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Quem é essa mulher?

De Antígona a Zuzu Angel

Agenda 08/07/2007 às 00:00

Tu o compreendeste. A tua lei não é a lei dos deuses; apenas o capricho ocasional de um homem. Não acredito que tua proclamação tenha tal força que possa substituir as leis não escritas dos costumes e os estatutos infalíveis dos deuses. Porque essas não são leis de hoje, nem de ontem, mas de todos os tempos: ninguém sabe quando apareceram. (Antígona de Sófocles)

Desacato é impedir o direito sagrado de uma mãe enterrar seu filho (Zuzu Angel)

No primeiro trecho em destaque, Antígona se rebela contra a ordem de um rei tirano, Creonte. Invoca o direito natural, tido como aquele que "independe de qualquer legislador é destinado a satisfazer exigências naturais do homem" (Paulo Dourado de Gusmão), em oposição ao direito positivo, posto e imposto pelo Estado.

O referido diploma legal (direito positivo) proibia celebração fúnebre em honra de Polinicies, tendo em vista que ele, embora tivesse morrido em batalha, tinha lutado contra Tebas, cidade governada pelo Rei Creonte, em defesa de Argos. Antígona, então, infringe o decreto de Creonte, por entender que há uma lei divina, universal, que transcende o poder de um soberano, e oferece ao irmão morto as cerimônias fúnebres tradicionais (direito natural). Antígona invoca o direito natural para que o irmão tivesse um enterro digno de um ser humano.

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"Um Rei mal coroado não queria o amor em seu reinado (...) [01]", mas mesmo assim Antígona se rebela, em nome do amor e da dignidade da pessoa humana. Importante é destacar que a obra de Sófocles foi escrita há mais de 2.500 anos. Neste sentido, a luta de Antígona ultrapassa a seara religiosa, pois para os gregos o direito de ser enterrado era tido como sagrado, e alcança o plano político, sendo ela um exemplo de insubordinação civil. Como poderia uma mulher ousar em expressar seus pensamentos em alta voz, sem ser taxada de arrogante? Se ainda hoje a luta pela emancipação da mulher é tarefa árdua, imagine no tempo de Antígona.

Zuzu Angel, assim como Antígona, também se rebela. Em épocas diferentes sim, mas em um contexto bem parecido. Antígona contra o tirano Creonte, Zuzu contra a tirania da ditadura. Antígona pelo o direito de enterrar seu irmão, Zuzu pelo direito de enterrar seu filho. Ambas invocam o "direito sagrado", o direito natural, aquele que é anterior e superior ao direito posto pelo Estado. As duas mulheres fortes, destemidas. Tanto Antígona quanto Zuzu pagaram alto preço pela sua rebeldia, pagaram com a própria vida. Por desrespeitar a ordem do déspota (direito positivo), Antígona é presa e conduzida a uma caverna, que lhe servirá também de túmulo ainda em vida. E Zuzu morre "acidentalmente" em um túnel na cidade do Rio de Janeiro, túnel que hoje leva o seu nome.

Até quando terão as mulheres que lutar contra a tirania? Até quando houver tirania. Enquanto isso, Antigonas, Zuzus, as mães da praça de maio, Marias (Madalenas ou não), lutarão a favor da vida e do amor, que em um sentido amplo significa o direito de ser livre.


Nota

01 Canção da Despedida. Letra: Geraldo Vandré

Sobre a autora
Wanise Cabral Silva

professora universitária em Vitória (ES), doutora em Direito, pesquisadora da FAPES, UFES e CNPq

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Wanise Cabral. Quem é essa mulher?: De Antígona a Zuzu Angel. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1467, 8 jul. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10125. Acesso em: 7 nov. 2024.

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