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[Modelo] Recurso contra multa por dirigir usando telefone celular

15/04/2021 às 13:02
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Recurso contra multa de trânsito por uso de celular enquanto dirigia. Falta de abordagem do condutor e violação dos princípios do devido processo legal e da ampla defesa.

ILUSTRÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE DA JUNTA ADMINISTRATIVA DE RECURSO DE INFRAÇÕES DE TRÂNSITO – JARI DA PREFEITURA MUNICIPAL DE SANTA CRUZ DO SUL-RS.

Notificado:

Proprietário: XXXXXXXXXXXXXXX

CPF: XXXXXXXXXXX

Veículo: XXXXXXXXXXXX

Placa: XXXXXXXXXXXXXXX

Infração:

Local da infração: XXXXXXXXXXXXXXXX

Nº Auto de Infração: XXXXXXXXXXXXX


Da qualificação

Eu, FULANA DE TAL, CPF nº XXXXXXXXXX, residente e domiciliada na XXXXXXXXXXX, CIDADE, venho respeitosamente à presença de Vossa Senhoria, com fundamento na Lei nº 9.503/97, interpor o presente recurso contra a aplicação de penalidade por suposta infração de trânsito, conforme notificação anexa, o que faz da seguinte forma.


Dos Fatos

Consta no auto de infração que o veículo QUALIFICAÇÃO VEÍCULO, na data de 20/10/2015, na LOCAL DA MULTA, às HORÁRIO DA MULTA, estava em via pública e o condutor estava utilizando telefone celular.

A começar a motorista e dona do automóvel em questão é funcionária de um Escritório Contábil, realizando SOMENTE serviço interno e no horário mencionado, estaria em meio ao expediente de trabalho.

Ademais, o presente auto de infração, é insubsistente e precisa/deve ser julgado inconsistente e irregular por Vossa Senhoria, tendo em vista o que se explana:

Segundo parecer do DENATRAN, existe a necessidade da abordagem do condutor para se lavrar o auto de infração - a fim de se comprovar realmente se o "infrator" encontrava-se dirigindo utilizando-se de telefone celular, pois o simples fato de se pegar o telefone celular não configura a infração tipificada pelo art. 252, VI - ademais se não há abordagem do infrator - não há como a autoridade verificar se o "infrator" estava ou não falando ao telefone celular, pois esta é, a finalidade do telefone.

Insurge-se um pseudo-sistema baseado em ficção fática - não devendo tal presunção prosperar.

Para que fosse consistente e valido, tal auto de infração deveria o condutor ter sido parado, autuado em flagrante, sob pena de ofensa aos Princípios do Devido Processo Legal e da Ampla Defesa.

É sabido por todos que a conduta dos fiscais de trânsito de Santa Cruz do Sul deixa a desejar, pois são infundadas pois, somente na existência de BLITZ existe o flagrante. Porém não é o que acontece, sendo que, diariamente são aplicadas supostas multas sem o motorista ao menos saber, pois quase nunca são parados.

Isso se distancia muito do caráter educativo de aplicação de multas.

Para ser educativo o motorista precisa ser devidamente parado, advertido verbalmente E MULTADO se necessário, mas assim como é feito, se trata de caráter punitivo e de abuso de poder.

O subjetivismo dessa multa é tão grande que chega a inverter o ônus da prova, sabidamente inserido no artigo 333 do Código Processo Civil, sob a falaciosa ideia de que o agente da autoridade, no caso, tem fé pública.

Aceitar-se que um simples agente municipal de trânsito tem em seu ato de multar a presunção da verdade absoluta, é querer minimizar, fragilizar os direitos e garantias dos cidadãos que trafegam com seus carros pelas avenidas da cidade. O condutor fica à mercê dos humores, amores e desamores de um agente da autoridade, cuja caneta vai fazendo vários reféns nas armadilhas orquestradas pela administração pública.

A multa aplicada pelo uso do telefone celular chega à casa dos cidadãos numa total surpresa que não raro o condutor se questiona de como alguém pode afirmar que estava neste dia, hora e local falando no celular? Por que o agente não fez o condutor parar e assinar a multa? Então começa um verdadeiro processo Kafkiano[1]. Um agente que não se sabe quando e onde viu, ou parece que viu o motorista dirigindo e usando o celular. Se o carro estava parado, então o motorista poderia usar o celular. Não pode fazê-lo quando em movimento. Neste caso, uma centena de fatos podem gerar o gesto de o motorista levar a mão próximo do ouvido. Ainda que pareça pueril o argumento, o movimento pode ser fruto de um breve mal estar, como uma coceira no ouvido, ou um aparelho auditivo que esteja saindo do lugar ou, mesmo, o cordão dos óculos que se desprendeu. Qualquer insignificante caso fortuito.

A autuação em flagrante faz-se imprescindível, pois trata-se de infração de difícil constatação, cuja verificação à desistência pela autoridade de trânsito claramente poderá dar margem a inúmeros equívocos e injustiças. Isto porque quaisquer elementos que possam ter levado a autoridade de trânsito a entender infringido o artigo 252, VI seriam vestígios como o fato do condutor estar aparentemente falando sozinho no carro ou encontrar-se com a mão próxima ao ouvido, fatos insuficientes para formarem uma convicção.

Ora, é vedado à Administração Pública lavrar auto de infração ou cominar penas e multas com base em meras suposições ou "desconfianças", circunstância agravada ainda pelo fato de ser de extrema dificuldade ou até impossível, a produção de prova em contrário pelo condutor. Devido a tal dificuldade o ônus da prova é invertido, como determina a lei processual pátria, cabendo à autoridade autuadora a obrigação de provar o cometimento indubitável da infração antes de cominar a pena.

O que, em conclusão, importa é que o agente, ao seu talante, multa, do cume da sua "fé pública". E o dano que esse gesto é capaz de causar não se limita, apenas, à esfera financeira, mas acrescenta quatro pontos na CNH.

Quando se vive num Estado Democrático, exercitar a cidadania faz parte do processo. Não se pode virar as costas às injustiças, aos engodos. Tem-se que se insurgir contra esses impositores. Aceitar como verdadeira uma multa aplicada ao arbítrio de um agente-fiscal de trânsito, é a mais absoluta manifestação de conformismo e desrespeito à inteligência.

Na esfera da legislação do trânsito, as arbitrariedades não se limitam, apenas, ao plano material, mas, especialmente, ao formal. Atente-se: multado o motorista pode exercer o direito de recorrer. Ocorre que esse recurso será analisado por uma junta do Município, formada por três membros. Indisfarçável que está presente a figura de o algoz travestido de seu próprio juiz. A Prefeitura indica seus agentes capazes de multar, beneficia-se com o valor da multa e, ainda, tem o poder de julgar o ato dos seus próprios prepostos. Na medida em que o órgão julgador dá provimento ao recurso, está reconhecendo que mal elegeu seu representante (culpa in eligendo) e, portanto, mal administra. Por isso, como regra, os recursos são indeferidos sob insólitas argumentações.

Ainda é oportuno ressaltar um fato da maior relevância: o que diz respeito à prova. A simples alegação, como já visto, não significa prova. Está sob exame, agora, a aplicação de multa sob a alegação de que o motorista usava, dirigindo, o telefone celular. De um lado, o agente afirmando; de outro, o motorista, se for o caso, negando. Sabidamente, como ensina basilar princípio de lógica material, ninguém pode provar o nada. Em se tratando de prova, a analogia com o Processo Penal é evidente. Para elucidar, de maneira objetiva e incontestável, a necessidade da existência de prova a respeito de um fato alegado contra alguém, são oportunos os ensinamentos de ARANHA 1987, p.9)[2], quando disserta sobre a Divisão do Ônus Probatório:

A respeito da teoria do ônus da prova encontramos várias doutrinas, desde os romanos, com as máximas de Ulpiano (reus in exceptione actor est) e Paulo (ei incubit probatio qui dicet, non qui negat), até hoje, com os excelentes ensinamentos de Bentham (a prova incumbe a quem pode satisfazê-la), Weber (a prova incumbe a quem pleiteia um direito ou uma liberação, em relação a fatos ainda incertos), Fitting (quem pleiteia um direito em juízo deve alegar e provar os fatos que o produzem, isto é, os pressupostos da norma-regra, devendo os outros fatos, pressupostos da norma-exceção, ser provados pelo adversário), Gianturco (deve provar quem auferir uma vantagem, etc..

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A legislação do trânsito não atropela, apenas, os princípios processuais pertinentes, mas a própria Constituição Federal, quando fala da presunção da inocência:

Art. 5º. LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito da sentença penal condenatória.

Ressalte-se que a aplicação de uma multa nada mais significa do que a prática de um ato administrativo. E este, para sua concretização plena, necessita preencher requisitos indispensáveis. No entendimento de ABREU (1998, p. 124)[3] “a simples menção do dispositivo legal não basta para caracterizá-la, porque a infração é um fato, com suas circunstâncias ou elementos constitutivos”.

A autoridade de trânsito deve ter em mente que a finalidade primeira do novo CTN não é a sanção, a punição, mas, conforme dispõe o Art. 5º, Capítulo II, do diploma legal referido:

I- estabelecer diretrizes da política nacional de trânsito, com vistas à segurança, à fluidez, ao conforto, à defesa ambiental e à educação para o trânsito, e fiscalizar seu cumprimento.

Nesse sentir, entende-se que a nova legislação está preocupada com a educação e a prevenção. Se é esse o objetivo da lei, nada mais natural que o agente - que é o instrumento para que ela se concretize - aplique suas regras no intento de prevenir e educar o cidadão, de forma preferencial. Caso contrário, estará desvirtuada a própria aplicação da Lei. Não pode a Administração Pública fazer das multas um meio de encher as burras do erário.

Enfocando um brocardo latino, pode-se dizer que allegatio et non probatio, quasi non allegatio. Naturalmente, que aquilo que se alega se não se pode provar, sequer pode ser considerada uma simples alegação. Logo, não há prova concreta de que o motorista estaria dirigindo e usando o celular. Há só uma presunção.

Para finalizar, chega-se ao entendimento de que a multa aplicada pelo uso do telefone celular, quando não preenchidas as formalidades para validade do ato, deverá ser considerada insubsistente, conforme preceitua o art. 281, parágrafo único, I do CTB. Deve ser arquivada.


DO DIREITO

O Código Nacional de Trânsito em seu artigo 280, § 2º preceitua:

Art. 280. Ocorrendo infração prevista na legislação de trânsito, lavrar-se-á auto de infração, do qual constará:

§ 2º. A infração deverá ser comprovada por declaração da autoridade ou do agente da autoridade de trânsito, por aparelho eletrônico ou por equipamento audiovisual, reações químicas ou qualquer outro meio tecnologicamente disponível, previamente regulamentado pelo CONTRAN. (grifo nosso)

A interpretação do artigo 280 é clara, a prova da infração de trânsito é a declaração do agente público, que deve estar presente nos autos, esta comprova que o fato ocorreu da forma descrita na conduta típica.

Porém, na própria notificação da autuação está em branco o requisito de equipamento utilizado. O que torna o auto nulo.


DOS PEDIDOS

Diante do exposto, e considerando que a Requerente não cometeu a mencionada infração, requer-se: a) seja declarado inconsistente e irregular o Auto de Infração nº 901525615666, dando-se provimento a presente DEFESA; b) seja eximido o Requerente do recolhimento do valor correspondente, bem como do acréscimo de pontuação; c) seja identificado o oficial de trânsito responsável pela lavratura do auto de infração. D) Requer a produção de provas em direito admitidos, especialmente a intimação pessoal dos agentes de trânsito municipais, responsáveis pela autuação.

Termos em que,

Pede deferimento.

Santa Cruz do Sul-RS, 23 de Novembro de 2015.

nome recorrente
CPF nº xxxxxxxxxxxxxxxx


NOTAS

[1] Processo em que o réu não sabe por quê, ou de quê, está sendo acusado.

[2] ADALBERTO JOSÉ Q. T. DE CAMARGO ARANHA (Da Prova no Processo Penal, Saraiva, 1987, p.9)

[3] WALDIR DE ABREU (Código de Trânsito Brasileiro, Saraiva, 1998, p. 124)-

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