Contestação com reconvenção: cobrança de cotas condominiais

09/09/2020 às 18:33
Leia nesta página:

Contestação à cobrança de débitos condominiais sob os quais são aplicadas taxas de juros moratórios no patamar de 10% ao mês.

EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA xxx VARA CÍVEL - COMARCA DA CAPITAL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

Processo n°.

Nome e qualificação do Requerido (a), vem à presença de V.Exa, por sua advogada que subscreve a presente, apresentar sua CONTESTAÇÃO C/C RECONVENÇÃO em face ao CONDOMÍNIO xxxxxx, qualificado em sua inicial, pelos motivos de fato e de direito que passa a expor:


DA TEMPESTIVIDADE

Esclarece a V.Exa. que a Ré, tomando ciência da ação em tramite movida em seu desfavor, espontaneamente se apresentou aos autos anexando sua procuração, no dia xxxxx.

De acordo com o art. 335. c/c § 1º, do artigo 239 do CPC, o prazo para apresentar a peça de defesa é de 15 dias a contar do comparecimento espontâneo do réu (xxxx) sendo, portanto tempestiva a presente.


DA GRATUIDADE DE JUSTIÇA

Inicialmente, afirma não possuir condições para arcar com as custas processuais, sem prejuízo de sua mantença. Requer à V. Exa. , que seja concedido os benefícios da justiça gratuita, nos termos do art. 5º, LXXIV da CF/88, da Lei 1.060/50 e art. 98. e seguintes do Código de Processo Civil.

Anexo: declaração de hipossuficiência e imposto de renda.


BREVE Resumo: DOS FATOS

O autor pretende receber da Ré valores referente a débitos condominiais através da presente ação de cobrança de cotas condominiais, além das parcelas que se vencerem no curso da ação.

Em sua inicial, anexa aos autos a convenção de condomínio entabulada em xxxx e planilha que engloba o período de xxx a xxxx, totalizando o valor de R$ xxxx (valor por extenso).

Importante esclarecer que a Requerida, ao longo do período em que está inadimplente, vem tentando saldar o débito das cotas condominiais, contudo o condomínio autor vem incluindo sobre tais parcelas a cobrança de juros moratórios no patamar de 10% (dez por cento), o que de fato vem impossibilitando-a de honrar com o pagamento do débito por sua abusividade.

É incontroverso o débito existente relativo às contribuições condominiais dos meses de xxxx até xxxxx, sendo o objeto da irresignação da Requerida a taxa de juros de mora fixada na convenção condominial e aplicada na planilha constante na inicial.

Sem obter êxito na esfera administrativa a fim de ser resolvido o problema e já em tramite a presente ação, a Requerida se dar por citada a fim de requerer a nulidade da cláusula contratual xxxx constante na convenção condominial.


DO DIREITO

DOS JUROS DE MORA

Não obstante, a possibilidade conferida pelo Código Civil, em seu art. 1.336, § 1º, de o condomínio deliberar em assembléia o percentual da multa e dos juros de mora àqueles que inadimplirem com suas obrigações condominiais, o percentual fixado para cobrança de tais taxas devem obedecer aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, sob pena de ser considerado abusivo, como no caso em tela.

Ressalte-se que o Código Civil não abriu porta para a estipulação dos juros de mora fora dos limites da lei, pois não teria sentido reduzir a multa moratória de 20% previsto na Lei 4.591/64 para 2% e permitir juros livres, nessa relação jurídica.

O art. 1.336. do Código Civil dispõe sobre a possibilidade de ser prevista a taxa dos juros na convenção, mas dentro das margens legais mínimas e máximas previstas no próprio Código; e por este quando não há previsão assegura-se sua incidência pelo mesmo critério aplicável ao ente público (art. 406); e se a lei não dispuser de modo diverso não poderá exceder 1% ao mês, art. 161, § 1º do CTN, verbis:

“Art. 161. O crédito não integralmente pago no vencimento é acrescido de juros de mora, seja qual for o motivo determinante da falta, sem prejuízo da imposição das penalidades cabíveis e da aplicação de quaisquer medidas de garantia previstas nesta Lei ou em lei tributária.

§ 1º Se a lei não dispuser de modo diverso, os juros de mora são calculados à taxa de um por cento ao mês.”

“Art. 406. Quando os juros moratórios não forem convencionados, ou o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional.”

Pertinente considerar, que os juros moratórios possuem natureza jurídica indenizatória, tem como objetivo evitar que ocorram inadimplências e reparar possíveis danos causados pelo atraso, portanto, não podem ultrapassar um por cento ao mês, sob pena de se incentivar a cobrança de juros abusivos.

Máxime porque o condomínio não é instituição financeira, assim não tem como propósito a exploração econômica, cujo campo de atuação há maior liberdade na fixação dos juros remuneratórios e moratórios, objetivando a obtenção de lucro.

No presente caso, a estipulação de juros de mora no valor de 10% (dez por cento) ao mês é muito superior às principais taxas averiguadas no mercado financeiro e também ao percentual de 1% (um por cento) previsto pelo legislador no § 1º do art. 1.336. do CC para a hipótese de omissão da convenção condominial, verbis:

“O condômino que não pagar a sua contribuição ficará sujeito aos juros moratórios convencionados ou, não sendo previstos, os de um por cento ao mês e multa de até dois por cento sobre o débito.”

A liberalidade para disposição dos encargos em caso de inadimplência não pode ser contrária aos ditames legais, se afigurando abusiva a cobrança de juros de mora no patamar de 10% ao mês.

Neste sentido, trago a colação a r. decisão proferida pelo Desembargador Glênio José Wasserstein Hekman, ao julgar caso semelhante, face aos argumentos consignados:

“Em que pese haja decisões isoladas no STJ quanto a possibilidade de livre deliberação dos condôminos em convenção condominial sobre os juros moratórios incidentes sobre as parcelas vencidas e impagas (CCB, art. 1.336, § 1º), tenho que, no caso concreto, em nome dos princípios da razoabilidade e da harmonia ao sistema jurídico pátrio e do que dispõe o art. 12, § 3º, da lei 4.591/64, é possível a limitação dos juros convencionados em 0,27% ao dia de atraso (8,7% ao mês) ao percentual de 1% ao mês, sob pena de transmudar os juros em dívida de cotas condominiais em juros utilizados por instituições financeiras, sobre os quais não incide limitação. Ressalvo, que é facultado ao Poder Judiciário intervir no condomínio e invalidar, regular e adequar deliberação convencional que submeta o condômino devedor a obrigação excessivamente onerosa.”

(Apelação Cível Nº 70078110723, Vigésima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Glênio José Wasserstein Hekman, Julgado em 08/08/2018) (grifos nossos)

A propósito é o entendimento do STJ:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO RECURSO ESPECIAL. QUOTAS DE CONDOMÍNIO. JUROS MORATÓRIOS. ALEGADA OFENSA AO ART. 535. DO CPC/73. INEXISTÊNCIA. ARTS. 294. E 333, I, DO CPC/73. TESE RECURSAL NÃO PREQUESTIONADA. SÚMULA 211 DO STJ. PERCENTUAL PREVISTO NO ART. 12, § 3º, DA LEI 4.591/64. JURISPRUDÊNCIA DOMINANTE DO STJ. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO.

I. Agravo interno aviado contra decisão publicada em 09.04.2018, que julgara recurso interposto contra decisum publicado na vigência do CPC/73.

II. Na origem, trata-se de Ação Ordinária, ajuizada pela parte agravada em face da União, a fim de cobrar despesas de condomínio, sob o argumento de que o ente público, conquanto por elas responsável, não vem honrando sua obrigação. O acórdão do Tribunal de origem reformou, em parte, a sentença, que julgara procedente o pedido, para, no que pertine à análise do presente recurso, determinar a incidência do percentual de juros previsto no art. 12, § 3º, da Lei 4.591/64.

III. Não há falar, na hipótese, em violação ao art. 535. do CPC/73, porquanto a prestação jurisdicional foi dada na medida da pretensão deduzida, de vez que os votos condutores do acórdão recorrido e do acórdão proferido em sede de Embargos de Declaração apreciaram fundamentadamente, de modo coerente e completo, as questões necessárias à solução da controvérsia, dando-lhes, contudo, solução jurídica diversa da pretendida.

IV. O Recurso Especial é manifestamente inadmissível, por falta de prequestionamento, no que tange à tese recursal relativa aos arts. 294. e 333, I, do CPC/73, pois não foi ela objeto de discussão, nas instâncias ordinárias, sequer implicitamente, razão pela qual não há como afastar o óbice da Súmula 211/STJ. V. Na forma da jurisprudência do STJ, "o § 3º do art. 12. da Lei nº 4.591/1964, que regula especificamente o condomínio em edificações e as incorporações imobiliárias, estipula a incidência de juros de mora de 1% ao mês quando não paga a contribuição no prazo previsto na convenção condominial" (STJ, REsp 1.186.373/MS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, DJe de 14.04.2015). Nesse sentido, em caso análogo: STJ, AgInt no REsp 1.503.652/SP, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, DJe de 10.02.2017. Assim, estando o acórdão recorrido em consonância com a jurisprudência sedimentada nesta Corte, merece ser mantida a decisão ora agravada, em face do disposto no enunciado da Súmula 568 do STJ. VI. Agravo interno improvido.

(AgInt no AREsp 954.517/SP, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, julgado em 06.09.2018, DJe 13.09.2018) (grifos nossos)

E ainda, a taxa de juros moratórios cobrados no patamar de 10% ao mês é maior do que a taxa referencial de juros básicos, fixados pelo Banco Central, ultrapassando o limite máximo fixado para a taxa de juros do empréstimo no Cheque Especial (8%), assim como da taxa mensal de crédito pessoal (6,10%), sendo que o objetivo destas instituições, em essência, é o lucro, ao contrário do condomínio.

Não é razoável e nem proporcional que, em decorrência da aplicação de taxa de juros abusiva, o débito condominial de pouco mais de xxxx reais tenha se transformando em uma monstruosa dívida superior a xxxx reais , o que representa o valor do imóvel.

Ressalte-se ainda que a liberalidade atribuída ao Condomínio para disposição dos encargos em caso de inadimplência em sua convenção não é absoluta, ela deve ser contida pelos princípios gerais do direito, sobretudo pela proteção do direito à moradia.

Conforme anteriormente disposto, o próprio Código Civil, ao limitar os juros a 1%, quando não estabelecido de modo diverso pela Convenção, impôs parâmetro de razoabilidade a ser considerado na aferição da abusividade. Outra baliza a ser considerada é a taxa estipulada para a correção de impostos devidos à Fazenda.

A taxa de 10% de juros ao mês fere os princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e se caracteriza como abuso e enriquecimento sem causa, pois em nenhuma aplicação financeira o Condomínio obteria tal taxa de remuneração, caso tivesse o recurso aplicado.

O colendo Superior Tribunal de Justiça encerrou seu posicionamento no REsp paradigma sem estabelecer um teto máximo aos juros convencionais , se restringindo apenas em dizer que é possível sua fixação acima de 1% ao mês, sem definir o limite a ser observado de modo a por cobro aos juros extorsivos ou à prática de abuso pelos condomínios, mesmo em tempos de dificuldades econômicas generalizadas por crises de toda ordem.

O Poder Judiciário, observando os princípios que norteiam o sistema jurídico pátrio, pode modular aquilo que foi convencionado, decotando possíveis excessos e adequando ou mitigando as regras convencionais a patamares juridicamente aceitáveis ante princípios éticos e morais que sustentam todo o arcabouço jurídico da razoabilidade , a fim de não incutir ao condômino momentaneamente privado de recursos, ônus excessivo e ou invencível, mormente o caráter propter rem da obrigação inadimplida. Assim, verificado o excesso no pactuado, há que se impor a necessária adequação.

A parte Autora, fugindo aos padrões dos juros moratórios simples, geralmente praticados fora do mercado bancário na casa de 1% a. m, realiza a cobrança de vultosos juros moratórios de 10% a. m., que extrapola toda razoabilidade e proporcionalidade ética e moral que limita os mesmos juros nas relações econômicas típicas.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

Desse modo, sopesando os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, é de ser revisto os juros moratórios em 1% (um por cento) ao mês para não desvirtuar sua natureza de caráter indenizatório, pois a estrutura de um condomínio edilício não tem propósito de exploração econômica (não objetiva a obtenção de lucro, o que ocorreria caso fosse mantido os juros convencionados), como medida de justiça.


RECONVENÇÃO

Conforme prevê o art. 343. do CPC, na contestação, é lícito ao réu propor reconvenção para manifestar pretensão própria, conexa com a ação principal ou com o fundamento da defesa.

Diante dos motivos acima elencados requer que seja revista a xxxxx constante na convenção de condomínio, na qual prevê a aplicação de juros de mora no patamar de 10% ao mês, reduzindo seu percentual para 1% ao mês, por todo o exposto.


DO PEDIDO

Requer a V.Exa. :

Preliminarmente, que seja deferido os benefícios da justiça gratuita a Ré.

a) A revisão da cláusula xxxxx constante na convenção de condomínio, na qual prevê a aplicação de juros de mora no patamar de 10% ao mês, reduzindo seu percentual para 1% ao mês, tendo em vista a abusividade dos juros cobrados.

b) Requer que seja julgado improcedente o pedido formulado na inicial referente aos juros moratórios no patamar de 10% ao mês.

c) Requer que seja julgado improcedente o pedido de honorários advocatícios aplicados na base de 10% vez que não consta na convenção de condomínio cláusula permissiva para esta cobrança.

d) Esclarece que a parte Ré concorda com a atualização monetária do valor segundo os índices do TJRJ, assim como a aplicação da multa no patamar de 2%.

e) Requer que seja declarado como valor devido para pagamento das cotas condominiais, referente ao período de xxxxxxxx, o valor de xxxxxxxxxxx, conforme laudo pericial anexo – onde foi aplicado juros de 1% ao mês , atualização monetária segundo os índices do TJRJ e multa de 2%.

f) Requer que seja determinada a aplicação dos juros no patamar de 1% ao mês, atualização monetária segundo os índices do TJRJ e multa de 2% às parcelas subsequentes, que se vencerem no curso do processo.

g) Esclarece que não tem interesse na audiência de conciliação do artigo 334 do CPC.

h) Protesta provar o alegado por todos os meios de prova legalmente previstos.

i) Requer que o Condomínio Autor seja condenado ao pagamento de eventuais custas e honorários advocatícios de sucumbência.

Requer que todas as publicações, notificações e intimações atinentes ao processo sejam expedidas em nome da Dra. xxxxxxxxx, com escritório nesta cidade sito xxxxxxxx.

Dá-se à causa o valor de R$ xxxxxx

Nestes termos,

Pede deferimento e juntada.

Data.

ASSINAR

Sobre a autora
Andrea Vieira

Andrea Vieira advoga há mais de 23 anos na área cível, prestando serviço jurídico de alta qualidade, com resultados expressivos em seus casos e atendimento humanizado, proporcionando uma experiência personalizada para cada novo cliente do escritório. Em constante busca pelo aprimoramento na profissão, encontra-se na mídia com diversos artigos publicados, além de E-books voltados para advogados iniciantes, os quais ensinam a prática jurídica. Nosso endereço eletrônico https://www.avadvocaciarj.com.br/

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos