder Judiciário. Não sequer aqui, negar à administração e o direito de decidir sua possibilidade de exercer funções materialmente judiciais ou de empreitar o que seria próprio da “res judicata”. Há no Brasil órgãos e comissão~com jurisdição administrativa, mas suas decisões não tem caráter conclusivo para o Poder Judiciário, ficando sujeitas a revisão judicial. Na Constituição Federal de 1998, no art. 5º, XXXV está escrito: “A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça o direito”. Infere-se desse enunciado que, adotou-se no Brasil, o sistema de jurisdição na qual apenas o Judiciário poderá julgar ou decidir contendas que envolvam a atividade administrativa em caráter judicial.
Pois bem, só se pode falar em Direito Administrativo, sob o pressuposto de que existem princípios que lhe são peculiares e que guardam uma lógica de coerência e unidade. Esse pensamento de Celso Antônio Bandeira de Mello é o principal elemento que conceitua tal Direito ou ainda lhe serve como regra (MELLO. 2012:99). A composição de elementos (principais) sob uma perspectiva unitária é o regime jurídico administrativo, que se delineia em função de dois princípios: a supremacia do interesse público e a indisponibilidade, pela administração, dos interesses públicos. Os dois realçados pela repercussão no ordenamento jurídico. Veja-se que não são realçados em si mesmo, mas, no desdobramento que se dá a partir deles, ou seja, na gama ou plexo de princípios e subprincípios que repercutem deles. A atividade administrativa é a administração como atividade jurídica, sua natureza e finalidade, seus princípios básicos, os poderes e deveres do administrador público e os seus atos. A atividade administrativa é subordinada à lei, compreende-se que esteja submetida a uma série de princípios e estes como elementos que compõem um sistema jurídico são os norteadores de toda e qualquer atividade que venha a ser tomada. Daí a importância do regime jurídico administrativo na atividade administrativa, visto que o fim de todo esse arcabouço é o interesse da coletividade no tocante e o bem da coletividade.
3 Princípios Constitucionais
Para Celso Antônio Bandeira de Mello a atividade jurídica da administração subordinada à lei, é a afirmação de que a administração assim como as pessoas administrativas não tem disponibilidade sobre os interesses públicos (MELLO. 2012:109), compreende-se que estejam submetidas à princípios, entre eles o da legalidade, com suas implicações e decorrências, a saber: princípios da finalidade, da razoabilidade, da proporcionalidade, da motivação e da responsabilidade do Estado; o princípio da continuidade do serviço público; do controle administrativo ou tutela; da isonomia; da publicidade; da inalienabilidade e do~controle jurisdicional dos atos administrativos. Cabe agora discorrer um pouco sobre alguns, visto que eles se sobressaem por terem tipicidade própria e não derivada, ou seja, não são subprincípios.
A legalidade é a subordinação da atividade administrativa à lei e surge como decorrência natural da indisponibilidade do interesse público. Portanto todo ato público deve estar revestido desse princípio para que não concorra em nulidade absoluta, visto que atos ilegais, não terão vida no mundo jurídico. Tal atividade não deve ser exercida em contraste com a lei. Não se resume apenas a ausência de oposição à lei, mas pressupõe autorização dela. Por isso se diz que: ao administrador só cabe o que a lei lhe permite fazer. Para entender uma lei, uma norma, é preciso saber qual seu objetivo. E para que não se torne censurável, não pode estar desencontrada com o fim legal, ou seja, a norma deve estar em sintonia com o escopo por ela visado. Por isso há o princípio da finalidade. Quando os objetivos de uma lei são alcançados, subtende-se que se obedeceu a sua finalidade, e isso, a torna legal. Logo, se cumpre a legalidade quando atende seu fim. Descende da legalidade, a razoabilidade, que é a disponibilidade da liberdade para eleger o comportamento cabível diante do caso concreto, de modo a evitar restrições desnecessárias por parte da administração pública. Ela está muito ligada à situação discricionária do administrador. Mas, a razoabilidade atua como critério, finalisticamente vinculado, quando se trata de valorização dos motivos e da escolha do objeto para a prática do ato discricionário. Não se pode confundir discricionariedade com liberdade e interesse do gestor na execução dos seus atos. Portanto, tal princípio é importante na aferição da legalidade porque: ao mesmo tempo que lhe concede liberdade para praticar ou escolher quais atos deve-se executar, não o faz aleatoriamente ou segundo sua vontade. O faz de forma vinculada a outros princípios, como Hely Lopes Meirelles:
“... não é conforme à ordem jurídica a conduta do administrador decorrente de seus critérios personalíssimos ou de seus standards pessoais que, não obstante aparentar legalidade acabe por falta daquela razoabilidade média, contrariando a finalidade, a moralidade ou a própria razão de ser norma em que se apoiou.” (MEIRELLES. 2008:93)
A proporcionalidade se parece em muito com a razoabilidade, pois ambas parecem ter as mesmas características e funções. No entanto, a proporcionalidade enuncia a ideia de que as competências administrativas só podem ser exercidas na extensão e intensidade correspondentes ao que seja realmente demandado para o cumprimento da finalidade do interesse público.~A publicidade é outro princípio importante para o regime jurídico administrativo principalmente no controle da atividade administrativa, porque ele é a divulgação oficial do ato para conhecimento público e para o início de seus efeitos externos. Ele é requisito de eficácia e moralidade. Pois se a administração é pública, todo e qualquer ato que venha a se relacionar a ela deve ser consequentemente pública. Todavia, não há como realizar atos legais sigilosamente, só se admitindo sigilo nos casos de em que estão previstos de forma expressa na lei. Após a Constituição Federal de 1988, o princípio da motivação foi inserido em nosso regime jurídico e é assim uma exigência do Direito Público. A administração deve justificar seus atos apontando-lhes os motivos que o levaram a tal execução. Em muitos atos a motivação está implícita, mas se for necessário que a aluda deve ser tal motivação prévia ou contemporânea à expedição do mesmo. Esse princípio está implícito na Constituição Federal no art. 1º, II, que aponta a cidadania como um dos fundamentos da República e ainda no parágrafo único deste artigo em epígrafe, segundo o qual todo o poder emana do povo, pois somente devem se sujeitar aquelas ajustadas às leis.
“Para Celso Antônio Bandeira de Mello, o ‘princípio da motivação é reclamado quer como afirmação do direito político dos cidadãos ao esclarecimento do porquê das ações de quem gere negócio’, daí a explicação para os interessados a respeito de cada ato a ser tomado, “quer como direito individual a não se assujeitarem a decisões arbitrárias.” (MELLO. 2012:115)
São vários os princípios que gerem a administração pública, mas, os que aqui foram elencados servem de exemplo de como o Direito Administrativo está à apoiado, tendo-os como elementos indispensáveis a sua própria existência; a importância deles no regime jurídico administrativo e consequentemente na atividade administrativa. Portanto não haveria como enumerá-los totalmente devido a sua amplidão. Para fazer parte do rol de princípios descritos nesse trabalho concluir-se-á falando da segurança jurídica. Este é de essência do próprio Direito, como condição de valores materiais que constituem a substância do ordenamento. Muitos dos que foram tratados estão presentes de forma expressa no art. 37 da nossa Constituição vigente.
CONCLUSÃO~Em sua evolução histórica, o Direito Administrativo ganhou novas vertentes principiológicas que o caracteriza cada vez mais, afastando-o da ideia de que ele veio inerente ao Direito Constitucional e assim se encontra. Pois bem, seus princípios lhes dão independência e características próprias fazendo-se necessário estudá-lo minuciosamente, como inerente a ele o regime jurídico administrativo, por ser uma de suas matérias centrais; considerando ainda tamanha importância deste na atividade administrativa. Conforme discorrido ao longo deste trabalho, o regime jurídico administrativo, está constituído de princípios que não só controlam a atividade administrativa, mas a torna propícia a uma aplicabilidade cada vez mais eficiente, voltada a principal finalidade de todo o arcabouço do agora tratamos, que é o bem social.
Pode-se concluir que é de fundamental importância, na atividade administrativa, todos os princípios que estão presentes na Constituição implícitos ou explícitos que de qualquer forma se interpretará sempre visando o bem de todos, de uma boa administração, que conforme está no artigo 37 da nossa Constituição, a eficiência também comum deles.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BARROS JUNIOR, Carlos S. de. Introdução ao direito Administrativo. 1954, pp. 85 e SS. Apud: MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo Brasileiro. 2008. 34º Ed. São Paulo. Malheiros editores. P. 47.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 34º Ed. Rio de Janeiro. Lumes Júris editora. 2011. P. 1.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo Brasileiro. 2008. 34º Ed. São Paulo. Malheiros editores. P. 54
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito administrativo. 2012. 29º Ed. São Paulo. Malheiros editores. P. 99


Autores


Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi.