Interessante julgado em que decidiu que há isenção quando o serviço prestado pela entidade de fins religiosos se relacione com a propagação do ensino religioso e dos valores concebidos em seu estatuto social e o recebimento de valores por eventuais anúncios se preste a custear o veículo pelo qual se propaga o ensino religioso.
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5010112-04.2021.4.03.6105
RELATOR: Gab. 21 - DES. FED. JOHONSOM DI SALVO
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO. ARTIGO 1.021 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. COFINS. ISENÇÃO. POSSIBILIDADE DA DECISÃO UNIPESSOAL, AINDA QUE NÃO SE AMOLDE ESPECIFICAMENTE AO QUANTO ABRIGADO NO NCPC. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DAS EFICIÊNCIA (ART. 37, CF), ANÁLISE ECONÔMICA DO PROCESSO E RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO (ART. 5º, LXXVIII, CF - ART. 4º NCPC). ACESSO DA PARTE À VIA RECURSAL (AGRAVO). APRECIAÇÃO DO TEMA DE FUNDO: AGRAVO INTERNO IMPROVIDO.
1. Eficiência e utilitarismo podem nortear interpretações de normas legais de modo a que se atinja, com rapidez sem excessos, o fim almejado pelas normas e desejado pela sociedade a justificar a ampliação interpretativa das regras do NCPC que permitem as decisões unipessoais em sede recursal, para além do que a letra fria do estatuto processual previu, dizendo menos do que deveria. A possibilidade de maior amplitude do julgamento monocrático - controlado por meio do agravo - está consoante os princípios que se espraiam sobre todo o cenário processual, tais como o da eficiência (art. 37, CF; art. 8º do NCPC) e da duração razoável do processo (art. 5º, LXXVIII, CF; art. 4º do NCPC).
2. O ponto crucial da questão consiste em, à vista de decisão monocrática, assegurar à parte acesso ao colegiado. O pleno cabimento de agravo interno - AQUI UTILIZADO PELA PARTE - contra o decisum, o que afasta qualquer alegação de violação ao princípio da colegialidade e de cerceamento de defesa; ainda que haja impossibilidade de realização de sustentação oral, a matéria pode, desde que suscitada, ser remetida à apreciação da Turma, onde a parte poderá acompanhar o julgamento colegiado, inclusive valendo-se de prévia distribuição de memoriais.
3. O desate da questão controvertida nos autos perpassa pela definição do que deve ser considerado como receita advinda de atividade própria da embargante para fins de gozo da isenção tributária e se as receitas glosadas pelo Fisco e que remanesceram da autuação, notadamente as receitas relacionadas à prestação de serviços como veiculação de patrocínios, anúncios na televisão e na revista Brasil Cristão, se amoldam ao conteúdo da norma isentiva.
4. Da análise conjugada dos artigos 13 e 14 da Medida Provisória nº 2.158-35/2001, depreende-se que são isentas da COFINS, as receitas relativas às atividades próprias de entidades tidas como templos religiosos (inciso I) ou de instituições de caráter filantrópico, recreativo, cultural, científico e as associações - referenciadas no art. 15 da Lei no 9.532, de 1997 (inciso IV).
5. Infere-se dos documentos acostados aos autos que além de um templo, a embargante é uma associação sem fins lucrativos, de caráter religioso, o que a amolda à previsão legal de isenção do pagamento da COFINS, tanto por se enquadrar no inciso I, quanto no inciso IV, do art. 13 da Medida Provisória nº 52.158-35/2001.
6. É fato incontroverso que a embargante se constitui em entidade considerada como “templo de qualquer culto” destinada à difusão do ensino religioso. Tal fato foi reconhecido pelo CARF ao considerar aplicável a isenção pretendida pela embargante, ainda que parcialmente em relação às receitas impugnadas na via administrativa.
7. Sustenta a embargante serem indevidos os débitos de COFINS incidentes sobre “receitas da prestação de serviços de veiculação de patrocínios, anúncios na televisão e revista” auferidas no período de 01/2003 a 11/2006, porquanto beneficiária da isenção tributária da COFINS contemplada no art. 14, inciso X, c/c o art. 13, inc. I, da Medida Provisória nº 2.158-35, de 24/08/2001, uma vez que se trata de entidade sem fins lucrativos de natureza religiosa voltada à prática e difusão de culto e conteúdos informativos religiosos por meio de veículos de comunicação TV Século 21, revista Brasil Cristão e site www.asj.org.br), constituindo tais receitas próprias de suas atividades, não se podendo aplicar o conceito de atividades próprias estabelecido pela IN SRF 247, por ser demasiadamente restritivo e contrariar os ditames da aludida MP n°2.158, de 2001.
8. De sua vez, a embargada assevera que, embora estas receitas possam se reverter à manutenção da entidade, não são voltadas propriamente para a difusão da religião.
9. A norma complementar tributária (§2º, do art. 47 da IN SRF 247/2002), ao restringir o âmbito das receitas obtidas pelas entidades beneficiárias da isenção, extrapolou o caráter regulamentar ao estabelecer a exclusão de receitas advindas de contraprestação de serviços realizados pelas entidades. Ora, não se pode desconsiderar a natureza de receita própria daquela advinda da contraprestação direta de serviços prestados pela entidade. Tal restrição desborda a regra prevista no texto legal, restringindo o que não foi objeto de restrição pelo legislador e violando o conteúdo da norma isentiva.
10. No caso, o art. 4º do Estatuto da embargante define como seu objetivo o desenvolvimento e a difusão do ensino religioso aculturado, cívico, ético, moral, filantrópico e promover ações beneficentes e assistenciais.
11. É certo que a embargante não tem por finalidade a realização ou veiculação de propaganda. Os anúncios realizados e pelos quais são pagos valores considerados receitas para fins tributários se prestam a financiar os meios pelos quais a embargante transmite o ensino religioso, é dizer, pratica sua finalidade essencial. Ora, tratando-se de meios de comunicação (revista, televisão e internet) é natural que a receita obtida advenha dos anúncios realizados, mas isso não desvincula a receita obtida do emprego na finalidade precípua da embargante. Isso porque as receitas obtidas com a veiculação de patrocínios, anúncios na televisão e na revista Brasil Cristão inegavelmente são destinadas à manutenção dos canais de veiculação do ensino religioso, ínsito à atividade e aos objetivos primordiais da embargante.
12. É a finalidade da regra de isenção que deve ser prestigiada. Com efeito, não faria sentido negar-se a isenção quando o serviço prestado pela entidade de fins religiosos se relacione com a propagação do ensino religioso e dos valores concebidos em seu estatuto social e o recebimento de valores por eventuais anúncios se preste a custear o veículo pelo qual se propaga o ensino religioso.
13. A embargante teve reconhecida a sua imunidade tributária pela E. Primeira Turma desta Corte Regional nos embargos à execução fiscal n. 0014794-15.2006.4.03.6105 em sessão realizada em 07/07/2020.
14. Agravo interno a que se nega provimento.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sexta Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo interno, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.