Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/6722
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

Noções introdutórias acerca do ato administrativo

Noções introdutórias acerca do ato administrativo

Publicado em . Elaborado em .

Sumário: 1. Considerações preambulares. 2. Fatos administrativos. 3. Ato administrativo. 4. Requisitos do ato administrativo. 5. Mérito administrativo. 6. Atributos do ato administrativo. 7. Atos administrativos em espécie. 8. Existência e extinção dos atos administrativos.


1. CONSIDERAÇÕES PREAMBULARES.

            Trata-se de apontamentos, anotações básicas para aqueles operadores do direito administrativo que queiram iniciar estudos concernentes ao ato administrativo, por conseguinte, carecem de uma maior aprofundamento teórico, senão que servem como um guia para estudos a serem feitos com mais rigor e detida análise.

            É material de reciclagem para os já formados, e instrumental útil para os bacharelandos que vivenciam o estudo de direito administrativo ainda na universidade. O texto aponta caminhos que devem necessariamente ser percorridos.


2 - FATOS ADMINISTRATIVOS.

            É conceito mais amplo do que o de ato administrativo. É uma atividade material no exercício da função administrativa que visa efeitos práticos para a Administração. (1) É o ato material de pura execução, i,e, em satisfação de um dever jurídico e traduz o exercício da função administrativa na dicção de Marçal Justen Filho. (2)

            Segundo Hely Lopes Meirelles o fato administrativo resulta do ato administrativo que o determina. (3) Entretanto, pode ocorrer o contrário, no caso da apreensão de mercadoria (atividade material de apreender), primeiro se apreende e depois se lavra o auto de infração, este sim o ato administrativo. (4) Pode ocorrer também independente de um ato administrativo, quando se consuma através de uma simples conduta administrativa, alteração de local de um departamento público se perfaz sem a necessidade de um ato administrativo, porém, não deixa de ser um atividade material. Até fenômenos naturais, quando repercutem na esfera administrativa, constituem fatos administrativos, um raio que destrói um bem público, chuvas que deterioram um equipamento do serviço público. Ex de fato administrativos: Construção de uma ponte, varredura de ruas, dispersão de manifestantes, reforma de escolas públicas.

            Para Diógenes Gasparini os fatos administrativos não se preordenam à produção de qualquer efeito jurídico, traduzem mero trabalho ou operação técnica do agente público. Ex: de atos materiais: dar aula. Ainda que não seja a regra, deles, atos materiais, podem advir efeitos jurídicos, ex: o direito a indenização do paciente que foi negligentemente operado por um cirurgião-médico do serviço público. Já os atos administrativos, ao contrário, predestinam-se a produção de efeitos jurídicos, são os típicos atos administrativos, sejam concretos ou abstratos, atos de governo (declaração de guerra, declaração de estado de emergência, declaração de estado de sítio, atos administrativos dos Tribunais de Contas, do Poder Legislativo, Judiciário, pelas Concessionárias de serviço público). Celso Antonio não concorda em colocar os atos de governo ou atos políticos sob a rubrica atos administrativos por traduzirem exercício de função política e não administrativa, porém, Gasparini diz que hoje em dia a sua sindicabilidade é ampla pelo judiciário, logo, perfeitamente enquadráveis na noção de ato administrativo. (5)

            ESPÉCIES ATOS PERTINENTES A ATIVIDADE PÚBLICA - No exercício da função legislativa o legislativo edita leis, o Judiciário, decisões judiciais, e o executivo, atos administrativos. Temos, assim, na atividade pública geral, três categorias de atos inconfundíveis entre si: atos legislativos, atos judiciais e atos administrativos. (6)

            ATOS DA ADMINISTRAÇÃO QUE NÃO SÃO TÍPICOS ATOS ADMINISTRATIVOS – Podem ser atos privados da administração, contratos regidos pelo direito privado, compra e venda e locação. Atos materiais, os chamados fatos administrativos já estudados.


3- ATO ADMINISTRATIVO.

            Conceito de Diógenes Gasparini, toda prescrição, juízo ou conhecimento, predisposta à produção de efeitos jurídicos, expedida pelo Estado ou por quem lhe faça as vezes, no exercício de suas prerrogativas e como parte interessada numa relação, estabelecida na conformidade ou compatibilidade da lei, sob o fundamento de cumprir finalidades assinaladas no sistema normativo, sindicável pelo Judiciário. (7)

            Do conceito de Gasparini (8) ressalta a presença do atos concretos e abstratos (chamados regulamentos do Executivo, art. 84, IV da CF). A prescrição destina-se a produzir efeitos jurídicos: certificar, criar, extinguir, transferir, declarar ou modificar direitos e obrigações. Excluem-se do conceito, os atos materiais, os atos de particulares, os de origem constitucional (sanção e veto), atos legislativos e as sentenças judiciais.

            Conceito de José dos Santos Carvalho Filho – é a exteriorização da vontade de agentes da Administração Pública ou de seus delegatários, nessa condição, que, sob regime de direito público, vise à produção de efeitos jurídicos, com o fim de atender ao interesse público. (9)

            Para Marçal Justen Filho ato administrativo é uma manifestação de vontade funcional apta a gerar efeitos jurídicos, produzida no exercício de função administrativa. (10)


4. REQUISITOS DOS ATOS ADMINISTRATIVOS.

            Para fins didáticos adotamos os requisitos constantes do art. 2º da Lei nº 4.717/65, ação popular, cuja ausência provoca a invalidação do atos. São eles, competência, objeto, forma, motivo e finalidade.

            Art. 2º. São nulos os atos lesivos ao patrimônio das entidades mencionadas no artigo anterior, nos casos de:

            a) incompetência;

            b) vício de forma;

            c) ilegalidade do objeto;

            d) inexistência dos motivos;

            e) desvio de finalidade.

            COMPETÊNCIA – Di Pietro (11) prefere fazer alusão ao SUJEITO ao revés de falar da COMPETÊNCIA. É o poder que a lei outorga ao agente público para desempenho de suas funções. Competência lembra a capacidade do direito privado, com um plus, além das condições normas necessárias à capacidade, o sujeito deve atuar dentro da esfera que a lei traçou. A competência pode vir primariamente fundada na lei (Art. 61, § 1º, II e 84, VI da CF), ou de forma secundária, através de atos administrativos organizacionais. A CF também pode ser fonte de competência, consoante arts. 84 a 87 (competência do Presidente da República e dos Ministros de Estado no Executivo); arts. 48, 49, 51 inciso IV e 52 (competência do Congresso Nacional, Câmara dos Deputados e Senado Federal).

            Para Di Pietro, competência é o conjunto de atribuições das pessoas jurídicas, órgãos e agentes, fixadas pelo direito positivo. (12)

            A competência é inderrogável, isto é, não se transfere a outro órgão por acordo entre as partes, fixada por lei deve ser rigidamente observada. A competência é improrrogável, diferentemente da esfera jurisdicional onde se admite a prorrogação da competência, na esfera administrativa a incompetência não se transmuda em competência, a não ser por alteração legal. (13) A competência pode ser objeto de delegação (transferência de funções de um sujeito, normalmente para outro de plano hierarquicamente inferior, funções originariamente conferidas ao primeiro – ver art. 84 parágrafo único da CF) ou avocação (órgão superior atrai para si a competência para cumprir determinado ato atribuído a outro inferior) consoante art. 11 da Lei 9.784/99 (Lei do procedimento administrativo federal), "a competência é irrenunciável e se exerce pelos órgãos administrativos a que foi atribuída como própria, salvo os casos de delegação e avocação legalmente admitidos". (14)

            Para Di Pietro a regra é a possibilidade de delegação e avocação e a exceção é a impossibilidade de delegação e avocação que só ocorre quando a competência é outorgada com exclusividade a um determinado órgão. Ver artigos 12 e 13 e 15 da mesma lei. (15) Para José dos Santos Carvalho Filho tanto a delegação quanto a avocação devem ser consideradas como figuras excepcionais, só justificáveis ante os pressupostos que a lei estabelecer. (16)

            OBJETO – Também chamado de conteúdo, é a alteração no mundo jurídico que o ato administrativo se propõe realizar, é identificado pela análise do que o ato enuncia, prescreve ou dispõe. O objeto é uma resposta a seguinte pergunta: para que serve o ato? Consiste na aquisição, na modificação, na extinção ou na declaração de direito conforme o fim que a vontade se preordenar. Ex: uma licença para construção tem como objeto permitir que o interessado possa edificar de forma legítima; o objeto de uma multa é a punição do transgressor da norma jurídica administrativo; o objeto da nomeação, é admitir o indivíduo como servidor público; na desapropriação o objeto do ato é o comportamento de desapropriar cujo conteúdo é o imóvel sobre a qual ela recai. (17)

            Para ser válido o ato administrativo, o objeto há que ser lícito, determinado ou determinável, possível.

            FORMA - É o meio pelo qual se exterioza a vontade administrativa. Para ser válida a forma do ato deve compatibilizar-se com o que expressamente dispõe a lei ou ato equivalente com jurídica. O aspecto relativo à forma válida tem estreita conexão com os procedimentos administrativos. O ato administrativo é o ponto em que culmina a seqüência de atos prévios (é um produto do procedimento), há que ser observado um iter (procedimento), até mesmo em homenagem ao princípio do devido processo legal. Torna-se viciado o ato (produto) se o procedimento não foi rigorosamente observado. Ex: licitação. Outros exemplos: Se a lei exige a forma escrita e o ato é praticado verbalmente, ele será nulo; se a lei exige processo disciplinar para demissão de um funcionário, a falta ou vício naquele procedimento invalida a demissão.

            Como anotado por José dos Santos Carvalho Filho, a forma e procedimento se distinguem, a forma indica apenas a exteriorização da vontade e o procedimento uma seqüência ordenada de atos e vontades, porém, a doutrina costuma caracterizar o defeito em ambos como vício de forma. Ex: portaria de demissão de servidor estável sem a observância do processo administrativo prévio (art. 41, § 1º, II, da CF); ou, contratação direta de empresa para realização de obra pública em hipótese na qual a lei exija o procedimento licitatório. (18)

            A forma é uma garantia jurídica para o administrado e para a administração, é pelo respeito à forma que se possibilita o controle do ato administrativo, quer pelos seus destinatários, que pela própria administração, que pelos demais poderes do Estado. (19)Em regra a forma é escrita, porém a Lei 9.784/99, consagra em seu art. 22 praticamente o informalismo do ato administrativo. Excpecionalmente, admitem-se ordens verbais, gestos, apitos (policial dirigindo o trânsito), sinais luminosos. Há ainda, casos excepcionais de cartazes e placas expressarem a vontade da administração, como os que proíbem estacionar em ruas, vedam acesso de pessoas a determinados locais, proíbem fumar etc. Até mesmo o silêncio pode significar forma de manifestação de vontade, quando a lei fixa um prazo, findo o qual o silêncio da administração significa concordância ou discordância. (20)

            MOTIVO – É o pressuposto de fato e de direito que serve de fundamento ao ato administrativo. Pressuposto de direito é o dispositivo legal em que se baseia o ato e o pressuposto de fato corresponde ao conjunto de circunstâncias, de acontecimentos, de situações que levam a administração a praticar o ato. A ausência de motivo ou a indicação de motivo falso invalidam o ato administrativo. Ex. de motivos: no ato de punição de servidor, o motivo é a infração prevista em lei que ele praticou; no tombamento, é o valor cultural do bem; na licença para construir, é o conjunto de requisitos comprovados pelo proprietário. (21)

            MotivaçãoMotivação é a demonstração por escrito de que os pressupostos de fato realmente existiram. A motivação diz respeito às formalidades do ato, que integram o próprio ato, vindo sob a forma de "considerandos". A lei 9.784/99 em seu art. 50 indica as hipóteses em que a motivação é obrigatória. (22) Segundo José dos Santos Carvalho Filho, pela própria leitura do art. 50 da Lei 9.784/99 pode-se inferir que não se pode mesmo considerar a motivação como indiscriminadamente obrigatória para toda e qualquer manifestação volitiva da Administração. (23) Ainda segundo ele, o art. 93, X, não pode ser estendido como regra a todos os atos administrativos, ademais a CF fala em "motivadas", termo mais próximo de motivo do que de motivação. Já para Maria Sylvia Zanella Di Pietro a motivação é regra, necessária, tantos para os atos vinculados quanto para os discricionários já que constitui garantia da legalidade administrativa prevista no art. 37, caput, da CF. (24)

            TEORIA DOS MOTIVOS DETERMINANTES – Segundo a qual o motivo do ato administrativo deve sempre guardar compatibilidade com a situação de fato que gerou a manifestação de vontade. Se o interessado comprovar que inexiste a realidade fática mencionada no ato como determinante da vontade, estará ele irremediavelmente inquinado de vício de legalidade. (25) Ex: administração revoga permissão de uso sob a alegação de que a mesma tornou-se incompatível com a destinação do bem público objeto da permissão, e logo a seguir permite o uso do mesmo bem a terceira pessoa, restará demonstrado que o ato de revogação foi ilegal por vício quanto ao motivo; servidor tem seu pedido de férias indeferido sob a alegação de que há falta de pessoal na repartição, poderia o agente público não ter declinado o motivo, já que o fez e em caso do servidor provar o contrário, o ato estará viciado uma vez que presente a incompatibilidade entre o motivo expresso no ato (motivo determinante) e a realidade fática.

            FINALIDADE – É o resultado que a Administração quer alcançar com a prática do ato. Enquanto o objeto é o efeito jurídico imediato (aquisição, transformação ou extinção de direitos) a finalidade é o efeito mediato, ou seja, o interesse coletivo que deve o administrador perseguir. Ex: numa permissão de transporte urbano o objeto é permitir a alguém o exercício de tal atividade e a finalidade é o interesse coletivo a ser atendido através deste serviço público.

            Abaixo jurisprudência do STJ, sobre vício de finalidade, ou seja, desvio de finalidade de ato administrativo, verbis:

            DESAPROPRIAÇÃO. UTILIDADE PÚBLICA.

            Cuida-se de mandado de segurança no qual o impetrante pretende invalidar ato de autoridade judicial que imitiu o Estado do Rio de Janeiro na posse de imóvel objeto de processo expropriatório. Visa, ainda, à anulação do Dec. Expropriatório n. 9.742/1987. A segurança foi concedida pelo TJ-RJ ao entendimento de que haveria ocorrido manifesto desvio de finalidade no ato expropriatório, pois, além de o Decreto omitir qual a utilidade pública na forma do DL n. 3.365/1941, os imóveis desapropriados destinavam-se a repasse e cessão a terceiros, entre eles, os inquilinos. O Min. Relator entendeu que se submete ao conhecimento do Poder Judiciário a verificação da validade da utilidade pública, da desapropriação e seu enquadramento nas hipóteses previstas no citado DL. A vedação que encontra está no juízo valorativo da utilidade pública, e a mera verificação de legalidade é atinente ao controle jurisdicional dos atos administrativos, cuja discricionariedade, nos casos de desapropriação, não ultrapassa as hipóteses legais regulamentadoras do ato. Com esse entendimento, a Turma não conheceu do recurso. REsp 97.748-RJ, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 5/4/2005.


5. MÉRITO ADMINISTRATIVO.

            Como bem leciona Hely Lopes Meirelles (26), o mérito administrativo conquanto não se possa considerar requisito de sua formação, deve ser apreciado neste tópico dadas as suas implicações com o motivo e o objeto (conteúdo) para que serve o ato? do ato, e conseqüentemente, com as suas condições de validade e eficácia. Portanto, considera-se mérito administrativo a avaliação (valoração) da conveniência e oportunidade relativas ao objeto e ao motivo, na prática do ato discricionário, ou seja, aquele em que a lei permite ao agente público proceder a uma avaliação de conduta (motivo e objeto), ponderando os aspectos relativos à conveniência e à oportunidade da prática do ato. (27)

            Os atos discricionários possuem requisitos sempre vinculados (competência, finalidade e forma), e outros dois (motivo e objeto) em relação aos quais a Administração decide como valorá-los, desde que observados os princípios constitucionais, e submetendo-se nos casos de desvio de poder a sindicabilidade do Judiciário.

            Os atos administrativos vinculados possuem todos os seus requisitos (elementos) definidos em lei, logo, não há falar-se em MÉRITO ADMINISTRATIVO (ex: licença para exercer profissão regulamentada em lei), logo, caberá ao Judiciário examinar todos os seus requisitos, a conformidade do ato com a lei, para decretar a sua nulidade ou não; já nos atos administrativos discricionários, o controle judicial também é possível, porém, terá que respeitar a discricionariedade administrativa nos limites em que ela é assegurada à Administração Pública pela lei (legalidade administrativa – 37, caput, CF). (28)

            Os autores que afirmam uma tendência de ampliar o alcance da apreciação do Poder Judiciário, falam em aplicar o princípio da razoabilidade para aferir a valoração subjetiva da administração pública. Aplica-se também o princípio da moralidade dos atos administrativos (art. 37, caput, CF), todavia, não cabe ao magistrado substituir os valores morais do administrador público pelos seus próprios valores, desde que uns e outros sejam admitidos como válidos dentro da sociedade; o que ele pode e deve invalidar são os atos que, pelos padrões do homem comum, atentar manifestamente contra a moralidade. Ex: zona cinzenta de sindicabilidade pelo Judiciário é o conceito de notável saber jurídico que permite certa margem de discricionariedade, exceto, nos casos em que fica patente, sem sombra de dúvida, de que o requisito constitucional não foi atendido. (29)

            Contra a tese de ampliação do controle de apreciação do mérito administrativo pelo Judiciário, José dos Santos Carvalho Filho (30) cita o STJÉ defeso ao Poder Judiciário apreciar o mérito do ato administrativo, cabendo-lhe unicamente examiná-lo sob o aspecto da sua legalidade, isto é, se foi praticado conforme ou contrariamente à lei. Esta solução se funda no princípio da separação dos poderes, de sorte que a verificação das razões de conveniência ou oportunidade dos atos admistrativos escapa ao controle jurisdicional do Estado (ROMS nº 1288-91-SP, Min. Cesar Asfor Rocha, DJ-2-5-1994). Cita também o STF – que em hipótese onde se discutia a expulsão de estrangeiro, disse a Corte que se trata de ato discricionário de defesa do Estado, sendo de competência do Presidência da República a quem incumbe julgar a conveniência ou oportunidade da decretação da medida, e que ao Judiciário compete tão-somente a apreciação formal e a constatação da existência ou não de vícios de nulidade do ato expulsório, não o mérito da decisão presidencial.

            Fluxograma dos requisitos do ato administrativo:

            Competência

            Forma

            Objeto

            Motivo

            Finalidade


6. ATRIBUTOS DOS ATOS ADMINISTRATIVOS.

            IMPERATIVIDADE ou COERCIBILIDADE – Os atos administrativos são cogentes, obrigando a todos que se encontrem em seu círculo de incidência, ainda que contrarie interesses privados, porquanto o seu único alvo é o atendimento do interesse coletivo. É certo que em determinados atos administrativos de consentimento (permissões e autorizações) o seu cunho coercitivo não se revela cristalino, uma vez que ao lado do interesse coletivo há também o interesse privado, porém, ainda nestes casos a imperatividade se manifesta no que diz respeito à obrigação do beneficiário de se conduzir exatamente dentro dos limites que lhe foram traçados. (31)

            PRESUNÇÃO DE LEGITIMIDADE – Trata-se de presunção relativa de que o ato administrativo nasceu em conformidade com as devidas normas legais, tal presunção iuris tantum pode ceder à prova de que o ato não se conformou às regras legais. O ônus da prova de provar que o ato é ilegítimo é do administrado que pode inclusive opor resistência ao seu cumprimento mediante dedução de pleito no Judiciário. O judiciário poderá rever o ato administrativo (respeitado o seu mérito) e a interpretação dada pela administração, até porque a presunção de legitimidade não é instrumento de bloqueio da atuação jurisdicional. (32)

            AUTO-EXECUTORIEDADE – É admissão da execução de ofício das decisões administrativas sem intervenção do Poder Judiciário. Desse ponto de vista, o ato administrativo vale como própria "sentença" do juiz, ainda que possa ser revista por este como bem anota García de Enterría. (33)

            Para Marçal Justen Filho só deve ser aplicada em situações excepcionais e observados os princípios da legalidade e da proporcionalidade. Não há auto-executoriedade sem lei que a preveja, e mesmo assim a auto-executoriedade só deverá ser aplicada quando não existir outra alternativa menos lesiva. (34)

            José dos Santos Carvalho Filho cita como exemplo do exercício da auto-executoriedade, a destruição de bens impróprios para o consumo público, a demolição de obra que apresenta risco iminente de desabamento. A vigente Constituição traça limites à executoriedade em seu art. 5º, LV, contudo mencionada restrição constitucional não suprime o atributo da auto-executoriedade do ato administrativo, até porque, sem ele, dificilmente poderia a Administração em certos momentos concluir seus projetos administrativos. (35)


7. ATOS ADMINISTRATIVOS EM ESPÉCIE.

            Podemos agrupar os atos administrativos em 5 cinco tipos como querem Hely Lopes Meirelles (36) seguido por Diogo de Figueiredo Moreira Neto. (37)

            ATOS NORMATIVOS – São aqueles que contém um comando geral do Executivo visando o cumprimento (aplicação) de uma lei. Podem apresentar-se com a característica de generalidade e abstração (decreto geral que regulamenta uma lei), ou individualidade e concreção (decreto de nomeação de um servidor). Os atos normativos podem ser:

            RegulamentosHely Lopes Meirelles e Diogo Figueiredo classificam os regulamentos como espécie autônoma dentro do tipo normativo, entretanto, José dos Santos Carvalho Filho entende que os regulamentos, muito embora citados pelo art. 84, IV da CF, não constituem espécie autônoma, mas sim um apêndice de decreto, tanto que o próprio Hely Lopes Meirelles apesar de classificá-lo em separado assim afirma: "Os regulamentos são atos administrativos postos em vigência por decreto, para especificar os mandamentos da lei ou prover situações ainda não disciplinadas por lei." (38) Logo, verifica-se que Hely Lopes Meirelles defende a tese de que existe o regulamento autônomo juntamente com o regulamento de execução. O primeiro seria destinado a prover situações não contempladas em lei, porém, atendo-se sempre aos limites da competência do Executivo (reserva do Executivo) não podendo invadir assim a competência de lei (reserva de lei). A partir da Emenda 32/01 que modificou a redação do art. 84, VI da CF, a corrente que defende a existência dos regulamentos autônomos ganhou nova força, pugnando pela idéia de que os regulamentos autônomos estão inseridos no campo da competência constitucional conferida diretamente pela CF ao executivo, chamando tal fenômeno de reserva administrativa.

            Decretos – São atos que provêm da manifestação de vontade dos Chefes do Executivo, o que os torna resultante de competência administrativa específica. A CF trata deles no art. 84, IV, como forma do Presidente da República dá curso à fiel execução da lei. Podem se manifestar na forma de decretos gerais, com caráter normativo abstrato, ou como decretos individuais, com destinatários específicos e individualizados. (39) Hely Lopes Meirelles fala em decretos autônomos e decretos regulamentar ou de execução, e representa um importante pensamento dentro desta corrente doutrinária. (40)

            Regimentos – São atos de atuação interna da administração destinados a reger o funcionamento de órgãos colegiados e de corporações legislativas, como ato regulamentar interno, o regimento só se dirige aos que devem executar o serviço ou realizar a atividade funcional regimentada, sem obrigar os particulares em geral. As relações entre o Poder Público e os cidadãos refogem ao âmbito regimental, devendo constar de lei ou de decreto regulamentar. (41)

            Resoluções – São atos normativos gerais ou individuais, emanados de autoridades de elevado escalão administrativo. Ex: Ministros e Secretários de Estado ou Município, art. 87 e incisos da CF. Constituem matéria das resoluções todas as que se inserem na competência específica dos agentes ou pessoas jurídicas responsáveis por sua expedição. (42) Não se confundem com resolução legislativa (art. 59, VII da CF; 155, § 2º, IV e 68, § 2º, ambos da CF), que é ato do Senado Federal ou do Congresso Nacional que independem de sanção e têm as regras jurídicas de elaboração conforme o Regimento interno ou o Regimento Comum destas Casas. (43)

            Deliberação – São atos normativos ou decisórios emanados de órgãos colegiados, como conselhos, comissões, tribunais administrativos etc. Segundo Hely Lopes Meirelles as deliberações devem obediência ao regulamento e ao regimento que houver para a organização e funcionamento do colegiado. (44)

            ATOS ORDINATÓRIOS – São os que visam a disciplinar o funcionamento da Administração e a conduta funcional de seus agentes. Emanam do poder hierárquico, isto é, podem ser expedidos por chefes de serviços aos seus subordinados. Só atuam no âmbito interno das repartições e só alcançam os servidores hierarquizados à chefia que os expediu. Não obrigam aos particulares. Não criam, normalmente, direitos ou obrigações para os administrados, mas geram deveres e prerrogativas para os agentes administrativos a que se dirigem. (45)

            Instruções, Circulares, Portarias, Ordens de Serviço, Provimentos e Avisos. Todos estes atos servem para que a Administração organize suas atividades e seus órgãos. O sistema legislativo pátrio não adotou o processo de codificação administrativo, de maneira que cada pessoa federativa dispõe sobre quem vai expedir esses atos e qual será o conteúdo. (46)

            ATOS NEGOCIAIS ou DE CONSENTIMENTO ESTATAL (47) – Segundo Hely Lopes Meirelles são todos aqueles que contêm uma declaração de vontade da Administração apta a concretizar determinado negócio jurídico ou a deferir certa faculdade ao particular, nas condições impostas ou consentidas pelo Poder Público. (48)

            Consoante escol de Diogo Figueiredo Moreira Neto os atos administrativos negociais contêm uma declaração de vontade da administração coincidente com uma pretensão do administrado. A manifestação de vontade do administrado não é requisito para a formação do ato, contudo, é necessária como provocação do Poder Público para sua expedição, bem como uma vez expedido, para que se dê a aceitação da vontade pública nele expressada. São unilaterais por conceito, embora já contenham um embrião de bilateralidade, já que de algum modo pressupõem a aceitação do administrado via provocação ao Poder Público, daí porque a nomenclatura atos negociais. (49) Tipos:

            Autorização – ato administrativo unilateral, discricionário e precário pelo qual a Administração faculta ao particular o uso do bem público no seu próprio interesse mediante (autorização de uso – fechamento de rua para realização de festa), ou exerça atividade (autorização de serviços de vans-peruas, táxi), ou a prática de ato, sem esse consentimento, seriam legalmente proibidos (autorização como ato de polícia – porte de arma). Ex: art. 176, parágrafo primeiro, art. 21, VI, XI, XII, todos da Constituição Federal.

            Permissão – É ato administrativo discricionário e precário pelo qual a Administração consente que ao particular utilize privativamente bem público. Com o advento da Lei 8.987/95 (art. 40), o instituto da permissão como ato administrativo está restringido ao uso de bens públicos, porquanto a permissão de serviços públicos passou a ter natureza jurídica de contrato administrativo bilateral, de adesão, e resultante de atividade vinculada do administrador em virtude da exigência normal de licitação para a escolha do contratado. (50)

            Licença – Ato vinculado e definitivo pelo qual o Poder Público, verificando que o interessado atendeu a todas as exigências legais, faculta-lhe o desempenho de atividade ou a realização de fatos materiais antes vedados ao particular, exemplo, o exercício de uma profissão, a construção de um edifício em terreno próprio. (51) Se o interessado preenche os requisitos legais para a concessão de licença, e por ser um ato administrativo vinculado, se for negada, caberá a impetração de mandado de segurança ex vi do art. 5º, inciso LXIX da CF.

            Em regra a licença por ser ato vinculado não pode ser revogada por conferir direito adquirido. Contudo, o STF em 1999 (RE nº 212.780-RJ, Rel. Min. Ilmar Galvão) reafirmou decisão anterior no sentido de que não fere direito adquirido decisão que, no curso do processo de pedido de licença de construção, em projeto de licenciamento, estabelece novas regras de ocupação de solo, ressalvando-se ao prejudicado o direito à indenização nos casos em que haja ocorridos prejuízos. (52)

            Aprovação, Homologação ou Visto ou atos de confirmação – Pressupõem sempre a existência de outro ato administrativo.

            A aprovação pode ser prévia (art. 52, III da CF), ou posterior (art. 49, IV da CF), é uma manifestação discricionária do administrador a respeito de outro ato.

            A homologação constitui manifestação vinculada, isto é, ou bem procede à homologação se tiver havido legalidade ou não o faz em caso contrário, é sempre produzida a posterior. Ex: licitação.

            O visto é ato que se limita à verificação da legitimidade formal de outro ato. (53) É condição de eficácia do ato que o exige. É ato vinculado, todavia, na prática tem sido desvirtuado para o exame discricionário, como ocorre com o visto em passaporte, que é dado ou negado ao alvedrio das autoridades consulares. (54)

            ATOS ENUNCIATIVOS – Segundo Diogo Figueiredo Moreira Neto, são todos aqueles em a Administração se limita a certificar ou a atestar um fato, ou emitir uma opinião sobre determinado assunto, constantes de registros, processos e arquivos públicos, sendo sempre, por isso, vinculados quanto ao motivo e ao conteúdo (objeto). (55)

            Certidões – são atos que reproduzem registros das repartições, contendo uma afirmação quanto à existência e ao conteúdo de atos administrativos praticados. É mera trasladação para o documento fornecido ao interessado do que consta de seus arquivos. Podem ser de inteiro teor ou resumidas. A CF em seu art. 5º, XXXIV, b, dispõe sobre o fornecimento de certidões independentemente do pagamento de taxas.

            Atestados – São atos pelos quais a Administração comprova um fato ou uma situação de que tenha conhecimento por seus órgãos competentes. Diferentemente da certidão, os atestados comprovam uma situação existente mas não constante em livros, papéis ou documentos em poder da administração, destinam-se a comprovação de situações transeuntes, passíveis de modificações freqüentes. Ex: atestado médico. (56)

            Pareceres – São atos que contém opiniões de órgãos técnicos a respeito de problemas e dúvidas que lhe são submetidos, orientando a Administração sobre a matéria técnica neles contida. Muito embora sejam opinativos, os pareceres da consultoria jurídica, órgãos exercentes de função constitucional essencial à justiça na órbita dos entes da federação, obrigam, em princípio, a Administração, não obstante se optar por desconsiderá-los, deverá motivar suficientemente porque o fazem. O parecer embora contenha um enunciado opinativo (opinar é diferente de decidir), pode ser de existência obrigatória no procedimento administrativo (caso em que integra o processo de formação do ato) e dar ensejo à nulidade do ato final se não contar do respectivo processo (por ausência de requisito FORMAL), exemplo, casos em que a lei exige prévia audiência de um órgão jurídico-consultivo, processo licitatório. Neste caso, o parecer é obrigatório, muito embora seu conteúdo não seja vinculante. Quando o ato decisório se limita a aprovar o parecer, fica este integrado ao ato como razões de decidir (motivação), agora, se ao revés, o ato decisório decide de maneira contrária ao parecer, deve expressar formalmente as razões que o levaram a não acolher o parecer, sob pena de abuso de poder e ilegalidade. (57)

            Pareceres normativos – É aquele que quando aprovado pela autoridade competente, é convertido em norma de procedimento interno, aos quais se confere uma eficácia geral e abstrata para a Administração, dispensando seus entes, órgãos e agentes de reproduzirem as motivações, se forem as mesmas nele examinadas.

            Apostila – São atos enunciativos ou declaratórios de uma situação anterior criada por lei. Ao apostilar um título a Administração não cria um direito, porquanto apenas declara o reconhecimento da existência de um direito criado por norma legal. Segundo Hely Lopes Meirelles equivale a uma averbação. (58)

            ATOS PUNITIVOS – São aqueles que contêm uma sanção imposta pela lei e aplicada pela Administração, visando punir as infrações administrativas ou conduta irregulares de servidores ou de particulares perante a Administração. (59)

            Multa – imposição pecuniária por descumprimento de preceito administrativo, geralmente, é de natureza objetiva, independente da ocorrência de dolo ou culpa.

            Interdição de atividades – Ato pelo qual a Administração veda a prática de atividades sujeitas ao seu controle ou que incidam sobre seus bens. Funda-se na lei e no poder de polícia administrativa, e pressupõe a existência de um prévio e devido processo administrativo (Art. 5º, LV da CF), sob pena de nulidade.

            Destruição de coisas – Ato sumário da Administração pelo qual se inutilizam alimentos, substâncias, objetos ou instrumentos imprestáveis ou nocivos ao consumo ou de uso proibido por lei. Típico ato de polícia administrativa, de caráter urgente que dispensa prévio processo, contudo, exige sempre auto de apreensão e de destruição em forma regular (descritivo e circunstanciado), nos quais se fixam os motivos da medida drástica, se identifiquem as coisas destruídas, para oportuna avaliação da legalidade do ato. (60)

            Demolição administrativa – Ato executório, praticado para remover perigo público iminente, exigindo, também, auto descritivo e circunstanciado sobre o estado da edificação a ser destruída, e quando possível, prévio e devido processo legal (art. 5º, LV, CF). (61)


8. EXISTÊNCIA E EXTINÇÃO DO ATO ADMINISTRATIVO.

            Noções iniciais – Antes de falarmos da extinção do ato administrativo, vamos falar de sua formação. Sob a perspectiva de sua existência (perfeição) no mundo jurídico o ato administrativo pode ser visto sob três planos de investigação científica quais sejam: vigência, validade e eficácia.

            Um ato admininistrativo quando editado e publicado passa a ter vigência, logo, possui existência jurídica (perfeição). Um ato administrativo existe quando contiver: motivo, conteúdo, finalidade, forma, e assinatura de autoridade competente. O ato administrativo que entrou no plano da existência "é". Existindo, pode ser válido se obedecidas as condições formais (órgão competente) e materiais (está de acordo com a lei e a Constituição) de sua produção e conseqüente integração no sistema ou inválido (nulo ou anulável) em caso contrário. Contudo, o ato administrativo inválido é existe e produz eficácia; ou seja, é qualidade do ato administrativo (que existe é válido ou inválido) e que está apto a produzir efeitos jurídicos, isto é, incidir/juridicizar o fato ocorrido no mundo real.

            O Ato existe, é válido e eficaz. Ex: nomeação de posse do Prefeito municipal eleito democraticamente.

            O ato existe, é válido e ineficaz. Ex: ato que permite a contratação depois que o vencedor da licitação tenha promovida a competente garantia.

            O ato existe, é inválido e como tal pode ser eficaz ou ineficaz. Ex: ato de declaração de utilidade pública para fins de utilidade pública, para fins expropriatórios, editados por vingança política.

            O ato existe, é inválido e ineficaz. Ex: o ato que permite a nomeação de servidor para cargo de provimento efetivo no serviço público (Câmara Municipal), sem o prévio concurso, depois do recesso parlamentar. (62)

            EXTINÇÃO – MODALIDADES

            Extinção natural – por cumprimento de seus efeitos. Ex: a destruição de mercadoria nociva ao consumo público, neste caso, o ato cumpriu seus objetivos, extinguindo-se naturalmente. (63)

            Extinção subjetiva ou objetiva – Ocorre quando do desaparecimento do sujeito ou do objeto. Ex: a morte do permissionário extingue o ato de permissão por ausência do elemento subjetivo. Vejamos agora, outro exemplo, agora de extinção objetiva. Sendo o objeto um dos seus elementos essenciais do ato administrativo, se depois de praticado o ato desaparece o objeto ocorre a chamada extinção objetiva, ex: interdição de estabelecimento, e após o estabelecimento é definitivamente desativado pelo proprietário. (64)

            Retirada – Que pode se realizar mediante REVOGAÇÃO quando se dá por razões de conveniência e oportunidade ou por razões de INVALIDAÇÃO (ANULAÇÃO), que compreende as idéias de vícios dos atos administrativos, convalidação e as modalidades de cassação e caducidade.

            Revogação (65) – É ato administrativo discricionário (não se aplica ao ato vinculado, porque nestes não há conveniência e oportunidade) pelo qual a Administração extingue um ato válido, por razões de conveniência e oportunidade. a)- Não retroage pois pressupõe um ato editado em conformidade com a lei; b)- seus efeitos se produzem a partir da própria revogação (ex nunc); c)- é ato privativo da administração; d)- não podem ser revogados os atos que já exauriram os seus efeitos, uma vez que a revogação não retroagem mais apenas impede que o ato continue a produzir efeitos, ex: a administração concede dois meses de afastamento ao servidor e após este prazo os efeitos já estarão exauridos; e)- pressupõe ato que ainda esteja produzindo efeitos, ex: autorização para porte de arma ou de qualquer atividade sem prazo estabelecido; f)- não podem ser revogados atos que integram um procedimento, pois a cada novo ato ocorre a preclusão em relação ao ato anterior, ex: não pode ser revogado o ato de adjudicação na licitação quando já celebrado o respectivo contrato; g)- não podem ser revogados os atos que geram direitos adquiridos, conforme Súmula nº 473 do STF - (A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial); g)- só quem pratica o ato ou quem tenha poderes explícitos ou implícitos para dele conhecer de ofício ou por via de recurso, pode revogá-lo, trata-se de competência intransferível a não ser por força de lei; h)- pressupõe o contraditório no caso de desfazimento de processo licitatório, art. 49, § 3º da Lei de Licitações (8.666/93)

            Invalidade ou anulação (66) – É o desfazimento do ato por razões de ilegalidade. a)- atinge o ato em sua origem, produzindo efeitos retroativos à data em que foi emitido (ex tunc); b)- pode ser feita pela própria administração ou pelo judiciário; c)- deve observar o princípio do contraditório quando afetar interesses de terceiros; d)- A doutrina não é unânime quanto ao caráter vinculado ou discricionário da invalidação, os que defendem o dever de anular apegam-se ao princípio da legalidade e da autotutela e os que defendem a faculdade de anular se apóiam na predominância do interesse público sobre o particular. Ex: loteamento irregular realizado em área municipal, valendo-se o interessado de documentos falsos que fizeram com que conseguisse aprovar o projeto na municipalidade e obter alvará, inúmeras famílias adquiriram os lotes, construíram casas, foram cobrados tributos etc. Após foi descoberta a falsidade. A doutrina neste caso entende que a Administração terá liberdade discricionária para avaliar qual será o prejuízo menor, manter (convalidar) ou anular o ato ilegal.

            Vícios que geram a possibilidade de invalidação – previstos no art. 2º da Lei 4.717/65

            Vícios relativos ao sujeito – Diz a Lei 4.717/65 em seu art. 2º, parágrafo único,

            Parágrafo único. Para a conceituação dos casos de nulidade observar-se-ão as seguintes normas:

            a) a incompetência fica caracterizada quando o ato não se incluir nas atribuições legais do agente que o praticou;

            O vício relativo ao sujeito pode se dar através de usurpação de poder (crime previsto no art. 328 do CP – a pessoa que pratica o ato não foi investida no cargo); excesso de poder (excede os limites de sua competência) e função de fato (pessoa que pratica o ato está irregularmente investida no cargo.

            Vícios relativos ao objeto – Diz a lei já citada,

            c) a ilegalidade do objeto ocorre quando o resultado do ato importa em violação de lei, regulamento ou outro ato normativo;

            Ex: município que desaproprie bem imóvel da União; nomeação para cargo inexistente; desapropriação de bem não definido com precisão; intervenção federal disfarçada por ato de requisição, caso da intervenção na área de saúde no Rio de Janeiro pelo Governo Federal etc.

            Vícios relativos à forma – Diz a Lei 4.717/65,

            b) o vício de forma consiste na omissão ou na observância incompleta ou irregular de formalidades indispensáveis à existência ou seriedade do ato;

            Ex: o decreto é a forma normal que deve revestir o ato do Chefe do Executivo e o Edital é a única forma possível para convocar os interessados em participar de concorrência pública (modalidade de licitação).

            Vícios quanto ao motivo – Diz a Lei 4.717/65, em seu art. 2º,

            d) a inexistência dos motivos se verifica quando a matéria de fato ou de direito, em que se fundamenta o ato, é materialmente inexistente ou juridicamente inadequada ao resultado obtido;

            Ex: A Administração pune um funcionário, mas este não praticou qualquer infração, o motivo é inexistente. Se ele praticou infração diversa da qual foi enquadrado o motivo é falso.

            Vícios relativos à finalidade. Diz o art. 2º da Lei 4.717/65,

            e) o desvio da finalidade se verifica quando o agente pratica o ato visando a fim diverso daquele previsto, explícita ou implicitamente, na regra de competência.

            Ex: desapropriação feita para prejudicar determinada pessoa; remoção ex officio do servidor com o objetivo de puni-lo. A grande dificuldade é provar o desvio de poder. Segundo Cretella Júnior o desvio de poder pode ser comprovado por indícios, exemplos, motivação insuficiente; motivação contraditória, irracionalidade do procedimento, camuflagem dos fatos, inadequação entre motivos e efeitos e excesso de motivação. (67)

            Convalidação – Também denominada por alguns de sanatória, é o processo de que se vale a Administração para aproveitar atos administrativos com vícios superáveis, de modo a confirmá-los no todo ou em parte. O instituto da convalidação é aceito pela doutrina dualista (68) bem como pela Lei 9.784/99 em seu art. 55, que admitem possam os atos administrativos serem nulos ou anuláveis. Convalida-se por ratificação, reforma ou conversão. (69) Na ratificação, a autoridade que praticou o ato ou superior hierárquico decide sanar o ato inválido anteriormente praticado, suprindo a ilegalidade que o vicia, ex: um ato com vício de forma pode ser posteriormente ratificado com a adoção de forma legal. Na reforma ou conversão, o novo ato suprime a parte inválida do anterior, mantendo sua parte válida, ex: ato anterior concede férias e licença a um servidor, após se verifica que ele não tinha direito a licença, pratica-se novo ato retirando a parte relativa à licença e ratifica-se a parte atinente às férias. Já na conversão. (70)

            Cassação – forma extintiva que se aplica quando o beneficiário de determinado ato descumpre condições que permitem a manutenção do ato e seus efeitos. Características: a)- trata-se de ato vinculado, já que o agente só pode cassar o ato anterior nas hipóteses previamente fixadas em lei; b)- é natureza jurídica sancionatória, porquanto pune aquele que deixou de cumprir as condições para a subsistência do ato. Ex: cassação de licença para exercício de profissão; cassação do porte de arma se o portador for detido ou abordado em estado de embriaguez, art. 10, § 2º da Lei 10.826/03. (71)

            Caducidade – Diz Diógenes Gasparini, há caducidade quando a retirada funda-se no advento de nova legislação que impede a permanência da situação anteriormente consentida. (72) Noutro dizer, significa a perda de efeitos jurídicos em virtude de norma jurídica superveniente contrária àquela que respaldava a prática do ato. Ex: permissão de uso de bem público, supervenientemente, é editada lei que proíbe o uso privativo do referido bem por particulares, o ato anterior (permissão de uso) de natureza precária, sofre caducidade, extinguindo-se. (73)


Notas

            1 José dos Santos Carvalho Filho, Manual de Direito Administrativo, 12ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p. 91.

            2 Cf. Curso de Direito Administrativo, São Paulo: Saraiva, 2005, p. 191.

            3 Cf. Direito Administrativo brasileiro. 20ª ed. São Paulo: Malheiros, atualizada por Eurico de Andrade Azevedo e outros, 1995, p. 133-134.

            4 Cf. Seabra Fagundes, apud, José dos Santos Carvalho Filho, op. cit. p. 92, e nota de rodapé nº 4.

            5 Cf. Diógenes Gasparini, Direito Administrativo. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 1995, p.60.

            6 Cf. Hely Lopes Meirelles, op. cit. p. 131-132.

            7 Diógenes Gasparini, op. cit. p. 62.

            8 Cf. Diógenes Gaspari, op. cit. p. 62-63.

            9 Cf. José dos Santos Carvalho Filho, op. cit. p. 95.

            10 Cf. Curso de Direito Administrativo, op. cit. p. 185.

            11 Maria Sylvia Zanella Di Pietro, Direito Administrativo, 18ª ed. São Paulo: Atlas, 2005, p. 196.

            12 Direito Administrativo, op. cit. p. 196.

            13 José dos Santos Carvalho Filho, op. cit. p. 102.

            14 Cf. José dos Santos Carvalho Filho, op. cit. p. 102-103.

            15 Cf. Di Pietro, op. cit. p. 198.

            16 Cf. Manual de Direito Administrativo. op. cit. p. 103.

            17 Cf. José dos Santos Carvalho Filho, op. cit. p. 104.

            18 Cf. Manual de Direito Administrativo. op. cit. p. 107.

            19 Cf. Maria Sylvia Zanella Di Pietro, op. cit. p. 201.

            20 Cf. Maria Sylvia Zanella Di Pietro, op. cit. p. 201-202.

            21 Cf. Maria Sylvia Zanella Di Petro, op. cit. p. 203.

            22 Cf. Maria Sylvia Zanella Di Pietro, op. cit. p. 204-205.

            23 Cf. Manual de Direito Administrativo. op. cit. p. 110.

            24 Cf. Direito Administrativo. op. cit. p. 204.

            25 Cf. José dos Santos Carvalho Filho, op. cit. p. 112.

            26 Cf. Direito Administrativo brasileiro. 20ª ed. São Paulo: Malheiros, 1995, p. 137-138.

            27 Cf. José dos Santos Carvalho Filho, op. cit. p. 119.

            28 Cf. Maria Sylvia Zanella Di Pietro, op. cit. p. 210.

            29 Cf. Maria Sylvia Zanella Di Pietro, op. cit. p. 212.

            30 Cf. Manual de Direito Administrativo. op. cit. p. 121.

            31 Cf. José dos Santos Carvalho Filho, op. cit. p. 116.

            32 Cf. Marçal Justen Filho. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 205.

            33 Apud. José dos Santos Carvalho Filho. op. cit. p. 117.

            34 Cf. Curso de Direito Administrativo. op. cit. p. 207.

            35 Cf. Manual de Direito Administrativo. op. cit. p. 117-118.

            36 Direito Administrativo brasileiro. 20ª ed. São Paulo: Malheiros, 1995, p. 160-179.

            37 Curso de Direito Administrativo. 14ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 155-159.

            38 Direito Administrativo brasileiro. op. cit. p. 165.

            39 Cf. José dos Santos Carvalho Filho. op. cit. p. 129.

            40 Direito Administrativo brasileiro. op. cit. p. 162-163.

            41 Cf. Hely Lopes Meirelles, op. cit. p. 164-165.

            42 Cf. José dos Santos Carvalho Filho, op. cit. p. 130.

            43 São os ensinamentos de Pontes de Miranda. Apud, José dos Santos Carvalho Filho, op. cit. p. 130.

            44 Cf. Direito Administrativo brasileiro. op. cit. p. 166.

            45 Cf. Hely Lopes Meirelles, op. cit. p. 166.

            46 Cf. José dos Santos Carvalho Filho, op. cit. p. 130-131.

            47 Nomenclatura usada por José dos Santos Carvalho Filho, cf. op. cit. p. 134.

            48 Cf. Direito Administrativo brasileiro. op. cit. p. 170.

            49 Cf. Curso de Direito Administrativo, op. cit. p. 157.

            50 Cf. José dos Santos Carvalho Filho. op. cit. p. 135-137.

            51 Cf. Hely Lopes Meirelles, op. cit. p. 170.

            52 Cf. José dos Santos Carvalho Filho, op. cit. p. 133-135.

            53 Cf. José dos Santos Carvalho Filho, op. cit. p. 139-140.

            54 Cf. Hely Lopes Meirelles, op. cit. p. 173.

            55 Cf. Curso de Direito Administrativo, op. cit. p. 158.

            56 Cf. Hely Lopes Meirelles, op. cit. p. 176.

            57 Cf. José dos Santos Carvalho Filho, op. cit. 131-132; Hely Lopes Meirelles, op. cit. p. 176 e Diogo Figueiredo Moreira Neto, op. cit. p. 158.

            58 Cf. Direito Administrativo brasileiro. op. cit. p. 177.

            59 Cf. Hely Lopes Merelles, op. cit. p. 177.

            60 Cf. Hely Lopes Meirelles, op. cit. p. 179.

            61 Cf. Diogo Figueiredo Moreira Neto, op. cit. p. 159.

            62 O conjunto dos exemplos sobre existência, validade e eficácia foram extraídos de Diógenes Gasparini, Direito Administrativo, 9ª ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 69.

            63 Cf. José dos Santos Carvalho Filho, op. cit. p. 142.

            64 Cf. José dos Santos Carvalho Filho, op. cit. p. 142.

            65 Cf. Maria Sylvia Zanella Di Pietro, op. cit. p. 238-239.

            66 Cf. Maria Sylvia Zanella Di Pietro, op. cit. p. 227.

            67 Apud, Maria Sylvia Zanella Di Pietro, op. cit. p. 233.

            68 Em sentido contrário, Diógenes Gasparini, para quem "A nosso ver, só há uma espécie de ato administrativo inválido: o comumente chamado de nulo. Desse modo, não se têm no Direito Administrativo, como ocorre no Direito Privado, atos nulos e anuláveis, em razão do princípio da legalidade, incompatível com esta dicotomia." op. cit. p. 108.

            69 Cf. José dos Santos Carvalho Filho, op. cit. p. 154.

            70 Cf. sobre este tópico, José dos Santos Carvalho Filho, op. cit. p. 154-155.

            71 Cf. José dos Santos Carvalho Filho, op. cit. p. 143.

            72 Apud, José dos Santos Carvalho Filho, op. cit. p. 143.

            73 Cf. José dos Santos Carvalho Filho, op. cit. p. 143.


Autor

  • Roberto Wagner Lima Nogueira

    mestre em Direito Tributário, professor do Departamento de Direito Público das Universidades Católica de Petrópolis (UCP) , procurador do Município de Areal (RJ), membro do Conselho Científico da Associação Paulista de Direito Tributário (APET) é autor dos livros "Fundamentos do Dever Tributário", Belo Horizonte, Del Rey, 2003, e "Direito Financeiro e Justiça Tributária", Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2004; co-autor dos livros "ISS - LC 116/2003" (coord. Marcelo Magalhães Peixoto e Ives Gandra da Silva Martins), Curitiba, Juruá, 2004; e "Planejamento Tributário" (coord. Marcelo Magalhães Peixoto), São Paulo, Quartier Latim, 2004.

    Textos publicados pelo autor

    Fale com o autor

    Site(s):

Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

NOGUEIRA, Roberto Wagner Lima. Noções introdutórias acerca do ato administrativo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 678, 14 maio 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6722. Acesso em: 24 abr. 2024.