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Lei da Ficha Limpa: A busca da idoneidade na representação popular

Lei da Ficha Limpa: A busca da idoneidade na representação popular

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Breves comentários sobre a Lei Complementar nº 135, de 4 de junho de 2010, também conhecida como Lei da Ficha Limpa.

Os políticos de má índole são reflexo de uma sociedade que não se preocupa com a formação dos representantes escolhidos para exercerem cargos públicos. Não se vislumbra eficácia, somente com base na lei, para tornar morais e éticos todos os cidadãos. Só com a efetividade da sanção é possível desmantelar a constante impunidade.

Diante deste cenário, a Lei Complementar nº 135, de 4 de junho de 2010, também conhecida como Lei da Ficha Limpa, veio para alterar a Lei Complementar nº 64, de 18 de maio de 1990, que estabelece, de acordo com o § 9º do art. 14 da Constituição Federal, casos de restrições à elegibilidade.

Fruto de um projeto de lei de iniciativa popular, a Lei da Ficha Limpa foi idealizada por entidades que fazem parte do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), e mobilizou diversos setores da sociedade, como a Associação Brasileira de Magistrados, Procuradores e Promotores Eleitorais, a Ordem dos Advogados do Brasil, organizações não governamentais, sindicatos, associações e confederações de diversas categorias profissionais.

O Projeto, que foi proposto com mais de 1 milhão de assinaturas de eleitores em todos os estados do Brasil, foi aprovado na Câmara dos Deputados no dia 5 de maio de 2010, aprovado no Senado Federal no dia 19 de maio de 2010 por votação unânime, e sancionado pelo então Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva.

O objetivo da Lei é impedir a candidatura a cargos eletivos de candidatos que não tiverem os requisitos morais necessários ao exercício do mandato político, em face de suas condutas desabonadoras, e que representariam uma ameaça a democracia se não fossem afastados da disputa eleitoral.

A Lei da Ficha Limpa trouxe inúmeras inovações, como o aumento no rol dos crimes elencados no art. 1º, I, e; Inclusão da imposição da inelegibilidade para os que forem condenados por captação ilícita de sufrágio; Aplicação da inelegibilidade aos condenados por terem simulado a cessação do vínculo conjugal ou da união estável, para evitar a inelegibilidade em razão de parentesco; Abolição da exigência do trânsito em julgado da decisão judicial para fins de inelegibilidade, bastando a existência de decisão proferida por órgão judicial colegiado a partir da edição da nova lei; a pessoa física e os dirigentes de pessoas jurídicas responsáveis por doações eleitorais tidas por ilegais por decisão transitada em julgado ou proferida por órgão colegiado da Justiça Eleitoral; e Aumento do prazo das inelegibilidades, que antes era de três, para oito anos.

Exemplo de aplicação da Lei ocorreu nas eleições presidenciais deste ano (2018), quando os ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiram por 6 votos a 1, pela rejeição do pedido de registro de candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), condenado em segunda instância pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro.

Outro exemplo foi nas eleições para o governo do Estado de Rondônia, em que o senador Acir Gurgacz (PDT) teve seu registro de candidatura indeferido pelo Tribunal Regional Eleitoral de Rondônia, por ter sido condenado pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) por crime contra o sistema financeiro. A decisão foi mantida pelo TSE, que confirmou a inelegibilidade de Acir Gurgacz.

Diante da mudança radical, a Lei dividiu opiniões. Embora a questão já tenha sido apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, que decidiu pela constitucionalidade da norma, ainda há na ordem jurídica muita controvérsia acerca da constitucionalidade da Lei da Ficha Limpa.

Parte da doutrina, apoiada no princípio da presunção de inocência, sustenta a inconstitucionalidade da Lei Complementar nº 135, de 2010, porque considera que a inelegibilidade possui caráter sancionatório e que a ausência do trânsito em julgado da decisão constitui violação a direitos fundamentais.

No dia 16 de fevereiro de 2012, o Supremo Tribunal Federal decidiu que a lei da Ficha Limpa não desrespeitava a Constituição Federal. Os ministros Carlos Ayres Britto, Rosa Weber, Joaquim Barbosa, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio e Luiz Fux votaram a favor da lei, enquanto Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Celso de Melo e Cezar Peluso foram contrários. Os votos favoráveis basearam-se no "princípio da moralidade", e na previsão do já mencionado § 9º do art. 14 da Constituição Federal, que diz que "lei complementar estabelecerá casos de inelegibilidade a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato".

Independente das controvérsias levantadas no ordenamento jurídico, uma conclusão é inegável: a Lei Complementar nº 135, de 2010 estabelece um “filtro” na política brasileira, buscando a idoneidade da representação popular. Segundo o Jornal “Folha de São Paulo”, nas eleições de 2018, 146 candidaturas foram barradas pela Justiça com base na Lei da Ficha Limpa.

Referências Bibliográficas

BRASIL, Constituição, 1988. Constituição da República Federativa do Brasil; Senado Federal, 1988.

_______. Lei Complementar nº 135, de 4 de junho de 2010

_______. Lei Complementar nº 64, de 18 de maio de 1990.

GOMES, José Jairo. Direito eleitoral. 5ª edição. Belo Horizonte: Del Rey, 2010.

MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 34ª edição. São Paulo: Atlas, 2018.

http://www.tse.jus.br/. Acesso em 06 de Outubro de 2018.

https://www1.folha.uol.com.br/poder/2018/09/justica-barra-146-candidatos-nos-estados-com-base-na-ficha-limpa.shtml. Acesso em 05 de Outubro de 2018.


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