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O princípio da boa-fé objetiva e sua incidência no Código de Processo Civil

O princípio da boa-fé objetiva e sua incidência no Código de Processo Civil

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O princípio da boa-fé, cada vez mais destacado em várias linhas do ordenamento jurídico, sofreu algumas alterações no que tange à sua aplicação, efetivação e eventuais sanções decorrentes de sua não observância, quando do advento do novo Código de Processo Civil.

1. INTRODUÇÃO

Para o homem mediano o ouvir da palavra lei, já lhe vem à mente algo coercitivo, imposto, criado por uma autoridade e que caberá a este obedecê-la, caso contrário, estará sujeito as sanções em decorrência de tal contrariedade. Dessa forma, a lei desde os primórdios tem sido um instrumento para traçar as regras a toda sociedade, prevendo em seu bojo as sanções como já dito, para qualquer conduta que contrarie aquela determinada regra.

Todavia, a sociedade está em constante evolução, assim, mesmo antes do próprio Estado tomar posições para determinadas questões, a própria sociedade já estabelece padrões, sem nenhuma concretude, estando estes pautados em costumes radicados em subjetivismo, consideram e avaliam as situações de um ponto de vista meramente pessoal, sabendo que ao longo do tempo tais situações irão se modificar, mas mesmo assim, não se importam com as imposições provindas de qualquer autoridade externa.

Entretanto ao focar no campo da boa-fé, mesmo que a relações negociais estejam no âmbito privado das partes, há de se preservar o uso da boa-fé, destarte, a partir do momento em as partes buscam o órgão jurisdicional, algum requisito da relação negocial foi quebrado, ou, por outro ângulo, algum sujeito foi prejudicado com aquela determinada relação.

Contudo, necessariamente no ramo do direito, todas as regras estabelecidas devem ser precisas, objetivas, definitivas, exemplo disso, observando aquilo que é lícito e ilícito.

 Assim, ainda que numa demanda, um agente se comporte plenamente dentro dos procedimentos estabelecidos pelo ordenamento jurídico, o resultado obtido desta atuação não está isento à avaliação do percurso traçado para a produção dos resultados, pois no curso do processo o agente pode simplesmente se afastar dos padrões valorativos, desviando-se da boa-fé.

Partindo do princípio de que o processo é um instrumento público, e que através dele é possível alcançar uma pacificação social, é inconcebível qualquer tipo de abuso de direito, atos que comprometam o desenvolvimento da demanda ou qualquer outro tipo de atuação que tenha por intuito a litigância de má-fé por qualquer sujeito, seja ele as partes, o defensor das partes, o juiz, os servidores, uma testemunha, o perito, oficial de justiça. Pautados nessa conduta com objetivo de obstar o fim social do processo, tais comportamentos merecem ser sancionados, respondendo os agentes por todo e qualquer prejuízo que causarem.  

No que diz respeito ao princípio da boa-fé, tal princípio não é considerado uma mera cláusula para se medir comportamento. A abrangência de tal princípio é tamanha, que o mesmo é capaz de ser invocado não só nas esferas cíveis, mas em todas as outras (constitucional, penal, defesa do consumir, trabalhista, tributária, empresarial, administrativa). Tal princípio não é estático, o mesmo percorre toda cadeia processual, possuindo um alto grau de dinamicidade, por isso em dizer que a boa-fé deve ser aplicada antes, durante e depois de uma relação quer seja ela negocial ou processual.

Quando da análise do artigo 5º do Código de Processo Civil, o mesmo retrata confiança, palavra chave do princípio da boa-fé, impondo a todos os sujeitos do processo, quer seja parte ou não, atitudes e condutas condizentes com o dever de lealdade, probidade, cooperação, dentre outros. Haja vista, tais comportamentos devem reger todo curso processual na busca da efetiva concretização da Justiça.

Em que pese o ordenamento pátrio trazer em seu bojo os deveres de lealdade, cooperação, probidade, sendo tais considerados como verdadeiros pilares que sustentam o sistema jurídico-processual, ainda assim, infelizmente há possibilidade de se deparar com a má-fé no transcorrer do processo. Mesmo com todos os instrumentos inibitórios, ou seja, imposição de multas, indenizações, que na maioria das vezes são pecuniárias, instituídos pelo próprio ordenamento jurídico para impedir tais condutas, lamentavelmente, pode-se assim dizer que o instituto não é totalmente eficaz.

Em consequência de tais atos desleais, desprovidos de probidade, eticidade e de qualquer atributo de licitude, quem sofre com tais atitudes é a sociedade, pois tais sujeitos fazem uso do processo e da via jurisdicional para obter lucros ilícitos e imorais, gerando assim um descredito e desvalorização no Poder Judiciário.

Posto isto, no decorrer do presente estudo além da análise sobre a conceituação da boa-fé objetiva, suas funções, finalidades e seus deveres anexos, a visão do presente instituto sob a ótica constitucional, como princípio norteador, também será feita uma abordagem do princípio da boa-fé processual no código de processo civil pátrio, discorrendo sobre a aplicabilidade das sanções caso haja transgressão a tal princípio.

Assim, para o pleno desenvolvimento deste trabalho foram consultados livros que discorrem sobre o assunto em epígrafe, encontrados na biblioteca das Faculdades Integradas de Ourinhos. Realizadas, buscas e análises de materiais eletrônicos; CD-ROM, acervos privados, a fim de complementar o estudo.


2. DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO

A boa-fé possui suas raízes no direito romano, tendo como expressão a palavra “fides”, que direciona para ideia de lealdade, confiança, transparência, honestidade.

Para os romanos a expressão “fides” era de grande importância e valia, pois se retratava como uma promessa, compromisso ou confiança. Dessa forma, toda palavra direcionada estaria sob a égide do respeito, o que mais tarde, se incorporou a ideia de ética.

A confiança se manifestava de várias formas, tinha como um dos exemplos a “fides patroni” a qual reportava a confiança entre patrão e empregados, apontando também a classe dos cidadãos livres e os escravos.

Adiante, nasceu a “bona fides”, teve seu desenvolvimento centrado no conceito de “fides”. Partindo dessa premissa o julgador possuía uma ampla margem de atuação em suas decisões, pois ao se deparar com o caso concreto, era concedido a ele o poder de condenar ou não o demandado. Observa-se que tal decisão não se tinha por base uma estrutura legal, sendo apenas sustentada pelos atributos da boa-fé.

Explica Flávio Tartuce que “desde os primórdios do direito romano, já se cogitava outra boa-fé, aquela direcionada à conduta das partes, principalmente nas relações negociais e contratuais”. (TARTUCE, 2015, p. 579)

Para Flávio Alves Martins no tocante a boa-fé, explica[1]:

Flávio Alves Martins explica que a boa-fé no direito romano foi a ponte que permitiu a passagem do formalismo para o consensualismo, uma vez que, desaparecendo a certeza da forma, é a boa-fé entre os contratantes que dá sustentáculo à relação jurídica-obrigacional. (MARTINS, apud, ANDRÉ HENTZ, 2007, p. 01)

No direito romano a boa-fé foi causa preponderante na passagem do formalismo para o consensualismo, vez que, mesmo sendo a forma abalada ou descaracterizada, a boa-fé era a base de sustentação para aquela determinada relação obrigacional.

Para o consensualimo não existe regras específicas, o simples acordo de duas ou mais vontades já é o bastante para que aquela obrigação se torne válida, como já mencionado anteriormente, não se exige em regra uma forma especial para a formação do vínculo contratual. Apesar desse princípio não exigir uma forma especial, os contratos que mantinham a forma solene, a sua validez estava condicionada a certos requisitos exigidos pela lei.

Mais adiante, especificamente durante a Idade Média, o Direito Civil era fortemente influenciado pelo direito canônico, dessa forma a boa-fé se atrelava a ideia de pecado.

Segundo João Emílio de Assis Reis[2]:

A ideia de boa-fé estava completamente atrelada à ideia de pecado. À palavra dada e a promessa era atribuído valor moral, porque na cultura cristã a mentira é considerada pecado. Assim, a boa-fé passa a ter um significado unificado, cuja substância se encontra na ideia de “ausência de pecado”. Enfraquece-se o seu significado ético do direito obrigacional e é fortalecida a dimensão subjetivista. Esta última é fortalecida com a vinculação a ideia do pecado porque não basta mais a mera ignorância do vício é necessária a consciência íntima da ausência do pecado, de se estar agindo corretamente.

Em contrapartida, na Idade Moderna, época em que se deu o renascimento do comércio, bem como as mudanças econômicas, cientificas, sociais e religiosas, o consensualismo ganha força, nessa época o considerado marco foi o abandono das formas rígidas (formalismo), e o trunfo do chamado princípio do consensualismo, adotado como base da teoria dos contratos, apoiando-se no princípio da autonomia da vontade em detrimento da boa-fé.

Destarte, a positivação da boa-fé ocorreu somente em 1804 com o advento do Código de Napoleão. Todavia, mesmo sendo ela positivada não alcançou os objetivos esperados, muito menos se desenvolveu da forma na qual se pretendia, vez que na França a renomada Escola da Exegese dominou o pensamento jurídico durante o século XIX propagando que o intérprete era mero escravo da lei.

Todavia, a boa-fé começou a ter aplicabilidade nos tribunais franceses somente na segunda metade do século passado, quando passou a ser exigida tanto do devedor no cumprimento de suas obrigações contratuais como do credor no exercício de seus direitos.

A plenitude da boa-fé também teve seu marco com a entrada em vigor do Código Civil Alemão em 1900 (Bürgerliches Gesetzbuch – BGB), quando então passou a influenciar as demais codificações modernas. Um de seus maiores adventos foi a distinção entre a boa-fé subjetiva (guter glauben) e a boa-fé objetiva (treu und glauben).

Em síntese, pode-se dizer que a boa-fé subjetiva, conhecida também como boa-fé (interior), está atrelada ao estado psicológico do agente, uma crença que traz um espírito de justiça, credibilidade quanto ao que se está praticando. Em contrapartida a boa-fé objetiva, denominada (exterior), impõe limitações, normas e condutas a serem respeitadas pelos agentes quando de suas relações, as quais devem estar dotadas de segurança, equilíbrio e além de satisfazer os interesses das partes, alcance também os interesses sociais.

De acordo com Flávio Tartuce, “com essa evolução, alguns Códigos da era moderna fazem menção a essa nova faceta da boa-fé, caso do Código Civil Português de 1966, do Código Civil Italiano de 1942 e do BGB alemão, dentro outros”. (TARTUCE, 2015, p. 580)

Assim, refere-se que tais normas serviram de base em seus ordenamentos jurídicos. Logo, respectivas normas foram como marco teórico para o Código Civil Brasileiro de 2002.

No Brasil, a boa-fé ganha espaço com o Código Comercial de 1850, em seu artigo 131[3], inciso 1, quando trazia em seu bojo:

Artigo 131 – Sendo necessário interpretar as cláusulas do contrato, a interpretação, além das regras sobreditas, será regulada sobre as seguintes bases:

1 - a inteligência simples e adequada, que for mais conforme à boa fé, e ao verdadeiro espírito e natureza do contrato, deverá sempre prevalecer à rigorosa e restrita significação das palavras;

Contudo tal dispositivo não foi abarcado pela doutrina muito menos pela jurisprudência, de modo que sua efetividade não se propagou.

 Teresa Negreiros explica a não propagação da boa-fé[4]:

Teresa Negreiros explica que isso ocorreu em razão de a boa-fé ter sido restringida a mera função de interpretação/integração do contrato, sem que fosse reconhecido o seu papel de criadora de deveres. Assim, a boa-fé foi colocada em contraposição ao sentido literal das cláusulas contratuais -- o que é criticado pela autora --, na medida em que deveria incidir não apenas na relação entre o declarado e o suposto, "mas igualmente sobre o núcleo mesmo da vontade intencionada, podendo inclusive redundar em sua desconsideração”. (NEGREIROS, apud, ANDRÉ HENTZ, 2007, p. 03)

Nota-se que nos termos do texto citado acima, o qual se reporta ao artigo 131 do Código Comercial, não foi acobertado pela doutrina nem pela jurisprudência, em função do desvio, no que tange a aplicação da real finalidade do instituto da boa-fé, ou seja, não ser este apenas usado como fonte interpretação mais também como fonte criadora de deveres entre as partes.

Nesse norte, o reaparecimento da boa-fé no ordenamento jurídico se deu de forma restrita no Código Civil de 1916.

Artigo 1.143. Se duas ou mais pessoas tiverem direito ao retrato sobre a mesma coisa, e só uma o exercer, poderá o comprador fazer intimar as outras, para nele acordarem. (Redação dada pelo Decreto do Poder Legislativo nº 3.725, de 15.1.1919)

Artigo 1.531. Aquele que demandar por dívida já paga, no todo ou em parte, sem ressalvar as quantias recebidas, ou pedir mais do que for devido, ficará obrigado a pagar ao devedor, no primeiro caso, o dobro do que houver cobrado e, no segundo, o equivalente do que dele exigir, salvo se, por lhe estar prescrito o direito, decair da ação. (Redação dada pelo Decreto do Poder Legislativo nº 3.725, de 15.1.1919)

Segundo Flávio Tartuce, uma das mais festejadas mudanças introduzidas pelo Código Civil de 2002, refere-se à revisão expressa do princípio da boa-fé contratual, que não constava da codificação de 1916. Como se sabe, a boa-fé, anteriormente, somente era relacionada com a intenção do sujeito de direito, estudada quando da análise dos institutos possessórios, por exemplo. (TARTUCE, 2015, p. 579)

Veja que, em 1916 a boa-fé ainda não se encontrava codificada, pois era observada apenas na esfera subjetiva atrelando-se apenas a intenção dos sujeitos. No Brasil, somente em 1990 com o advento do Código de Defesa do Consumidor, é que a boa-fé objetiva foi adotada. Desde então passou a ser norte para interpretação de cláusulas contratuais, bem como, para regulamentar as obrigações a serem pactuadas, exigindo das partes que entre si comportassem com eticidade e lealdade.

Na visão de Claudia Lima[5]:

Cláudia Lima Marques explica que a adoção da boa-fé objetiva pelo Código de Defesa do Consumidor contribuiu sobremaneira na exegese das relações contratuais no Brasil como linha teleológica de interpretação (art. 4º, III), e como cláusula geral (art. 51, IV), positivando em todo o seu corpo de normas a existência de uma série de deveres anexos às relações contratuais, como o dever de informação dos fornecedores e prestadores de serviços (art. 31) e a vinculação à publicidade divulgada (artigos 30 e 35), dentre outros”. (MARQUES, apud, ANDRÉ HENTZ, 2007, p. 04)

Em continuação, as palavras de Teresa Negreiros[6]:

Teresa Negreiros entende que a grande contribuição da inserção da boa-fé objetiva no ordenamento jurídico por meio do art. 51, IV, do Código de Defesa do Consumidor, que prevê a nulidade de cláusulas contratuais incompatíveis com a boa-fé, foi a aproximação com a Constituição Federal. Isso porque, para que esse dispositivo seja aplicado, "há que se buscar na normativa constitucional critérios de interpretação e densificação desta noção que funcionalizem à proteção da pessoa, de sua dignidade – onde e para onde, em última e definitiva instância, se radicam e convergem os princípios constitucionais".

Fica evidente, portanto, que a proteção contratual conferida ao consumidor – parte mais fraca na relação de consumo – é, na verdade, a consagração do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, o que significa, em última análise, a aproximação entre Ética e Direito”. (NEGREIROS, apud, ANDRÉ HENTZ, 2007, p. 04)

Nota-se que a codificação da boa-fé, no campo consumerista, trouxe um avanço significativo ao ordenamento jurídico. De certo modo, a inserção da boa-fé respaldada em normas constitucionais, trouxe além do atendimento as necessidades dos consumidores, a proteção de seus interesses econômicos, bem como, o respeito a sua dignidade, qualidade de vida, saúde e segurança, dentre outros atributos.

Contudo, mesmo com os avanços no Código de Defesa do Consumidor, é no Código Civil de 2002 que a boa-fé alcança seu ápice no ordenamento jurídico brasileiro. Desde então, passa a ser aplicada como fonte de deveres autônomos sobre todos os contratos, sejam eles de quaisquer espécies. Assim, há uma expansão do instituto, não mais restringindo apenas às relações consumeristas, deixando de ser visto apenas no âmbito subjetivo, passando então sua aplicabilidade com maior incidência no âmbito objetivo.

Destarte, codificada no Código Civil de 2002, a boa-fé encontra-se disciplinada em 03 (três) artigos, conforme define Hentz[7]:

A boa-fé objetiva encontra-se disciplinada em três dispositivos do Código Civil de 2002 e em cada um deles tem um papel diferente a desempenhar no ordenamento jurídico. O art. 422 estabelece que "os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé". Trata-se da função integrativa. O art. 113 determina que "os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração. Eis a função interpretativa. Por fim, a função limitativa está prevista no art. 187, que diz que "também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes"(grifo nosso) (ANDRÉ HENTZ, 2007, p. 05)

Por fim, com a expansão do instituto da boa-fé este ganha força, sendo que sua importância ultrapassa as esferas particulares incidindo na esfera processual. Assim com o advento da Lei nº 13.105/2015, intitulado como o Código de Processo Civil, abordaremos o estudo em capítulo reservado no que tange ao instituto da boa-fé como princípio processual.


3. A BOA-FÉ OBJETIVA

A boa-fé pode ser vista por várias modalidades, finalidades e dimensões jurídicas, dentre elas se destacam as duas vertentes mais comuns, sendo a objetiva e a subjetiva. Importante destacar seus fundamentos vez que visam regrar o comportamento dos agentes nas relações quer seja ela judicial ou extrajudicial.

3.1 Conceituação

A boa-fé objetiva, objeto do presente estudo, está voltada para uma regra de conduta ante a uma determinação social de agir com zelo, lealdade, franqueza, clareza, honestidade, respeito e dignidade; já a boa-fé subjetiva está relacionada à manifestação de vontade própria do indivíduo, ou seja, “consiste em uma situação psicológica, estado de espírito ou ânimo do sujeito, que realiza algo, ou, vivência um momento, sem ter a noção do vício que o inquina”[8]

Partindo do ponto de vista das relações contratuais, o Código Civil de 2002 ao estabelecer a boa-fé, parte sob a ótica de impor às partes contratantes uma conduta baseada nos valores da honestidade e lealdade. Esta sistemática contratual veio exigir que os contratantes quando de suas negociações, devam agir dentro de uma conduta social e ética, ou seja, sempre respeitando a confiança, o interesse e a honestidade do outro contratante. 

Sílvio Rodrigues define que a boa-fé “é um conceito ético, moldado nas ideias de proceder com correção, com dignidade, pautando sua atitude pelos princípios da honestidade, da boa intenção e no propósito de a ninguém prejudicar”. (RODRIGUES, 2004, p.61).

No entanto, o autor supracitado continua a ressaltar que a mesma é “derivada de sua própria etimologia, “bona fides”, a “fides” seria a honestidade, a confiança, a lealdade, a sinceridade que deve ser usada pelos homens em suas relações internegociais”. (RODRIGUES, 2004, p.61).

Já Sílvio de Salvo Venosa, traz que:

A boa-fé objetiva, parte de um padrão de conduta comum, do homem médio, naquele caso concreto, levando em consideração os aspectos sociais envolvidos. Desse modo, a boa-fé objetiva se traduz de forma mais perceptível como uma regra de conduta, um dever de agir de acordo com determinados padrões sociais estabelecidos e reconhecidos. (2005, p.409).

Nesse sentido, Caio Mário da Silva Pereira, interpreta que “boa-fé objetiva cria deveres positivos, já que exige que as partes tudo façam para que o contrato seja cumprido conforme previsto e para que ambas obtenham o proveito objetivado”. (PEREIRA, 2005, p. 20-21).

Diante disso, pode-se dizer que a boa-fé consiste em uma atuação refletiva, onde para cada ato praticado das partes, deve ser analisado se o mesmo está ferindo ou não os interesses, direitos e perspectivas, da outra parte. Em cada relação formada, as partes devem agir como verdadeiros parceiros, pois de alguma forma ambos têm seus interesses, sendo que nenhum deles quer ver esses interesses sendo prejudicados.

Como já mencionado anteriormente, no Código Civil de 1916, não havia tanto ênfase ao princípio da boa-fé como na atualidade. Com a aprovação do Código Civil de 2002, a boa-fé objetiva incorporou-se ao ordenamento jurídico como princípio geral, tornando-se característica obrigacional de todas as relações jurídicas.

 É certo que quando das negociações, o princípio da boa-fé, deve ser analisado sob todos os ângulos, e devem ser levadas em consideração todas as condições em que a obrigação foi firmada, qual o nível sociocultural dos agentes, o momento histórico e econômico em que aquela negociação está se firmando, pois há de se ressaltar, que mesmo analisando todos esses requisitos, a má-fé pode aparecer em qualquer estágio de uma relação, seja ela ainda na fase preliminar em que os agentes ainda estão estabelecendo suas condições, seja em uma fase processual.

Ela pode vir à tona já desde o início, bem antes dos sujeitos pactuarem determinada relação, a parte já tem a intenção de prejudicar a outra; pode ser que durante a vigência do negócio uma das partes se vê na impossibilidade do cumprimento da obrigação, faltando assim com a palavra e com o dever de cumprir o compromisso honrado, e vários outros fatores que podem acarretar o não cumprimento daquele determinado compromisso assumido. Independentemente de ser logo no começo ou durante a vigência do negócio a constatação da má-fé, caberá ao juiz examinar em cada caso, se o descumprimento decorre na realidade da boa ou da má-fé. Cabe a ele verificar em qual momento do pacto o agente se desviou da boa-fé, vindo a causar prejuízos à outra parte.

Vale dizer, que a boa-fé objetiva encontra extensivo envolvimento e ancoragem na área negocial. Dessa forma, é cediço que por conter seus próprios aspectos normativos está indubitavelmente contida no fenômeno jurídico em sua totalidade, logo, plenamente capaz de amoldar toda a sua sistemática, utilidades e vantagens dentro das mais variadas áreas da ciência jurídica, até mesmo a processual.

Teresa Negreiros no tocante a boa-fé, traz[9]:

Para Teresa Negreiros a boa-fé objetiva é o elo entre as negociações privadas e a normativa constitucional, trazendo para todo o ordenamento jurídico a dignidade da pessoa humana como valor normativo supremo. (NEGREIROS, apud, ANDRÉ HENTZ, 2006, p. 129)

Desta feita, cabe aqui dizer que a boa-fé se caracteriza sob a ótica da transparência e da confiança mútua das partes.

Ressalta-se que a boa-fé não se amolda ao caso concreto, todavia, o caso concreto é que deve se adequar a boa-fé, logo, se tem a boa-fé como um instituto direto, sem atalhos, não havendo nela variações ou duplo entendimento, ou seja, para este caso ela será aplicada, para outro determinado caso ela não será aplicada.

A boa-fé, em hipótese alguma, será confundida ou equiparada a equidade (julgamento justo). Enquanto, neste último, o instituto se amolda para cada tipo de situação, ou seja, para cada julgamento haverá uma solução ao caso concreto, diferentemente ocorrerá com a boa-fé, vez que está impõe critérios e condutas os quais não fica ao arbítrio da noção do que é certo ou errado, justo ou injusto analisado pelo juiz na aplicação do caso concreto. O objetivo da boa-fé é proporcionar a segurança jurídica, impedindo qualquer tipo de arbitrariedade por qualquer das partes envolventes na relação processual.

3.2 A boa-fé sob a ótica constitucional

Em análise ao instituto da boa-fé objetiva, tem-se pela unanimidade dos estudiosos e doutrinadores sobre o tema, que a boa-fé tem como fundamento a própria Constituição Federal.

Para Fredie Didier Junior:

Há quem veja no inciso I do art. 3º da CF/1988 o fundamento constitucional da proteção da boa-fé objetiva. É o objetivo da República Federativa do Brasileira a construção de uma sociedade livre, justa e solidária. Haveria um dever fundamental de solidariedade, do qual decorreria o dever de não quebrar a confiança e de não agir com deslealdade. Nesta mesmo linha de raciocínio, há quem veja a cláusula geral de boa-fé como concretização da proteção constitucional à dignidade da pessoa humana. (DIDIER, 2015, p. 107)

O princípio da boa-fé está atrelado ao dever de lealdade processual, a honestidade e a integridade entre as partes, logo, caso não atendido, trata-se de uma afronta não só a parte contrária na relação processual, mas, ainda, a transposição de tais efeitos contra o próprio Estado, que por sua vez, tem como base a entrega de maneira justa da tutela jurisdicional.

Para tudo existem regras, assim não é diferente quando se vive em sociedade. Para que se tenha um convívio sadio, sem que nenhum indivíduo se sobreponha em detrimento de outro com intuito de lesar, se faz necessário um comportamento probo, repulsando tudo o que é ilícito e acolhendo o que é lícito. Isso decorre do princípio da boa-fé objetiva.

O Estado por sua vez, baliza como paradigma sob a égide de um Estado Democrático de Direito (artigo 1º, caput, da CF) firmado na dignidade da pessoa humana (artigo 1º, III, CF), cujos objetivos são construir uma sociedade livre, justa e solidária (artigo 3º, I, CF); promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (artigo 3º, IV, CF) que rege suas relações internacionais pelos princípios da igualdade entre os Estados (artigo 4º, V, CF); defesa da paz (artigo 4º, VI, CF); solução pacífica dos conflitos (artigo 4, VII, CF); cooperação entre os povos para o progresso da humanidade (artigo 4º, IX, CF), pautado pelo princípio da boa-fé objetiva.

Destarte, observa-se que os valores explícitos na Constituição Federal Brasileira, demonstram que o Estado tem suas bases firmadas em valores éticos, os quais foram especificamente criados em função e para segurança da sociedade. Assim, a boa-fé objetiva está diretamente ligada aos demais princípios expressos na Constituição Federal.

Logo, todos os princípios espalhados pelas leis infraconstitucionais devem estar condizentes com as normas expressas na Carta Magna.

Dessa forma, para se obter a positivação do Código Civil, do Código de Processo Civil, do Código de Defesa do Consumidor, do Código Penal, e demais normas que tratam mesmo que de forma não explícita em seu bojo, sobre o princípio da boa-fé objetiva, se buscou amparo para sua validade na Constituição Federal, se deparando implicitamente ali, com o princípio da boa-fé objetiva.

Vale dizer que a Constituição Federal veda expressamente a má-fé, trazendo em seu texto de lei mais especificamente nos artigos 5º, inciso LXXIII e 14, § 11º:

Artigo 5º - [...]

LXXIII - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência;[10] (Grifo nosso)

Artigo14 – [...]

§ 11. A ação de impugnação de mandato tramitará em segredo de justiça, respondendo o autor, na forma da lei, se temerária ou de manifesta má-fé[11].

Com isso, conclui-se que por rechaçar expressamente a má-fé, é adepta aos atributos da boa-fé.

Ademais, o fato da boa-fé ser um princípio implícito na Constituição Federal, isso não retira o caráter constitucional. Logo, não haveria possibilidade de o legislador elencar no corpo da Carta Magna todos os princípios atinentes, até porque a sociedade está em constante evolução. Porém elucidou em seu parágrafo 2º do artigo 5º:

Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte[12].

Dessa forma, a nova hermenêutica constitucional, se apoiando no pensamento pós-positivista, quanto a valorização dos princípios e a sua inserção nos diversos textos constitucionais, incontroverso que o princípio da boa-fé objetiva seja um princípio constitucional.

Na seara processual, não é diferente o princípio da boa-fé também é caracterizado como um princípio constitucional.

Para Fredie Didier, o mesmo ressalta que:

Mesmo que não houvesse texto normativo expresso na legislação infraconstitucional, o princípio da boa-fé processual poderia ser extraído de outros princípios constitucionais. A exigência de comportamento em conformidade com a boa-fé pode ser encarada como conteúdo de outros direitos fundamentais. (DIDIER, 2015, p. 107)

Pode-se entender que a boa-fé, seja ela na esfera processual ou não, não necessita estar expressa na legislação, na realidade, é apenas um comportamento dentro dos ditames que norteiam a boa-fé, dessa maneira, pode ser extraído de vários outros princípios que estão atrelados a direitos fundamentais.

Nesta ótica, alguns doutrinadores citados por Didier, fazem menção sustentando também a boa-fé processual como princípio constitucional:

Para Menezes Cordeiro:

A exigência de atuação de acordo com a boa-fé decorre do direito fundamental à igualdade: “a pessoa que confie, legitimamente, num certo estado de coisas não pode ser vista se não tivesse confiado: seria tratar diferente de modo igual”. (CORDEIRO, apud, DIDIER, 2015, p. 108)

Na visão de Antônio do Passo Cabral:

Entende que o fundamento da boa-fé objetiva processual é o princípio do contraditório, que não é apenas fonte de direitos processuais, mas também de deveres. O contraditório não serve penas para dar aos litigantes o direitos de poder influenciar na decisão, mas também “tem uma finalidade de colaboração com o exercício da jurisdição”. O direito ao contraditório não poder ser exercido ilimitadamente: o respeito à boa-fé objetiva é exatamente um desses limites. (CABRAL, apud, DIDIER, 2015, p. 108)

De acordo com a visão de Joan Pico i Junoy:

O princípio da boa-fé processual compõe a cláusula do devido processo legal, limitando o exercício do direito de defesa, como forma de proteção do direito à tutela efetiva, do próprio direito de defesa da parte contrária e do direito a um processo com todas as garantias (“processo devido”). Cria, para tanto, eloquente expressão: o devido processo leal. (PICO, apud, DIDIER, 2015, p. 108)

Cada doutrinador citado destaca a boa-fé processual como um princípio constitucional: direito a igualdade; princípio do contraditório; cláusula do devido processo legal.

Na visão do Supremo Tribunal Federal concernente a boa-fé, segue a mesma linha de arguição, porém de forma mais contundente. Reporta a Corte que a cláusula do devido processo legal exige um processo leal pautado na boa-fé. Conforme segue a transcrição dos trechos também abordado por Didier:

"O princípio do devido processo legal, que lastreia todo o leque de garantias constitucionais voltadas para a efetividade dos processos jurisdicionais e administrativos, assegura que todo julgamento seja realizado com a observância das regras procedimentais previamente estabelecidas, e, além, representa uma exigência de fair trial, no sentido de garantir a participação equânime, justa, leal, enfim, sempre imbuída pela boa-fé e pela ética dos sujeitos processuais.

A máxima do fair trial é uma das faces do princípio do devido processo legal positivado n a Constituição de 1988, a qual assegura um modelo garantista de jurisdição, voltado para a proteção efetiva dos direitos individuais e coletivos, e que depende, para seu pleno funcionamento, da boa-fé e lealdade dos sujeitos que dele participam, condição indispensável para a correção e legitimidade do conjunto de atos, relações e processos jurisdicionais e administrativos".

O STF confirma que a exigência de comportamento segundo a boa-fé atinge a todos os sujeitos processuais, e não apenas às partes:

"Nesse sentido, tal princípio possui um âmbito de proteção alargado, que exige o fair trial não apenas dentre aqueles que fazem parte da relação processual, ou que atuam diretamente no processo, mas de todo o aparato jurisdicional, o que abrange todos os sujeitos, instituições e órgão, públicos e privados, que exerce m, direta o u indiretamente, funções qualificadas constitucionalmente como essenciais à justiça".

(DIDIER, 2015, p. 108-109)

Em que pese o respeitado posicionamento e entendimento dos doutrinadores aqui citados, sobre princípios os quais estão atrelados à boa-fé no âmbito constitucional, o posicionamento adotado é o do STF (Supremo Tribunal Federal), pois traz o princípio o devido processo legal como uma cláusula geral, sendo tal posicionamento além de pacífico, muito bem estruturado doutrinariamente o qual tem sido aceito pela jurisprudência.

No tocante ao fair trial conforme destacado na citação acima, ao analisar a tradução fair, significa = justo, razoável, equitativo; no que tange ao termo trial, por sua vez trata-se = julgamento, processo. Sendo assim, agregando as duas palavras, temos fair trial = concluindo a sua tradução como um julgamento justo. Logo, o entendimento do STF é que se tenha um processo justo, baseado na boa-fé, lealdade com a devida proteção dos direitos e garantias individuais e coletivas.

Nas palavras de Fredie Didier:

É com base nesta garantia que, no direito estadunidense, se construiu o dever de boa-fé processual como conteúdo da garantia do fair trial. A referência ao due process of law como fundamento para reprimir os comportamentos temerários é frequente nos países do common law. Em tais países, a cláusula geral do devido processo legal é diretamente aplicada pelas cortes como um padrão geral para a avaliação de práticas processuais inadequadas. (DIDIER, 2015, p. 109)

Perceba que na esfera processual se torna mais favorável abordar a boa-fé como um dever geral atrelado ao devido processo legal, partindo da lógica de que um processo para ser devido precisa estar pautado na equidade, ética, lealdade, probidade. De modo que não haveria razão para considerar como justo um processo no qual desde o seu nascimento, ou no seu desenvolvimento o mesmo venha se pautar em comportamento desleais, antiéticos ou até mesmo fraudulentos.

3.3 A boa-fé objetiva como princípio norteador

Antes de abordar especificamente o princípio da boa-fé, importante analisar o fundamento norteador da palavra princípio e qual o ponto de vista dos doutrinadores.

De fato, ao se falar em princípio entende-se pelo início de algo. Como se extrai da Wikipédia a palavra princípio: Princípio (do latim principiu)[13] significa o início, ponto de partida, fundamento ou essência de algum fenômeno. 

Miguel Reale, classifica que:

Os princípios são ‘verdades fundantes’ de um sistema de conhecimento, como tais admitidas, por serem evidentes ou por terem sido comprovadas, mas também por motivos de ordem prática de caráter operacional, isto é, como pressupostos exigidos pelas necessidades da pesquisa e da praxis. (REALE, apud TARTUCE, 2015, p. 19)

No mesmo sentido, José de Oliveira Ascensão:

Os princípios são as grandes orientações formais da ordem jurídica brasileira, que fundam e unificam normas e soluções singulares. (REALE, apud TARTUCE, 2015, p. 19)

Na visão de Francisco Amaral:

Os princípios jurídicos são pensamentos diretores de uma regulamentação jurídica. São critérios para a ação e para a constituição de normas e modelos jurídicos. Como diretrizes gerais e básicas, fundamentam e dão unidade a um sistema ou a uma instituição. O direito, como sistema, seria assim um conjunto ordenado segundo princípios. (REALE, apud TARTUCE, 2015, p. 20)

Maria Helena Diniz, afirma que:

Os princípios são cânones que não foram ditados, explicitamente, pelo elaborador da norma, mas que estão contidos de forma imanente no ordenamento jurídico. Observa Jeanneau que os princípios não têm existência própria, estão ínsitos no sistema, mas é o juiz que, ao descobri-los, lhes dá força e vida. Esses princípios que servem de base para preencher lacunas não podem opor-se às disposições do ordenamento jurídico, pois devem fundar-se na natureza do sistema jurídico, que deve apresentar-se como um ‘organismo’ lógico, capaz de conter uma solução segura para o caso duvidoso.  (REALE, apud TARTUCE, 2015, p. 20)

Nas lições de Nelson Nery e Rosa Maria de Andrade Nery, os princípios gerais de direito:

São regras de conduta que norteiam o juiz na interpretação da norma, do ato ou negócio jurídico. Os princípios gerais de direito não se encontram positivados no sistema normativo. São regras estáticas que carecem de concreção. Têm como função principal auxiliar o juiz no preenchimento das lacunas. (REALE, apud,TARTUCE, 2015, p. 20)

Por fim, Tartuce entende que:

Princípios podem ser definidos como regramentos básicos aplicáveis a uma determinada categoria jurídica, abstraídos das normas, da doutrina, da jurisprudência e de aspectos políticos, econômicos e sociais. (TARTUCE, 2015, p. 03)

Observadas tais definições, conclui-se que os princípios em detrimentos das normas jurídicas são mais amplos, abertos, abstratos e muitas vezes com caráter e posição balizados e delimitados na Constituição Federal.  

Assim, conforme abordado anterioriormente é incontroverso que a boa-fé tem suas bases firmadas nas raízes constitucionais, razão pela qual traz em sua essência todas as características de um princípio constitucional.

Tratando-se de um princípio, a boa-fé estabelece padrões de comportamentos, perfis de condutas, funcionando como instrumento constitucional refletindo tanto nas relações públicas como privadas. Entende-se que a boa-fé integraliza todo o sistema normativo fazendo com que haja uma conexão entre as áreas jurídicas.

Nas palavras de Ovídio Baptista:

O preceito contido no art. 14 do CPC é uma manifestação do princípio geral da boa-fé objetiva, de que já se disse constituir, mais do que um princípio, o verdadeiro oxigênio sem o qual a vida do Direito seria impossível (destacamos). (BAPTISTA, apud TARTUCE, 2015, p. 39)

Com razão, sem a presença da boa-fé o Direito e todo sistema legal, não poderia sequer respirar, tampouco se manter. Dessa forma, devem as partes agir com máxima integridade, dentro das esperáveis regras do jogo.

3.4 Funções e finalidades da boa-fé

Com o advento do Código Civil de 2002, uma das mudanças mais aplaudida foi a previsão expressa do princípio da boa-fé contratual, o qual não constava do Código Civil de 1916. Assim, a boa-fé objetiva é analisada sob três grandes funções: interpretativa, controle e integração.

  1. Interpretativa: o artigo 113 diz “os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração”, a boa-fé como função interpretativa, pode-se dizer que é uma mistura da boa-fé objetiva com a função social que devem ser analisadas pelos contratantes na realização dos negócios jurídicos, devendo levar em consideração a honestidade, a lealdade, e também não deixar de lado os usos, costumes, do lugar onde a obrigação está sendo pactuada. Assim, na função interpretativa tem-se que a boa-fé seja um meio auxiliador para interpretar de maneira mais favorável as negociações, afim de preservar e garantir o direito as partes negociantes.

No Código de Processo Civil, a função interpretativa claramente se vê nos artigos 322 e 489, quando a boa-fé passa a ser norte interpretativo do pedido e da sentença.

  1. Controle: Já o artigo 187 do Código Civil traz que “também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”. Aqui a boa-fé retrata-se como função de controle, busca impor limites para que as partes não cometam abusos nas negociações, bem como, em uma demanda judicial.

Conforme se extrai da obra de Silvio de Salvo Venosa, e, Maria Helena Diniz:

No direito processual, o abuso de direito caracteriza-se pela lide temerária, trazendo o CPC, nos arts. 14 e 16, descrição pormenorizada da falta processual”. No mesmo sentido, as lições de Maria Helena Diniz : Se o litigante ou exequente (CPC, art. 598), em processo de conhecimento ou de execução, formular pretensões, oferecer defesas ciente de que são destituídas de fundamento, praticar atos probatórios desnecessários  à defesa do direito, alterar intencionalmente a verdade dos fatos, omitir fatos essenciais ao julgamento da causa, enfim, se se apresentarem todas as situações de má-fé arroladas no Código de Processo Civil , art. 17, estará agindo abusivamente e deverá responder por perdas e danos, indenizando a parte contraria dos prejuízos advindos do processo e de sua conduta dolosa”. (VENOSA, DINIZ, apud TARTUCE, 2015, p. 41)

Dessa forma, a função de controle emanada da boa-fé tem por finalidade impedir justamente condutas dolosas e abusivas, sem qualquer respaldo legal. Assim, qualquer das partes, ao agir excessivamente aos limites impostos, de modo a prejudicar qualquer que esteja envolvido na respectiva demanda, responderá por tais atos.

c) Integração: no artigo 422, a boa-fé é caracterizada como função de integração e traz que “os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé”. O objetivo é integrar a boa-fé em todas as fases da negociação, ou seja, pré-contratual, contratual e pós-contratual.

A lacuna deixada pelo Código de 1916 quanto ao princípio da boa-fé, foi preenchida no Código Civil de 2002 com o advento do artigo 422, citado acima. Observa-se que o respectivo artigo faz menção somente a guardar a boa-fé na execução e na conclusão do ato negocial.

Nesse sentido, Caio Mário da Silva Pereira interpreta da seguinte maneira o artigo em questão:

Esqueceu-se o legislador de incluir expressamente na fórmula do artigo 422 os períodos pré e pós-contratual, dentro dos quais o princípio da boa-fé tem importância fundamental para a criação de deveres jurídicos para as partes, diante da inexistência nessas fases de prestação a ser cumprida. Essa omissão não implica negação da aplicação da regra da boa-fé para essas fases antecedente e posterior ao contrato, muito pelo contrário, já que cabe aqui a interpretação extensiva da norma para abranger também as situações não expressamente referidas, mas contidas no seu espírito. (PEREIRA, 2005, p. 20).

Assim o artigo 422 deve ser interpretado de forma extensiva. Em que pese o legislador não incluir os períodos pré e pós-contratual, a interpretação da norma deve abranger as expressões não referidas no respectivo termo legal, pois de forma implícita estão contidas na norma. Dessa forma, tudo o que estiver em andamento para a concretização do negócio, assim como detalhes que ligaram concomitantemente as partes naquela relação negocial, estarão amparados pelo ordenamento jurídico.

Em consonância com o artigo 422, Vicente Arruda explica:

[...] conclusão do contrato”, que compreende a fase de negociação, elaboração, assinatura, e da sua execução, que compreende o cumprimento ou descumprimento das obrigações contratuais, bem como a solução dos conflitos entre as partes. (ARRUDA, apud, DINIZ, 2007, p. 34-35).

Desta forma o artigo em questão expõe o significado das expressões “conclusão do contrato”, na qual pode ser interpretada como a fase das negociações, elaboração e assinatura de documentos, e, “execução do contrato”, retrata a fase de cumprimento ou descumprimentos das obrigações ora contratadas, assim como, a solução de qualquer conflito existente entre as partes.

No tocante à aplicação da boa-fé em todas as fases negociais, o Conselho da Justiça Federal e Superior Tribunal de Justiça aprovou dois enunciados doutrinários os quais fazem menção a aplicação da boa-fé em tais fases:

Enunciado n. 25 do CJF/STJ, da I Jornada[14]:

O art. 422 do Código Civil não inviabiliza a aplicação pelo julgador do princípio da boa-fé nas fases pré-contratual e pós-contratual.

Enunciado n. 170 da III Jornada[15]:

A boa-fé objetiva deve ser observada pelas partes na fase de negociações preliminares e pós a execução do contrato, quando tal decorrer da natureza do contrato.

Observa-se dos enunciados que a norma possui destinatários diferentes. No primeiro enunciado o destinatário é o próprio juiz, fazendo uso do princípio da boa-fé quando da aplicação da norma a um caso concreto, independente se na fase pré ou pós-contratual. Já o segundo enunciado o destinatário da norma são as próprias partes quando de suas negociações.

Por fim, na função de integração a boa-fé não se está limitada a fase temporal, muito menos a uma condição, podendo ser avocada em qualquer momento ou situação, seja ainda em fase preliminar, quer seja em uma fase processual.

3.5 Deveres anexos da boa-fé

Em se tratando do princípio da boa-fé há necessidade de que as partes observem os chamados deveres anexos.

Flavio Tartuce destaca alguns deles:

São considerados deveres anexos, entre outro: a) dever de cuidado em relação à outra parte negocial; b) dever de respeito; c) dever de informar a outra parte sobre o conteúdo do negócio; d) dever de agir conforme a confiança depositada; e) dever de lealdade e probidade; f) dever de colaboração ou cooperação, que passa a estar expresso no âmbito do processo, pela cooperação processual prevista no Art. 6º do Novo CPC; g) dever de agir com honestidade; h) dever de agir conforme a razoabilidade, a equidade a boa razão. (TARTUCE, 2015, p. 40)

Para Christiano Cassettari, em sua obra “Elementos do Direito Civil:

São exemplos de deveres anexos à boa-fé objetiva: 1. dever de cuidado em relação à outra parte; 2. dever de colaboração ou cooperação; 3. dever de respeito à confiança; 4. dever de informação quanto ao conteúdo do negócio jurídico; 5. dever de lealdade; 6. dever de agir conforme a equidade e a razoabilidade. (CASSETTARI, 2011, p. 185-186)

Ressalta-se que os deveres anexos não seguem um rol taxativo, tampouco exauriente. Dessa forma as partes, bem como, os julgadores não estão limitados ou devam se pautar somente pelos deveres acima elencados.

Destaca-se que onde se faz presente a boa-fé ali sempre estarão seus deveres anexos. Dessa forma, diariamente as pessoas estão sendo beneficiadas pelos deveres anexos e ao menos se dão conta. Por exemplo, ao ir ao supermercado comprar um produto, ao verificar a data de validade, qual a sua composição; ao adquirir um equipamento recebemos o manual com as instruções de uso, isso é o dever de informação da parte contrária. Ao se deparar com placas sinalizadoras para se evitar situações de perigo, ali está o dever de proteção; ao se evitar causar prejuízos a parte contrária sem qualquer motivo, ali está o dever de lealdade.

 Ademais, ao falar em lealdade, tem-se anexo a ela a confiança, ou seja, as partes na relação esperam e almejam ter seus interesses alcançados, dessa forma devem se abster de qualquer ação que lese ou prejudique a parte contrária.

No âmbito processual não é diferente. As partes não podem de maneira alguma frustrar, obstruir, atravancar a finalidade instrumental do processo. Além da lealdade, confiança, e demais deveres oriundos da boa-fé, deve haver cooperação entre as partes.

O Código de Processo Civil trouxe em seu artigo 6º, o dever de cooperação, quando ressaltou expressamente que “todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva”.

Quanto ao dever de cooperação versa este sobre o dever das partes em cumprir com os atos, condutas, executar as atividades necessárias para que se alcance os fins pretendidos dentro do processo, ou seja, cada parte cooperando entre si, na questão de documentos, informações, provas, não dificultando com situações que podem protelar ou embaraçar o processo.

José Moacyr Doretto Nascimento, faz menção que:

Se o processo é um conjunto de atos voltados para fins predeterminados e esses atos advêm de um diálogo essencialmente bilateral é possível dessumir que a cooperação é dever irmanado com teleologia da processualística moderna.[16]

Ainda, os artigos 378 e 380 do Código de Processo Civil, traz:

Artigo 378 – Ninguém se exime do dever de colaborar com o Poder Judiciário para o descobrimento da verdade.

Artigo 380 – Incumbe ao terceiro, em relação a qualquer causa:

i – informar ao juiz os fatos e as circunstancias de que tenha conhecimento;

ii – exibir coisa ou documento que esteja em seu poder.

Conforme se depreende dos artigos citados acima, veja que estes, impõe as partes o dever de ampla colaboração, para que se chegue ao fim esperado, qual seja, o descobrimento da verdade e uma decisão de mérito justa e efetiva. Logo, as partes entre si devem com franqueza informar ao juiz todos os fatos, informações, documentos que possam ajudar naquele determinado caso, assim também há de se proceder com o terceiro, que deverá e portar da mesma forma.

Ademais, nota-se que o dever de cooperação/colaboração abrange também o terceiro, ou seja, pessoas estranhas à relação jurídica processual. Assim, claramente se vê que a boa-fé objetiva não se caracteriza um mero fenômeno que se limita àquela relação jurídica, mas que tais deveres se desprendem dela para alcançar toda a sociedade, chamando à responsabilidade tais indivíduos que também serão designados a cooperar.       

Tartuce leciona que:

Para âmbito do processo civil, a violação dos deveres anexos processuais passa a gerar, além de imposição das penalidades por litigância de má-fé, uma responsabilização objetiva ou sem culpa pelos danos processuais ou materiais causados. (TARTUCE, 2015, p. 40)

Da mesma forma, o Enunciado nº 24 do Conselho da Justiça Federal, dispõe:

Enunciado 24 - Art. 422: em virtude do princípio da boa-fé, positivado no art. 422 do novo Código Civil, a violação dos deveres anexos constitui espécie de inadimplemento, independentemente de culpa[17].

Dessa forma, a não observância de qualquer dos deveres anexos a boa-fé objetiva calhando em sua violação, imputa àquele que praticou tal ato uma espécie de inadimplemento, independentemente de culpa, na qual responderá pelos danos processuais ou materiais causados.


4. O PRINCÍPIO DA BOA-FÉ NO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

Adentrando especificamente na esfera processual, com o advento da Lei nº 13.105/2015, o Código de Processo Civil, a boa-fé ganha importância central na teoria geral do processo.

O princípio da boa-fé processual, antes tratado pelo Código de Processo Civil de 1973 apenas em seu artigo 14, na qual retratava sobre a litigância de má-fé, atualmente ganha importância central no novo código de processo civil, justamente porque não só é tratado no artigo 81 fixando-se um aumento no teto para a multa quanto a litigância de má-fé para 10%(dez por cento) do valor corrigido da causa, como também se registra em outros artigos do código, veja:

Artigo 81 -  De ofício ou a requerimento, o juiz condenará o litigante de má-fé a pagar multa, que deverá ser superior a um por cento e inferior a dez por cento do valor corrigido da causa, a indenizar a parte contrária pelos prejuízos que esta sofreu e a arcar com os honorários advocatícios e com todas as despesas que efetuou.

Nesse sentido como se vê, ao invés de 1%(um por cento) sobre o valor da causa que era o teto fixado pelo código anterior, a nova sistemática aumenta esse teto para 10%(dez por cento) prestigiando assim o princípio da boa-fé, da lealdade processual.

Além dessa previsão especifica que já se via no código anterior, o Código de Processo Civil atual traz a consagração do princípio da boa-fé em outros 03 (Três) artigos:

 Em primeiro lugar, na parte geral reza o artigo 5º no sentido de:

Artigo 5o - Aquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de acordo com a boa-fé.

O artigo acima não especifica quem ou qual sujeito deve observar o princípio da boa-fé, logo, referido artigo consagra o princípio da boa-fé processual, trazendo uma pauta de conduta a todos no processo, ou seja, todos aqueles que de qualquer forma participarem do processo ou ingressarem no processo por qualquer seja o motivo, devem contribuir para o perfeito andamento processual, bem como, a prestação efetiva da atividade jurisdicional.

Compreende-se então que, a boa-fé processual, pautada na boa-fé objetiva, deve ser entendida como uma norma de conduta aos sujeitos do processo.

Nas palavras de Fredie Didier Junior, este preconiza que a fonte do artigo 5º do atual Código de Processo Civil, inspira-se no artigo 52 do Código de Processo Civil Suíço:

Nessa linha, ampliando a incidência do princípio da boa-fé processual a todos os sujeitos processuais inclusive ao juiz, o art. 52 do Código de Processo Civil Suíço de 2009, fonte de inspiração do art.5º do CPC brasileiro: “Art. 52. Comportamento secando buona fede. Tutte le persone che partecipano al procedimento devono comportarsi secondo buona fede. ” (TARTUCE, 2015, p. 104)

Em segundo lugar, no artigo 322, § 2º, dispõe acerca do pedido na parte especial, estabelecendo que:

Artigo 322 - O pedido deve ser certo.

§ 2o A interpretação do pedido considerará o conjunto da postulação e observará o princípio da boa-fé.

Novamente se vê o princípio a boa-fé no que concerne a interpretação do pedido, ou seja, fazendo com que o pedido ao ser interpretado, bem como, as decisões proferidas pelos tribunais devem estar pautadas pelo princípio da boa-fé.

Em terceiro lugar, preconiza o artigo 489, § 3º, no sentido de:

Artigo 489 - São elementos essenciais da sentença:

§ 3o A decisão judicial deve ser interpretada a partir da conjugação de todos os seus elementos e em conformidade com o princípio da boa-fé.

Indubitavelmente o princípio da boa-fé ganha importância central, tanto na teoria geral do processo, como também servindo de base interpretativa quanto para o pedido como para as decisões judiciais em geral.

O julgado do STJ de 2014 – Resp: 1119361 RS 2009/0111518-0, Relator: Ministra Nancy Andrighi, T3 - Terceira Turma, no item 4 da Ementa, amparado pelo Código anterior traz:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO. AUSÊNCIA. PRECLUSÃO TEMPORAL. NÃO OCORRÊNCIA. PRINCÍPIOS DA BOA-FÉ PROCESSUAL E DA COOPERAÇÃO. PREMISSA FÁTICA DA SENTENÇA MODIFICADA. AUSÊNCIA DE OFENSA À COISA JULGADA. FIM DA CONCORDATA. FATO EXTINTIVO SUPERVENIENTE. 1- Ação ajuizada em 27.9.1993. Execução iniciada em 18.10.2000. Recurso especial concluso ao Gabinete em 21.9.2009. 2- Controvérsia que se cinge a determinar se o requerimento de extinção do processo em virtude da perda superveniente de seu objeto é questão sobre a qual se operou a preclusão e se o entendimento adotado pelo acórdão recorrido viola a coisa julgada. 3- Ausentes os vícios do art. 535 do CPC, rejeitam-se os embargos de declaração. 4- Os princípios da boa-fé e da cooperação exigem que a atuação das partes integrantes da relação processual sejam balizadas pela ética e pela lealdade. O formalismo, nesse contexto, deve ceder diante de prática de condutas maliciosas ou ímprobas. 5- A superveniência de fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito de uma das partes - como o é, no particular, a questão relativa ao encerramento da concordata - impõe ao julgador o dever de tomá-lo em consideração, até mesmo de ofício (art. 462 do CPC). 6- Esta Corte já teve oportunidade de se manifestar no sentido de que "é de elementar inferência a distinção entre alteração da causa petendi, vedada no direito pátrio após a citação, com o instituto do direito superveniente, consagrado no art. 462 do CPC, que deve ser prestigiado no momento da decisão" (REsp 710.081/SP, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, DJ 27/03/2006). 7- Inexistência de violação à coisa julgada, pois a sentença tão somente proibiu que a instituição bancária efetuasse lançamentos de débito em conta corrente depois de deferido o processamento da concordata, não havendo disposição acerca de eventual e futura compensação. 8- Adimplidos os créditos relacionados na concordata e encerrado o processo, razão não há para a restituição de valores à recorrente pelo banco, verdadeiro credor da importância reclamada. Conclusão diversa importaria em inelutável enriquecimento ilícito, hipótese vedada pelo ordenamento jurídico pátrio. 9- Negado provimento ao recurso especial.

(STJ - REsp: 1119361 RS 2009/0111518-0, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 06/05/2014, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 19/05/2014).(grifo nosso)

Na realidade, o Código de Processo Civil apenas regulamentou algo que na prática já vinha sendo utilizado amplamente pela jurisprudência. Nos termos do acórdão a Ministra/Relatora Nanci Andrighi deixa evidente que o princípio da boa-fé assim como o dever de cooperação estão interligados na relação processual, sendo dever das partes integrantes estarem pautadas  pela ética e lealdade, assim como todo e qualquer sujeito que esteja na relação processual, cooperando e colaborando para que haja uma rápida solução naquele determinado conflito, de modo que em seus depoimentos, manifestações durante o processo, todos prezem pela verdade e sejam íntegros em suas manifestações.

Sobretudo, ao analisar os Enunciados 374, 375, 376, 377 e 378 do Fórum Permanente de Processualistas Civis sobre o princípio da boa-fé no Código de Processo Civil, a matéria é tratada:

Enunciado 374. (art. 5º) O art. 5º prevê a boa-fé objetiva. (Grupo: Normas fundamentais)[18]

Enunciado 375. (art. 5º) O órgão jurisdicional também deve comportar-se de acordo com a boa-fé objetiva. (Grupo: Normas fundamentais)[19]

Enunciado 376. (art. 5º) A vedação do comportamento contraditório aplica-se ao órgão jurisdicional. (Grupo: Normas fundamentais)[20]

Enunciado 377. (art. 5º) A boa-fé objetiva impede que o julgador profira, sem motivar a alteração, decisões diferentes sobre uma mesma questão de direito aplicável às situações de fato análogas, ainda que em processos distintos. (Grupo: Normas fundamentais)[21]

Enunciado 378. (arts. 5º, 6º, 322, §2º, e 489, §3º) A boa fé processual orienta a interpretação da postulação e da sentença, permite a reprimenda do abuso de direito processual e das condutas dolosas de todos os sujeitos processuais e veda seus comportamentos contraditórios. (Grupo: Normas fundamentais)[22]

Em análise a todos os enunciados acima destacados, é dever da parte ao entrar em uma demanda, que tenha um comportamento justo pautado na seriedade, despojado de qualquer tipo de maldade, má-fé, segundas intenções, deixando todo e qualquer tipo de intenção em se locupletar, em detrimento da outra parte.

Para Alexandre Freitas Câmara:

Não se trata, pois, apenas de se exigir dos sujeitos do processo que atuem com boa-fé subjetiva (assim entendida a ausência de má-fé), mas com boa-fé objetiva, comportando-se da maneira como geralmente se espera que tais sujeitos se conduzam. A vedação de comportamentos contraditórios (nemo venire contra factum proprium), a segurança resultante de comportamentos duradouros (supressio e surrectio), entre outros corolários da boa-fé objetiva, são expressamente reconhecidos como fundamentais para o desenvolvimento do processo civil. A boa-fé processual orienta a interpretação da postulação e da sentença, permite a imposição de sanção ao abuso de direitos processuais e às condutas dolosas de todos os sujeitos do processo, e veda seus comportamentos contraditório (FPPC, enunciado 378) (CÂMARA, 2016, p.09)

Importante destacar alguns comportamentos que contrariam a boa-fé processual. No exemplo abaixo, destaca Alexandre Freitas Câmara:

Pense-se, por exemplo, no caso de o juiz ter indeferido a produção de uma prova requerida pelo demandante, ao fundamento de que tal prova se destinaria a demonstrar um fato que já estaria comprovado. Posteriormente, o pedido é julgado improcedente ao fundamento de que aquele mesmo fato não estaria provado, sendo do autor o ônus probatório. Essas são condutas contraditórias e, por isso mesmo, contrárias ao princípio da boa-fé objetiva. Não se admite que o juiz assim proceda (FPPC 375: “o órgão jurisdicional também deve comportar-se de acordo com a boa-fé objetiva) (CÂMARA, 2016, p.09 e 10)

Nitidamente há um comportamento contraditório. Não se pode ter dois pesos e duas medidas, ou o fato está provado e a sentença de improcedência na qual declarou que o fato não estaria provado está incorreta, ou realmente o fato não está provado e nesse caso o mais cogente seria a reabertura do prazo probatório já que o pedido a produção da prova requerida anteriormente pelo demandante foi indeferido.

Outro exemplo abordado por Câmara:

Intimado um devedor a cumprir uma decisão judicial em certo prazo sob pena de multa, este deixa transcorrer o prazo sem praticar os atos necessários à realização do direito do credor. Este, então, fica inerte, não toma qualquer iniciativa, e permite que os autos sejam arquivados. Passados alguns anos, o credor desarquiva os autos e postula a execução da multa vencida por esses anos de atraso no cumprimento da decisão. Em um caso assim, deve-se considerar que o comportamento do credor, que não tomou qualquer providência para evitar o arquivamento dos autos por tão prolongado tempo, gerou no devedor a legítima confiança que não seria executado, daí resultando a perda do direito do credor à multa já vencida (supressio). Isso não implica, porém, dizer que o credor não tenha direito à satisfação do seu direito. Será preciso, porém, novamente intimar o devedor para cumprir a decisão no prazo que lhe fora assinado, sob pena de tornar a incidir a multa. Mas a multa pelo decurso dos anos anteriores não será mais devida por força da violação da boa-fé objetiva. (CÂMARA, 2016, p.10)

Novamente o princípio da boa-fé em evidência, o próprio credor deu causa ao arquivamento do processo, quando ainda poderia ter agido e não o fez, assim futuramente não poderá após todos esses anos exigir juntamente com o seu crédito a cobrança dessa multa, dessa maneira, terá que citar novamente o devedor para o pagamento, caso este não cumpra com o pagamento, então, ocorra a incidência de multa.

Nos termos do Agravo Regimental no Recurso Especial abaixo, o ministro Herman Benjamin destaca precisamente no item 7, que merece repreensão o comportamento contraditório da parte:

AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 1.439.136 - PR (2014/0044584-0)

RELATOR: MINISTRO HERMAN BENJAMIN

AGRAVANTE: ACRAS BASTOS ORTOLAN E COMPANHIA LTDA

ADVOGADO: ALEXANDRE BLEGGI ARAÚJO

AGRAVADO: FAZENDA NACIONAL

PROCURADOR: PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA NACIONAL

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. ALEGAÇÕES DE OMISSÃO DA DECISÃO AGRAVADA. NÃO CONHECIMENTO. VIA INADEQUADA. CARÁTER GENÉRICO DAS RAZÕES RELATIVAS À OFENSA DOS ARTS. 475 E 535 DO CPC. SÚMULA 284/STF. NULIDADE POR JULGAMENTO EXTRA PETITA. COMPORTAMENTO CONTRADITÓRIO DA PARTE. BOA-FÉ PROCESSUAL. FALTA DE INTERESSE RECURSAL.

7. Desse modo, merece censura o comportamento da parte, que silencia acerca de suposto julgamento extra petita, que em tese a favorece e que passa a questionar exatamente a mesma nulidade, quando o conhecimento da matéria alegadamente estranha aos limites da lide pode trazer-lhe algum prejuízo quando analisada a demanda em abstrato.

A parte deixa de arguir um julgamento extra petita justamente porque lhe favorece e em outro momento no qual ela se vê em desvantagem por conta dessa mesma questão, ela então faz a impugnação especifica.

Na visão do STJ quanto ao caso retro, se tem um grave ferimento ao princípio da boa-fé processual, venire contra factum proprium” – proibição do comportamento contraditório no processo, ou seja, se o indivíduo não arguiu o erro quando lhe favorecia, o porquê alegar agora. Literalmente há um ferimento dos princípios da honestidade, dos deveres anexos da boa-fé.

Por conseguinte, o artigo 5º do Código de Processo Civil, destacado também nos enunciados acima, trata-se claramente de uma cláusula geral, o mesmo não destaca quem é o destinatário da norma apenas impõe a todos o dever e um comportamento pautado na boa-fé, sem necessidade de enumerar quais condutas são desleais.

Em se tratando da questão, sobre qual o valor atribuído à boa-fé processual Fredie Didier faz um comparativo e retrata:

Até na guerra a proteção da boa-fé objetiva se impõe. o Estatuto de Roma, que criou o Tribunal Penal Internacional, reputa crime de guerra (art. 8°, 2, "b", vi e vii) " provocar a morte ou ferimentos a um combatente que tenha de posto armas ou que, não tendo meios para se defender, se tenha incondicionalmente rendido e utilizar indevidamente uma bandeira de tréguas, a bandeira nacional, as insígnias militares ou o uniforme do inimigo ou das Nações Unidas, assim como os emblemas distintivos das Convenções de Genebra, causando deste modo a morte ou ferimentos graves". São, como se vê, condutas abusivas, que ferem a ética da guerra. Hastear "bandeira branca", incentivando o avanço das tropas adversárias direto para uma emboscada, é venire contra factum proprium, conduta intolerável mesmo na guerra. A leitura do rol dos crimes de guerra previsto neste artigo revela, com alguma facilidade, a preocupação com a preservação e o incentivo à boa-fé e à cooperação em períodos de guerra.

Se mesmo na guerra a ética há de ser preservada, como não defender a existência de um princípio da boa-fé processual, em que, ainda que apenas metaforicamente, de modo civilizado e sob supervisão do juiz, as partes “guerreiam” por seus interesses?

Ademais, como afirma Leonardo Greco, "bem aplicado, esse princípio . . . serve com certeza mais adequadamente ao processo liberal", pois serve à proteção dos direitos subjetivos dos litigantes, "pois a eficácia das garantias fundamentais do processo impõe um juiz tolerante e partes que se com portem com lealdade”. (DIDIER, 2015, p.106/107)

Observa-se que não há possibilidade de mensurar o valor da boa-fé, apenas  deve a todo custo ser preservada, independentemente de qualquer situação, a comparação feita por Fredie é totalmente plausível, vez que mesmo na guerra a preservação da ética se mantém firme, na mesma esteira devem agir as parte estando em juízo, ademais, estão guerreando por seus interesses, sendo supervisionados pela pessoa do juiz, na qual todos envolvidos no contexto processual, seja, as partes, o próprio juiz, os procuradores das partes deverão prezar pela aplicação e proteção de tal princípio.

Nota-se, portanto, que o código de processo civil ao introduzir expressamente em vários artigos do texto legal a expressão boa-fé, deixa evidente sua real intenção, manifestando claramente o compromisso processual com respectivo instituto.

Dessa forma, ao percorrer o respectivo diploma legal, o artigo 5º, traz a obrigação de que todos aqueles que de alguma forma participarem no processo, deverão zelar e agir com boa-fé. Os artigos 79, 80 e 81, descreve alguns atos dos quais se exercidos, estarão caracterizados como atos acobertados pela litigância de má-fé, em seguida, o próprio legislador já impõe as respectivas sanções. O artigo 142 não traz expressamente a palavra boa-fé, mas como já estudado, tal princípio não precisa estar expresso, estando muitas vezes pelo seu caráter dinâmico, implícito na norma. Assim caracteriza o artigo 142, a boa-fé encontra-se implícita na norma, regulamentando o legislador que, se acaso se convencer de que as partes (qualquer parte) usaram do processo para praticar ato simulado ou se favorecer de fins nos quais estão vedados por lei, serão aplicadas a elas de oficio, as penalidades por litigância de má-fé. Da mesma forma se comporta o artigo 311, inciso I, quanto a concessão de tutela de evidência, em caso de abuso de direito de defesa ou manifesto propósito protelatório. Novamente, o princípio da boa-fé implícito na norma. O artigo 774 caput e parágrafo único, também se vê o princípio da boa-fé nas execuções em geral (fraudar a execução, se opor maliciosamente), também sofrerá as sanções previstas em lei. Por fim, o artigo 1.026, §2º trata-se dos embargos declaratórios com fins protelatórios, prevendo que também sofrerá o embargante a multa prevista em lei, se constatado sua má-fé.

Em atenção ao disposto no parágrafo anterior, os deveres de agir com boa-fé nas relações processuais estão espalhados por todo texto normativo.

Dessa forma, afirma Flávio Tartuce que traçando uma ponte entre o Direito Civil e o Direito Processual Civil, a relação entre ambos deve ser analisada sob dois aspectos fundamentais, ou seja, a instrumentalidade e a efetividade:

Com base na instrumentalidade, deve-se conceber o processo como um instrumento de atuação dos valores consagrados no plano do direito material. Em termos de efetividade, deve-se considerar, como bem expôs Liebman, que, sem o processo, o direito (material) estaria abandonado apenas à boa vontade dos homens, correndo o risco de não ser atuado; já o processo sem o direito (material) seria um mecanismo fadado a cair no vazio, privado de conteúdo e objetivo. Como atesta Rodolfo de Camargo Marcuso, com tal contribuição o mestre italiano “logrou encontrar o ponto de equilíbrio entre direito e processo, como dois polos que, sem se sobreporem, antes se implicam e se complementam”. (TARTUCE, 2015, p.69)

Em outras palavras, a interação entre a legislação material e a processual se complementam ao ponto de que uma não sobreviva sem a outra. Por outro lado, esta nova visão do código de processo civil, para um sistema aberto e principiológico, intensificará não só está comunicação com o Código Civil, mas também com a Constituição Federal, que por sua vez nos traz uma visão unitária do ordenamento jurídico.

Para Fredie Didier:

A consagração do princípio da boa-fé processual foi resultado de uma expansão da exigência de boa-fé do direito privado ao direito público. A jurisprudência alemã entendeu aplicável o § 242 do Código Civil alemão (cláusula geral de boa-fé) também ao direito processual civil e penal. De um modo geral, a doutrina seguiu o mesmo caminho. Na verdade, a boa-fé objetiva expandiu - se para todos os ramos do Direito, mesmo os "não civis". Sempre que exista um vínculo jurídico, as pessoas envolvidas estão obrigadas a não frustrar a confiança razoável do outro, devendo comportar-se como se pode esperar de uma pessoa de boa-fé. Como acontece com qualquer relação jurídica, a boa-fé recai também sobre as relações processuais. (DIDIER, 2015, p.105/106)

Nota-se que a boa-fé apenas expressada de forma tímida pelo Código Civil de 1973, ganha força expandindo-se para todos os ramos do direito trazendo uma segurança jurídica.

Ademais, em caráter majoritário tratam os doutrinadores que o princípio da boa-fé é extraído de uma cláusula geral processual. Segundo tais, esse foi o caminho mais seguro que o legislador encontrou para abordar diversas modalidades de situações que poderão surgir ao longo do processo. Dessa forma, se o legislador fosse tipificar e caracterizar cada uma das condutas e seus perfis e elencá-las dentro de um rol os comportamentos desleais, tornaria o processo ineficaz.


5. A EFETIVAÇÃO DO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ PROCESSUAL

Destaca-se sobre a efetivação do princípio da boa-fé processual, que as regras de proteção a tal princípio compõe a modelagem do devido processo legal brasileiro.

Dessa forma, o Código de Processo Civil em seu artigo 81 impõe sanções as condutas processuais que venham ou pretendam impedir a realização do direito material. Já a norma contida no artigo 80 não caracteriza o destinatário, apenas se reporta ao litigante de má-fé, podendo ser qualquer pessoa na relação, que, praticando tal conduta contrária, estará sujeita as penalidades previstas na lei.

Assim, boa-fé se concretiza quando atos e condutas opostas com intuito de lesar e fraudar tanto a parte quanto o processo em si são impedidas, de tal modo, o próprio ordenamento traz em seu bojo mecanismos e ferramentas com escopo de alertar as partes sobre tais comportamentos.

Ao tratar sobre a proibição de criar dolosamente posições processuais, o ordenamento jurídico proíbe a criação de situações que o próprio texto normativo não autoriza, caracterizando um dolo processual. A exemplo disso o Código de Processo Civil traz: a litigância de má-fé do artigo 80; a atuação dolosa do órgão jurisdicional do artigo 143, requerimento doloso de citação por edital do artigo 258. Esses são alguns exemplos que ferem o princípio da boa-fé processual.

No que tange a proibição de venire contra factum proprium. Conforme já abordado anteriormente se refere a proibição de duas condutas praticadas pela mesma pessoa na qual uma dessas condutas vai de encontro e totalmente oposta a conduta anteriormente praticada pela mesma pessoa, gerando assim uma certa expectativa na parte contrária. Exemplo disso: a parte que recorre de uma decisão na qual anteriormente já se aceitara (artigo 1.000 do CPC); o pedido de invalidação de um ato defeituoso na qual a parte mesmo deu causa (artigo 276 CPC) ou, a impugnação da legitimidade ativa, já aceita em processo anterior (artigo 108 CPC).

Reafirma-se, qualquer comportamento com fins contraditório é vedado pelo ordenamento jurídico brasileiro, sendo que atos praticados de acordo com as condutas acima passa a ser considerado um ilícito processual.

Ainda, a proibição de abuso de direitos processuais. Por esta conduta tem-se duas interpretações. O abuso de um direito já é considerado uma conduta ilícita, contudo, o abuso de um direito processual também se caracteriza como comportamento ilícito. Exemplificando: o abuso pela parte do direito de defesa; o manifesto propósito protelatório; o abuso na escolha do meio executivo; o abuso do direito de recorrer, são hipóteses em que o próprio ordenamento traz expressamente a incidência da litigância de má-fé.

Dentre outros institutos também estão atrelados às beneficies da boa-fé objetiva: a Supressio, a Surrectio, e, a Tu Quoque, ferramentas que também tem como intuito, a imposição quanto a aplicação da boa-fé.

Em breves palavras, trata-se a Supressio (Verwirkung da doutrina alemã) da supressão de um direito pela renúncia tácita do mesmo, devido ao fato de não o ter exercido com o passar do tempo.

O artigo 330 do Código Civil exemplifica perfeitamente a questão:

Artigo 330 – O pagamento reiteradamente feito em outro local faz presumir renúncia do credor relativamente ao previsto no contrato.

Para ilustrar o artigo acima, tendo como exemplo que as partes tenham pactuado no contrato que os pagamentos deveriam ocorrer no domicílio do credor, ao passo que o devedor de forma reiterada permanece efetuando os pagamentos em seu domicilio, sem que o credor tenha se manifestado de forma contraria àquele comportamento, logo, a obrigação passará a ser quesível, ou seja, os pagamentos deverão continuar sendo efetuados no domicilio do devedor.

Em contrapartida, ao mesmo tempo que há uma supressão no direito do credor, que não terá argumentos para questionar tal fato como no exemplo acima, nasce para o devedor um direito que não existia juridicamente até então, ocasionado pela prática, usos e costumes de determinadas situações, daí chamado de Surrectio (Erwirkung).

O Informativo nº 478 do Superior Tribunal de Justiça, exemplifica o caso:

CORREÇÃO MONETÁRIA. RENÚNCIA.

O recorrente firmou com a recorrida o contrato de prestação de serviços jurídicos com a previsão de correção monetária anual. Sucede que, durante os seis anos de validade do contrato, o recorrente não buscou reajustar os valores, o que só foi perseguido mediante ação de cobrança após a rescisão contratual. Contudo, emerge dos autos não se tratar de simples renúncia ao direito à correção monetária (que tem natureza disponível), pois, ao final, o recorrente, movido por algo além da liberalidade, visou à própria manutenção do contrato. Dessarte, o princípio da boa-fé objetiva torna inviável a pretensão de exigir retroativamente a correção monetária dos valores que era regularmente dispensada, pleito que, se acolhido, frustraria uma expectativa legítima construída e mantida ao longo de toda a relação processual, daí se reconhecer presente o instituto da supressio. REsp 1.202.514-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 21/6/2011. (Grifo nosso).[23]

Destarte, em análise ao caso retro citado, pelo princípio da boa-fé não há o que se falar em cobrança retroativa tendo por objeto impugnar direito que ao seu tempo não fora prequestionado, logo, torna-se totalmente inviável tal pretensão.

Quanto a “tu quoque”, segundo Flavio Tartuce o instituto diz respeito:

[...] uma parte que violou uma norma jurídica não poderá, sem a caracterização do abuso de direito, aproveitar-se dessa situação anteriormente criada pelo desrespeito”. (TARTUCE, 2015, p.49)

A palavra “tu quoque” vem de uma expressão latina que se refere a quebra de confiança, para alguns caracterizada como um elemento surpresa.

No âmbito do Direito Civil, o instituto tem como forma representativa a exceção do contrato não cumprido prevista no artigo 476 do Código Civil:

Art. 476. Nos contratos bilaterais, nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua obrigação, pode exigir o implemento da do outro.

Em análise ao artigo supra, pretende-se com tal dispositivo se evitar que aquele que não cumpre a sua obrigação, partindo da violação de uma norma jurídica, não venha a invocar essa mesma norma em seu favor, atentando nitidamente contra o princípio da boa-fé objetiva.

No âmbito processual, o comportamento não é diferente. Pelo princípio da boa-fé processual é vedado as partes ou qualquer outro sujeito se beneficiar de seu próprio erro.

De acordo com entendimento dos tribunais:

Embargos de Declaração nº 0701772-40.2011.8.02.0001/50000 (Físico), de Maceió, 9ª Vara Cível da Capital

EMENTA: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO CÍVEL. ALEGAÇÃO DE OMISSÃO EM ACÓRDÃO. FALTA DE MANIFESTAÇÃO ACERCA DA NECESSIDADE DE INTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NO FEITO. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. POSSIBILIDADE DE CONHECIMENTO DE OFÍCIO. OMISSÃO RECONHECIDA. NULIDADE ALEGADA POR QUEM LHE DEU CAUSA. CPC, ARTS. 243 E 84 DO CPC. VIOLAÇÃO DA BOA-FÉ PROCESSUAL: TU QUOQUE E VENIRE CONTRA FACTUM PROPIUM. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE PREJUÍZO PARA O INCAPAZ. O MINISTÉRIO PÚBLICO, QUANDO ATUA COMO FISCAL DA LEI, É IMPARCIAL, NÃO POSSUINDO O DEVER DE ASSUMIR A DEFESA TÉCNICA DE UMA DAS PARTES. DIREITO PATRIMONIAL DISPONÍVEL. DESNECESSIDADE DE INTERVENÇÃO DO MP. AINDA QUE SE ENTENDA PELA NULIDADE, ELA FOI SUPRIDA EM SEGUNDO GRAU. INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS. ART. 154 DO CPC. NULIDADE NÃO DECRETADA. OMISSÃO SUPRIDA, SEM MODIFICAÇÃO DO JULGADO. APRECIAÇÃO DA MANIFESTAÇÃO OFERTADA PELO MP. NÃO ACOLHIMENTO. VALOR DOS HONORÁRIOS FIXADO DE FORMA RAZOÁVEL. DEMAIS OMISSÕES APONTADAS NO RECURSO NÃO RECONHECIDAS. TENTATIVA DE REDISCUSSÃO DA CAUSA. EMBARGOS CONHECIDOS E ACOLHIDOS EM PARTE, SANANDO-SE A OMISSÃO SEM MODIFICAÇÃO DO JULGADO.

Assim, pela inteligência do princípio da boa-fé objetiva não poderá a parte prequestionar um direito que ao seu tempo não fora inquerido, para se beneficiar com o mesmo. 

Os efeitos do princípio da boa-fé são consumados com a aplicação das sanções impostas pelo ordenamento jurídico, quando se verifica a incidência de atos contrários ao que está prescrito em lei.

De tal forma, não se pode confundir o princípio da boa-fé como norma preexistente no ordenamento jurídico, com a exigência de se proceder com boa-fé para configuração de alguns atos ilícitos processuais.

Ademais, a parte pode estar amparada pelos princípios da boa-fé no quesito de documentos, provas, testemunhas, mas reproduzir atitudes e atos dentro do processo, por exemplo, manifesto propósito protelatório, na qual está totalmente contraria a boa-fé processual.

Dessa forma, a abrangência do princípio da boa-fé vai além. Em outras palavras, a boa-fé objetiva pode ser praticada ou usada como forma de defesa.

Por fim, as penalidades para os atos contrários ao ordenamento jurídico, reportados no presente estudo, serão aplicadas precisamente na esfera financeira daqueles que agirem de tal forma. Como abordado anteriormente, uma das principais mudanças trazidas pelo código de processo civil foi a retirada do limite para a aplicação da pena por litigância de má-fé, deixando dessa forma o instituo mais aberto, na qual o próprio juiz é quem vai preenchê-lo, e, definir qual a porcentagem deverá ser aplicada aos infratores.


6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo primordial do presente estudo, é demonstrar que no decorrer da história grandes foram os avanços obtidos quanto ao instituto da boa-fé. Aquela boa-fé na qual se baseavam as decisões, e, que não se tinha por base uma estrutura positivada, sendo apenas sustentada pelos próprios atributos da boa-fé, ao longo dos anos ela foi adotando preceitos e normas diferente. Passando pelo consensualimo as regras deixaram de existir, e, o simples acordo de duas ou mais vontades já era o bastante para que aquela obrigação se tornasse válida. Na idade média o cenário da boa-fé era visto sob a ótica de pecado. Em 1850, a boa-fé ganhou espaço em nosso Código Comercial, mas de forma ainda tímida, vindo a reaparecer no Código Civil de 1916, mas de forma restrita.

Contudo foi em 2002 que se teve a tão aplaudida mudança na qual foi a introdução expressa pelo Código Civil de 2002 do princípio da boa-fé.

De acordo com o presente estudo, percebe-se que o instituto da boa-fé ao longo dos tempos veio amadurecendo tanto na área material como na seara processual e se moldando aos avanços da sociedade, tornando-se um instituto influente, capaz de ser invocado não só nas esferas cíveis, mas em todas as outras áreas (constitucional, penal, defesa do consumir, trabalhista, tributária, empresarial, administrativa) estruturadas dentro do ordenamento jurídico brasileiro.

Para se falar em boa-fé não é trabalho fácil, não há possibilidade de se concluir ou aferir, se o agente está ou não de boa-fé. É algo que se efetiva na própria conduta. Torna-se necessário analisar se o comportamento do agente está pautado na lealdade, probidade, confiança, veracidade, cooperação, ou, se age com condutas e atos maléficos.

O Código de Processo Civil traz em seu bojo a preservação por um processo participativo e cooperativo, de sorte que não é exigido somente das partes agir de acordo com a boa-fé, mas do Poder Judiciário que deve portar-se de forma coerente e íntegra, como também de qualquer pessoa seja está o juiz, os servidores, uma testemunha, o perito, oficial de justiça, ou o terceiro a quem o processo atingir.

A visão do novo Código Processual Civil é a de estabelecer sanções pecuniárias efetivamente capaz de reprimir e desestimular a litigância de má-fé, ao ponto que aquele que adentrar em uma demanda e assumir conduta tipificada como litigância de má-fé, ocorrerá para este a aplicação de três condenações de diferentes naturezas, quais sejam: multa, indenização por perdas e danos e condenação ao pagamento de honorários e despesas.

Em que pese o ordenamento pátrio trazer em seu bojo os deveres de lealdade, cooperação, probidade, implícitos ao princípio da boa-fé, sendo tais considerados como verdadeiros pilares que sustentam o sistema jurídico-processual, ainda assim, como já dito, infelizmente há possibilidade de se deparar com a má-fé no transcorrer do processo.

Dessa forma, deve haver uma conscientização de que está banido do nosso ordenamento o famoso “jeitinho” em que as partes atribuem para determinada situação, ou seja, querendo improvisar soluções para certas situações adotando procedimentos totalmente contrários a boa-fé, se valendo do famoso trecho citado por Maquiavel, não importam os meios e sim o fim a que se pretende, usando o processo como um subterfugio para se beneficiar de algo ilicitamente.

Conclui-se então, que o que se busca com o Código de Processo Civil é que a conduta de todos aqueles envolvidos na demanda esteja em devida consonância com a boa-fé objetiva processual. Essa conduta pode partir de qualquer das partes no processo, dessa forma, devem todos pautar-se em comportamentos éticos, probos, de acordo com a moralidade, lealdade, da mesma forma o judiciário, zelando pelo efetivo contraditório, não fazendo uso de decisões surpresas, e que o processo tenha por objetivo a finalidade social.


7. FONTES

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8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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DIDIER JR, Fredie. Curso de direito processual civil II. Salvador: Editora JusPodivm, 2015

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CÂMARA, Alexandre Freitas. O novo processo civil brasileiro. São Paulo: Editora Atlas, 2016


Notas

[1] Apud HENTZ, André Soares. Origem e Evolução Histórica da Boa-fé no Ordenamento Jurídico Brasileiro. Disponível em <http://egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/9693-9692-1-PB.pdf> Acesso em 29 de outubro de 2016.

[2] REIS, João Emílio de Assis. Boa-Fé Objetiva: Historicidade e Contornos Atuais no Direito Contratual. Disponível em <http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=8281#_ftnref9> Acesso em 29 de outubro de 2016.

[3] Código Comercial Planalto. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L0556-1850.htm>. Acesso em 29 de outubro de 2016

[4] Apud HENTZ, André Soares. Origem e Evolução Histórica da Boa-fé no Ordenamento Jurídico Brasileiro. Disponível em <http://egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/9693-9692-1-PB.pdf> Acesso em 29 de outubro de 2016

[5] Apud HENTZ, André Soares. Origem e Evolução Histórica da Boa-fé no Ordenamento Jurídico Brasileiro. Disponível em <http://egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/9693-9692-1-PB.pdf> Acesso em 29 de outubro de 2016

[6] Idem

[7] HENTZ, André Soares. Origem e Evolução Histórica da Boa-fé no Ordenamento Jurídico Brasileiro. Disponível em <http://egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/9693-9692-1-PB.pdf> Acesso em 29 de outubro de 2016.

[8] AMARAL, Diego Martins Silva. O princípio da boa-fé e suas diferenças entre objetiva e subjetiva. Disponível em <http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=1781> Acesso em 10 de novembro de 2016

[9] HENTZ, André Soares. Origem e Evolução Histórica da Boa-fé no Ordenamento Jurídico Brasileiro. Disponível em <http://egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/9693-9692-1-PB.pdf> Acesso em 29 de outubro de 2016

[10] Constituição Federal. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ constituicaocompilado.htm>Acesso em 30 de outubro de 2016

[11] Idem

[12] Idem

[13] Wikipédia. Disponível em <https://pt.wikipedia.org/wiki/Princ%C3%ADpio> Acesso em 30 de outubro de 2016

[14]Enunciados aprovados I Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal.   <http://daleth.cjf.jus.br/revista/enunciados/IJornada.pdf>. Acesso em 30 de outubro de 2016

[15] Enunciados aprovados I Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal. <http://daleth.cjf.jus.br/revista/enunciados/IIIJornada.pdf>. Acesso em 30 de outubro de 2016

[16] NASCIMENTO, José Moacyr Doretto. A boa-fé objetiva e o processo civil. Disponível em < https://jus.com.br/artigos/20311/a-boa-fe-objetiva-e-o-processo-civil> Acesso em 30 de outubro de 2016

[17] Enunciados aprovados I Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal. <http://daleth.cjf.jus.br/revista/enunciados/IJornada.pdf>. Acesso em 30 de outubro de 2016

[18] Enunciados do Fórum Permanente de Processualistas Civis. < http://www.tjmg.jus.br/data/files/2C/F5/DF/3F/98FB4510660CAB45DD4E08A8/Enunciados%20do%20Forum%20Permanente%20de%20Processualistas%20Civis.pdf>. Acesso em 30 de outubro de 2016

[19] Idem

[20] Idem

[21] Idem

[22] Idem

[23] Informativo nº 0478 - período: 20 a 24 de julho de 2011 do Superior Tribunal de Justiça < www.stj.jus.br/docs_internet/informativos/RTF/Inf0478.rtf>. Acesso em 30 de outubro de 2016



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