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RESPOSTA A ACUSAÇÃO COM PEDIDO DE REVOGAÇÃO DA PRISÃO CAUTELAR

RESPOSTA A ACUSAÇÃO COM PEDIDO DE REVOGAÇÃO DA PRISÃO CAUTELAR

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Trata-se de Resposta à acusação com pedido de revogação da prisão cautelar, no caso o réu está sendo acusado de participação nos crimes de roubo e latrocínio. A liberdade foi concedida !

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA 1ª VARA CRIMINAL DA COMARCA  DE .................../SP.



 


Processo n.º ..........................

URGENTE – RÉU PRESO


                            fulano de tal, já qualificado nos autos da ação penal em destaque, atualmente preso e recolhido à disposição da Justiça Pública nas dependências do C.D.P. de Guarulhos 2, por seu advogado que subscreve, com fundamento no artigo 406 do Código de Processo Penal, em RESPOSTA À ACUSAÇÃO dizer que a instrução criminal demonstrará a improcedência da acusação, para ao final requerer REVOGAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA, pelos motivos de fato e de direito a seguir delineados:


                            Meritíssimo Juiz:


                            O Ministério Público na condição de dominus litis, exibiu proposta acusatória em face do denunciado pela prática dos delitos tipificados no artigo 157, § 2º; incisos I e II (por duas vezes) e artigo 157, § 3º, ambos do Código Penal, tendo sua prisão preventiva decretada por este R. Juízo.

                            Colhe-se dos autos que com exceção do reconhecimento fotográfico realizado pela vítima cicrana (depois retratado em juízo às fls. 363), e dos duvidosos, parciais e tendenciosos depoimentos dos co-réus.............e................... ( que apontaram nos autos a participação do réu), nada mais foi produzido nos autos, que indiquem a participação do acusado nos delitos, ou seja, nenhuma outra prova ou indício que pudesse ligá-lo às empreitadas criminosas, somente a presunção policial pelo fato de ter sido delatado pelos co- réus, que aliás já haviam apontados anteriormente um tal de “.................”, e um outro de vulgo “......................”, o que por si só, SMJ, já demonstra que a versão apresentada pelos co-réus (no que tange a participação do réu nos delitos,  não merece qualquer credibilidade).

                            A prisão do acusado, em síntese, ocorreu ainda sob a fundamentação de ter sido reconhecido fotograficamente por uma das vítimas, entretanto, esse motivo ensejador da custódia preventiva precisa ser urgentemente revisto, sob pena de uma gritante injustiça. Senão vejamos:

                            É sabido que o reconhecimento é, de todos os meios de prova, a mais falha, a mais precária. A ação do tempo, o disfarce, más condições de observação, erros por semelhanças, a vontade de reconhecer, tudo, absolutamente tudo, torna o reconhecimento uma prova altamente precária.

                            Ressalte-se que a lei fala em indícios suficientes de autoria, portanto, não é qualquer indício que autoriza a custódia cautelar.

                            O acusado nega ter sido ele o autor do crime, e a vitima, no suposto reconhecimento fotográfico, ao ser ouvida em juízo (fls. 363), afirmou que não teria condições de afirmar se um dos autores –e o representado pela fotografia de fls. 322 (foto que corresponde à pessoa  do réu), além de afirmar que não fez qualquer  reconhecimento por fotografia na fase policial.

                            Portanto Excelência, desde o início, o decreto prisional foi baseado em fatos ainda em apuração sem o mínimo suporte probatório e sem que tenha sido proferida qualquer sentença condenatória contra o acusado, violando, desta forma, a Constitucional Presunção de Inocência.

                            Em outras palavras, independente de saber se contém ou não, alcance de presunção – pode-se até dizer que a presunção de inocência não é só garantia, projetando-se como tal, por exemplo, na distribuição do ônus da prova no processo, o certo é que essa cláusula garante aos acusados, em causa criminal não sofrerem, até o trânsito em julgado da sentença nenhuma sanção ou consequência jurídica danosa, cuja justificação normativa dependa do trânsito em julgado de sentença condenatória que é o juízo definitivo de culpabilidade.

                            O Congresso Nacional, através do Decreto Legislativo n. 27, de 26 de maio de 1992, aprovou o texto da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica). E o governo brasileiro, em 25 de setembro de 1992, depositou a carta de adesão a essa convenção, determinando-se seu integral cumprimento pelo decreto n.º 678, de 06 de novembro de 1992, publicado no diário oficial de 09/11/92, pág. 15.562.

                            Com efeito, ao tratar das garantias processuais a referida convenção assegura expressamente que “toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente sua culpa”. (Art. 08, primeira parte).

                            E referida disposição tem valor de preceito constitucional, pois a carta de 1988 é expressa o respeito, no seu art. 5º, 2º. Os direitos e garantias expressas nesta constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por elas adotadas, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil, seja parte.

                            Assim, parte da referida publicação, a presunção de inocência, “constitui princípios informados de nosso processo penal assegurada por duas fontes legislativas”, o art. 5º, inciso LVII da Constituição, em que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença condenatória”. Segundo DIRCEU ÁGUIA CINTRA JÚNIOR (IN PRISÕES CAUTELARES - O USO E ABUSO, Revista da PGE, junho de 1994, p. 132):

“Seja o réu primário, ou reincidente, tenha bons, ou  maus antecedentes, ainda que pronunciado ou condenado em primeiro grau, enquanto não transitar em julgado a condenação, continuará inocente, com todas as aplicações constitucionais de tal estado”.

                            O Princípio Constitucional da não culpabilidade, em nosso sistema jurídico, consagra uma regra de tratamento que impede o poder público de agir e de se comportar, em relação ao suspeito, ao indiciado, ao denunciado, ou ao réu, como se esses já houvessem sido condenados definitivamente por sentença do poder jurídico.

                            Parece evidente que uma execução antecipada em matéria penal, configuraria grave atentado contra a própria ideia de dignidade humana.

                            Se entender, como enfaticamente destacam a doutrina e a jurisprudência, que o princípio da dignidade humana não permite que o ser humano se convole em objeto da ação estatal, não há compatibilizar semelhante ideia com a execução penal antecipada.

                            Como preleciona o eminente Magistrado LUÌS FLÀVIO GOMES (revista jurídica, 189, [jul. 1994], síntese, Porto Alegre-RS):

“O eixo, a base, o fundamento de todas as prisões  cautelares no Brasil residem naqueles requisitos da prisão preventiva. Quando presentes pode o juiz fundamentadamente decretar qualquer prisão cautelar, quando ausentes ainda que se trate de reincidente, ou de que não tem bons antecedentes, ou de crime hediondo, ou de tráfico, não pode ser decretada a prisão antes do trânsito em julgado da decisão”.

                           

                            Ademais, merece ficar registrado também, o fato de que a concessão de liberdade provisória em nada prejudica o curso da possível ação penal além de não se avistarem presentes os motivos legitimadores de um decreto prisional cautelar como o que fora prolatado no feito sub examine, comprometendo-se, o requerente a comparecer a todos os atos processuais a serem designados por Vossa Excelência.


                            Excelência, em que pese à gravidade do delito imputado ao réu, é sempre importante reiterar que nenhuma acusação penal se presume provada, ou seja, não compete ao réu demonstrar a sua inocência, pelo contrário, o Ministério Público deverá comprovar, de forma inequívoca, para além de qualquer dúvida razoável, a culpabilidade do acusado.

                            Assim Excelência, não há que se falar em gravidade do delito para justificar uma prisão processual, nesse sentido vem a jurisprudência do STJ:

“A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de  que a  existência de indícios  de autoria e prova da materialidade do delito, bem como o juízo valorativo sobre a gravidade genérica do crime imputado ao paciente e sua periculosidade abstrata, não constituem fundamentação idônea a autorizar a prisão cautelar, se desvinculados de qualquer valor concreto ensejador da configuração dos requisitos do art. 312 do CPP.” (HC 245703-MG, 5ª.T., Rel. Gilson Dipp, 28.08.2012, v.u.) .

                            Corrobora este entendimento o julgamento do HC 94404-SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJe-110, divulgado em 17.06.2010 e publicado 18.06.2010, cujo trecho está abaixo transcrito:

A PRISÃO PREVENTIVA - ENQUANTO MEDIDA DE  NATUREZA CAUTELAR - NÃO PODE SER UTILIZADA COMO INSTRUMENTO DE PUNIÇÃO ANTECIPADA DO INDICIADO OU DO RÉU.

 - A prisão preventiva não pode - e não deve - ser utilizada, pelo Poder Público, como instrumento de punição antecipada daquele a quem se imputou a prática do delito, pois, no sistema jurídico brasileiro, fundado em bases democráticas, prevalece o princípio da liberdade, incompatível com punições sem processo e inconciliável com condenações sem defesa prévia. (...) A GRAVIDADE EM ABSTRATO DO CRIME NÃO CONSTITUI FATOR DE LEGITIMAÇÃO DA PRIVAÇÃO CAUTELAR DA LIBERDADE. - A natureza da infração penal não constitui, só por si, fundamento justificador da decretação da prisão cautelar daquele que sofre a persecução criminal instaurada pelo Estado. Precedentes. (grifos nossos)

                            Excelência, a liberdade não é um bem patrimonial que pode ser atualizada no proferimento da  decisum. Por ser ela psicológica e até mesmo moral, a futura sentença jamais poderá compensar a liberdade que ficou perdida, não a como atualizar a perda da liberdade, direito insopitável em decorrência da própria natureza.

                             Diante desse panorama, e conhecedores que somos da realidade de nossos presídios, conclui-se que a prisão durante o processo deve ser de extrema raridade, mesmo porque, seguindo a própria lógica constitucional, o preso provisório nada mais é que um inocente encarcerado.

DOS REQUERIMENTOS

Pelo exposto e pelo que consta dos autos, requer-se:

  1. A REVOGAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA ;

  1. No decorrer da instrução, o reconhecimento formal em juízo, se possível nos moldes do artigo 226 do C.P.P.,

  1. A reinquirição das testemunhas abaixo arroladas, resguardando o direito de eventual substituição;

  • A LIBERDADE FOI CONCEDIDA

                            Termos em que,

                            Pede deferimento.

                            São Paulo, 10 de agosto de 2017.

                            José Roberto Telo Faria

                            Advogado – OAB/SP 207.840


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