Parecer jurídico sobre a Portaria 04 da Vara Cível da Infância e Juventude da Comarca de Belo Horizonte

13/06/2016 às 00:24
Leia nesta página:

Trata-se de parecer acerca da Portaria 04 da Vara Cível da Infância e Juventude da Comarca de Belo Horizonte.

PARECER

Ementa: Portaria n° 04/VCIJBH/2014 – Fiscalização da entrada e a permanência de crianças e adolescente em salas de exibição cinematográfica e em teatros, bem como da atuação do Comissário de Menores – Art. 149 do Estatuto da Criança e do Adolescente – Atuação do Comissário de Menores.


I-RELATÓRIO

O presente parecer objetiva, dentre outros, a análise acerca de alguns aspectos formais da Portaria 04/VCIJBH/2014, emanada pelo Juiz de Direito da Vara Cível da Infância e Juventude da Comarca de Belo Horizonte, Dr. Marcos Flávio Lucas Padula.

Referida Portaria dispõe sobre a entrada e a permanência de crianças e adolescente em salas de exibição cinematográfica e em teatros, bem como da atuação do Comissário de Menores.


II-FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA

Inicialmente cumpre consignar a competência da Autoridade Judiciária (Juiz de Direito) para disciplinar, através de portaria, ou autorizar, mediante alvará a entrada e permanência de criança e adolescente, desacompanhado dos pais ou responsável, dentre outros, em estúdios cinematográficos, de teatro, rádio e televisão (Art. 149 do Estatuto da Criança e do Adolescente).[1]

Conforme leitura do Artigo 2°da Portaria 04/2014[2] da Vara Cível da Infância e Juventude:

“Art. 2°O ingresso e a permanência de criança com idade inferior a 10 (dez) anos, em salas de exibição cinematográfica e em teatros, somente será admitido se a criança es-tiver acompanhada por seus pais ou responsável, conforme prevê o parágrafo único do art. 75 da Lei n° 8.069, de 1990, e desde que a classificação indicativa seja compatível com sua faixa etária”.

(...)

Tendo em vista o dispositivo acima transcrito, a criança, menor de 10 anos de idade, não pode, em tese, assistir filme e/ou peça teatral, com classificação indicativa inadequada a sua faixa etária, ainda que acompanhado de seu Responsável.

Nesse sentido, tem sido a orientação do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, publicada, inclusive, em seu endereço eletrônico. Vejamos:

CRIANÇAS E ADOLESCENTES NOS CINEMAS E TEATROS: PROCEDIMENTOS. Infân-cia e Juventude. 10.10.2014. A Portaria 4/VCIJBH/2014, que dispõe sobre o ingresso de crianças e adolescentes nas salas de cinema e de teatro, disciplina que crianças com idade inferior a dez anos só poderão entrar e permanecer nas salas quando acompanhadas pelos pais ou responsáveis, desde que a classificação indicativa seja compatível com a faixa etária, e portem documento de identidade. Caso a criança tenha mais de dez anos e esteja desacompanhada, poderá ingressar nas salas quando a exibição for adequada à sua faixa etária. Quando acompanhada por um responsável, a criança poderá entrar nas salas em que as exibições tenham a classificação indicativa até 18 anos. O estabelecimento deverá afixar, em local visível e de fácil acesso, um aviso contendo informações sobre os horários e as res-pectivas faixas etárias constantes da classificação indicativa. Cabe ao estabelecimento, ainda, assegurar condições de segurança, fiscalizar a documentação na entrada, e cuidar para que não ocorra o consumo, venda ou entrega de bebidas alcoólicas a crianças e adoles-centes dentro do local. Esta portaria entra em vigor no prazo de 30 (trinta) dias, contados da data de sua publicação. A Portaria 4/VCIJBH/2014 foi disponibilizada na  DJe de 08/10/2014.[3]

Cumpre consignar, que o § 1° do artigo 2° da Portaria n°04/VCIJBH/2014 define a figura do responsável no âmbito de salas de cinemas e teatros. Vejamos:

§ 1º. Para os efeitos desta Portaria, considera-se responsável:

a) o pai ou a mãe;

b) o representante legal (guardião ou tutor);

c) o avô ou a avó;

d) o irmão, a irmã, o tio ou a tia, desde que maiores de idade; e

e) a pessoa maior, autorizada por escrito por um dos pais ou pelo representante legal.

Neste caso, para efeito dos demais artigos previstos na presente Portaria, o parâmetro de responsável da criança/adolescente é abrangente comportando inclusive, pessoa maior, desde que, autorizada a entrar e permanecer com crianças ou adolescentes em salas de cinema e teatros.

Mencionada Portaria explicita ainda que, as crianças, a partir de 10 anos de idade, e adolescentes, podem entrar e permanecer em salas de cinema e teatro, independente da classificação indicativadesde que, acompanhada de um responsável legal e que o filme ou peça teatral não seja classificado para maiores de 18 anos (Art.3º Portaria n°04/VCIJBH/2014).[4]

No que tange a identificação das crianças e adolescentes, ressalta-se a possibilidade da carteira de estudante ser aceita como documentação comprobatória, desde que, contenha fotografia e data de nascimento. (Art.4º Portaria n°04/VCI-JBH/2014)[5]

Assevera-se que a falta do documento de identificação da criança e do adolescente, pode ser suprida por declaração escrita do responsável. Este deverá apresentar sua carteira de identidade ou outro documento oficial que comprove sua identidade. (Art.5º Portaria n°04/VCIJBH/2014) [6]

Constata-se que a portaria n° 04/VCIJBH/2014, alicerçada nos ditames dispostos no Estatuto da Criança e Adolescente, regulamenta situações fáticas de proteção e proporciona certa discricionariedade legal aos responsáveis pela criança e adolescente.

No que concerne a atuação do Agente Fiscalizador a Portaria 04/VCIJBH/2014 dispõe que:

Art. 9°. Fica determinado ao Comissariado da Infância e da Juventude o exercício das atividades de fiscalizaçãoinclusive preventiva, podendo desenvolver suas atividades em todos os setores e espaços do estabelecimento.

§ 1º. Verificada a ocorrência de infração administrativa, deverá ser lavrado o auto de infração em face do estabelecimento enquanto pessoa jurídica, sem prejuízo da responsabilidade dos proprietários, dos sócios, dos diretores, dos dirigentes ou dos gerentes do estabelecimento, assim como de seus funcionários, empregados, prepostos ou responsáveis.

§ 2º. Constatada a entrada ou a permanência irregular de criança e de adolescente desacompanhados, deverão ser os mesmos encaminhados aos pais ou ao responsável e, na sua falta, ao Conselho Tutelar.

§ 3º. No caso de falta de documento de identidade da criança ou do adolescente, deverá ser colhida a declaração dos pais ou do responsável, atestando a idade da criança ou do adolescente.

Nesse sentido, constatada infrações administrativas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente, bem como nos artigos da Portaria n°04/VCIJBH/2014[7], deve o Comissário lavrar o Auto de Infração e as crianças/adolescentes serem entregues sob Termo de Responsabilidade ao responsável e, na sua ausência, ser encaminhada ao Conselho Tutelar.

Pondera-se ainda que, é comum representantes dos estabelecimentos fiscalizados justificar a entrada e permanência de crianças e adolescentes com base na Portaria 1.100 do Ministério da Justiça, publicada em 14 de julho de 2006. Entretanto, citada Portaria foi REVOGADA pela Portaria n° 368, de 11 de fevereiro de 2014 conforme redação do artigo 54. Vejamos:

Art. 54. Ficam revogadas:

I - a Portaria no 1.100, de 14 de julho de 2006, do Ministério da Justiça;

II - a Portaria no 1.220, de 11 de julho de 2007, do Ministério da Justiça;

III - a Portaria no 3.203, de 8 de outubro de 2010, do Ministério da Justiça;

IV - a Portaria no 1.642, de 3 de agosto de 2012, do Ministério da Justiça;

V - a Portaria no 1.643 de agosto de 2012, do Ministério da Justiça; e

VI - a Portaria no 14, de 17 de julho de 2009, da Secretaria Nacional de Justiça.

Salvo melhor juízo, a Portaria nº 368/2014 do Ministério da Justiça não possui, em tese, dispositivo conflituoso com a Portaria 04/2014[8] da Vara Cível da Infância e Juventude da Comarca de Belo Horizonte.

Outro ponto enfrentado pelo Comissário da Infância e Juventude são as diversas solicitações realizadas por pais e mães, no sentido de expedir autorização para entrada e permanência de menores nas salas de cinema/teatro. Cumpre dizer que a Portaria 04/VCIJBH/2014 não prevê a realização desse tipo de autorização por parte do Juizado da Infância e Juventude da Comarca de Belo Horizonte.


III_CONCLUSÃO

Conforme debatido no presente parecer a Portaria 04/VCIJBH/2014, pautada nos ditames do Estatuto da Criança e Adolescente, em especial, na competência prevista em seu artigo149, traça os contornos para a atuação do Comissário no que tange a fiscalização, entrada e a permanência de crianças e adolescente em salas de exibição cinematográfica e em teatros.            A Vara Cível da Infância e Juventude da Comarca de Belo Horizonte por intermédio de seus agentes (Comissários), possuem o poder-dever, conferido pelo ordenamento jurídico, de proceder às atividades de fiscalização, inclusive preventiva, em todos os setores e espaços dos cinemas e teatros, no sentido de coibir e identificar a prática de infrações administrativas.

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Salienta-se por fim que, é dever do Comissário de Menores, tratar o Fiscalizado (comerciante) com respeito e urbanidade e todas as orientações verbais emanadas pelo Agente Fiscalizador (comissário), devem ser pautadas pelas regras/princípios da legalidade, proporcionalidade, razoabilidade e adequação, visando sempre à proteção da criança e do adolescente nos termos dispostos na Lei Federal n° 8.069/90.

É o parecer.   


Notas

[1]  Art. 149 do ECA. Compete à autoridade judiciária disciplinar, através de portaria, ou autorizar, mediante alvará:

I - a entrada e permanência de criança ou adolescente, desacompanhado dos pais ou responsável, em:

(...)

e) estúdios cinematográficos, de teatro, rádio e televisão.

[2] Dispõe sobre a entrada e permanência de crianças e adolescentes em salas de exibição cinematográfica e em teatros. Juiz Marcos Flávio Lucas Pádua. Diário do Judiciário Eletrônico do TJMG 08/10/2014.

[3] FONTE - http://www.tjmg.jus.br/portal/imprensa/informes/criancas-e-adolescentes-nos-cinemas-e-teatros-procedimentos.htm. Acesso em 27/04/2016.

[4] Portaria 04/VCIJBH/2014 Art. 3º. O ingresso de criança a partir de 10 (dez) anos de idade e de adolescente, quando desacompanhados, será admitido nos casos de exibição de filme ou peça teatral adequados à sua faixa etária, segundo classificação indicativa.

Parágrafo único. Quando acompanhados de um ou de ambos os pais ou de outro responsável legal, será admitida a entrada e a permanência de criança a partir de 10 (dez) anos e de adolescente, independentemente da classificação indicativa, desde que não seja a exibição proibida para menores de 18 (dezoito) anos.

[5] Portaria 04/VCIJBH/2014. Art. 4º. A criança e/ou o adolescente, assim como o responsável, deverão exibir carteira de identidade ou outro documento oficial de identidade, que contenha fotografia.

§ 1º. No caso de crianças, será admitida sua identificação por certidão original de nascimento ou por cópia, desde que legível.

§ 2º. A carteira de estudante poderá ser aceita como prova de identificação da criança ou do adolescente, desde que contenha fotografia e data de nascimento.

§ 3º. Não comprovada a identidade, o parentesco, ou a relação de responsabilidade e sendo a classificação indicativa incompatível com a idade da criança, será solicitado ao responsável que providencie a saída da criança, informando o ocorrido em relatório.

[6]Portaria 04/VCIJBH/2014. Art. 5º. A falta de documento de identidade da criança ou do adolescente poderá ser suprida por declaração escrita do responsável quanto à idade da criança ou do adolescente sob sua responsabilidade.

§ 1º. No caso deste artigo, o responsável deverá apresentar sua carteira de identidade ou outro documento oficial que comprove sua identidade.

(...).

[7] Vide nota 01.

[8] Vide nota 01.

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Sobre o autor
Pedro Henrique Mendes Drumond

Bacharel em Direito Pós-graduado em Direito Processual Pós-graduado em Direito Constitucional - Mestre em Direito

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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