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Responsabilidade solidária em matéria tributária

Agenda 18/03/2023 às 12:00

A lei não pode tornar responsável solidário pelo tributo uma pessoa alheia à situação configuradora do fato gerador.

A responsabilidade solidária em matéria tributária difere um pouco da do direito comum.

Não estando essa questão inserida no âmbito da definição de competência tributária, não tem aplicação a regra do art. 110 do CTN, que vincula os institutos e conceitos de direito privado na seara do direito tributário.

Nos termos do art. 124 do CTN: 

“São solidariamente obrigadas:

I - as pessoas que tenham interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação principal;

II - as pessoas expressamente designadas por lei.”               

Na interpretação do inciso I é muito comum confundir o interesse comum na exploração de determinada atividade econômica, que existe entre empresas coligadas, com o interesse comum na situação jurídica que constitua o fato gerador da obrigação principal.

São duas coisas completamente diferentes.

Uma empresa do mesmo grupo econômico não é responsável solidária pelos tributos devidos por uma outra empresa do mesmo grupo, a menos que elas atuem conjuntamente na situação deflagradora da obrigação tributária principal.

Nesse sentido é a jurisprudência do STJ, conforme ementa abaixo: 

“PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ISS. EXECUÇÃO FISCAL. LEGITIMIDADE PASSIVA. EMPRESAS PERTENCENTES AO MESMO CONGLOMERADO FINANCEIRO. SOLIDARIEDADE. INEXISTÊNCIA. VIOLAÇÃO DO ART. 124, I, DO CTN. NÃO-OCORRÊNCIA. DESPROVIMENTO.

1. "Na responsabilidade solidária de que cuida o art. 124, I, do CTN, não basta o fato de as empresas pertencerem ao mesmo grupo econômico, o que por si só, não tem o condão de provocar a solidariedade no pagamento de tributo devido por uma das empresas" (HARADA, Kiyoshi. "Responsabilidade tributária solidária por interesse comum na situação que constitua o fato gerador").

2. Para se caracterizar responsabilidade solidária em matéria tributária entre duas empresas pertencentes ao mesmo conglomerado financeiro, é imprescindível que ambas realizem conjuntamente a situação configuradora do fato gerador, sendo irrelevante a mera participação no resultado dos eventuais lucros auferidos pela outra empresa coligada ou do mesmo grupo econômico.

3. Recurso especial desprovido.” (Resp. 834044/RS, Rel. Min. Denise Arruda, data do julgamento 11-11-2008, DJe de15-12-2008). 

Essa confusão na seara do direito tributário aconteceu como reflexo das decisões equivocadas da Justiça do Trabalho que vinham e vêm responsabilizando solidariamente pelos débitos trabalhistas, as empresas do mesmo grupo econômico, como se elas conjuntamente tivessem contratado o mesmo empregado.

Exemplo típico de responsabilidade solidária por interesse comum na situação caracterizadora do fato gerador é o fato de duas pessoas serem coproprietárias de imóvel urbano, situação em que ambas se tornam devedoras do IPTU. Outra hipótese é a da execução de serviço por meio de consórcio de prestadores de serviços, hipótese em que cada consorciado-prestador responde pelo pagamento do ISS, ainda que o respectivo contrato tenha acordado previamente a responsabilidade de cada um no pagamento proporcional do imposto. É que a obrigação tributária é una e incindível como decorrência da indivisibilidade do fato gerador que desencadeia a obrigação tributária.

Ademais, as convenções particulares concernentes à responsabilidade pelo pagamento de tributos não podem ser opostas à Fazenda Pública, conforme art. 123 do CTN.

Com relação à  hipótese do inciso II, do art. 124 é importante lembrar que não se trata de responsabilidade objetiva. A lei não pode tornar responsável solidário pelo tributo uma pessoa alheia à situação configuradora do fato gerador. A responsabilidade solidária não pode ser deduzida de um ato urdido por terceiro.

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Por isso, a lei que designar as pessoas solidárias há que observar o disposto no art. 128 do CTN: 

“Art. 128. Sem prejuízo do disposto neste capítulo, a lei pode atribuir de modo expresso a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação, excluindo a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a a este em caráter supletivo do cumprimento total ou parcial da referida obrigação.”           

O art. 13 da Lei nº. 8.620/93 dispunha que “o titular de firma individual e os sócios das empresas por cotas de responsabilidade limitada respondem solidariamente, com os seus bens pessoais, pelos débitos junto à seguridade social”.

Esse art. 13, além de invadir esfera de competência da lei complementar (art. 146, III, b da CF), criou a figura de responsabilidade objetiva fora das hipóteses previstas no § 6º, do art. 37 da CF.

A norma foi declarada inconstitucional pelo STF, porque a responsabilidade não pode ser de qualquer pessoa “exigindo-se relação com o fato gerador ou com o contribuinte” (RE nº 562276/PR, Min. Ellen Gracie, DJe de 10-2-2011).

Em consequência o citado art. 13 veio a ser revogado pelo art. 79, VII da Lei nº 11.941 de 27-5-2009.

No próximo artigo examinaremos a responsabilidade solidária dos sócios de sociedades limitadas, onde a distorção da jurisprudência de nossos tribunais é bem mais acentuada, implicando inovação legislativa. 

Sobre o autor
Kiyoshi Harada

Jurista, com 26 obras publicadas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 20 (Ruy Barbosa Nogueira) da Academia Paulista de Letras Jurídicas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 7 (Bernardo Ribeiro de Moraes) da Academia Brasileira de Direito Tributário. Acadêmico, Titular da cadeira nº 59 (Antonio de Sampaio Dória) da Academia Paulista de Direito. Sócio fundador do escritório Harada Advogados Associados. Ex-Procurador Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

HARADA, Kiyoshi. Responsabilidade solidária em matéria tributária. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 28, n. 7199, 18 mar. 2023. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/103000. Acesso em: 26 dez. 2024.

Mais informações

Texto publicado no Portal Migalhas, edição nº 5.552 de 2-3-2023.

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