Resumo: Este artigo discute acerca do Benefício de Prestação Continuada realizando uma breve pesquisa bibliográfica dos principais pontos históricos, suas características sociais, as transformações e inovações que permeiam a instituição até os dias de hoje. O Benefício é um marco no Brasil por sua natureza não contributiva, garantida como direito, regulamentada pela Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), beneficiando a população socialmente desfavorecida, conferindo proteção ao idoso a partir de sessenta e cinco (65 anos) As pessoas com deficiência que comprovem não ter condições de suprir suas necessidades básicas ou de tê-las providas por seus familiares, implementam esse acompanhamento de proteção por meio do fornecimento de um salário mínimo aos beneficiários, bem como assistência social, voltada para o enfrentamento da vulnerabilidade social.
Palavras-chave: Política de Assistência Social, Benefício de Prestação Continuada e Lei Orgânica da Assistência Social.
Introdução
O Benefício de Prestação Continuada (BPC) é um direito constitucional regulado pela Lei das Organizações de Assistência Social (LOAS) e pelos Decretos 6.214/2007 e 6.564/2008. Destina-se às pessoas idosas com 65 anos ou mais e às pessoas com deficiência incapacitadas para a vida independente e para o trabalho, ambas tendo a renda familiar per capita é inferior a 1/4 do salário mínimo. Em 2021, o BPC foi concedido a 4,65 milhões de beneficiários, sendo 2,55 milhões de pessoas com deficiência e 2 milhões de idosos, num investimento de R$ 5,1 bilhões por mês.
Este trabalho visa refletir sobre os direitos do BPC. Nele, tentamos compreender a formação, retirada e extensão deste direito. Nele temos a seguinte questão: Como a conceituação e a compreensão desse direito se relacionam com sua efetivação?
Partimos da hipótese de que o conceito de BPC como uma categoria histórica. Está intrinsecamente ligado à concretização e concretização deste direito. Para tratar disso, analisaremos os direitos do BPC em seu arcabouço legal (constituição) 88, LOAS, PNAS 2004, NOB-SUAS e Decretos 1744/1995 e 6214/2007). Iniciaremos o estudo com a apresentação de elementos históricos e conceituais. Em seguida, mostraremos a evolução normativa do beneficial, por fim, serão expostas à conclusão.
REFERENCIAL HISTÓRICO
O Benefício de Prestação Continuada (BPC) foi garantido em 1988 pela promulgação da Constituição Federal, regulamentada pela Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, a Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), sendo um salário mínimos garantidos para idosos com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais e pessoas com deficiência. O reque sito da idade foi ratificada pelo Estatuto do Idoso - Lei n° 10.741/03 -, que em seu artigo 34 prevê:
Art. 34. Aos idosos, a partir de 65 (sessenta e cinco) anos, que não possuam meios para prover sua subsistência, nem de tê-la provida por sua família, é assegurado o benefício mensal de 1 (um) salário mínimo, nos termos da Lei Orgânica da Assistência Social – Loas.
Parágrafo único. O benefício já concedido a qualquer membro da família nos termos do caput não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a Loas.
Primeiramente, a LOAS definiu família como a unidade mononuclear, vivendo sob o mesmo teto, cuja economia é mantida por seus integrantes. Posteriormente, a Medida Provisória n° 1.599-38, de 11.11.1997, alterou o conceito de família, passando a designá-la como o conjunto de pessoas arrolada no artigo 16, da Lei n° 8.213/91, que trata dos dependentes para fins previdenciários.
É importante esclarecer que o BPC foi conquistado na década de 1980, durante o período de redemocratização do país, durante as muitas lutas e participação dos movimen-tos sociais, quando foi possível a consolidação dos direitos sociais, marcando a participação intensificada, que também é determinado pelo intenso processo de ditadura militar.
Na Constituição Federal, no seu artigo 194. A assistência social é incorporada ao tripé da seguridade social, a qual “compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social”.
Anterior ao BPC não existia outro benefício não contributivo para a população, muito menos um trabalho socioassistencial, abraçando uma política de garantia de Renda. Antes da Constituição de 1988, apenas a previdência social assegurava amparo ao cidadão, onde apresentava beneficio com características contributivas que exigiam a filiação ao regime previdenciário, por exemplo, o Renda Mensal Vitalícia (RMV) que foi criado em 1974, regulamentado pela Lei nº 6.179/1974 como benefício previdenciário destinado às pessoas “maiores de 70 (setenta) anos".
O BPC REMETE AO CONCEITO ASSISTENCIAL.
O BPC foi um divisor de águas para o Brasil no enfrentamento da pobreza extrema e da miséria, porque é um direito importante de transferência de renda, elementos não contributivos nas políticas de assistência social, e não só, mas também representa um elo para a provisão de serviços de assistência social.
No Manual de Orientação do Ministério do Desenvolvimento Social de 2005 diz:
Este Benefício Assistencial foi regulamentado pela Lei n.º 8.742 - Lei Orgânica da Assistência Social/LOAS, de 07/12/1993, com alterações das Leis n.º 9.720/1998 e n.º 10.741/2003 e pelo Decreto n.º 1.744/1995, tendo entrado em vigor em 01/01/1996. A partir de uma nova concepção da Política Nacional de Assistência Social – PNAS na perspectiva do Sistema Único de Assistência Social - SUAS, em 2004, o Benefício de Prestação Continuada - BPC passou a constituir parte integrante da Proteção Social Básica.
A Constituição Federal de 1988 no seu art. 203 esclarece as garantias do BPC, sendo expresso:
Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independente-mente de contribuição à Seguridade Social, e tem por objetivos:
V – a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa com deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
A LOAS regulamentou em 1993 no art. 203, que oferece garantias aos usuários dos benefícios, reforça sua notoriedade na transferência de renda, descreve-o como um programa de assistência social, e o documento BOLETIM, BPC, 2015 traz a importância do acompanhamento das famílias beneficiárias:
A atenção aos beneficiários do BPC nos serviços socioassistenciais visa a garantia de direitos, o desenvolvimento de mecanismos para a inclusão social de acordo com as barreiras identificadas, a equiparação de oportunidades e a participa-ção e o desenvolvimento da autonomia das pessoas com deficiência e pessoas idosas, consideradas suas necessidades e potencialidades individuais e sociais, prevenindo situações de risco, a exclusão e o isolamento. Contribui ainda com a promoção do acesso dos beneficiários aos serviços de outras políticas públicas. A oferta de serviços socioassistenciais e execução de ações articuladas da Assis-tência Social com outras políticas com foco nos beneficiários do BPC no âmbito municipal é fundamental para ampliar a proteção social das pessoas idosas, das pessoas com deficiência e suas famílias.
Conforme a LOAS (Lei nº 8.742/1993), com redação dada pela Lei nº 12.435, de 6 de julho de 2011, o conjunto de serviços e ações da Assistência Social organiza-se considerando dois tipos de proteções: Proteção Social Básica e a Proteção Social Especial de média e alta complexidade.
Figura 1 – Pirâmide de proteção Social
Fonte: SUAS 2011
COMPETÊNCIAS DOS ÓRGÃOS MUNICIPAIS DA POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL
Centro de Referência de Assistência Social (Cras) é a porta de entrada da Assistên-cia Social. É um local público, localizado prioritariamente em áreas de maior vulnerabilidade social, onde são oferecidos os serviços de Assistência Social, visando fortalecer a convi-vência com a família e com a comunidade.. O documento Boletim BPC, 2015 salienta a importância do CRAS neste processo:
A participação do CRAS é fundamental como porta de entrada dos requerentes do benefício, por meio de orientações, identificação de potenciais beneficiários e encaminhamentos. Além disso, é assegurada a oferta prioritária de serviços socioassistenciais para os beneficiários do BPC e suas famílias, especialmente as que apresentam maior vulnerabilidade e risco social.
Figura 2 – Funcionalidade do CRAS
Fonte: Boletim BPC 2015
A inscrição no Cadastro Único é requisito obrigatório para a concessão do BPC. O cadastramento deve ser realizado no CRAS antes do requerimento do benefício aos canais de atendimento do INSS.
Assim, é importante ressaltar que o benefício de prestação continuada é uma ação do Estado voltada para a garantia e ampliação, coordenado pela Assistência Social, sendo o estruturador de proteção aos usuários contemplados proporcionando acesso aos bens e serviços públicos, oportunizando condições de superação das desvantagens sociais.
Vinculação do Benefício ao Salário Mínimo e Elevação da Despesa
As Principais causas da elevação da despesa é a política permanente de valorização do salário mínimo com reajustes acima da inflação, acompanhando o crecimento do PIB (Produto Interno Bruto) desde 2005 e consolidado com a Lei nº 12.382, de 25 de fevereiro de 2011. No período de 2004 a 2022 o salário mínimo variou de R$ 260,00 aos atuais R$ 1.212,00 como mostra tabela abaixo.
Tabela 1 – Variação Salário Mínimo
Ano |
Salário Mínimo |
Previsão Legal |
Percentual de Aumento |
2004 |
R$260 |
Lei 10.888/2004 |
8,33% |
2005 |
R$300 |
Lei 11.164/2005 |
15,38% |
2006 |
R$350 |
Lei 11.321/2006 |
16,67% |
2007 |
R$380 |
Lei 11.498/2007 |
8,57% |
2008 |
R$415 |
Lei 11.709/2008 |
9,21% |
2009 |
R$465 |
Lei 11.944/2009 |
12,05% |
2010 |
R$510 |
Lei 12.255/2010 |
5,88% |
2011 |
R$545 |
Lei 12.382/2011 |
0,93% |
2012 |
R$622 |
Decreto 7.655/2011 |
14,13% |
2013 |
R$678 |
Decreto 7.872/2012 |
9,00% |
2014 |
R$724 |
Decreto 8.166/2013 |
6,78% |
2015 |
R$788 |
Decreto 8.381/2014 |
8,84% |
2016 |
R$880 |
Decreto 8.618/2015 |
11,68% |
2017 |
R$937 |
Decreto 8.948/2016 |
6,48% |
2018 |
R$954 |
Decreto 9.255/2017 |
1,81% |
2019 |
R$ 998 |
Decreto 9.661/2019 |
4,61% |
2020 |
R$ 1.045 |
Lei 14.013/2020 |
4,11% |
2021 |
R$ 1.100 |
Lei 14.158/2021 |
5,26% |
2022 |
R$ 1.212 |
MP 1091/2021 |
10,18% |
Fonte: Elaboração feita pelo autor do artigo com dados do Ministério da Economia.
A política de valorização do salário mínimo imputou ganhos reais consideráveis ao valor da remuneração fixada em 2004. Isso Impactou o crescimento do orçamento da assistência social de forma contundente. Com os valores atuais e a cobertura crescente de benefícios, o vínculo com o salário mínimo é uma das principais causas da explosão de gastos do BPC e põe em xeque sua implementação, devido à estreita relação entre benefícios previdenciários e benefícios sociais.
Os dados apresentados mostram que se o benefício do BPC estivesse desvinculado do valor do salário mínimo antes da implementação da política de valorização real do salário mínimo em 2005, o gasto do BPC hoje, seriam cerca de 30 bilhões a menos.
Apesar das disposições constitucionais, a experiência internacional mostra que Os benefícios assistenciais vinculados ao salário mínimo, não é nada comum entre os países dá OCDE.
Figura 3 – Benefício ao Idoso - % do Salário Mínimo
Fonte: OCDE e PensionWatch 2013
DESPESA DA UNIÃO COM O BPC
O gasto com o benefício foi de R$ 69,2 bilhões em 2020, a preços de setembro de 2021. Com exceção dos gastos relacionados à pandemia da Covid19, o BPC foi a terceira maior despesa primária da União em 2021, atrás apenas do gasto previdenciário e do gasto com pessoal ativo.
Tabela 2 – Evolução dos recursos destinados ao BPC – Brasil - 1996 a 2020
ANO |
RECURSO |
% CRESCIMENTO |
1996/12 |
172.342.940,37 |
|
1997/12 |
769.732.677,82 |
77,61% |
1998/12 |
1.134.199.299,43 |
32,13% |
1999/12 |
1.533.122.423,04 |
26,02% |
2000/12 |
2.001.468.218,92 |
23,40% |
2001/12 |
2.694.021.511,93 |
25,71% |
2002/12 |
3.428.100.224,72 |
21,41% |
2003/12 |
4.533.221.507,66 |
24,38% |
2004/12 |
5.814.283.013,95 |
22,03% |
2005/12 |
7.523.861.446,78 |
22,72% |
2006/12 |
9.718.787.585,46 |
22,58% |
2007/12 |
11.548.344.928,11 |
15,84% |
2008/12 |
13.785.788.689,03 |
16,23% |
2009/12 |
16.859.412.616,03 |
18,23% |
2010/12 |
20.104.033.027,29 |
16,14% |
2011/12 |
22.854.838.824,09 |
12,04% |
2012/12 |
27.434.934.652,87 |
16,69% |
2013/12 |
31.412.336.945,35 |
12,66% |
2014/12 |
35.141.429.410,52 |
10,61% |
2015/12 |
39.645.792.847,52 |
11,36% |
2016/12 |
45.637.596.914,59 |
13,13% |
2017/12 |
50.292.415.808,16 |
9,26% |
2018/12 |
52.583.300.326,70 |
4,36% |
2019/12 |
55.525.469.399,81 |
5,30% |
2020/12 |
69.220.042.200,07 |
19,1% |
Fontes: Dados do Ministério da Cidadania