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A PENA DE INABILITAÇÃO DA FUNÇÃO PÚBLICA PARA O PRESIDENTE QUE SOFRE O IMPEACHMENT NÃO É AUTOMÁTICA.

A PENA DE INABILITAÇÃO DA FUNÇÃO PÚBLICA PARA O PRESIDENTE QUE SOFRE O IMPEACHMENT NÃO É AUTOMÁTICA.

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O ARTIGO DISCUTE CASO CONCRETO COM RELAÇÃO A AUTONOMIA DA PENA DE INABILITAÇÃO COM RELAÇÃO A CONDENAÇÃO NO IMPEACHMENT.

A PENA DE INABILITAÇÃO DA FUNÇÃO PÚBLICA PARA O PRESIDENTE QUE SOFRE O IMPEACHMENT NÃO É AUTOMÁTICA.

Rogério Tadeu Romano

Como noticiou a Folha de São Paulo, em seu site, no dia 17 de setembro do corrente ano, o registro de candidatura da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), que concorre ao Senado em Minas Gerais, foi deferido pelo Tribunal Regional Eleitoral nesta segunda (17) por quatro votos a três. 

O desembargador Pedro Bernardes, presidente da corte, desempatou a favor de Dilma, que foi considerada elegível apesar de ter sofrido um impeachment há dois anos

A candidatura da petista foi alvo de mais de dez questionamentos, inclusive do diretório estadual do Partido Novo e da filha do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (MDB), Danielle Cunha (MDB), que concorre a deputada federal. O emedebista, hoje preso, foi responsável por deflagrar o andamento do pedido de impeachment na Câmara. 

Os questionamentos sustentavam que Dilma deveria ficar inelegível por oito anos, como estabelece a Constituição nos casos de impeachment. Os senadores, na época, porém, votaram de forma separada a cassação de Dilma e a inabilitação para o exercício da função pública por oito anos, aprovando a primeira punição, mas não a segunda. 

O Ministério Público também opinou a favor da candidatura de Dilma, considerando que não cabe à Justiça Eleitoral rever o julgamento feito no Senado. No TRE-MG, prevaleceu a opinião do juiz Ricardo Matos de Oliveira, relator do caso, que também considerou válida a votação feita pelos senadores.

Os senadores entenderam por determinar o impeachment da ex-presidente da República, mas a pouparam da condenação por inabilitação.

O julgamento, por determinação constitucional, é presidido pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal. Para que o impeachment seja aprovado, dos 81 senadores, pelos menos, 54 devem votar favoravelmente a ele.

Ao Senado Federal cabe julgar o presidente da República com relação ao seu impedimento, num juízo misto, penal e político. Caberá apenas ao Supremo Tribunal Federal se manifestar sobre eventual ilegalidade cometida por aquela casa legislativa na aplicação da pena.  

Entendeu o Senado Federal que essa sanção de inabilitação é autônoma com relação à sanção de impeachment.

Como assevera a eminente ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), “(...) a Constituição cuidou de não apenas afastar o agente do cargo (o que não teria exequibilidade com sua anterior renúncia), mas, ainda, preocupou-se em não permitir que o poder público, por qualquer de suas funções, pudesse vir a ser, pelo período de oito anos subsequentes à condenação, tangível à mão daquele que destratou a República, lesou a ordem jurídica e afrontou o povo do Estado brasileiro”.

É que, se o presidente da República renunciar ao cargo antes de concluído o julgamento do impeachment pelo Senado Federal, o processo continua e, em caso de condenação, evidentemente, aplica-se apenas a inabilitação; não por existirem sanções autônomas, mas, sim, por impossibilidade material de decretação da perda do cargo em face da renúncia.

Nesse sentido foi o acórdão do Supremo Tribunal Federal que, por unanimidade, indeferiu o mandado de segurança impetrado pelo ex-presidente Fernando Collor de Melo contra resolução do Senado que o havia declarado inabilitado por oito anos para o exercício de função pública (Mandado de Segurança n.º 21.689-DF, cujo relator foi o ministro Carlos Velloso).

O ministro Celso de Mello, também afirmou então no seu voto que “(...) há uma única sanção constitucionalmente estabelecida, que compreende, na abrangência do seu conteúdo, a destituição do cargo com inabilitação temporária. A unidade constitucional da sanção prevista torna-a indecomponível, incindível, impedindo, dessa forma, que se dispense tratamento jurídico autônomo às projeções punitivas que emanam da condenação senatorial”.

Por outro lado, naquele mesmo mandado de segurança ficou claro – como em recentes precedentes do Supremo Tribunal Federal – que o mérito do impeachment é, obviamente, a condenação ou absolvição pela prática de crimes de responsabilidade. O ministro do Supremo Tribunal Teori Zavascki observou  não ser cabível juízo de mérito “sobre a ocorrência ou não dos fatos ou sobre a procedência ou não da acusação (...)” (vide Mandado de Segurança n.º 34.193-DF). e em relação a isso o Supremo não se pode pronunciar, por se tratar de julgamento político realizado pelo Senado Federal.

Já se entendeu que deve o Supremo Tribunal Federal, contudo, exercer o controle de constitucionalidade quanto à aplicação da sanção do impeachment na sua inteireza, conforme dispõe o artigo 52, parágrafo único, da Constituição federal. Como acentuou, mais uma vez, o eminente decano do Supremo, ministro Celso de Mello, em trecho do seu voto: “(...) a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal jamais tolerou que a invocação do caráter político das resoluções tomadas pelas Casas Legislativa pudesse configurar (...) manto protetor de comportamentos abusivos ou arbitrários, praticados à margem da Constituição”.

No passado havia disciplina anterior, .Leis nº 27 (que disciplinava as infrações) e nº 30 (que disciplinava o procedimento), ambas de 1892 – sobre as quais se debruçaram muitos dos comentaristas sem que mais assim o fizessem diante da nova disciplina da Lei nº 1.079/50), onde a sanção de inabilitação guarda autonomia (observe-se que na CF de 34 o art. 58, § 7º chegava ao ponto de usar o termo “somente” a perda de cargo, com inabilitação até….”, enquanto na atual a redação não usa esses termos peremptórios). Por outro lado, no caso da inabilitação, a sanção diz respeito a qualquer investidura pública, ou seja, é mais abrangente do que a própria perda do cargo.

Para que o impeachment seja aprovado, dos 81 senadores, pelos menos, 54 devem votar favoravelmente a ele.

Nos casos de condenação de prefeito, Decreto-lei 201/67, o Superior Tribunal de Justiça já disse que deve ser levada a devida proporcionalidade na condenação de suspensão da função pública.

Sabe-se que, para os crimes de responsabilidade cometidos por prefeito, como a lei que prevê e define os crimes de responsabilidade de prefeitos é omissa a respeito, incide o parágrafo único do artigo 92 do CP, dispondo que “os efeitos de que trata este artigo não são automáticos, devendo ser motivadamente declarados na sentença”, como determina a Constituição Federal exigindo que todas as decisões sejam motivadas.

No entendimento de Alberto Silva Franco e outros(Código Penal e sua Interpretação Jurisprudencial, 4ª edição, pág. 1911), já ensinavam que aquele efeito da condenação não é de aplicação automática, devendo o julgador analisar cada caso, sob pena de cometer injustiças, premiando os maus servidores e alijando aqueles que terão praticado meras irregularidades. O entendimento de que tal condenação é automática é desproporcional.

O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.322.864/GO, relator ministro Nefi Cordeiro, DJ de 12 de junho de 2015, entendeu que, no mesmo entendimento do HC 88. 588,  que o artigo 2º, § 1º, do Decreto-lei nº 201/67 impõe  um efeito específico e não automático da condenação definitiva.

Desta forma deve-se entender que a ex-presidente da República perdeu o mandato, mas não as condições para elegibilidade.


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