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O princípio da cooperação no novo Código de Processo Civil como meio para uma lide mais célere, justa e efetiva

O princípio da cooperação no novo Código de Processo Civil como meio para uma lide mais célere, justa e efetiva

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O novo Código exige um juiz mais ativo na promoção do diálogo processual. Nesse contexto, cabe aprofundar o dever-poder de esclarecimento, de consulta, de auxílio, de ampliação de prazos, de flexibilização procedimental, dever de informação, entre outros.

"Na história da humanidade (e dos animais também) aqueles que aprenderam a colaborar e improvisar foram os que prevaleceram.”

O novo Código de Processo Civil, em seu artigo 6º, expressamente dispõe “que todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva”.

Princípio, derivado do latim principium (origem, começo), em sentido vulgar quer exprimir o começo de vida ou o primeiro instante em que as pessoas ou as coisas começam a existir. É, amplamente, indicativo do começo ou da origem de qualquer coisa. Princípios, no sentido jurídico, notadamente no plural, quer significar as normas elementares ou os requisitos primordiais instituídos como base, como alicerce de alguma coisa. 2

Mas o que entender por cooperação?

Cooperar. Do lat. cooperare, por cooperari. 1.Operar, ou obrar, simultaneamente; 2.Prestar colaboração, serviços; trabalhar em comum; 3.Ajudar;4.Prestar colaboração; 5.Ajudar, auxiliar; colaborar.

O princípio da cooperação tem sua origem na função dos princípios da boa-fé objetiva e do contraditório, e pressupõe uma conduta de lealdade por parte de todos sujeitos do processo.

A cooperação exige comportamento pautado nos padrões razoáveis de conduta, à luz do homem médio, que levem em consideração as legítimas expectativas estabelecidas em relação aos demais sujeitos processuais (boa-fé objetiva)3

Para Carlos Alberto Álvaro de Oliveira (apud Fredie Didier4) esse modelo caracteriza-se pelo redimensionamento do princípio do contraditório, com a inclusão do órgão jurisdicional no rol dos sujeitos do diálogo processual e não mais como um mero espectador do duelo das partes.

E embora uma parte da doutrina acredite que tal dispositivo tenha criado uma utopia, ou “um processo civil do arco-íris”, “processo civil dos ursinhos carinhosos” enfim, várias expressões como essas já foram levantadas, a nosso ver, o princípio da cooperação é “um quê” do novo Processo Civil, e as palavras de ordem são: colaboração, auxílio, harmonia, eficácia, boa-fé, etc.

Quando se diz que no processo haverá uma efetiva cooperação entre as partes e o juiz para a construção de uma decisão final justa, isso significa dizer que, apesar dos interesses divergentes que possam existir no confronto de pretensões, o certo é que todos devem pautar a sua efetiva participação processual como colaboradores, agindo de forma leal e com boa-fé, fornecendo ao juiz subsídios para a construção de uma decisão équo e justa5.

Não se pensa aqui em um jardim do Éden, em que as partes vivem na bela harmonia entre si, mas deseja-se que os litigantes cooperem, até porque a cooperação não inibe a defesa reta dos interesses das partes pelos seus advogados, que, apesar de estarem em campos opostos, têm a obrigação de observar os deveres de veracidade e de lealdade. Sob outro ângulo, este vínculo cooperativo levará o juiz a dirigir o processo assegurando a liberdade das partes e a igualdade, tudo com vias a minimizar as diferenças fáticas, direcionando o processo para uma decisão rápida e justa6.

Mas o princípio da cooperação não diz respeito somente às partes. Os deveres de cooperação são conteúdo de todas as relações jurídicas processuais que compõem o processo: autor-réu, autor-juiz, juiz-réu, autor-réu-juiz, juiz-perito, perito-autor, perito-réu etc. Essa é a premissa metodológica indispensável para compreender o conteúdo dogmático do princípio da cooperação7.

E não se trata de colaboração no sentido de fornecer informações ou simplesmente não atuar com má-fé: todos – juízes, demais operadores do direito, auxiliares da justiça e partes – devem estar atentos para efetivamente atuarem de forma colaborativa uns com os outros, para que o processo alcance seu objetivo. É preciso haver reciprocidade, o que fica evidenciado pela inclusão da expressão 'entre si' no texto deste CPC 6º8.

O novo Código exige um juiz mais ativo, com uma participação mais efetiva. A sua atuação deverá fazer parte do diálogo processual. E, nesse contexto, vale lembrar alguns deveres trazidos pela doutrina: dever-poder de esclarecimento, de consulta, de auxílio, de ampliação de prazos, de flexibilização procedimental, dever de informação, entre outros.

Em recentes decisões, os Tribunais se manifestaram sobre a matéria:

“(…) Consoante preceitua o princípio da cooperação, o magistrado também possui relevante papel na condução do processo, de modo que sua atuação deve se dar de maneira a contribuir com a celeridade e efetividade da tutela jurídica. (TJ-MG Agravo de Instrumento 1014513067669800, Data de publicação: 24/03/2015)

“(...).O princípio da cooperação impõe que o magistrado comunique às partes a intenção de abreviar o procedimento, julgando antecipadamente a lide. Essa intimação prévia é importantíssima, pois evita uma decisão-surpresa, que abruptamente encerre o procedimento, frustrando expectativas das partes. (TJ-AM APL 07195088020128040001, Data de publicação: 01/03/2016)

“(…) O princípio da cooperação consiste no dever de cooperação entre as partes para o deslinde da demanda, de modo a se alcançar, de forma ágil e eficaz, a justiça no caso concreto. 3. O indeferimento da petição inicial, sem a oportunidade de emenda, constitui cerceamento do direito da Autora, em verdadeiro descompasso com o princípio da cooperação. (TJ-DF AC 20150110703592, Data da publicação: 01/10/2015)

“ Estando evidenciada a insuficiência de elementos para orientar o julgador acerca do juízo de mérito, impõe-se a instrução do processo, contando o magistrado com poderes para determinar o suprimento de falhas e a produção de provas. Prestígio ao art. 6º do CPC, que enaltece o princípio da cooperação entre todos os agentes do processo a fim de se alcançar a justa, efetiva e completa decisão de mérito. DE OFÍCIO, DESCONSTITUÍRAM A SENTENÇA. UNÂNIME. (TJRS Apelação Cível Nº 70070067863, Julgado em 15/09/2016)

“Conforme o Princípio da Cooperação positivado no art. 6º do Novo Código de Processo Civil, às portas de entrar em vigor, é dever dos sujeitos processuais cooperarem entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva. 3. A extinção do processo, sem resolução do mérito, tendo por fundamento o não cumprimento de ordem judicial a qual a parte veio aos autos, justamente, manifestar o seu não entendimento quanto ao que pretendia o juízo, caracteriza violação ao devido processo legal e, por consequência, ao Princípio da Cooperação, base da nova ordem legal processual civil. APELAÇÃO PROVIDA. (TJRS, Apelação Cível Nº 70048521165, Julgado em 08/03/2016)

Este breve artigo propôs uma reflexão acerca da cooperação no processo e a relevância de sua aplicação para obtermos um resultado satisfatório da lide.

Por derradeiro, ressalta-se mais uma vez que não se entende que o princípio da cooperação seja o paraíso na terra e que não existirá mais litígio ou que as partes agora desistirão de toda lide e se abraçarão e nada mais os afetará. Não é esta a intenção legislativa. A cooperação aqui não exige que as partes esqueçam de seus interesses pelos quais procuraram o Poder Judiciário, mas que haja uma colaboração entre partes e juízes, uma harmonia processual, facilitando assim o desenrolar do processo para que se possa chegar mais eficaz e rapidamente ao fim desejado – a solução da lide.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

DIDIER JÚNIOR, Fredie. Curso de direito processual civil: introdução ao direito processual civil, parte geral e processo de conhecimento. 18. ed. Salvador: 2016.

NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Comentários ao Código de Processo Civil: novo CPC: Lei 3.105/2015. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. 2845 p.

MACHADO, Marcelo Pacheco. Novo CPC, princípio da cooperação e processo civil do arco-íris. Disponível em: <http://jota.uol.com.br/novo-cpc-principio-da-cooperacao-e-processo-civil-do-arco-%C2%ADiris>. Acesso em: 16 set. 2016.

SOUZA, Artur César de. O princípio da cooperação no Projeto do novo Código de Processo Civil. Revista de Processo., São Paulo, v. 38, n. 225, p. 65-81, nov. 2013.

WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Breves comentários ao novo Código de Processo Civil. 2. ed., rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. 2524 p


Notas

2 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 5 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1978. pp. 1220.

3Disponível em <http://jota.uol.com.br/novo-cpc-principio-da-cooperacao-e-processo-civil-do-arco-%C2%ADiris>

4DIDIER JÚNIOR, Fredie. Curso de direito processual civil: introdução ao direito processual civil, parte geral e processo de conhecimento. 18. ed. Salvador: 2016

5 SOUZA, Artur César de. O princípio da cooperação no Projeto do novo Código de Processo Civil. Revista de Processo., São Paulo, v. 38, n. 225, p. 65-81, nov. 2013.

6 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Breves comentários ao novo Código de Processo Civil. 2. ed., rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. p . 84

7DIDIER JÚNIOR, Fredie. Curso de direito processual civil: introdução ao direito processual civil, parte geral e processo de conhecimento. 18. ed. Salvador: 2016, p. 128.

8NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Comentários ao Código de Processo Civil: novo CPC : Lei 3.105/2015. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 208.


Autor

  • Rosiane Ferreira Machado

    Advogada Licenciada (OAB/SC 11.330).Bacharel em Direito, graduada pela Universidade do Vale do Itajaí - UNIVALI/SC; Especialista em Direito Civil pela Universidade do Sul de Santa Catarina - UNISUL/SC; Especialista em Interesses Difusos e Coletivos pela Universidade do Sul de Santa Catarina - UNISUL/SC;

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MACHADO, Rosiane Ferreira. O princípio da cooperação no novo Código de Processo Civil como meio para uma lide mais célere, justa e efetiva. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4849, 10 out. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/52598. Acesso em: 20 abr. 2024.