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O JUIZ DAS GARANTIAS NO BRASIL

A nova Lei nº 13.964, de 2019. Inovações ritualísticas e ações de inconstitucionalidade

O JUIZ DAS GARANTIAS NO BRASIL. A nova Lei nº 13.964, de 2019. Inovações ritualísticas e ações de inconstitucionalidade

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O presente ensaio jurídico tem por finalidade precípua analisar sem caráter exauriente a figura do Juiz das Garantias introduzida no ordenamento jurídico por meio da recente Lei nº 13.964, de 24 de dezembro de 2019.

 

“[...] nos próximos dias, seja qual for a decisão do STF, a figura do Juiz das Garantias não deve ser vista exclusivamente como instrumento de amparo aos direitos de delinquentes, de sanguessugas sociais, mas acima dessas discussões ideológicas, deve servir de medida de salvaguarda de profissionais que atuam diretamente na fase de persecução criminal, defesa também da sociedade, ferramenta de proteção do princípio da imparcialidade do juiz que atuará no processo, sem dúvidas, mais um ingrediente do devido processo legal e componente do estado democrático de direito, sendo certo que a autonomia de um Poder não pode servir de amplitude decisória e liberdade para fazer o que bem quiser, como ocorrem com alguns Conselhos Administrativos e com o próprio STF no Brasil, que indevidamente e ao arrepio da lei, criam normas processuais e penais e até tipificam condutas criminosas, como no caso que criminalizou na Lei de Racismo, Lei nº 7.716/89 os atos homofóbicos e transfóbicos, levados a efeito no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 26, exorbitando-se de suas atribuições legais, violando com pena de morte o artigo 11 da Lei nº 8.429, de 92, que define os atos de improbidade administrativa [...]”

“[...] é preciso despir-se das vaidades pessoais e jogo de egos, agir com foco na coletividade, imaginar Administração Pública com olhos voltados para a supremacia do interesse público, pensar mais no Brasil e na sociedade como um todo, e menos em Instituições corporativas [...]”

“[...] por que quando se instituiu o juízo colegiado de três juízes no Brasil, para julgar ações de membros de organizações criminosas no Brasil, ninguém arguiu a inconstitucionalidade da Lei nº 12. 694, de 2012? [...]”

 

 

RESUMO. O presente ensaio jurídico tem por finalidade precípua analisar sem caráter exauriente a figura do Juiz das Garantias introduzida no ordenamento jurídico por meio da recente Lei nº 13.964, de 24 de dezembro de 2019.

Palavras-Chave. Minirreforma. Penal. Processual. Juiz das Garantias. Lei nº 13.964, de 2019. Inconstitucionalidade?

Resumen. El objetivo de este ensayo jurídico es examinar sin carácter agotador la figura del Juez de Garantías introducida en el ordenamiento jurídico a través de la reciente Ley No 13.964, de 24 de diciembre de 2019.

Palabras clave. Mini-reforma. criminal. Procedimiento. Juez de las Garantías. Ley No 13.964, 2019. ¿Inconstitucionalidad?

 

A minirreforma penal e processual penal no Brasil, levado a efeito por meio da Lei nº 13.964 de 24 de dezembro de 2019, que entrará em vigor dia 23 de janeiro de 2020, numa quinta-feira, tem gerado inúmeras discussões no meio jurídico-acadêmico e social.

Destarte, a instituição do juiz das garantias no ordenamento processual brasileiro tem chamado a atenção de juristas, profissionais do direito e jornalistas, lembrando que o Projeto de Lei nº 156/2009, de autoria do senador José Sarney já previa no Capítulo II, em seu artigo 14, a figura do Juiz das Garantias, responsável pelo controle da legalidade da investigação criminal e pela salvaguarda dos direitos fundamentais do acusado.

Assim, percebe-se, claramente, que o tema vem sendo discutido no Brasil desde 2009.

Vejamos a proposta do Projeto de Lei nº 156/2009, em trâmite no Congresso Nacional que visa reformar o Código de Processo Penal no país:

CAPÍTULO II

DO JUIZ DAS GARANTIAS

Art. 14. O juiz das garantias é responsável pelo controle da legalidade da investigação criminal e pela salvaguarda dos direitos individuais cuja franquia tenha sido reservada à autorização prévia do Poder Judiciário, competindo-lhe especialmente:

I – receber a comunicação imediata da prisão, nos termos do inciso LXII do art. 5º da Constituição da República Federativa do Brasil;

II – receber o auto da prisão em flagrante, para efeito do disposto no art. 555;

III – zelar pela observância dos direitos do preso, podendo determinar que este seja conduzido a sua presença;

IV – ser informado sobre a abertura de qualquer investigação criminal;

V – decidir sobre o pedido de prisão provisória ou outra medida cautelar;

VI – prorrogar a prisão provisória ou outra medida cautelar, bem como substituí-las ou revogá-las;

VII – decidir sobre o pedido de produção antecipada de provas consideradas urgentes e não repetíveis, assegurados o contraditório e a ampla defesa;

VIII – prorrogar o prazo de duração do inquérito, estando o investigado preso, em vista das razões apresentadas pelo delegado de polícia e observado o disposto no parágrafo único deste artigo;

IX – determinar o trancamento do inquérito policial quando não houver fundamento razoável para sua instauração ou prosseguimento;

X – requisitar documentos, laudos e informações ao delegado de polícia sobre o andamento da investigação;

XI – decidir sobre os pedidos de:

5 a) interceptação telefônica, do fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática ou de outras formas de comunicação;

b) quebra dos sigilos fiscal, bancário e telefônico;

c) busca e apreensão domiciliar;

d) acesso a informações sigilosas;

e) outros meios de obtenção da prova que restrinjam direitos fundamentais do investigado.

XII – julgar o habeas corpus impetrado antes do oferecimento da denúncia;

XIII – determinar a realização de exame médico de sanidade mental, nos termos do art. 452, § 1º;

XIV – arquivar o inquérito policial;

XV – assegurar prontamente, quando se fizer necessário, o direito de que tratam os arts. 11 e 37;

XVI – deferir pedido de admissão de assistente técnico para acompanhar a produção da perícia;

XVII – outras matérias inerentes às atribuições definidas no caput deste artigo.

Parágrafo único. Estando o investigado preso, o juiz das garantias poderá, mediante representação do delegado de polícia e ouvido o Ministério Público, prorrogar, uma única vez, a duração do inquérito por até 15 (quinze) dias, após o que, se ainda assim a investigação não for concluída, a prisão será imediatamente relaxada.

 Art. 15. A competência do juiz das garantias abrange todas as infrações penais, exceto as de menor potencial ofensivo e cessa com a propositura da ação penal.

§ 1º Proposta a ação penal, as questões pendentes serão decididas pelo juiz do processo.

§ 2º As decisões proferidas pelo juiz das garantias não vinculam o juiz do processo, que, após o oferecimento da denúncia, poderá reexaminar a necessidade das medidas cautelares em curso.

§ 3º Os autos que compõem as matérias submetidas à apreciação do juiz das garantias serão apensados aos autos do processo.

Art. 16. O juiz que, na fase de investigação, praticar qualquer ato incluído nas competências do art. 14 ficará impedido de funcionar no processo, observado o disposto no art. 748.

Art. 17. O juiz das garantias será designado conforme as normas de organização judiciária da União, dos Estados e do Distrito Federal.

Há quem afirme que seria inviável a implementação do Juiz das Garantias em face das dimensões territoriais do Brasil, e que sua criação por lei ordinária fere com pena de morte o pacto federativo e a autonomia dos Tribunais, e entidades de representação estudam atravessar ação de inconstitucionalidade contra a medida criada pela nova lei.

Atualmente, um mesmo juiz de direito participa da fase de investigação, geralmente levado a feito pela Polícia Judiciária, por meio do Inquérito Policial, preside a instrução criminal e profere a sentença, vigorando as normas atinentes à prevenção.

Como as mudanças, o devido processo legal passaria a contar com a participação de dois juízes naturais. Assim, caberá ao juiz das garantias atuar na fase investigatória, e ao juiz do processo instruir o processo e ao final proferir o julgamento.

O Juiz do processo poderia contar com a participação de mais dois juízes no procedimento colegiado de 1º grau quando do julgamento de criminosos, integrantes de organizações criminosas, a teor da Lei nº 12.694, de 24 de julho de 2012, também modificada pelo Pacote Anticrime.

Essa nova lógica legal seria para proteger o Magistrado em sua imparcialidade para proferir o julgamento.

Nesse sentido, a nova lei nº 13.964, de 2019, determinada nova redação ao artigo 3º do CPP, logo informando que o processo penal terá estrutura acusatória, vedadas a iniciativa do juiz na fase de investigação e a substituição da atuação probatória do órgão de acusação.

O artigo 3º B, prevê que o juiz das garantias é responsável pelo controle da legalidade da investigação criminal e pela salvaguarda dos direitos individuais cuja franquia tenha sido reservada à autorização prévia do Poder Judiciário, competindo-lhe especialmente:

I - receber a comunicação imediata da prisão, nos termos do inciso LXII do caput do art. 5º da Constituição Federal;

II - receber o auto da prisão em flagrante para o controle da legalidade da prisão, observado o disposto no art. 310 deste Código;

III - zelar pela observância dos direitos do preso, podendo determinar que este seja conduzido à sua presença, a qualquer tempo;

IV - ser informado sobre a instauração de qualquer investigação criminal;

V - decidir sobre o requerimento de prisão provisória ou outra medida cautelar, observado o disposto no § 1º deste artigo;

VI - prorrogar a prisão provisória ou outra medida cautelar, bem como substituí-las ou revogá-las, assegurado, no primeiro caso, o exercício do contraditório em audiência pública e oral, na forma do disposto neste Código ou em legislação especial pertinente;

VII - decidir sobre o requerimento de produção antecipada de provas consideradas urgentes e não repetíveis, assegurados o contraditório e a ampla defesa em audiência pública e oral;

VIII - prorrogar o prazo de duração do inquérito, estando o investigado preso, em vista das razões apresentadas pela autoridade policial e observado o disposto no § 2º deste artigo;

IX - determinar o trancamento do inquérito policial quando não houver fundamento razoável para sua instauração ou prosseguimento;

X - requisitar documentos, laudos e informações ao delegado de polícia sobre o andamento da investigação;

XI - decidir sobre os requerimentos de:

a) interceptação telefônica, do fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática ou de outras formas de comunicação;

b) afastamento dos sigilos fiscal, bancário, de dados e telefônico;

c) busca e apreensão domiciliar;

d) acesso a informações sigilosas;

e) outros meios de obtenção da prova que restrinjam direitos fundamentais do investigado;

XII - julgar o habeas corpus impetrado antes do oferecimento da denúncia;

XIII - determinar a instauração de incidente de insanidade mental;

XIV - decidir sobre o recebimento da denúncia ou queixa, nos termos do art. 399 deste Código;

XV - assegurar prontamente, quando se fizer necessário, o direito outorgado ao investigado e ao seu defensor de acesso a todos os elementos informativos e provas produzidos no âmbito da investigação criminal, salvo no que concerne, estritamente, às diligências em andamento;

XVI - deferir pedido de admissão de assistente técnico para acompanhar a produção da perícia;

XVII - decidir sobre a homologação de acordo de não persecução penal ou os de colaboração premiada, quando formalizados durante a investigação;

XVIII - outras matérias inerentes às atribuições definidas no caput deste artigo.

 

Importante disposição inovadora acerca do prazo para conclusão do Inquérito Policial, em caso de investigado preso. 

Destarte, se o investigado estiver preso, o juiz das garantias poderá, mediante representação da autoridade policial e ouvido o Ministério Público, prorrogar, uma única vez, a duração do inquérito por até 15 (quinze) dias, após o que, se ainda assim a investigação não for concluída, a prisão será imediatamente relaxada.

Um ponto de suma importância do Instituto do Juiz das garantias diz respeito à abrangência e à cessação de sua competência, que segundo consta, abrange todas as infrações penais, exceto as de menor potencial ofensivo, e cessa com o recebimento da denúncia ou queixa na forma do art. 399 do CPP.

Uma vez recebida a denúncia ou queixa, as questões pendentes serão decididas pelo juiz da instrução e julgamento.

As decisões proferidas pelo juiz das garantias não vinculam o juiz da instrução e julgamento, que, após o recebimento da denúncia ou queixa, deverá reexaminar a necessidade das medidas cautelares em curso, no prazo máximo de 10 (dez) dias.

Os autos que compõem as matérias de competência do juiz das garantias ficarão acautelados na secretaria desse juízo, à disposição do Ministério Público e da defesa, e não serão apensados aos autos do processo enviados ao juiz da instrução e julgamento, ressalvados os documentos relativos às provas irrepetíveis, medidas de obtenção de provas ou de antecipação de provas, que deverão ser remetidos para apensamento em apartado.

Fica assegurado às partes o amplo acesso aos autos acautelados na secretaria do juízo das garantias.

Nas comarcas em que funcionar apenas um juiz, os tribunais criarão um sistema de rodízio de magistrados, a fim de atender às disposições do juiz das garantias.

O juiz das garantias será designado conforme as normas de organização judiciária da União, dos Estados e do Distrito Federal, observando critérios objetivos a serem periodicamente divulgados pelo respectivo tribunal.

O juiz das garantias deverá assegurar o cumprimento das regras para o tratamento dos presos, impedindo o acordo ou ajuste de qualquer autoridade com órgãos da imprensa para explorar a imagem da pessoa submetida à prisão, sob pena de responsabilidade civil, administrativa e penal.

Por meio de regulamento, as autoridades deverão disciplinar, em 180 (cento e oitenta) dias, o modo pelo qual as informações sobre a realização da prisão e a identidade do preso serão, de modo padronizado e respeitada a programação normativa transmitidas à imprensa, assegurados a efetividade da persecução penal, o direito à informação e a dignidade da pessoa submetida à prisão.

No Código de Processo Penal, significativas modificações, como a instituição do juiz das garantias, prevendo um juiz de controle das investigações criminais, competente para acompanhar desde o recebimento da comunicação imediata da prisão, nos termos do inciso LXII do caput do art. 5º da Constituição Federal, até receber o auto da prisão em flagrante para o controle da legalidade da prisão, zelar pela observância dos direitos do preso, podendo determinar que este seja conduzido à sua presença, a qualquer tempo, ser informado sobre a instauração de qualquer investigação criminal, concessão de medidas cautelares, como prisão, mandado de busca e apreensão, concessão de interceptação telefônica, julgar o habeas corpus impetrado antes do oferecimento da denúncia, determinar a instauração de incidente de insanidade mental, e uma vez recebida a denúncia ou queixa, as questões pendentes serão decididas pelo juiz da instrução e julgamento.

É certo que a figura do juiz das garantias não é novidade e criação da legislação brasileira, já existindo na legislação comparada, como no caso da ITÁLIA, ESPANHA, FRANÇA, ALEMANHA, CHILE, PARAGUAI E COLÔMBIA, além de outras legislações. Importante lembrar que o Projeto de Lei nº 156/2009, de autoria do senador José Sarney já previa em seu artigo 14, a figura do Juiz das Garantias, responsável pelo controle da legalidade da investigação criminal e pela salvaguarda dos direitos fundamentais do acusado.

A introdução da figura do juiz das garantias no sistema processual brasileiro já divide opiniões de juristas.

Há quem afirme que o instituto é inconstitucional, por ferir com pena de morte o pacto federativo e autonomia do Poder Judiciário, além de difícil implantação do juiz das garantias em face da particular condição geográfica do Brasil, além da falta de juízes em todas as Comarcas do país, lembrando que em Minas Gerais das 296 Comarcas, existem inúmeras com apenas um juiz de direito e outras sem magistrados.

De outro lado, vale ressaltar a experiência exitosa em Minas Gerais, com a existência da Vara de Inquérito Policial em Belo Horizonte, composta por membros do Poder Judiciário e do Ministério Público, atuando com proatividade nessa fase de Investigação, com forte tendência de especialização de profissionais que atuam na apreciação das medidas legais existentes na fase pré-processual, indubitavelmente, um modelo de Juiz das Garantias e que funciona muito bem no acompanhamento das investigações policiais, o sistema de justiça criminal conhecendo os profissionais que atuam nas agências de Segurança Pública e dando maior credibilidade na produção de provas.

Entretanto, a AMB – Associação dos Magistrados Brasileiros e a Ajufe (Associação dos Juízes Federais do Brasil) ingressaram no STF, com a Ação Direta de Inconstitucionalidade em 27 de dezembro de 2019, pedindo a suspensão da medida alegando inconstitucionalidade, e dentre outras questões, argumentaram que o Poder Judiciário não possui estrutura suficiente para a sua implementação e funcionamento regular.

Nessa mesma direção, em 28 de dezembro de 2019, em pedido conjunto, os partidos políticos PODEMOS e CIDADANIA, atravessaram AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE, com pedido de medida cautelar, do JUIZ DAS GARANTIAS, alegando vício de iniciativa, art. 96, II, “d”, da Carta Magna, porquanto tratar-se de matéria de exclusiva iniciativa do Poder Judiciário, e mais, alegando falta de previsão de impacto orçamentário e da violação do novo regime fiscal, violação de princípios informadores do sistema jurídico, violação ao princípio da razoável duração do processo, artigo 5º, inciso LXXVIII, da Constituição da República de 1988, violação do Pacto Federativo, da interpretação conforme a Constituição, além de outros fundamentos.

Por último, em 31 de dezembro de 2019, o PARTIDO SOCIAL LIBERAL – PSL também atravessou ADI Nº 6.300, contra o Juiz das Garantias, havendo pedido de distribuição por dependência ao ministro Luiz Fux, que já é relator das outras ADIs apresentadas, sob vários argumentos.

“A INSTITUICAO DO “JUIZ DAS GARANTIAS” SEM PRÉVIA CONSULTA AOS TRIBUNAIS VIOLA A AUTONOMIA ADMINISTRATIVA E FINANCEIRA DO JUDICIÁRIO E O PACTO FEDERATIVO”.

Nos termos dos artigos 10 e seguintes da Lei 9868/99 e do art. 273 do CPC, requer-se cautelar e liminarmente a:

SUSPENSÃO DA EFICÁCIA dos artigos 3º-A, 3º-B, 3º-C, 3º-D, 3º-E e 3º-F, introduzidos pelo art. 3º da Lei n° 13.964, de 24 de dezembro de 2019 no Decreto-Lei n° 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal), que criam o órgão jurisdicional do “Juiz das Garantias” e definem suas competências, por ofensa aos artigos 96, II, “d” e 99 da Constituição Federal, até o julgamento final dessa ação. Conforme explanado, a criação desse novo órgão jurisdicional fere a autonomia administrativa e financeira dos Tribunais brasileiros, bem como o pacto federativo, porque torna necessária a criação de novos cargos de juízes ou de provimentos daqueles vagos existentes, criando despesas para os demais entes federativos em momento de crise e de contenção de gastos. De igual sorte, a medida foi instituída sem estudo prévio de impacto financeiro e orçamentário, em momento em que os orçamentos dos Tribunais já estão definidos.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS.

 

É de bom alvitre lembrar que esta matéria foi tema de ampla discussão em ensaio jurídico de nossa produção jurídica, publicado da Revista Jus Navegandi, denominado A NOVÍSSIMA LEI Nº 13.964, DE 2019 E O PACOTE ANTICRIME. Modelo jurídico inédito de combate ao crime. Bondade Social?

Neste novo ensaio, um enfrentamento mais aprofundado, sem a pretensão de exaurir tema de extrema relevância social e jurídica.

O Brasil possui ampla massa territorial e ninguém se discute isso, tornando de difícil adequação qualquer atividade pública de âmbito nacional. Esse nos parece ponto pacífico.

Quando se criou no país a famigerada Audiência de Custódia, vozes se levantaram para dizer da impossibilidade de implantar no país, sob o mesmo argumento. Amplitude territorial.

Mas como era um instituto para proteger criminosos e prejudicar policiais, ninguém falou mais nada e hoje as audiências acontecem numa velocidade incrível, o delinquente vai para a rua antes do policial chegar em casa e trocar de roupas, e mais que isso, existem inúmeros policiais processados por conta de acusações falsas de delinquentes.

Mas será que existe algum delinquente condenado por denunciação caluniosa quando dão causa à instauração de procedimentos infundados?  Pode ser que existem alguns processos nesse sentido, embora raridade.

Diante de toda essa celeuma, como ficará a situação do juiz das Garantias no Brasil? 

Acredito, piamente, que antes da entrada em vigor da Lei nº 13.964/2019, previsto para dia 23 de janeiro de 2020, esse ponto da lei será julgado em sede de medida cautelar nas ações diretas de inconstitucionalidade.

Nos próximos dias, seja qual for a decisão do STF, a figura do Juiz das Garantias não deve ser vista exclusivamente como instrumento de amparo aos direitos de delinquentes, de sanguessugas sociais, mas acima dessas discussões ideológicas, deve servir de medida de salvaguarda de profissionais que atuam diretamente na fase de persecução criminal, defesa também da sociedade, ferramenta de proteção do princípio da imparcialidade do juiz que atuará no processo, sem dúvidas, mais um ingrediente do devido processo legal e componente do estado democrático de direito, sendo certo que a autonomia de um Poder não pode servir de amplitude decisória e liberdade para fazer o que bem quiser, como ocorrem com alguns Conselhos Administrativos e com o próprio STF no Brasil, que indevidamente e ao arrepio da lei, criam normas processuais e penais e até tipificam condutas criminosas, como no caso que criminalizou na Lei de Racismo, Lei nº 7.716/89 os atos homofóbicos e transfóbicos, levados a efeito no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 26, exorbitando-se de suas atribuições legais, violando com pena de morte o artigo 11 da Lei nº 8.429, de 92, que define os atos de improbidade administrativa.

Por último, é premente estabelecer uma contenção ou barreira de privação de determinados órgãos administrativos e jurisdicionais do Brasil que usurpam claramente de suas funções, sob argumento de omissão de órgão legitimado ou falácia utópica do vazio normativo e criam um turbilhão de normas jurídicas com grave violação ao sistema da tripartição de funções, uma verdadeira bagunça legislativa sem fim, tudo por conta do jogo de vaidades corporativas.

Por que quando se instituiu o juízo colegiado de três juízes no Brasil, para julgar ações de membros de organizações criminosas no Brasil, ninguém arguiu a inconstitucionalidade da Lei nº 12. 694, de 2012?

Essa lei também não feriu a autonomia do Poder Judiciário? Aqui não teria havido também ofensa ao pacto federativo?

É preciso despir-se das vaidades pessoais e jogo de egos, agir com foco na coletividade, imaginar Administração Pública com olhos voltados para a supremacia do interesse público, pensar mais no Brasil e na sociedade como um todo, e menos em Instituições corporativas.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁTICAS

BOTELHO, Jeferson. A NOVÍSSIMA LEI Nº 13.964, DE 2019 E O PACOTE ANTICRIME. Modelo jurídico inédito de combate ao crime. Bondade Social? Disponível em https://jus.com.br/artigos/78728/a-novissima-lei-n-13-964-de-2019-e-o-pacote-anticrime. Acesso em 04 de janeiro de 2020, às 10h17min.


Autor

  • Jeferson Botelho Pereira

    Jeferson Botelho Pereira. Ex-Secretário Adjunto de Justiça e Segurança Pública de MG, de 03/02/2021 a 23/11/2022. É Delegado Geral de Polícia Civil em Minas Gerais, aposentado. Ex-Superintendente de Investigações e Polícia Judiciária de Minas Gerais, no período de 19 de setembro de 2011 a 10 de fevereiro de 2015. Ex-Chefe do 2º Departamento de Polícia Civil de Minas Gerais, Ex-Delegado Regional de Governador Valadares, Ex-Delegado da Divisão de Tóxicos e Entorpecentes e Repressão a Homicídios em Teófilo Otoni/MG, Graduado em Direito pela Fundação Educacional Nordeste Mineiro - FENORD - Teófilo Otoni/MG, em 1991995. Professor de Direito Penal, Processo Penal, Teoria Geral do Processo, Instituições de Direito Público e Privado, Legislação Especial, Direito Penal Avançado, Professor da Academia de Polícia Civil de Minas Gerais, Professor do Curso de Pós-Graduação de Direito Penal e Processo Penal da Faculdade Estácio de Sá, Pós-Graduado em Direito Penal e Processo Penal pela FADIVALE em Governador Valadares/MG, Prof. do Curso de Pós-Graduação em Ciências Criminais e Segurança Pública, Faculdades Unificadas Doctum, Campus Teófilo Otoni, Professor do curso de Pós-Graduação da FADIVALE/MG, Professor da Universidade Presidente Antônio Carlos - UNIPAC-Teófilo Otoni. Especialização em Combate à corrupção, crime organizado e Antiterrorismo pela Vniversidad DSalamanca, Espanha, 40ª curso de Especialização em Direito. Mestrando em Ciências das Religiões pela Faculdade Unida de Vitória/ES. Participação no 1º Estado Social, neoliberalismo e desenvolvimento social e econômico, Vniversidad DSalamanca, 19/01/2017, Espanha, 2017. Participação no 2º Taller Desenvolvimento social numa sociedade de Risco e as novas Ameaças aos Direitos Fundamentais, 24/01/2017, Vniversidad DSalamanca, Espanha, 2017. Participação no 3º Taller A solução de conflitos no âmbito do Direito Privado, 26/01/2017, Vniversidad DSalamanca, Espanha, 2017. Jornada Internacional Comjib-VSAL EL espaço jurídico ibero-americano: Oportunidades e Desafios Compartidos. Participação no Seminário A relação entre União Europeia e América Latina, em 23 de janeiro de 2017. Apresentação em Taller Avanco Social numa Sociedade de Risco e a proteção dos direitos fundamentais, celebrado em 24 de janeiro de 2017. Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad Del Museo Social Argentino, Buenos Aires – Argentina, autor do Livro Tráfico e Uso Ilícitos de Drogas: Atividade sindical complexa e ameaça transnacional, Editora JHMIZUNO, Participação no Livro: Lei nº 12.403/2011 na Prática - Alterações da Novel legislação e os Delegados de Polícia, Participação no Livro Comentários ao Projeto do Novo Código Penal PLS nº 236/2012, Editora Impetus, Participação no Livro Atividade Policial, 6ª Edição, Autor Rogério Greco, Coautor do Livro Manual de Processo Penal, 2015, 1ª Edição Editora D´Plácido, Autor do Livro Elementos do Direito Penal, 1ª edição, Editora D´Plácido, Belo Horizonte, 2016. Coautor do Livro RELEITURA DE CASOS CÉLEBRES. Julgamento complexo no Brasil. Editora Conhecimento - Belo Horizonte. Ano 2020. Autor do Livro VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. 2022. Editora Mizuno, São Paulo. articulista em Revistas Jurídicas, Professor em Cursos preparatórios para Concurso Público, palestrante em Seminários e Congressos. É advogado criminalista em Minas Gerais. OAB/MG. Condecorações: Medalha da Inconfidência Mineira em Ouro Preto em 2013, Conferida pelo Governo do Estado, Medalha de Mérito Legislativo da Assembléia Legislativa de Minas Gerais, 2013, Medalha Santos Drumont, Conferida pelo Governo do Estado de Minas Gerais, em 2013, Medalha Circuito das Águas, em 2014, Conferida Conselho da Medalha de São Lourenço/MG. Medalha Garimpeiro do ano de 2013, em Teófilo Otoni, Medalha Sesquicentenária em Teófilo Otoni. Medalha Imperador Dom Pedro II, do Corpo de Bombeiros, 29/08/2014, Medalha Gilberto Porto, Grau Ouro, pela Academia de Polícia Civil em Belo Horizonte - 2015, Medalha do Mérito Estudantil da UETO - União Estudantil de Teófilo Otoni, junho/2016, Título de Cidadão Honorário de Governador Valadares/MG, em 2012, Contagem/MG em 2013 e Belo Horizonte/MG, em 2013.

    Autor do livro <em>Tráfico e Uso Ilícitos de Drogas: atividade sindical complexa e ameaça transnacional</em> (JH Mizuno). Participação nos livros: "Lei 12.403/2011 na Prática - Alterações da Novel legislação e os Delegados de Polícia", "Comentários ao Projeto do Novo Código Penal PLS 236/2012", e "Atividade Policial" (coord. Prof. Rogério Greco), da Impetus. Articulista em Revistas Jurídicas.

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