Mandado de Segurança contra ato de Juiz de Direito que aplica as penalidades do art. 234, § 2º, do CPC/2015 sem intimação pessoal do advogado

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A aplicação das penalidades do § 2º do art. 234 do CPC/2015 ao advogado depende de intimação pessoal.

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR ____ DA CÂMARA CÍVEL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MATO GROSSO

 

 

 

FULANA DE TAL, brasileira, solteira, inscrita no CPF/MF nº XXX.XXX.XXX-XX, RG nº XXXXXXX-X SSP/MT, e-mail: XXXXXXXXXXXXXXXX, Advogada inscrita na Ordem dos Advogados do Brasil em Mato Grosso sob o nº XX.XXX, residente e domiciliada na Rua XXXXX, nº XXX, Bairro XXXXXX, Cuiabá/MT, CEP nº  XX.XXX-XXX, vem, por meio do seu Advogado, impetrar MANDADO DE SEGURANÇA COM PEDIDO DE LIMINAR DE TUTELA DE URGÊNCIA contra ato ilegal do Juiz de Direito BELTRANO, titular da XXX Vara Cível da Comarca de Cuiabá/MT, pelos fundamentos de fato e de direito a seguir expostos.  

DOS FATOS

A Impetrante, na condição de advogada, fez carga dos autos do Processo nº XXXXXXXXXXXXXXXXX em 26.09.2019 junto à Secretaria da XXX Vara Cível da Comarca de Cuiabá/MT. Ocorre, porém, que, por um lapso de memória e também em decorrência do seu dia a dia corrido, esqueceu-se de devolvê-lo.

Assim, em 30.09.2019 o Sr. Gestor da Secretaria da XXX Vara Cível da Comarca de Cuiabá entrou em contato com a Impetrante, via telefone, solicitando a devolução dos citados autos.

Em 02.10.2019 (dois dias depois) a Impetrante fez a devolução do processo.

Nada obstante a devolução dos autos, foi proferida pelo Juiz de Direito BELTRANO decisão com o seguinte teor:

“Narra a certidão lavrada pelo Gestor deste Juízo que a advogada Dra. FULANA DE TAL – OAB/MT nº XX.XXX efetuou carga dos autos, e mesmo depois de intimada para devolver em Cartório o processo que retirou em carga, não o fez. (...) No caso, a advogada reteve abusivamente os autos recebidos com vista por prazo maior que o prazo legal, e mesmo intimada não devolveu o processo em cartório, perdendo assim o direito de vista do processo fora do Cartório, e incorrendo em multa correspondente a metade do salário mínimo vigente, conforme estabelece o § 2º do artigo 234, do Novo Código de Processo Civil. Ante ao exposto, expeça-se Mandado de Busca e Apreensão do Processo nº XXXXXXXXXXXXXXXXX e comunique-se o fato à Ordem dos Advogados do Brasil.” – Sem grifos no original.

Desse modo, foi expedido mandado de busca e apreensão de autos, tendo o Sr. Oficial de Justiça TÍCIO se dirigido até o domicilio da Impetrante em 17.10.2019 visando cumpri-lo. Contudo, a Impetrante não estava em casa no momento; assim, o Oficial de Justiça entrou em contato com a Impetrante, tendo ela informado a ele que já havia devolvido o processo.

Eis o resumo do essencial.

DO CABIMENTO DO MANDADO DE SEGURANÇA

O Mandado de Segurança é o remédio constitucional/processual cabível para proteger direito líquido e certo quando o cidadão sofrer em decorrência de ilegalidade ou abuso de poder praticado por autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público (Art. 5º, LXIX, CF/1988 c.c. art. 1º da Lei nº 12.016/2009).

No caso em testilha, o presente mandado de segurança objetiva sanar ilegalidade praticada pelo Juiz de Direito BELTRANO, visto que este aplicou as penalidades referentes ao artigo 234, parágrafo 2º, do Código de Processo Civil, sem intimar pessoalmente a impetrante para devolver os autos no prazo de três dias.

É bom destacar que o presente caso não se encaixa nas hipóteses do artigo 5º da Lei nº 12.016/2009, que vedam a impetração do remédio constitucional:

Art. 5o  Não se concederá mandado de segurança quando se tratar: 

I - de ato do qual caiba recurso administrativo com efeito suspensivo, independentemente de caução; 

II - de decisão judicial da qual caiba recurso com efeito suspensivo

III - de decisão judicial transitada em julgado. - Destaque nosso. 

Da decisão proferida contra a Impetrante não é cabível nenhum recurso.

Ainda que fosse admitido o recurso de embargos de declaração contra a decisão proferida pela autoridade coatora, ainda assim não incidiria o impedimento do inciso II do artigo 5º da Lei nº 12.016/2009, visto que o citado recurso não possui efeito suspensivo. [[1]]

 Em continuidade, por mais que se trate de decisão interlocutória proferida nos autos do Processo nº XXXXXXXXXXXXXXXXX, a impetrante não é parte no referido processo, tendo apenas prestado serviços para a parte reclamada daquele feito como advogada, sendo, portanto, incabível o recurso de agravo de instrumento.

Alias, se fosse admitido o agravo de instrumento, sequer os autores do Processo nº XXXXXXXXXXXXXXXXX poderiam figurar como agravados/recorridos, visto não terem nenhum interesse em manter ou reformar a decisão interlocutória que se pretende anular.

A decisão que se pretende anular interessa única e exclusivamente à Impetrante.

Sobre o cabimento de mandado de segurança nos casos envolvendo o descumprimento dos requisitos do parágrafo 2º do artigo 234 do Código de Processo Civil, vejamos os julgados a seguir:


EMENTA: AGRAVO INTERNO - AGRAVO DE INSTRUMENTO - MANDADO DE SEGURANÇA - APLICAÇÃO PENALIDAE ARTIGO 234, §2º DO CPC - AUSÊNCIA DE CABIMENTO - ARTIGO 1.015 DO CPC - INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA - NÃO APLICÁVEL.
- A decisão que aplica a penalidade do artigo 234,§2º do CPC ao advogado da parte não se encontra prevista no rol de cabimento do Agravo de Instrumento e também não se encaixa nas hipóteses do Julgado do C. STJ.
- Provimento negado.  (TJMG -  Agravo Interno Cv  1.0105.15.022385-4/004, Relator(a): Des.(a) Ângela de Lourdes Rodrigues , 8ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 14/08/0019, publicação da súmula em 23/08/2019). 


EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA - PROCESSUAL CIVIL - AUTOS EXTRAVIADOS - PROIBIÇÃO DE RETIRADA POR QUALQUER PARTE OU PROCURADOR - RESPONSABILIDADE DO ADVOGADO - ART. 234 CPC - NÃO CONFIGURAÇÃO - VIOLAÇÃO DOS ARTS. 107, III DO CPC/2015 E 7º, XV DA LEI 8.906/94.
- Somente podem ser aplicadas penalidades de perda do direito de vista fora de cartório, ao advogado que tiver responsabilidade sobre a não devolução dos autos, conforme se infere do art. 234 do CPC/2015.
- Não configurada a responsabilidade ou concorrência do advogado para o extravio dos autos, carece a proibição de embasamento jurídico, convolando-se em violação a direito líquido e certo, amparado pelos artigos 107, III, do CPC/2015 e 7º XV da lei 8.906/94.  (TJMG -  Mandado de Segurança  1.0000.16.058789-5/000, Relator(a): Des.(a) Alice Birchal , 7ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 25/10/2016, publicação da súmula em 31/10/2016).


EMENTA: PROCESSUAL CIVIL - MANDADO DE SEGURANÇA - ESPÓLIO - AUTOS EXTRAVIADOS - RESPONSABILIDADE OU CONCORRÊNCIA DO ADVOGADO - ART. 234 CPC - NÃO CONFIGURAÇÃO - CARGA ALÉM DO PRAZO - PROIBIÇÃO DE RETIRADA POR PARTE DE PROCURADOR - VIOLAÇÃO DOS ARTS. 107, III, DO CPC/2015 E 7º, XV, DA LEI 8.906/94.
- Somente podem ser aplicadas penalidades de perda do direito de vista fora de cartório ao advogado que tiver responsabilidade sobre a não devolução dos autos, conforme se infere do art. 234 do CPC/2015.
- Não configurada a responsabilidade ou a concorrência do advogado para o extravio dos autos, carece a proibição de embasamento jurídico, convolando-se em violação a direito líquido e certo, amparado pelos artigos 107, III, do CPC/2015 e 7º, XV, da Lei 8.906/94.  (TJMG -  Mandado de Segurança  1.0000.16.090996-6/000, Relator(a): Des.(a) Alice Birchal , 7ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 11/07/2017, publicação da súmula em 17/07/2017).

 

O art. 107, inc. II, do CPC em vigor, em reforço à previsão do art. 7º, inciso XV, da Lei nº 8.906/94 (Estatuto da Advocacia), assegura ao advogado o direito de retirar os autos em carga. Por outro lado, o NCPC atribui ao advogado o dever de restituir os autos no prazo legal, sob pena de perda do direito à vista fora do Cartório, imposição de multa no valor de meio salário mínimo e oficiamento à OAB, nos termos do seu art. 234, §§ 2º e 3º. Sobre a questão, a jurisprudência do STJ e desta Corte Estadual orienta-se no sentido de que a aplicação das penalidades previstas no art. 234 do CPC deve obrigatoriamente ser precedida da intimação pessoal do advogado, para devolução dos autos no prazo legal, não sendo possível substituí-la por outro meio de intimação. No caso dos autos, a autoridade impetrada, ao constatar a retenção indevida dos autos, intimou o impetrante por nota de expediente e, na sequência imediata, determinou a busca e apreensão dos autos do processo-crime de origem. Neste contexto, ausente a intimação pessoal do impetrante, não está autorizada a aplicação das sanções de multa, vedação de carga dos autos e expedição de ofício à OAB. Nesta toada, o mandamus procede de plano, impondo-se conceder a segurança, para desconstituir as penalidades aplicadas na decisão judicial coacta. Precedentes jurisprudenciais. SEGURANÇA CONCEDIDA DE PLANO. (TJRS, 6ª CÂMARA CRIMINAL, Mandado de Segurança nº 70.080.849.557, Decisão monocrática proferida pelo Des. Aymoré Roque Pottes de Mello em 13.03.2019).

 

MANDADO DE SEGURANÇA. POSSE (BENS IMÓVEIS). DIREITO LÍQUIDO E CERTO. Art. 7º, XV do EAOAB e art. 234, § 2º, CPC/15. Ausência de intimação pessoal. REVOGAÇÃO DA VEDAÇÃO DE CARGA A ADVOGADO. SEGURANÇA CONCEDIDA. Vedação de carga. Somente após a intimação pessoal do advogado para devolução dos autos e, acaso descumprida a determinação, se faz possível a vedação da carga e demais penalidades constantes no artigo. 234, §2º do CPC/15. Caso. Malgrado o longo tempo em que permaneceu com a carga, o procurador não foi intimado pessoalmente a devolver os autos, os tendo devolvido de forma espontânea e sem cobrança por parte da serventia. Segurança concedida. Evidenciado o direito líquido e certo do impetrante com o preenchimento dos requisitos previstos pelo art. 1º da Lei nº 12.016/2009, impõe-se a concessão do mandamus. CONCEDERAM A SEGURANÇA. UNÂNIME. (TJRS, 17ª Câmara Cível, Mandado de Segurança nº 70078154143, Relator: DES. GIOVANNI CONTI, julgado em 30.08.2018).

No relatório do Mandado de Segurança transcrito acima, o relator discorreu acerca da questão se seria cabível agravo de instrumento ou mandado de segurança:

Des. GIOVANNI CONTI (RELATOR):

Trata-se de mandado de segurança impetrado por ACÁCIO PINHEIRO RAMOS contra ato do JUIZ DE DIREITO DA VARA CÍVEL DO FORO REGIONAL DO PARTENON, nos autos da Ação de Reintegração de Posse ajuizada por BELILDE MELANI MARTINI.

Para melhor esclarecer o caso, transcrevo a decisão que originou o presente mandado:

Em face da certidão da fl. 71, anote-se na capa dos autos a proibição de carga, inclusive a rápida, ao advogado, devendo, também, ser expedido ofício à OAB/RS para noticiar o fato, a fim de que adotem as medidas cabíveis.

(...)

O impetrante salientou ter ingressado com agravo de instrumento contra a decisão, recurso que restou não conhecido por ausência de previsão no rol do art. 1.015 do NCPC, o que autoriza o conhecimento do presente remédio. Em suas razões, alegou que a decisão proferida pelo Magistrado de primeiro grau contraria direito líquido e certo seu previsto no art. 7º, inc., XV da 8.906/94 (Estatuto da OAB). Argumentou que além de não haver sido intimado conforme determina o § 2º, do art. 234, do NCPC, o processo em carga ficou suspenso por força de agravo de instrumento interposto por Belilde, portanto, sem causar prejuízo algum ao feito. O dispositivo legal é claro ao determinar que o advogado somente perderá o direito de vista fora de cartório, após intimado para devolver e não o fizer em três dias. Requereu a concessão da segurança para que seja reformulada a decisão ora combatida pois manifestamente ilegal e causadora de dano irreparável. Recebido o mandado, fl. 31, determinou-se o oficiamento da autoridade impetrada para que preste informações, nos termos do art. 7ª, inciso I da lei 12.016/2009. Sobreveio informação de fl. 39. O Ministério Público de Segundo Grau opinou, fls. 48/53 pela denegação da segurança postulada. Vieram os autos conclusos para julgamento.

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É o relatório.

(Relatório do Mandado de Segurança nº 70078154143).

Como se vê, é perfeitamente cabível o mandado de segurança no presente caso, para que seja anulada a decisão proferida pelo Juízo da XXX Vara Cível de Cuiabá/MT, afastando o vício de legalidade que a inquina.

DA DECISÃO PROFERIDA PELA AUTORIDADE COATORA

A decisão proferida pela autoridade coatora deve ser anulada/desconstituída pelos seguintes motivos:

a) o Gestor da Secretaria da XXX Vara Cível de Cuiabá entrou em contato com a Impetrante, por telefone, em 30.09.2019 solicitando a devolução dos autos do processo, e no 02.10.2019 (dois dias depois) a devolução fora feita, conforme consta no extrato do processo em anexo;

b) a expedição do mandado de busca e apreensão dos autos foi feita quando o processo já havia sido devolvido;

c) a expedição do mandado de busca e apreensão dos autos não foi precedida de intimação pessoal da Impetrante (Advogada).

DA AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO PESSOAL DA IMPETRANTE

Dispõe o artigo 234 do Código de Processo Civil:

Art. 234. Os advogados públicos ou privados, o defensor público e o membro do Ministério Público devem restituir os autos no prazo do ato a ser praticado.

§ 1º É lícito a qualquer interessado exigir os autos do advogado que exceder prazo legal.

§ 2º Se, intimado, o advogado não devolver os autos no prazo de 3 (três) dias, perderá o direito à vista fora de cartório e incorrerá em multa correspondente à metade do salário-mínimo.

§ 3º Verificada a falta, o juiz comunicará o fato à seção local da Ordem dos Advogados do Brasil para procedimento disciplinar e imposição de multa.

Conforme se nota, o artigo 234 do Código de Processo Civil, ao disciplinar a hipótese de devolução de processo fora do prazo, estabelece que o advogado deve ser intimado para devolver os autos no prazo de 03 (três) dias, sob pena de perder o direito à vista fora do cartório e incorrer em multa correspondente à metade do salário mínimo.

Saliente-se que o Superior Tribunal de Justiça vem decidindo que a intimação do advogado a que se refere o parágrafo 2º do artigo 234 deve ser feita pessoalmente. Nesse sentido:

RECURSO ESPECIAL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RETENÇÃO DO AUTOS. ADVOGADO. INTIMAÇÃO PESSOAL. NECESSIDADE. ART. 234, § 2º, DO CPC/2015. SANÇÕES. APLICAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. 1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 2. Cinge-se a controvérsia a definir se é necessária a intimação pessoal do advogado para que lhe sejam aplicadas as sanções previstas no § 2º do art. 234 do CPC/2015, decorrentes da retenção indevida dos autos. (...) 4. A partir da entrada em vigor do CPC/2015, para aplicar as sanções por retenção dos autos (art. 234, § 2º), exige-se também a intimação pessoal do advogado para devolvê-los5. Se o advogado for intimado pessoalmente e não devolver os autos no prazo de 3 (três) dias, perderá o direito à vista fora de cartório e incorrerá em multa correspondente à metade do salário mínimo. (...) (Recurso Especial 1.712.172 – DF, Relator: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, publicado no DJE de 24.08.2018).

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RETENÇÃO DE AUTOS PELO ADVOGADO. SANÇÕES DO ART. 196 DO CPC. INTIMAÇÃO PESSOAL POR MANDADO. NECESSIDADE. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. Não se aplicam as penalidades de perda  do  direito  de  vista do processo fora do cartório e multa a advogado  que  não foi pessoalmente intimado para devolver os autos, como no caso ora em análise. Súmula 83/STJ. 2. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp nº 910821/DF, Relator: Ministro RAUL ARAÚJO, publicado no DJE de 21.09.2017).

No caso em epígrafe, a Impetrante não foi intimada pessoalmente para devolver os autos em cartório.

O que ocorreu foi que, em 30.09.2019 o Gestor da Secretaria da XXX Vara Cível de Cuiabá/MT entrou em contato, por telefone, com a Impetrante solicitando que ela devolvesse os autos do processo, e dois dias depois (em 02.10.2019) os autos foram entregues no Cartório do citado Juízo.

A intimação da Impetrante por telefone (se é que se pode chamar isso de intimação) não pode ser entendida como intimação pessoal.

Portanto, ausente o requisito referente à intimação pessoal do advogado, não podem ser impostas ao profissional da advocacia as penalidades do parágrafo 2º do artigo 234 do Código de Processo Civil (multa e perda do direito à vista fora do Cartório).

Aliás, ainda que se admita como válida a intimação feita por telefone pelo Gestor da Secretaria, é bom destacar que os autos foram devolvidos em dois dias após o telefonema, e o prazo para o advogado devolver os autos, consoante o parágrafo 2º do artigo 234 do CPC, é de três dias após a intimação. Assim, ainda nesse caso estaria a Impetrante dentro do prazo e as penalidades legais não lhe poderiam ter sido aplicadas.

Ressalte-se ainda que a expedição do mandado de busca e apreensão dos autos foi totalmente descabida, pois foi expedido e cumprido quando o processo já havia sido devolvido à Secretaria da XXX Vara Cível.

Em conclusão, deve a decisão proferida pela autoridade coatora ser anulada, impedindo-se a aplicação das penalidades referidas no parágrafo 2º do artigo 234 do CPC.

DO PEDIDO LIMINAR DE TUTELA DE URGÊNCIA

O vigente Código de Processo Civil autoriza o magistrado a conceder tutela provisória, liminarmente, quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo (Art. 300, caput e § 2º).

Da leitura do artigo 300 do CPC/2015 conclui-se que são requisitos da tutela provisória de urgência: 1) a existência de elementos que evidenciem a probabilidade do direito; e 2) o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.

O primeiro requisito – probabilidade do direito consiste na demonstração de que o Requerente é titular do direito que está sob ameaça, e que esse direito merece proteção. Tal requisito é analisado em cognição sumária, ou seja, com base na probabilidade, sendo que a análise da efetiva existência do direito deve ser feita apenas ao final do processo, em cognição exauriente. Conforme ensina MARCUS VINICIUS RIOS GONÇALVES:

“O juiz tem de estar convencido, senão da existência do direito ameaçado, ao menos de sua probabilidade. É preciso que ele [o direito ameaçado] tenha aparência de verdade.” (in Direito Processual Civil Esquematizado, São Paulo, Saraiva, 2016, p. 365).

Os outros dois requisitos, que são alternativos, consubstanciam o periculum in mora: perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. Em linhas gerais, o Requerente deve demonstrar que a demora na prestação jurisdicional lhe produzirá efeitos tão nefastos a ponto de se tornar inútil a decisão/sentença que for proferida ao final da marcha processual. A esse respeito, ensina-nos DANIEL AMORIM ASSUMPÇÃO NEVES:

“... tanto na tutela cautelar quanto na tutela antecipada de urgência caberá à parte convencer o juiz de que, não sendo protegida imediatamente, de nada adiantará uma proteção futura, em razão do perecimento do seu direito.” (in Novo Código de Processo Civil Comentado, Salvador, Ed. JusPodivm, 2016, p. 476).

No presente caso, os requisitos para a concessão liminar da tutela de urgência estão preenchidos, conforme passaremos a expor.

A probabilidade do direito está demonstrada pelo extrato do Processo nº XXXXXXXXXXXXXXXXX, que demonstra que o Gestor da Secretaria da XXX Vara Cível entrou em contato com a Impetrante, por telefone, solicitando a devolução dos autos, e, no mesmo extrato, consta que no dia 02.10.2019 (dois dias depois) houve a devolução do processo.

Não houve intimação pessoal da Impetrante, tendo ocorrido apenas a comunicação dela por telefone, o que fora suficiente para os autos do processo serem devolvidos.

Assim, estando demonstrado que não houve a intimação pessoal da Impetrante, conforme exige o parágrafo 2º do artigo 234 do Código de Processo Civil, resta evidenciado o primeiro requisito para a concessão da tutela de urgência.

O perigo da demora, na mesma toada, também está demonstrado. Deve, de forma urgente, ser suspensa a decisão prolatada pela autoridade coatora, pois, se cumprida a Impetrante será impedida de retirar os autos fora do Cartório e será instaurado procedimento administrativo na Ordem dos Advogados do Brasil em Mato Grosso, causando enormes prejuízos e dissabores à Impetrante.

Portanto, pleiteia a Impetrante, em sede liminar, a concessão de tutela provisória de urgência, para que seja suspensa a decisão proferida pela autoridade coatora, até o encerramento desse processo.

DOS PEDIDOS

ANTE O EXPOSTO, a Impetrante REQUER: 

1) seja concedida, de forma LIMINAR, TUTELA DE URGÊNCIA para SUSPENDER os efeitos da decisão proferida em 02.10.2019 nos autos do Processo nº XXXXXXXXXXXXXXXXX pelo Juízo da XXX Vara Cível de Cuiabá, impedindo a expedição de ofício à OAB/MT, a execução da multa e a vedação de acesso aos citados autos fora de cartório; 

2) no MÉRITO, seja concedida a SEGURANÇA para ANULAR/DESCONSTITUIR a decisão referida no item anterior, confirmando-se a medida liminar

3) a notificação do autoridade coatora, o Juiz de Direito BELTRANO, para que preste informações no prazo legal, podendo ser encontrada na Avenida XXXXXXXXXXX, s/n, Fórum da Capital, Cuiabá/MT; 

4) seja dada ciência do feito ao órgão de representação do Estado de Mato Grosso e ao Ministério Público do Estado de Mato Grosso.

 

Dá-se à causa o valor R$ 499,00.

 

Cuiabá/MT, 19 de outubro de 2019.

 

Thiago Borges Mesquita de Lima

OAB/MT nº 19547

 

 

[[1]] Art. 1.026 do CPC/2015: “Os embargos de declaração não possuem efeito suspensivo e interrompem o prazo para a interposição de recurso.”

Sobre o autor
Thiago Borges Mesquita de Lima

Bacharel em Direito pelo Instituto Cuiabá de Ensino e Cultura (ICEC), Pós-Graduado em Direito Constitucional pela Faculdade Dom Alberto, Pós-Graduado em Direito Civil Constitucionalizado e o Novo Processo Civil pela Universidade de Cuiabá (UNIC), Advogado em Cuiabá/MT e Juiz Leigo credenciado do Tribunal de Justiça de Mato Grosso. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/9511639822037013

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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