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O princípio da vulnerabilidade e a defesa do consumidor no direito brasileiro

origem e conseqüências nas regras regulamentadoras dos contratos e da publicidade

O princípio da vulnerabilidade e a defesa do consumidor no direito brasileiro: origem e conseqüências nas regras regulamentadoras dos contratos e da publicidade

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O presente trabalho visa a analisar o princípio da vulnerabilidade no ordenamento jurídico brasileiro, tendo em vista a sua utilização como fundamento filosófico de todo o movimento de defesa do consumidor.

"A regra da igualdade não consiste senão em aquinhoar desigualmente aos desiguais, na medida em que se desigualam. Nesta desigualdade social, proporcionada à desigualdade natural, é que se acha a verdadeira lei da igualdade" (Rui Barbosa).


SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. A tutela do consumidor como decorrência da sua vulnerabilidade nas relações de consumo. 3. A Vulnerabilidade e suas espécies. 3.1. Vulnerabilidade Técnica. 3.2. Vulnerabilidade Jurídica. 3.3. Vulnerabilidade Política ou Legislativa. 3.4. Vulnerabilidade Psíquica ou Biológica. 3.5. Vulnerabilidade Econômica e Social. 3.6. Vulnerabilidade Ambiental. 4. Vulnerabilidade X Hipossuficiência. 5. Efeitos da vulnerabilidade do consumidor na tutela legal da publicidade. 5.1 Conceito de Publicidade. 5.2 Natureza Jurídica: seria a publicidade compatível com o clássico conceito de oferta?. 5.3. Regras que vinculam a publicidade no CDC. 6. Vulnerabilidade nos contratos. 6.1. Do contrato de adesão. 6.2. Algumas formas de tornar o consumidor vulnerável nos contratos. 6.3. Regra da interpretação mais favorável ao pólo vulnerável da relação e integração contratual. 6.4 Controvérsia acerca da aplicação do CDC nos contratos bancários: ADI 2.591. 7.Conclusão.


1. Introdução

O presente trabalho visa analisar, pormenorizadamente, o princípio da vulnerabilidade no ordenamento jurídico brasileiro (Lei 8.078/1990, artigo 4º, inciso I: "reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo"), tendo em vista a sua utilização como fundamento filosófico de todo o movimento de Defesa do Consumidor. Por imperativo de sistematização, a abordagem, será disposta da seguinte maneira: a) faz-se um estudo dos fatos sociais que ocasionaram as disparidades nas relações entre fornecedor e consumidor; b) é realizada uma abordagem sistemática do princípio da vulnerabilidade; c) finaliza-se com um estudo sobre a publicidade e os contratos, tendo em vista que estes são uns dos principais focos de vulnerabilidade do consumidor.


2. A tutela do consumidor como decorrência da sua vulnerabilidade nas relações de consumo

As transformações havidas no processo produtivo desde a revolução industrial (segunda metade do século XVIII) e, principalmente, com a revolução tecnológica (fenômeno decorrente do grande desenvolvimento técnico alcançado no pós 2.ª Guerra Mundial) ocasionaram uma profunda alteração nas relações de consumo. A partir de então, a produção caracterizada pela elaboração artesanal de produtos e restrita ao âmbito familiar, passou a ser uma exceção. As relações de consumo deixaram de ser pessoais e diretas, fulminando com o relativo equilíbrio existente entre as partes.

Essa nova configuração do mercado baseada na produção em massa, pelo domínio do crédito, marketing, e práticas comerciais abusivas colocou o consumidor numa situação de extrema precariedade frente aos agentes econômicos, requerendo, dessa maneira, uma transformação ou amenização deste sistema predatório.

Diante dessa conjuntura percebeu-se que o consumidor estava desassistido, e por isso, necessitava de uma proteção legal, pois é utópica a possibilidade de autocomposição entre os integrantes das relações de consumo sem a intervenção estatal. Baseado nessa vulnerabilidade do consumidor, foi iniciado um movimento no âmbito internacional com o intuito de reequilibrar as relações entre consumidores e produtores. No ano de 1985 a ONU pela resolução 39/248 "baixou norma sobre a proteção do consumidor (...) reconhecendo expressamente ‘ que os consumidores se deparam com desequilíbrios em termos econômicos, níveis educacionais e poder aquisitivo’" (Almeida, 2002, p.05).

No caso brasileiro a constituição de 1988 alçou a defesa do consumidor ao patamar de direito fundamental (art. 5º, XXXII: "o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor"), bem como a princípio da ordem econômica, além de prever no artigo 48 do ato das disposições constitucionais transitórias a elaboração de um Código de Defesa do Consumidor (CDC).

Assim visualiza-se a importância do princípio da vulnerabilidade como fundamento dessa nova disciplina jurídica. Segundo Antônio Herman V. e Benjamin ao prefaciar o livro de Moraes (1999, p.10):

O princípio da vulnerabilidade representa a peça fundamental no mosaico jurídico que denominamos Direito do Consumidor. É lícito até dizer que a vulnerabilidade é o ponto de partida de toda a Teoria Geral dessa nova disciplina jurídica (...) A compreensão do princípio, assim, é pressuposto para o correto conhecimento do Direito do consumidor e para a aplicação da lei, de qualquer lei, que se ponha a salvaguardar o consumidor.


3. A Vulnerabilidade e suas espécies

Vulnerabilidade, literalmente, significa o estado daquele que é vulnerável, daquele que está suscetível, por sua natureza, a sofrer ataques. No Direito, vulnerabilidade é o princípio segundo o qual o sistema jurídico brasileiro reconhece a qualidade do agente(s) mais fraco(s) na(s) relação (ões) de consumo. Logo podemos afirmar que a presunção da vulnerabilidade do consumidor é absoluta, isto é, independente da classe social a que pertença.

Iniciaremos agora o estudo dos tipos de vulnerabilidade para torná-lo mais aprofundado. Para tanto, utilizaremos a divisão dada por Moraes (1999, p.115 e ss): técnica, jurídica, política ou legislativa, biológica ou psíquica, ambiental, econômica e social [01].

3.1. Vulnerabilidade Técnica

A vulnerabilidade técnica decorre do fato de o consumidor não possuir conhecimentos específicos sobre os produtos e/ou serviços que está adquirindo, ficando sujeito aos imperativos do mercado, tendo como único aparato a confiança na boa-fé da outra parte.

Esta vulnerabilidade concretiza-se pelo fenômeno da complexidade do mundo moderno, que é ilimitada, impossibilitando o consumidor de possuir conhecimentos das propriedades, malefícios, e benefícios dos produtos e/ou serviços adquiridos diuturnamente [02]. Dessa forma, o consumidor encontra-se totalmente desprotegido, já que não consegue visualizar quando determinado produto ou serviço apresenta defeito ou vício, colocando em perigo, assim, a sua incolumidade física e patrimonial [03].

3.2. Vulnerabilidade jurídica

Esta espécie de vulnerabilidade manifesta-se na avaliação das dificuldades que o consumidor enfrenta na luta para a defesa de seus direitos, quer na esfera administrativa ou judicial.

Em sentido contrário encontramos a posição de Marques (2002, p. 120) que, assim, se manifesta: "é a falta de conhecimentos jurídicos específicos, conhecimentos de contabilidade ou de economia".

Consoante os ensinamentos de Moraes (1999, p.120) discordamos da conceituação oferecida pela ilustre jurista, pois da maneira por Ela exposta estamos diante da vulnerabilidade técnica, tratada anteriormente.

3.3. Vulnerabilidade política ou legislativa

A vulnerabilidade política ou legislativa decorre da falta de organização do consumidor brasileiro, inexistem associações ou órgãos "capazes de influenciar decisivamente na contenção de mecanismos legais maléficos para as relações de consumo e que acabam gerando verdadeiros ‘monstrengos’ jurídicos" (Moraes, 1999, p.132).

Ao contrário, as associações de fornecedores possuem força no cenário político nacional, possuindo, inclusive, um grande lobby junto ao Congresso Nacional. Essa situação foi presenciada quando da tramitação do atual Código de Defesa do Consumidor:

... A dissimulação daquilo que era Código em lei foi meramente cosmética e circunstancial. É que, na tramitação do Código, o lobby dos empresários, notadamente o da construção civil, dos consórcios e dos supermercados, prevendo sua derrota nos plenários das duas casas, buscou, através de uma manobra procedimental, impedir a votação do texto naquela legislatura, sob o argumento de que, por se tratar de Código, necessário era respeitar um iter legislativo extremamente formal... (Pellegrini, 2001, p.09).

3.4. Vulnerabilidade Psíquica ou Biológica

O consumidor é atingido por uma infinidade de estímulos (visuais, olfativos, químicos, auditivos, etc.) que devido a sua própria constituição orgânica influenciam na tomada da decisão de comprar determinado produto.

Por isso nos dias atuais percebemos a importância desta motivação, capaz de criar desejos, necessidades e manipular manifestações de vontade como uma forma de influenciar o consumidor. Segundo Moraes (1999, p.151) "essa motivação pode ser produzida pelos mais variados e eficazes apelos de marketing possíveis à imaginação e à criatividade orientada pelos profissionais desta área" [04].

3.5. Vulnerabilidade Econômica e Social

A vulnerabilidade econômica e social é resultado das disparidades de força entre os agentes econômicos e os consumidores. Aqueles detêm condições objetivas de impor sua vontade através de diversos mecanismos. Podemos destacar como uma dessas formas a introdução dos contratos de adesão e os submetidos às condições gerais (ou condições gerais dos contratos – CONDGs) [05].

Assim, surge a cada dia a necessidade de uma maior presença do Estado no âmbito econômico para harmonizar essas relações de consumo.

3.6. Vulnerabilidade Ambiental

Esta espécie de vulnerabilidade é decorrência direta do consumo em massa da nossa sociedade. Como parte do meio ambiente o homem fica sujeito a uma gama de alterações havidas neste, ocasionado pelo uso irracional dos recursos naturais de nosso planeta.

Segundo Mirian de Almeida Souza apud Moraes (1999, p.162):

... Uma visão sistêmica do direito do consumidor, em que todos habitam o mesmo planeta, faz deste direito o reverso da moeda do direito ambiental. Ou seja, o ‘consumerismo’ destrutivo do meio ambiente é inerente ao modelo vigente da indústria e agricultura, em que todos têm participação em diversos graus através da sociedade de consumo, e todos sofrem prejuízos biológicos em diversos graus por causa do abuso do meio ambiente.


4. Vulnerabilidade X Hipossuficiência

Para finalizar essa parte do trabalho iremos traçar os elementos distintivos entre a vulnerabilidade do consumidor e sua hipossuficiência no mercado de consumo, já que os conceitos apresentam realidades jurídicas distintas, bem como conseqüências jurídicas diversas. Embora haja essas diferenças é comum a utilização desses termos como sinônimos [06].

Conforme afirmado anteriormente o princípio da vulnerabilidade é um traço inerente a todo consumidor de acordo com o art. 4º, inciso I do CDC. Já a hipossuficiência [07] é uma marca pessoal de cada consumidor que deve ser auferida pelo juiz no caso concreto, tendo em vista o art. 6º, inciso VIII do CDC que assim dispõe:

São direitos básicos do consumidor: VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiência (grifamos).

Portanto, é errônea a utilização dos termos como sinônimos, já que se assim o fosse, todo consumidor teria direito à inversão do ônus da prova.


5. Efeitos da vulnerabilidade do consumidor na tutela legal da publicidade

Passaremos, agora, a tratar das repercussões da incontroversa vulnerabilidade do consumidor no âmbito da publicidade e do contrato, assinalando quais são as condutas ilícitas e os meios através dos quais o direito assegura a proteção dos consumidores. Deteremo-nos inicialmente com a publicidade.

5.1 Conceito de Publicidade

Compete-nos conceituar publicidade. Lembraríamos ao leitor que não há no Código Brasileiro de Defesa do Consumidor um conceito para o objeto de nossa análise. Limitou-se, o legislador, apenas a esboçar conceituação de publicidade enganosa e abusiva [08]. Para a economista Raimar Richers publicidade é:

A comunicação, através de meios impessoais (impressos e eletrônicos), destinada a informar, divulgar e promover a oferta de idéias, bens e/ou serviços por parte de um patrocinador identificado (Richers, 1985, p.66).

Existem conceitos dos mais diversos para a atividade que visamos descrever, e que acabam, invariavelmente, a fazer referência a dois elementos que reputamos serem essenciais: a informação e a divulgação [09]. E de fato, não há de se falar na existência de publicidade se não se fizer notar o mínimo de informação a respeito do produto/serviço que se quer vender ou divulgação dessa informação. Morais (1999, ob. cit.) se põe a diferenciar o conceito de publicidade do de propaganda. Não vislumbramos quanto à sua essência, distinção alguma, uma vez que em ambos os casos o que há é a divulgação de determinada informação. Na realidade, há uma distinção quanto ao uso desses termos: quando se objetiva a venda de um produto, se usa a expressão publicidade. Ao passo que quando se tem por objeto a propagação de idéias políticas ou religiosas se utiliza do termo propaganda. À conclusão muito semelhante chegou o doutrinador mencionado [10].

5.2 Natureza Jurídica: seria a publicidade compatível com o clássico conceito de oferta?

Conceituado o objeto de nosso estudo, nos lançaremos ao problema de sua natureza jurídica. Tentadora é a hipótese de considerarmos como sendo proposta [11]. No entanto, bastaria uma rápida leitura do CDC para concluirmos que tal possibilidade é com ele incompatível, vez que no seu capítulo V, que trata das práticas comerciais, existe uma seção dedicada à oferta e outra à publicidade, respectivamente a II e III. Mas não seria meramente o fato do CDC distinguir tais conceitos que nos daria base para não aceitar a classificação da publicidade como espécie de oferta. Eis qual a diferença principal entre os dois institutos: Com a proposta basta que se dê a aceitação do policitado para que se aperfeiçoe o contrato. Já a publicidade tem muitas vezes apenas o afã de mostrar que o anunciante está propenso a contratar, tendo por objetivo atrair o consumidor.

É exemplo de oferta ad incertam persona a exposição em vitrine de produto com seu respectivo preço. Nesse caso, os elementos essenciais do contrato a ser celebrado (de compra e venda) já estão determinados: a coisa e o preço. Exemplo de publicidade é o anúncio corrente em jornais e revistas nos quais apenas se veicula o logotipo do estabelecimento, a área de atuação e outras informações básicas tendo a intenção de atrair clientes e, não de estabelecer todas as condições de um futuro contrato, que para se aperfeiçoar necessitaria apenas da adesão por parte do policitado.

Diferenciados os dois institutos, descartamos de antemão a possibilidade de um ser gênero do outro [12], mas não solucionamos, ainda, o problema que anunciamos o qual será elucidado por Lôbo com o qual concluímos esse tópico: "Assim, não se pode considerar a publicidade como oferta, no sentido tradicional do termo, melhor se concebendo como modo de integração compulsória aos contratos de consumo" [13] (2000).

5.3. Regras que vinculam a publicidade no CDC

É do conhecimento de todos o tamanho poder que os meios de comunicação em massa (mass media) detêm. Não infundadamente se diz até que se trata de um quarto poder. Aquilo que é veiculado na televisão, rádio, revistas e jornais seja uma notícia, seja uma campanha publicitária, acaba por entrar na esfera das convicções do indivíduo sem que haja uma valoração crítica e analítica dos fatos.

Tal é a razão pela qual o Estado interveio, por meio do CDC, estabelecendo normas que possuem por objeto regular a publicidade e proteger o consumidor, posto que este se encontra em posição de vulnerabilidade psíquica frente àquela. A seguir, citaremos tais normas.

A) A identificação da publicidade: Em consonância com o artigo 36 do CDC a publicidade deve ser veiculada de tal forma que o consumidor, fácil e imediatamente, a identifique como tal. O que se objetiva aqui é evitar que informes publicitários passem por jornalísticos ou educativos.

B) Vinculação contratual: por força dos artigos 30 e 35 do CDC não só a publicidade, como também a oferta [14] integram compulsoriamente o contrato que venha a ser firmado. Em decorrência disso, nos casos em que exista incongruência entre as cláusulas ou condições gerais presentes na publicidade e no contrato, é dada ao consumidor faculdade de proceder de três diferentes formas: 1. Exigir o cumprimento da oferta, apresentação ou publicidade; 2. Aceitar outra prestação equivalente àquela difundida; ou 3. Resolver o contrato em perdas e danos [15] obtendo o ressarcimento das parcelas então empenhadas.

C) Regra da veracidade: Na cabeça do artigo 37 do CDC existe a proibição de toda publicidade enganosa, impondo-se, dessa forma, um compromisso de veracidade daquilo que é divulgado em campanha publicitária. É definida por enganosa qualquer modalidade de informação publicitária inteira ou parcialmente falsa, mesmo que por omissão [16].

D) Regra da não-abusividade da publicidade: Por força, também, do caput do artigo 37 se tem por proibida toda publicidade abusiva. Eis a segunda modalidade de publicidade ilícita. Entende-se, na doutrina, que o abuso é o uso irregular de uma faculdade que a princípio se apresentava como regular e legítima [17]. Ao tentar delimitar o que viria a ser abusividade o referido codex listou rol não taxativo, nos seguintes termos: É abusiva, dentre outras, a publicidade discriminatória; que incite à violência; explore o medo ou superstição; que se aproveite da deficiência de julgamento da criança, etc.

E) Inversão obrigatória do onus probandi: Como é do conhecimento do leitor, no processo, a parte que alega a ocorrência de determinado fato é que suporta a carga de prová-lo. Acontece que se tal preceito fosse cruamente aplicado nas relações de consumo, teríamos que consumidores, possuidores de bons direitos, veriam seu pedido julgado improcedente por falta de provas graças a sua vulnerabilidade que o impede de produzi-las, tão bem quanto o fornecedor. Razão pela qual o CDC fez duas previsões de inversão do ônus da prova: uma ope legis (ao artigo 38) e outra ope judicis (ao artigo 6º, VIII). Enquanto que esta se opera mediante uma valoração, in casu, da existência de verossimilhança daquilo que é alegado ou de hipossuficiência do autor, aqueloutra se dá independentemente de qualquer análise por parte do magistrado pelo fato de derivar, em última análise, da presunção legal de vulnerabilidade do consumidor [18]. De tal inversão decorre que a prova da veracidade daquilo que é anunciado cabe ao fornecedor.

F) Transparência da fundamentação publicitária: O fornecedor deve ter consigo os dados fáticos que fundamentem a informação veiculada, é o que impõe o artigo 36, parágrafo único da lei em tela. Saliente-se que a inobservância desse dever por parte do fornecedor enseja a caracterização da já referida propaganda enganosa por omissão, assim, como a interpretação contra o mesmo.

G) Correção do desvio publicitário: Por imperativo do art. 56, inciso XII do CDC, o desvio da publicidade possuirá não só efeitos civis e penais como também publicitários. Leva-se em conta que para corrigir os malefícios causados aos consumidores o único meio eficaz é fazendo uso da própria publicidade sob o nome de contrapropaganda:

Trata-se de veiculação de outra publicidade para sanar os malefícios causados pela publicidade originária. Naquela, de caráter explicativo, o fornecedor, às suas expensas, informa corretamente ao consumidor, desfazendo os erros de anúncio original. (Gonçalves; 2002, tópico 10).


6. Vulnerabilidade nos contratos

Discorreremos, agora, a respeito dos contratos de adesão (muito usados nas relações de consumo); de alguns meios utilizados pelo fornecedor que tornam vulnerável o consumidor; das regras interpretativas das cláusulas contratuais e da questão, então em voga (pelo advento da Ação Direta de Inconstitucionalidade - ADI 2.591 -), da aplicação do CDC aos contratos bancários.

6.1. Do contrato de adesão

Desde a revolução industrial o mundo vem assistindo a uma gradual massificação da produção dos bens da vida. Tal processo trouxe-nos algumas conseqüências das quais destacaríamos: massificação das necessidades de consumo; difusão do modo de vida ocidental e (conseqüência que mais nos interessa) uniformização dos vínculos jurídicos entre fornecedor e consumidor. Daí, surge naturalmente a necessidade de uso de contratos-tipo, vindo a possibilitar uma dinâmica circulação de riquezas, uma vez que com instrumentos pré-formulados se vencia, com um único passo, toda a etapa pré-negócial, que envolve toda uma cadeia de ajustamentos. Podemos extrair do que foi exposto, os elementos essenciais dos contratos de adesão: 1. Uso em massa: no sentido em que regem as interações econômicas entre um fornecedor e seus distintos consumidores; 2. Textos pré-constituídos unilateralmente e 3. Formação dos contratos com a adesão (que só poderá se dá em bloco) do consumidor [19].

É de se frisar que a simples adoção da espécie contratual em comento não constitui, per si, um ato abusivo que mereça ser coibido; ao passo que é instrumento útil ao atual estágio de desenvolvimento capitalista, razão pela qual merece (sim) uma especial fiscalização e especial tutela legal (inserida no nosso ordenamento com o CDC) que sejam capazes de compensar a vulnerabilidade do consumidor e refrear os abusos contratuais que, via de regra, ocorrem em sede de contratos standart.

6.2. Algumas formas de tornar o consumidor vulnerável nos contratos

Podemos notar, estudando o instituto do contrato de adesão, que se trata de instrumento que confere ao fornecedor pujantes meios de abusar da boa-fé ou do estado de necessidade do consumidor, alguns dos quais passaremos a comentar infra [20]:

A) Tecnismo dos termos contratuais: Os instrumentos contratuais em geral devem ser escritos de modo a possibilitar a compreensão de seu conteúdo sob pena de comprometer a validade da vontade que ali se expressa e, conseqüentemente, a obrigatoriedade do pacto. Acontece que tal imperativo comumente é inobservado pelo elaborador do contrato, que usando de termos técnicos do meio econômico ou jurídico, deixa o texto nebuloso aos olhos do consumidor, tornando-o ainda mais suscetível a sofrer lesões.

B) Complexidade e extensão do contrato: Tanto o tecnismo como o uso constante de remissões a outras cláusulas do instrumento contribuem para torná-lo mais complexo. Fazendo de sua leitura e interpretação uma tarefa árdua mesmo para profissionais do meio. Moraes (1999, p. 227) relata que de certa feita precisou de mais de cinco horas ininterruptas para analisar contrato que além de complexo era deveras extenso pelo fato de conjugar, na verdade, em um único texto vários contratos distintos.

C) Cláusulas abusivas: O CDC, em seu art. 51 traz lista, não exaustiva, de cláusulas consideradas abusivas e que, como tais, são nulas de plenos direito. Tal rol é na realidade, uma consignação de entendimentos que foram consagrados em nossos tribunais ao longo das décadas que antecederam ao referido codex [21]. E por essa razão, ele pode ser complementado pela jurisprudência, assim como entendimentos dos Ministérios Públicos e decisões administrativas dos Procon’s, as quais serão consolidadas (através de portarias) pela Secretária de Direito Econômico, que pelo Decreto 2181 de 1997 recebeu essa atribuição.

6.3. Regra da interpretação mais favorável ao pólo vulnerável da relação e integração contratual

Preceito fundamental para uma eficaz proteção do consumidor, dentro de um contexto de disseminação do uso de contratos padronizados com texto nebuloso, extenso e cláusulas abusivas, é o da interpretação que lhe seja mais favorável (artigo 47 do CDC). É inconteste, na doutrina, o fato de decorrer dessa norma a possibilidade do magistrado declarar nulidade de cláusulas contratuais. O que não ocorre, no entanto, com a possibilidade de, no afã de buscar a solução mais favorável ao consumidor, vir o juiz a acrescentar, ao contrato, novas disposições. Acreditamos que tal possibilidade (de integração contratual pelo Judiciário) é legítima e prevista no artigo 51 §2º do CDC, verbis: "a nulidade de uma cláusula contratual abusiva não invalida o contrato, exceto quando de sua ausência, apesar dos esforços de integração, decorrer ônus excessivo a qualquer das partes" (destacamos). Sendo que o entendimento em contrário nada mais é que o resquício de um tempo, não muito distante, no qual sob a alegação de proteção ao princípio da autonomia da vontade se impedia que o Estado interferisse nas relações privadas a fim de promover os ajustamentos necessários a colocar em igualdade de condições os naturalmente desiguais. [22]

6.4 Controvérsia acerca da aplicação do CDC nos contratos bancários: ADI 2.591.

Estaria incompleto o presente estudo se não fizéssemos referência, por mais pontual que seja, à controvérsia muito recentemente suscitada (ou ressuscitada) a respeito da consideração (ou não) das cadernetas de poupança, depósitos bancários, contratos de mútuo, cartões de crédito, de seguros, abertura de crédito e todas as operações bancárias ativas e passivas como relação de consumo. Justifica-se a assertiva anterior com a constatação de que são nos contratos bancários, feitos em série e muitas vezes elaborados de modo a lesionar o consumidor [23], que esses deixam mostrar de forma mais proeminente a sua vulnerabilidade; e com a constatação de que tais contratos estão de tal forma disseminados que é difícil encontrar quem nunca os celebrou [24].

Sobre o tema, o STJ firmou sólido entendimento no sentido de que o CDC, em sua parte propriamente consumerista, (imposição da boa fé, adoção do in dubio pro consumidor, regras sobre responsabilidade por fato e vício do produto e do serviço, etc) seria aplicável normalmente aos contratos bancários [25]. Não o sendo, no entanto, na parte que se refere à limitação dos juros reais em 12% ao ano, posto que tal matéria, de Direito Financeiro, muito embora possua previsão constitucional (art. 192, §3º), precisa de lei complementar que a regulamente.

A controvérsia, que parecia então pacificada, voltou à baila com o advento da ADI. 2.591 proposta pelo CONSIF – Confederação Nacional do Sistema Financeiro – cujo julgamento junto ao STF foi iniciado, e logo interrompido, em 17 de abril de 2002 graças a pedido de vista do Min. Nelson Jobim. O objeto dessa ação é o de declarar a inconstitucionalidade da expressão "inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária" em face do artigo 192 da CF. A pretendida inconstitucionalidade formal residiria no fato de que, por força do dispositivo constitucional, o sistema financeiro nacional só pode ser regulado por Lei Complementar e não por Lei Ordinária como o CDC.

Em parecer elaborado, mediante consulta do Instituo Brasileiro de Política e direito do Consumidor – BRASILCON, pela douta jurista Cláudia Lima Marques existe farta e elaborada contra-argumentação que leva à conclusão da improcedência do pedido. Inicia, a doutrinadora, por deixar clara a clássica distinção entre "normas de conduta" e "normas de organização", aquelas, destinadas de forma imediata a reger o comportamento dos indivíduos considerados isoladamente ou coletivamente; e estas, destinadas a regular a constituição e funcionamento de institutos publicamente relevantes como o sistema financeiro nacional, por exemplo. Segue afirmando que a premissa na qual se fundamentou o CONSIF para propor a ação, qual seja: a de que o CDC é uma norma de organização que regulamenta o sistema financeiro nacional; é falsa; posto que o CDC traz em seu seio normas de conduta destinadas a reger relações de consumo. Razão pela qual não vê, a jurista, incompatibilidade entre o referido dispositivo constitucional e a norma do artigo 3º, §2o do CDC. Deixando claro que o CDC se aplica aos contratos bancários, com a devida ressalva do campo de atuação da lei 4.595/64 que legitima a taxa de juros superior a 12% ao ano. Essa é a posição que nos parece mais acertada até porque se coaduna com o entendimento ao longo do tempo construído pelo STJ.

E de fato, o Min. Relator da ADI, Carlos Velloso, diferentemente do Min. Néri da Silveira que julgou improcedente o pedido, trilhou esse caminho (aberto pelo STJ) ao julga-lo procedente em parte para emprestar ao §2º, do art. 3º do CDC, interpretação conforme a Constituição para excluir da incidência a taxa dos juros reais nas operações bancárias ou sua fixação em 12% ao ano pelos argumentos já mencionados.


7. Conclusão

Os princípios em qualquer ramo do conhecimento são os pilares que alicerçam todas as vertentes do seu saber. No Direito não poderia ser diferente, os princípios são a base da Ciência Jurídica. Já se tem dito, e hoje a afirmação ganha cada vez mais relevo, que violar um princípio, é mais grave do que infringir um dispositivo legal. A assertiva é verdadeira em todos os sentidos, pois a sua violação é a tentativa de negação, de descumprimento, dos pilares de onde brotam, de onde se inspiram, as regras jurídicas.

Assim, percebemos a importância do princípio da vulnerabilidade como base de toda a Ciência Consumerista, configurando esta como uma conquista histórica em favor do consumidor, como decorrência dos tempos modernos. Dessa maneira, para um perfeito entendimento do Sistema de Proteção do Consumidor, impende a necessidade da análise do referido princípio para uma conseqüente aplicação equânime da lei, Tendo em vista que a vulnerabilidade é o alicerce (matriz) da defesa do consumidor.

No decorrer do trabalho, visualizamos as várias espécies de vulnerabilidade inerentes ao consumidor. Estas implicam inúmeras situações fáticas de exploração, que demonstram a importância dessa tutela legal.

No âmbito da publicidade e da contração em massa, constatamos a relevância dessa proteção, ao vedar determinadas práticas comerciais, que visem ludibriar o pólo vulnerável da relação de consumo, objetivando a observância da cláusula geral da boa-fé, que deverá ser buscada, inclusive, por meio de inserção de novas cláusulas pelo magistrado.

Quanto à aplicabilidade do CDC aos contratos bancários, filiamo-nos à corrente de que não há vedação alguma, no concernente às normas de conduta. Em logrando êxito a tese levantada na ADI 2.591, restará por fulminado todo o sistema de proteção ao consumidor.


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15. NOVAES, Elaine Cardoso de Matos. A inversão do ônus da prova no Código de Defesa do Consumidor in Revista Jurídica IN VERBIS n. 02, p. 18-25. Agosto/setembro de 1995.

16. RICHERS, Raimar. O que é Marketing. São Paulo: Abril Cultural, 1985.

17. ROCHA, Sílvio Luís Ferreira da. Responsabilidade civil do fornecedor pelo fato do produto no direito brasileiro. São Paulo: RT, 1992.

18. SOARES, Paulo Brasil Dill. Princípios básicos de defesa do consumidor. Leme: LED, 2001.

19. VIEIRA, Adriana Carvalho Pinto. O princípio constitucional da igualdade e o direito do consumidor. Belo Horizonte: Melhoramentos, 2002.


Notas

01 Para Marques (2002, p. 270) existem apenas três tipos de vulnerabilidade: a técnica, a jurídica e a fática ou sócio-econômica.

02 Exemplo esclarecedor sobre a vulnerabilidade técnica do consumidor nos é dado por Pasqualoto (1997, p. 33) "a questão do leite infantil ficou como um marco na luta contra os desvios da publicidade. Uma trintena de empresas multinacionais sugeriam, especialmente em países do Terceiro Mundo, a substituição da amamentação materna pela mamadeira. Mexiam com a vaidade feminina e com o conforto da mãe. O leite em pó, que substituiria o aleitamento materno, era mais caro e, sendo nutricionalmente menos valioso transformou-se em causa corrente de desnutrição. ..".

03 Essa situação também pode ser constatada nos inúmeros recalls ocorridos nos últimos anos na indústria automobilística em decorrência do desgaste ou defeito de fabricação em peças que colocam em risco a vida de inúmeros consumidores. Vícios esses que, pelo fato do consumidor comum não possuir conhecimento técnico, passaram despercebidos dos mesmos.

04 A título exemplificativo Miriam de Almeida Souza apud Moraes (1999, p.154) "... os apelos publicitários levam o indivíduo a considerar-se numa situação psicológica e social inferior, caso não adquira tais produtos prestigiados, por acreditar que todos devem ter e usar... as empresas... investem conjuntamente em comercias, e criam, dessa forma, no consumidor, a necessidade intolerável de manter-se em dia, andar na moda, e assim por diante, ou seja, o efeito demonstração a toda prova". Dessa maneira percebe-se mais uma vez o subjugamento do consumidor no mercado de consumo.

05 Segundo Marques "entende-se como contratos submetidos a condições gerais aqueles contratos, escritos ou não escritos, em que o comprador aceita, tácita ou expressamente, que cláusulas pré-elaboradas pelo fornecedor, unilateral e uniformemente para um número indeterminado de relações contratuais, venham a disciplinar o seu conteúdo específico" (2002, p.66).

06 Exemplo de confusão entre os dois conceitos existe no trecho do agravo de instrumento. n. 99.002927-1; 3ª Vara Cível – Mossoró/RN. Relator: Des. Dúbel Cosme do TJRN, que citamos infra, no qual se argumenta que a norma do Art. 101, inciso I do CDC (que se refere à possibilidade do consumidor ajuizar ação de responsabilidade civil do fornecedor no seu próprio domicílio) deve ser aplicada in casu como conseqüência da presunção de hipossuficiência da consumidora. Quando, na verdade, tal norma decorre da presunção juris et de jure de vulnerabilidade. Verbis: "Embora a Agravante insista em desconsiderar a condição de hipossuficiente da Agravada, diante do cargo de juíza de direito ocupado pela mesma, a hipossuficiência a que alude o Código de Defesa do Consumidor é afirmada pela sua qualidade de consumidora frente ao fornecedor de serviço (sic). Portanto, não merece guarida referida alegação. São pacíficas a doutrina e jurisprudência pátrias, quando definem como competente o foro do lugar do dano ou do domicílio do consumidor, para as ações de indenização, ante o disposto no artigo 6º, VIII do Código de Defesa do Consumidor que elenca dentre os direitos básicos do consumidor, a facilitação da defesa de seus direitos".

07 De acordo com os ensinamentos de Antônio Benjamin "... A vulnerabilidade é um traço universal de todos os consumidores, ricos ou pobres, educados ou ignorantes, crédulos ou espertos. Já a hipossuficiência é uma marca pessoal, limitada a alguns – até mesmo a uma coletividade – mas nunca a todos os consumidores" (2001, p.325).

08 Preocupou-se, o legislador, com o desvio (publicidade ilícita) e não com o padrão.

09 Para corroborar o supra afirmado, disponibilizamos ao estudioso do assunto o conceito de Antônio Herman de Vasconcelos e Benjamin, que também faz referência às noções de informação e de divulgação, citado por João Bosco Pastos Gonçalves: "Publicidade é toda informação dirigida a público com o objetivo de promover, direta ou indiretamente, uma atividade econômica" (Gonçalves, 2002, tópico 2).

10 Cf. Nesse sentido a referida obra à página 250 na qual escreve o autor: "não fala o código em contra publicidade, dado que o objetivo da publicidade é vender, enquanto o objetivo da propaganda é a implantação de idéias, na forma já vista".

11 Já que tanto a proposta (ou oferta) como a publicidade poderiam ser aprioristicamente definidos como atos pré-negociais. Cf nesse sentido: (Gomes, 1999). Em sentido contrário, considerando a proposta como negócio jurídico unilateral: (Lôbo, 2000).

12 Cf em sentido contrário, defendendo que a publicidade é espécie de oferta: (Filomeno, 2001, p. 251).

13 Compulsoriedade essa dada pela norma do artigo 30 do CDC.

14 Ao contrário do que ocorre no seio das relações regidas pelo Código Civil (vide art. 1.080 do Código de 1916, norma repetida no Código ora em vacatio legis ao artigo 427), nas relações de consumo a proposta sempre obrigará o fornecedor promitente. A nossa lei de proteção não vedou expressamente o uso de cláusula de retratabilidade na proposta, mas entendemos que tal vedação está subentendida, sendo totalmente aplicável a regra do artigo 7º, 5 da Lei Portuguesa de defesa dos consumidores, in fine: "As informações concretas e objetivas contidas nas mensagens publicitárias de determinado bem, serviço ou direito consideram-se integradas no conteúdo dos contratos que se venham a celebrar após a sua emissão, tendo-se por não escritas as cláusulas contratuais em contrário". Grifamos.

15 Saliente-se que pelo fato do direito consumerista ser um direito de proteção ao consumidor e não de repressão ao fornecedor negligente, inexiste, em regra, a necessidade de comprovação de culpa por parte do fornecedor para responsabilizá-lo (regra que possui como exceção o caso dos profissionais liberais) de modo que para que haja a condenação em perdas e danos basta que se apresentem os demais requisitos: 1. Ocorrência de dano patrimonial positivo (dano emergente) ou negativo (lucros cessantes) e 2 – Nexo causal entre o dano e o inadimplemento daquilo que fora prometido em publicidade. Um estudo desses requisitos pode ser encontrado em (Diniz, 1998, p. 379).

16 Já se considerou como enganosa por omissão publicidade que dizia: "Hoje promoção inédita de Santana e Parati" posto que "basta um simples raciocínio para, de pronto, constatar isso, a ausência de qualquer esclarecimento acerca do que o fornecedor pretendeu com a expressão ‘inédito’, o que bem caracteriza o informe como obscuro" (TJDFT, 3ª Turma Cível. Apelação Cível e Remessa ex officio n º 8114/2000 e 7912/2000).

17 Cf nesse sentido: (Moraes, op. cit). e (Loureiro, 2002).

18 Maiores apontamentos sobre o tema poderão ser encontrados em: Elaine Cardoso de Matos Novaes (1995, p. 18 e ss).

19 Genovese apud Orlando Gomes ( 1999, p118 ) coloca os seguintes elementos, que se identificam com os mencionados supra, como características do contrato de adesão: 1) A uniformidade; 2) A predeterminação e 3) A rigidez.

20 Lista pormenorizada contendo esses e outros meios pode ser encontrada em Moraes (1999, p. 226 e ss.).

21 Não há de se falar, nesse sentido, que o uso de cláusula que permita ao fornecedor, variação de preço de maneira unilateral não era procedimento abusivo antes do advento da Lei de proteção ao consumidor; uma vez que tal prática sempre foi considerada leonina vindo, com o CDC, apenas a se formalizar tal entendimento.

22 Corroborando a posição colocada a respeito da possibilidade de integração contratual por parte do Judiciário: Bonatto (2001, p. 193 e ss.).

23 Seja através do uso de tecnismo, complexidade ou cláusulas abusivas.

24 Sobre o assunto, diz Daniel M. G. Meneses (2002, p. 37): "(...) os contratos bancários alcançaram a tal nível de popularidade que mesmo o cidadão mais humilde não costuma escapar da ação (muitas vezes nefasta) dos tipos mais comuns, como: depósito bancário, o depósito em conta corrente, etc.".

25 STJ, 3º T: AG 448061 MG; AG 445664RS; AG 445314 RS; AG 424767 RS; AG 438114 RS; 4º T: AG 444223 RS; AG 430435 RS; AG 430458 RS; AG 420203 RS; AG 425643 RS; RESP 325620 RS; RESP 293778 RS e RESP 213825 RS. Dentre tantos outros julgados. Já que o CDC, do art. 3º §2º, definindo serviço, faz expressa referência ao de natureza bancária, verbis: "Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista" (grifamos). Previsão legal que de tão explícita, ao nosso ver, descarta a necessidade de realizar maiores divagações teóricas sobre o assunto.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BRITO, Alírio Maciel Lima de; DUARTE, Haroldo Augusto da Silva Teixeira. O princípio da vulnerabilidade e a defesa do consumidor no direito brasileiro: origem e conseqüências nas regras regulamentadoras dos contratos e da publicidade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 1109, 15 jul. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8648. Acesso em: 29 mar. 2024.