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Dissonância cognitiva e o juiz de garantias

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5.Conclusão.

Ante o exposto, faz-se notória a importância, para o aperfeiçoamento da jurisdição penal brasileira, do advento de um instituto processual penal na configuração do juiz de garantias, que é capaz de atacar, de forma direta, um problema gravíssimo do sistema processual penal brasileiro, qual seja, a polivalência do magistrado no sentido de que, a ele, é atribuída a competência para conduzir a fase investigatória (com base no critério da prevenção, ao qual dedicamos um tópico do trabalho) e a fase processual.

A ausência de uma figura como o juiz de garantias, que atua exclusivamente na fase pré-processual, culmina em aberrações processuais, como se dá no exemplo do juiz que é responsável, concomitantemente, por conduzir uma audiência de custódia (e, ao final dela, decidir, eventualmente, pela decretação de uma prisão preventiva, caso presentes os requisitos desta) e por proferir uma sentença ao final do processo, condenando ou absolvendo um réu.

O problema de “aberrações” como a supracitada é o conflito cognitivo que decorre dessa conjuntura, o qual é muito bem explicado pela Teoria da Dissonância Cognitiva, desenvolvida por Leon Festinger, que explana, com maestria, acerca da dissonância existente entre cognições referentes a uma mesma situação, o que acarreta, no processo cognitivo de um indivíduo, um “movimento” para que a dissonância se reduza e a pessoa encontre um estado de coerência.

A dissonância se faz presente, no âmbito do exercício jurisdicional, quando, por exemplo, um juiz decide por uma prisão cautelar na fase investigatória, medida que ele teve que embasar a partir de um juízo de valor sobre o agente supostamente criminoso e as condutas supostamente delituosas imputadas a ele. A partir desse juízo de valor feito para adotar medida restritiva do direito de liberdade do imputado, cada elemento de prova dissonante com relação aquilo que o magistrado considerou para editar aquela decisão acarretará, ao magistrado, uma situação cognitiva desconfortável, a qual ele tentará atenuar, a partir do desprezo das cognições dissonantes e da supervalorização das consonantes.

Em razão da dissonância cognitiva, portanto, a existência de um juiz para a fase investigatória (no caso, o juiz de garantias) diferente do juiz que conduz a fase processual e profere sentença é imprescindível, uma vez que, com o juiz de garantias, se retira da fase processual o juiz prevento, já contaminado por preconcepções que formulara quando da emissão de ato decisório na fase investigatória, fase em que impera uma dinâmica inquisitória, de contraditório precário.

Por derradeiro, vale ressaltar que a busca pelo aprimoramento da jurisdição penal deve ser incessante, de maneira que sempre se almeje a observância dos princípios inferidos de um Estado Democrático de Direito. A Lei 13.964/2019, com a inauguração do juiz de garantias, trouxe, indubitavelmente, um avanço para o sistema processual penal brasileiro, que, agora, poderá ter fortalecido o seu viés acusatório, sobretudo no sentido de proporcionar, mais do que uma jurisdição imparcial, uma jurisdição que aparente ser imparcial perante os jurisdicionados, isto é, perante os cidadãos brasileiros.


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Sobre os autores
Luiza dos Santos Nicetto

Advogada, graduada em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e pós graduada em Direito e Processo Penal pela FADEG. Atualmente, atuando como Paralegal.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

NICETTO, Luiza Santos; RECCO, Isabella Beatriz Benetasso et al. Dissonância cognitiva e o juiz de garantias. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 27, n. 7097, 6 dez. 2022. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/101274. Acesso em: 23 dez. 2024.

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