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Contratos administrativos: por escopo e por prazo determinado

Contratos administrativos: por escopo e por prazo determinado

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A importância de se firmar regras mais rígidas sobre o prazo dos contratos de escopo ou de objeto no âmbito da Administração Pública.

Resumo: O presente trabalho tem por objetivo discutir a diferenciação entre contratos por escopo e contratos por prazo determinado, sobretudo o que envolve suas respectivas vigências. Prévia e breve análise sobre o tema dos contratos administrativos, os essenciais princípios que norteiam sua aplicação, além das características inerentes ao tema dos contratos administrativos. São demonstradas as regras e exceções quanto à duração dos contratos administrativos, além de tratar de decisões de vários órgãos da administração acerca da duração dos contratos. É necessário a constante atualização dos estudos dos contratos administrativos, mantendo sua eficácia e satisfação quanto ao atendimento do interesse público, visto que estão presentes continuamente na rotina da administração pública, podendo sofrer a influência negativa e corruptiva do interesse de particulares e governantes de má-fé. Os dados foram coletados mediante pesquisa e revisão bibliográfica de literaturas de grandes expoentes do direito e, sobretudo, do direito administrativo, e produções científicas de pesquisadores das ciências jurídicas. Propõe uma diferente abordagem aos contratos por escopo visando o melhor aproveitamento do mesmo, em benefício dos administrados.

Palavras-chave: Contrato por escopo, contrato por prazo determinado, contratos administrativos, direito administrativo.


INTRODUÇÃO

A Administração Pública, para celebrar ajustes, precisa obedecer a certas formalidades estabelecidas em lei, ao contrário dos particulares, os quais podem fazer suas avenças sob as mais diversas formas, desde que não vedadas por lei.

Nisso consiste o princípio da legalidade, o qual estabelece que a administração publica só pode fazer o que a lei determina ou autoriza, conforme artigo 37, caput, da Constituição da República, o qual, de certa forma, complementa o disposto no artigo 5º, inciso II, da Lei Fundamental, já que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.

O direito administrativo, didaticamente, é o ramo do direito responsável por ditar as normas de direito público que direcionam a atuação da administração pública, visando a satisfação maior do interesse da coletividade.

Por seu corolário, então, aparece a figura do contrato administrativo, o qual deve obediência às normas insculpidas principalmente na Lei Federal nº. 8.666/93 e, agora, a novel Lei Federal nº 14.133/2021, sendo que somente a primeira será objeto de análise neste trabalho, haja vista que a nova lei de licitações e contratos manteve a vigência da antiga lei por 2 (anos) anos a contar de sua publicação (art. 193, inc. II).

Outrossim, os demais entes federativos também podem legislar sobre normas especificas de licitações e contratos administrativos, por autorização constitucional.

Nada obstante, por sua amplitude, essas leis locais igualmente não serão objeto de análise deste trabalho, o qual voltar-se-á exclusivamente para as normas gerais insculpidas na Lei Geral de Licitações e Contratos Administrativos.

Por seu turno, existem várias espécies de contratos administrativos, sendo que esta produção se esmiuçará nos contratos de prazo e nos contratos de escopo pela sua singularidade.

Primeiramente e para tal desiderato, serão apresentadas as conceituações de contrato administrativo, os princípios que os norteiam e a questão da sua vigência.

Após, serão aventados os conceitos de contrato de prazo e contrato de escopo, diferenciando-os.

Ao final, concluir-se-á este artigo pontuando sobre a necessidade de, em ambas as espécies de contratos, se respeitar seu prazo de vigência, conforme o artigo 57 da Lei nº. 8.666/93 e artigo 105 da Lei nº 14.133/2021 e jurisprudência do Tribunal de Contas da União, além das orientações normativas da Advocacia Geral da União e a responsabilidade na gestão fiscal.

A atualidade dos estudos envolvendo quaisquer temas dentro do direito administrativo mostra-se de demasiada importância, com intuito de serem sempre respeitados os preceitos basilares do ordenamento jurídico pátrio, realizando e satisfazendo seu objetivo final de forma mais vantajosa à nação.


1. CONTRATOS ADMINISTRATIVOS

O contrato administrativo é o instrumento por excelência utilizado pela Administração Pública na formalização de seus ajustes com os particulares, de acordo com conceito expendido no parágrafo único do artigo 2º de ambas as Leis Federais de Contratos Administrativos, que tem por finalidade a realização do interesse público.

Pelos princípios da indisponibilidade do interesse público e da legalidade, os contratos administrativos devem observância às formas estabelecidas em lei, nada obstante apliquem-se, a eles, ainda que supletivamente, as normas gerais de direito privado.

Noutra quadra, os particulares, na confecção de seus pactos, não precisam seguir o mesmo formalismo imposto para o administrador público, podendo, inclusive, inovar, celebrando contratos sem as formas previstas na lei, verdadeiros contratos inominados, conforme artigo 425 do Código Civil de 2002.

Passando a análise da temática à doutrina, encontramos definições pontuais sobre os contratos administrativos, vejamos então alguns deles.

O doutor Marçal Justen Filho, grande nome da área de estudos do direito administrativo, em especial em licitações e contratos, em breve comentário, define os contratos administrativos, em sentido amplo, como "o acordo de vontades destinado a criar, modificar, ou extinguir direitos e obrigações, tal como facultado legislativamente e em que pelo menos uma das partes atua no exercício da função administrativa".

O também doutor Dirley da Cunha Júnior define contrato administrativo de forma similar, tendo como conceito o ajuste da Administração Pública, agindo com supremacia, feito com particular, para realização do interesse público maior, em condições fixadas pela própria administração.

Possuem muitos pontos em comum as definições apontadas previamente. Dessa forma, podemos consolidá-las, conceituando então os contratos administrativos como ferramentas da administração pública, agindo em sua função administrativa de firmar acordos de vontade com particulares, objetivando atender ao interesse público.

A Lei de Licitações e Contratos destina em seu terceiro capítulo um espaço próprio aos dispositivos que trabalham especificamente sobre os contratos administrativos, além de outros pontos esparsos em seu texto.

O artigo 54 da Lei 8.666/93 (art. 89 da nova lei de licitações) traz o norte para fixação desses contratos, os quis regulam-se pelas suas cláusulas e pelos preceitos de direito público, aplicando-se-lhes, supletivamente, os princípios da teoria geral dos contratos e as disposições de direito privado.

Essa prevalência das regras do direito público sobre as do direito privado traz uma abordagem diferente da que se tem sobre a teoria civilista dos contratos, distanciando assim, os contratos administrativos dos pactos particulares pela necessidade de atendimento ao interesse público primário.

Em consideração acerca deste artigo, os Doutores Alexandre Guerra e Marcelo Benacchio definem o método de aplicação da Teoria Geral dos Contratos, ademais separam os contratos privados e públicos:

A despeito do artigo 54 da Lei nº 8.666/93, a aplicação da Teoria Geral dos Contratos aos administrativos comporta temperamentos, mas não exclusões. Os contratos privados visam realizar interesses dessa mesma natureza, ao passo que os públicos são destinados a atender ao interesse público, o que se sobrepõe tanto aos interesses privados dos contratados quantos aos interesses secundários da própria Administração Pública contratante.

Esse tópico do direito administrativo possuí diversos pontos a serem observados, como as espécies contratuais, seus princípios, características quanto ao objeto pactuado, a sua vigência, as cláusulas exorbitantes, entre diversos outros tópicos. Ater-nos-emos ao essencial e necessário a compreensão da sistemática envolvendo os contratos administrativos, levando ao cristalino entendimento acerca dos contratos por escopo e dos contratos por prazo determinado.


2. PRINCÍPIOS APLICÁVEIS AOS CONTRATOS ADMINISTRATIVOS

Os princípios são comumente considerados, pela sua importância, como os pilares do ordenamento jurídico, possuindo diversas funções. Eles trabalham lado a lado com as normas propriamente ditas para solidificar entendimentos, a interpretação e a aplicação do direito de forma justa e efetiva.

Adiante discorrer-se-á brevemente sobre os princípios aplicáveis ao contrato administrativo, no que tange à temática proposta por esta produção das ciências jurídicas.

Os princípios constitucionais consagrados no artigo 37, caput, da Carta Magna, são a principal fonte principiológica do direito administrativo, nele se encontrando expressamente os princípios da legalidade, moralidade, impessoalidade, publicidade e eficiência.

Outrossim, o princípio da legalidade surge com a evolução ao Estado de Direito, pois a partir daí houve a submissão do Estado aos ditames da lei e não mais a vontade do soberano. A Administração Pública não possui autonomia no sentido de tomar decisões alheias às dispostas na legislação elaborada pelo Parlamento.

Este princípio se traduz na máxima em que os particulares podem fazer tudo o que não é vedado por lei, enquanto as entidades públicas só podem agir em conformidade e de acordo com a lei. Nas palavras de Dirley da Cunha Júnior, a norma deve autorizar o agir e o não agir dos sujeitos da administração pública, pois ela é totalmente submissa a lei.

O professor Antônio Carlos Cintra do Amaral, citado por Guerra e Benacchio, discorre sobre o princípio da legalidade administrativa em contraposto com as regras do direito privado. Diz ele que a administração pública somente poderá disciplinar interesses ditados por lei a assim proceder, em face do princípio da legalidade administrativa, enquanto sobre os contratos plenamente de direito privado, as partes estão autorizadas a contratar tudo o que não for ilegal, por força do princípio da autonomia privada.

Por seu turno, a indisponibilidade do interesse público trata da impossibilidade de quem detêm a gestão dos bens e patrimônio públicos deles livremente dispor, pois são propriedades propriamente públicas, res públicas.

A indisponibilidade defende o interesse da coletividade, visando benefício e proteção de toda a sociedade, respeitando a finalidade a que foi destinado.

Por seu turno, os princípios da impessoalidade e moralidade apontam para uma atuação isonômica, transparente e ética da administração, visando somente o atendimento do interesse coletivo, de modo que a administração pública exerça suas funções de forma a não promover um ou outro servidor público, atuante em determinada função, ou mesmo um particular.

Por outro lado, o princípio da moralidade serve ainda como importante baliza para evitar abusos dos administradores, mesmo quando aparentemente respeitada a legalidade, conforme explica o mestre Ronny Charles Lopes de Torres:

Esse princípio se apresenta como um vetor fundamental das atividades do Poder Público, de forma que,verificada ofensa à moralidade, mesmo que uma conduta seja aparentemente compatível com a lei, deve ser invalidada. Tal compreensão está relacionada à mutação na noção clássica de legalidade para uma ideia de legitimidade, que, além do cumprimento das regras jurídicas, abarca também a moralidade e a finalidade pública.

Penúltimo princípio insculpido no caput do artigo 37 da Constituição Federal, a publicidade traz para os entes públicos a obrigação de informar seus administrados acerca das decisões, leis e demais enunciações que sejam de interesse coletivo, ressalvadas as informações que sejam indispensáveis a segurança da sociedade e do Estado (art. 5º, inciso XXXIII, da Lei Maior).

No tocante dos contratos administrativos, o professor doutor Marçal Justen Filho aponta o respeito ao princípio da publicidade como um requisito de eficácia dos contratos, mas não de invalidade, pois na ausência ou defeito, é simplesmente sanado por uma nova publicação corrigida.

Por último se observa o princípio da eficiência, também insculpido no artigo 37 da Constituição de Outubro, o qual foi inserido pela Emenda Constitucional nº 19 de 1998, na evolução de uma administração burocrática para uma administração gerencial, projeto esse ainda em construção.

Tal mandamento se traduz na necessidade do bom rendimento no trabalho do administrador público, agindo de forma a satisfazer as suas necessidades e de seus administrados da forma mais rentável e com presteza e perfeição.

Nada obstante, não se trata de espaço apto para ignorar o princípio da legalidade. A eficiência deve ser sempre buscada na atuação da máquina estatal, mas sem ignorar o que exprime a lei.

Os ajustes pactuados pela administração devem sempre buscar a eficiência, respeitando o interesse público.


3. VIGÊNCIA DOS CONTRATOS ADMINISTRATIVOS

Sobre a duração dos contratos administrativos, é necessário que o Poder Público mantenha seu controle, de forma a realizar mandamento da Lei de Responsabilidade Fiscal, abaixo descrito, além da busca de satisfação ao interesse público:

Art. 1º Esta Lei Complementar estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal, com amparo no Capítulo II do Título VI da Constituição.

§ 1º A responsabilidade na gestão fiscal pressupõe a ação planejada e transparente, em que se previnem riscos e corrigem desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas, mediante o cumprimento de metas de resultados entre receitas e despesas e a obediência a limites e condições no que tange a renúncia de receita, geração de despesas com pessoal, da seguridade social e outras, dívidas consolidada e mobiliária, operações de crédito, inclusive por antecipação de receita, concessão de garantia e inscrição em Restos a Pagar. (g. n.)

Dessa forma, o que se observa da Lei Complementar Federal nº 101/2000 no que tange à duração das contratações da administração, é que se demonstra incompatível com uma gestão planejada e transparente, contratações que atravessem o tempo necessário para obtenção de resultados. Sendo assim, são vedados contratos administrativos com prazo indeterminado, conforme § 3º do artigo 57 da Lei Geral dos Contratos (art. 105 da novel lei).

Contudo, recentemente, a Advocacia Geral da União, em sua Orientação Normativa nº 36/2011, passou a admitir o prazo indeterminado em alguns contratos, conforme abaixo transcrito:

"A Administração pode estabelecer a vigência por prazo indeterminado nos contratos em que seja usuária de Serviços Públicos essenciais de energia elétrica, água e esgoto, serviços postais monopolizados pela ECT (Empresa Brasileira De Correios E Telégrafos) e ajustes firmados com a Imprensa Nacional, desde que no processo da contratação estejam explicitados os motivos que justificam a adoção do prazo indeterminado e comprovadas, a cada exercício financeiro, a estimativa de consumo e a existência de previsão de recursos orçamentários."

A Corte de Contas Federal cristalizou entendimento acerca dos limites na duração dos contratos em súmula de número 191, in verbis:

Torna-se, em princípio, indispensável à fixação dos limites de vigência dos contratos administrativos, de forma que o tempo não comprometa as condições originais da avença, não havendo, entretanto, obstáculo jurídico à devolução de prazo, quando a Administração mesma concorre, em virtude da própria natureza do avençado, para interrupção da sua execução pelo contratante.

Conforme observado, as regras quanto à duração dos contratos administrativos estão dispostas em sua lei específica, artigo 57, segundo o qual, regra geral, é vedada a duração do contrato além da vigência dos créditos orçamentários, ressalvados quatro hipóteses presentes em seus incisos.

O primeiro inciso traz três requisitos essenciais para extrapolação do prazo contratual: a previsão no plano plurianual, a justificativa da administração e a previsão no ato convocatório original.

Nessa toada, firma-se imperioso definir o que são serviços contínuos.

Segundo a Corte de Contas da União, serviços contínuos são aqueles serviços auxiliares, necessários à Administração para o desempenho de suas atribuições, cuja interrupção pode comprometer a continuidade de suas atividades e cuja contratação deve se estender por mais de um exercício financeiro.

Por outro lado, quanto ao aluguel de equipamentos e a utilização de programas de informática, prevista no inciso III do artigo 57 supracitado, a regra é semelhante com a do inciso anterior, com as suas peculiaridades, e delimitada a 48 (quarenta e oito) meses, enquanto no inciso II a previsão do prazo é de 60 (sessenta) meses (a nova lei possui prazos de duração de até 5 anos no caso de serviços e fornecimento contínuos, até 10 anos nos contratos sem investimento, até 15 anos o contrato que previr a operação continuada de sistemas estruturantes de tecnologia da informação, e até 35 anos nos pactos com investimento).

Finalmente, o último inciso veio com o advento da Lei Federal nº 12.349/2010, trazendo a possibilidade de vigência de até 120 (cento e vinte) meses para alguns casos nele elencados, havendo interesse e vantagem para a Administração.

Ademais, a Advocacia Geral Federal sedimentou entendimento no sentido da necessidade da Procuradoria verificar, no caso de prorrogação contratual, se o contrato administrativo ainda encontra-se vigente. Eis a Orientação Normativa nº 3/2009, in verbis:

NA ANÁLISE DOS PROCESSOS RELATIVOS À PRORROGAÇÃO DE PRAZO, CUMPRE AOS ÓRGÃOS JURÍDICOS VERIFICAR SE NÃO HÁ EXTRAPOLAÇÃO DO ATUAL PRAZO DE VIGÊNCIA, BEM COMO EVENTUAL OCORRÊNCIA DE SOLUÇÃO DE CONTINUIDADE NOS ADITIVOS PRECEDENTES, HIPÓTESES QUE CONFIGURAM A EXTINÇÃO DO AJUSTE, IMPEDINDO A SUA PRORROGAÇÃO.

Nesse diapasão, conforme orientação adrede fixada, será demonstrado que, independentemente do tipo de contrato administrativo, os prazos não poderão estar esgotados para eventual prorrogação de prazo.


4. CONTRATOS POR PRAZO

Existe uma classificação pertinente aos contratos quanto à satisfação do seu objeto, dividindo-se entre contratos que finalizam-se com a entrega de determinado produto ou obra, e outros que perduram no tempo e só se exaure com o término do prazo estabelecido.

Os primeiros são os chamados contratos de escopo ou de execução instantânea, e serão relatados adiante.

Por outro lado, existem os contratos por prazo ou de duração continuada. Nestes, o objetivo é ter uma prestação contínua de serviços ou de fornecimento de bens, durante o tempo previamente estabelecido pela administração no instrumento convocatório.

Nessa senda, pontua-se desde já inexistir divergência quanto à observância da vigência dos contratos por prazo, porquanto a sua duração e possibilidade de prorrogação estão insculpidos no artigo 57 da LLCA, e seus incisos e parágrafos.

Outrossim, nessa espécie de contrato, o prazo trata da extinção da avença, podendo ser prorrogado se existir previsão editalícia e contratual, além, é clara, da autorização legal.

Por sua vez, o professor Marçal Justen Filho ensina que os contratos de execução continuada impõem à parte o dever de realizar uma conduta que se renova ou se mantém no decurso do tempo.

Além disso, exemplifica ser o contrato de serviço de limpeza como um contrato de prazo, no qual os serviços devem ser realizados conforme periodicidade contratada até o decurso do prazo de vigência.

Nesse exemplo, não pode dar-se por finalizado o ajuste com a realização do serviço de limpeza completa no primeiro dia.


5. CONTRATOS POR OBJETO OU DE ESCOPO

A questão da vigência dos contratos de escopo é um pouco mais complexa do que a dos contratos por prazo. Primeiramente necessário consolidar o entendimento acerca do conceito dessa espécie contratual.

O mestre Floriano Marques Neto, citado por Carlos Fernando Mazzoco, conceitua contratos de escopo como sendo aquele em que a Administração tem em vista o obtenção de um bem determinado. Eis suas palavras:

Nos contrato ditos de escopo, a Administração contrata tendo em vista a obtenção de um bem determinado. O escopo do contrato estará consumado quando entregue o bem. Certo deve estar que a fixação do prazo é relevante para que a Administração possa exigir do particular executante um mínimo de eficiência e celeridade necessário para a satisfação do interesse público. Mas, nesse caso, o tempo em que vai se desenrolar a execução do contrato não é essencial.

Os contratos por escopo ou por objeto são formas contratuais que se exaurem com o cumprimento de seu objeto, sendo que o prazo estipulado em seu texto destina-se a estabelecer uma data limite para a entrega do objeto concluso.

O professor doutor Ronny Charles, em excelente trabalho, leciona que significante parte da doutrina considera que nos casos de contratos por objeto, a extinção se dá pela entrega do objeto.

Dessa forma, o prazo estipulado no instrumento contratual é somente moratório, não representado o fim do pacto negocial, e sim somente o prazo firmado para a sua execução e entrega do objeto final.

Nada obstante, existe jurisprudência do TCU apontando que nos casos de contrato de escopo ainda não finalizado, seu prazo deve ser prorrogado antes do de seu término, sob pena de impossibilidade de ser prorrogação. Segue trecho do acórdão:

8. A principal tese jurídica da defesa é que o aditamento de prazo não é necessário nos chamados contratos de escopo, em que o objeto é a aquisição de um determinado bem ou benfeitoria, a exemplo de uma obra, como no caso. Não abono tal tese, (...), não só porque contradiz a remansosa jurisprudência desta Corte, mas também porque é contrária à Lei 8.666/1993, cuja disciplina acerca do assunto, estabelecida no art. 57, veda a duração indeterminada do contrato administrativo e permite a prorrogação apenas nos acasos ali relacionados. É dizer: considera-se extinto o contrato que atingiu o termo final do prazo de duração nele fixado. Daí a necessidade de prorrogá-lo, por um dos motivos previstos em lei, ainda durante sua vigência.

9 . Porém, não se pode deixar de admitir que, de fato, para os contratos visando obra certa, essas exigências legais têm apenas o objetivo de evitar a prorrogação indefinida ou abusiva dos contratos, sem responsabilização de alguma das partes. Na disciplina da Lei 8.666/1993, o contrato administrativo há de produzir efeitos a partir de sua celebração, vedada, entre outras práticas, a de suspender prazos de execução sob alegação de falta de recursos sem qualquer responsabilização dos agentes administrativos.

Nessa linha, se extinto o prazo sem o objeto contratual finalizado, deve ser realizado novo contrato, e não sua prorrogação.

Nessa esteira são os escritos do saudoso Hely Lopes Meirelles:

“A extinção do contrato pelo término de seu prazo é a regra nos ajustes por tempo determinado. (...)

O prazo é de eficácia do negócio jurídico contratado, e, assim sendo, expirado o prazo, extingue-se o contrato, qualquer que seja a fase de execução de seu objeto, como ocorre na concessão de serviço público ou na simples locação de coisa por tempo determinado. Há, portanto, prazo de execução e prazo extintivo do contrato. Neste último caso, a expiração do prazo de vigência, sem prorrogação, opera de pleno direito a extinção do ajuste, exigindo novo contrato para continuação das obras, serviços ou compras anteriormente contratados. O contrato extinto não se prorroga, nem se renova: é refeito e formalizado em novo instrumento, inteiramente desvinculado do anterior.” (g. n.)

Por conseguinte, deve o administrador público tomar as cautelas necessárias com a realização dos negócios da administração pública, pois esta a atividade administrativa sujeita a demora no tramite de seus processos, o que justifica a recorrente necessidade de fiscalização e gestão responsável.

Por fim, de acordo com a jurisprudência do Tribunal de Contas Federal, é dever do administrador público evitar aditamentos e prorrogações indefinidas ou abusivas, ainda que o prazo nos contratos de escopo tenha um caráter meramente moratório. O respeito aos prazos contratuais vai de acordo com o interesse coletivo.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conforme abordado ao longo deste trabalho, vimos que a administração pública, quando celebra ajustes com particulares, se vale do contrato administrativo.

Verificamos assim, seu conceito, princípios aplicáveis, sua vigência, além da diferenciação entre contrato de prazo de contrato de escopo.

Podemos pontuar, com base no principio constitucional da eficiência, que em ambos os ajustes (de prazo e de escopo), torna-se imprescindível a observância de seu prazo de vigência, sob pena de extinção.

Inclusive, essa é uma visão que se coaduna com a administração do tipo gerencial inaugurada com o Decreto-lei nº 200/67 e inserida na Constituição atual com a Emenda 19/98.

Por seu turno, a Lei de Responsabilidade Fiscal, grande avanço em matéria de responsabilidade fiscal e infelizmente ainda muito descumprida, especialmente nessa época de crise financeira mundial, prescreve constituir a responsabilidade na gestão fiscal de ações planejadas, as quais englobam o correto cumprimento de prazos, em especial nos contratos administrativos.

Por outro lado, a Corte de Contas Federal possui entendimento acerca da necessidade de prorrogação tempestiva dos acordos administrativos, a fim de se evitar a prorrogação indefinida ou abusiva dos contratos, sem responsabilização de alguma das partes, de forma ainda que o tempo não comprometa as condições originais da avença.

Noutra quadra, a Procuradoria Jurídica da União possui entendimento no sentido de ser obrigação do advogado público federal, nos processos de prorrogação de prazo, analisar se não houve a extrapolação do atual prazo de vigência, bem como eventual ocorrência de solução de continuidade nos aditivos precedentes.

Ademais, a própria Lei Federal nº 8.666/93 veda a existência de contratos administrativos com prazo indeterminado. A novel lei de licitações permite a existência de contratos por prazo indeterminado na hipótese em que a administração seja usuária de serviço público oferecido em regime de monopólio (art. 109), situação já defendida pela doutrina administrativista.

Nesse espírito, não merece prosperar a doutrina que advoga a tese de que a fixação do prazo é relevante apenas para que a Administração possa exigir do particular executante um mínimo de eficiência e celeridade necessário para a satisfação do interesse público, porque contraria ao princípio constitucional da eficiência.

Nesse diapasão, ambas as espécies de contrato, de prazo e de escopo, deverão obedecer aos prazos dispostos em seu texto, sob pena de comprometimento das condições originais de avença, verbi gratia, com a ocorrência de sucessivos reajustes ou repactuações, além de aditamentos baseados na modificação do projeto ou das especificações e em decorrência de acréscimo de seu objeto.

Entretanto, infelizmente, a Lei Federal nº 14.133/2021 estabeleceu, sem seu artigo 111, que na contratação que previr a conclusão de escopo predefinido, o prazo de vigência será automaticamente prorrogado quando seu objeto não for concluído no período firmado no contrato, em sentido diametralmente oposto ao defendido neste trabalho.

Nada obstante, é dever do administrador público agir com responsabilidade e eficiência no trato da coisa pública, respeitando especialmente os prazos contratuais, sob pena de subversão do Estado Constitucional de Direito estreado em 1988.


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Notas

[1] JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo. 2014, p. 468.

[2] CUNHA JÚNIOR, Dirley da. Curso de Direito Administrativo. 2011, p. 482

[3] MARINELA, Fernanda. BOLZAN, Fabrício. (Org.). Direito Administrativo: Licitações e Contratos. 2012, pg. 32.

[4] CUNHA JÚNIOR, Dirley da. op. cit. 2011, p. 39.

[5] MARINELA, Fernanda. BOLZAN, Fabrício. (Org.). op. cit. 2012, pg. 33.

[6] Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado;

[7] JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 2012, p. 866.

[8] BALTAR NETO, Fernando Ferreira; TORRES, Ronny Charles Lopes de. Direito Administrativo. 2014, pg. 62.

[9] AGU. Orientação Normativa nº 36. Advocacia Geral da União. 13 de dezembro de 2011. Disponível em: <https://www.agu.gov.br/page/atos/detalhe/idato/418797>. Acesso em: 20 dez. 15.

[10] CNJ - SÚMULA 191 - TCU. Conselho Nacional de Justiça. 26 de outubro de 1982. Disponível em: <https://www.cnj.jus.br/sobre-o-cnj/composicao/626-gestao-planejamento-e-pesquisa/controle-interno/sumulas/18302-sumula-191-tcu>. Acesso em: 21. dez 2015.

[11] Tribunal de Contas da União. LICITAÇÕES & CONTRATOS: Orientação e Jurisprudência do TCU. 2010. Disponível em: <https://portal2.tcu.gov.br/portal/pls/portal/docs/2057620.PDF>. Acesso em: 22 dez. 2015. pg. 772.

[12] AGU. Orientação Normativa nº 3. Advocacia Geral da União. 01 de abril 2009. Disponível em: <https://www.agu.gov.br/page/atos/detalhe/idato/189164>. Acesso em: 20 dez. 15.

[13] JUSTEN FILHO, Marçal. op. cit.. 2012, p. 829.

[14] MAZZOCO, Carlos Fernando. Duração do Contrato Administrativo. Portal e-gov. Disponível em: <https://egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/19885-19886-1-PB.pdf>. Acesso em: 22 dez. 2015.

[15] TORRES, Ronny Charles Lopes de. Leis de Licitações Públicas comentadas. 2013, pg. 504.

[16] BRASIL. Tribunal de Contas da União. RELATÓRIO DE AUDITORIA. OBJETO DE CONTRATO CONFIGURANDO DESVIO DE FINALIDADE. TREINAMENTO DE EMPREGADOS DE CONCESSIONÁRIAS DE ÁREAS DE AEROSHOPPING. CELEBRAÇÃO DE ADITIVOS QUANDO O CONTRATO ENCONTRAVA-SE EXTINTO. ADITIVOS CONTRATUAIS COM EFEITO RETROATIVO. CELEBRAÇÃO DE CONTRATOS COM EFEITO RETROATIVO. RELEIÇÃO DAS RAZÕES DE JUSTIFICATIVA. MULTA. PEDIDO DE REEXAME. ALEGAÇÕES RECURSAIS SUFICIENTES A ENSEJAR A REFORMA DO ACÓRDÃO COMBATIDO. CONHECIMENTO. PROVIMENTO. APROVEITAMENTO DAS ALEGAÇÕES RECURSAIS PARA OUTROS RESPONSÁVEIS. COMUNICAÇÃO. Acórdão: 3131/2010 - Plenário. Relator Ministro Augusto Nardes. 24 de novembro de 2010. Tribunal de Contas da União. Disponível em: < https://www.tcu.gov.br/Consultas/Juris/Docs/judoc/Acord/20150818/AC_1997_32_15_P.doc >. Acesso em: 23 dez. 2015.

[17] MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e Contrato Administrativo. 2006, p. 245.


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