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A morte de Moore e a lei de Moore

É preciso atualizar a Lei de Inovação e permitir o surgimento de novos clusters de tecnologia

Agenda 01/04/2023 às 16:35

Empresas como a Intel, Microsoft ou Apple só nascem quando o ambiente regulatório propicia o surgimento das mesmas.

Na última semana faleceu Gordon Moore, o cofundador da Intel, fabricante de chips, que foi fundada por Moore e pelo seu colega Robert Noyce.

Moore que era formado em Engenharia, criou em 1965 a chamada Lei de Moore, segundo a qual o número de transistores que poderiam ser colocados em um chip de silício dobraria em intervalos regulares no futuro previsível, aumentando, assim, exponencialmente o poder de processamento de dados dos computadores.

Essa previsão foi fundamental para levar a Intel e os fabricantes de chips rivais a direcionar agressivamente seus recursos de pesquisa e desenvolvimento para garantir que essa regra se tornasse realidade. Quem de nós não se lembra ser a memória e sua evolução o item que modificava os computadores anualmente, nos famosos 286, 386 e assim por diante, o avançar da capacidade de memória com a crescente de dados fazia da evolução do chip e da sua capacidade de memória o grande diferencial, diferença essa que se mantém até hoje no processo de transformação digital, onde a Lei de Moore serve de referência na atual guerra dos chips.

Nos últimos anos, rivais da Intel, como a Nvidia, passaram a argumentar que a Lei de Moore não seria mais válida. E qual a importância no universo do Direito?

O seu criador, Gordon Moore esteve algumas vezes no Brasil, uma figura sempre simples e acessível, como os verdadeiros gênios, em seus encontros com estudantes, trazia sempre no bolso um lápis amarelo com grafite HB. Segundo diversas reportagens que narravam suas visitas, “Quando falava do enorme potencial dos computadores e o passo veloz da evolução dos chips, tirava o lápis do bolso, mostrava para a garotada e dizia: “O primeiro nós fizemos apenas com a ajuda dessa poderosa ferramenta”.

Seguidamente Moore tinha de responder se a lei que leva seu nome ainda era válida e por quanto tempo ainda ditaria o ritmo de evolução e queda no preço dos chips. Concebida em 1965, a Lei de Moore indicava que o número de transistores em um chip dobraria, em média, a cada 18 meses, mantendo o mesmo (ou menor) custo e o mesmo espaço. O fato é que ela ainda é válida, mas, nos últimos anos, vem desacelerando, a cada mudança de patamar na evolução dos chips, uma desaceleração que já era esperada, até é claro a descoberta de um outro material que sirva de base para os chips.

Duas são as principais causas desse lentidão na evolução, o que muitos veem como o fim da Lei de Moore:

A primeira causa é a absurda miniaturização dos circuitos. Os chips são feitos de circuitos de silício cada vez menores. Estão se aproximando da escala atômica, e isso só me modifica com a potencialização de novos materiais.

A segunda causa da desaceleração, seria o aumento dos custos combinado a retornos decrescentes no desempenho dos chips. As últimas gerações de chips, porém, têm custos de fabricação cada vez mais altos, mas não entregam mais os saltos de desempenho do passado. Oferecem apenas ganhos modestos, logo virou briga de cachorro muito grande investir em chips, sua importância aumentou pela transformação digital, o que acelera a guerra comercial e de patentes entre países, e também amplia a evolução de um arcabouço regulatório para novas fabricas.

Curiosamente, como característica dessa nova economia, ao mesmo tempo que temos uma concentração das plataformas, identificamos um ambiente ainda mais concentrado na produção dos chips, impulsionados pela pandemia, que acelerou a demanda pelos microprocessadores.

Conhecida como TSMC, a Taiwan Semiconductor manufacturig Company, que é atualmente responsável pela fundição de chips para as principais cadeias de suprimentos globais, tornou-se o mais recente cavalo de batalha na luta política e tecnológica entre essas duas potências, curiosamente justamente a empresa taiwanesa que tem relações pra lá de espinhosas com a China e que lidera esse processo verticalizado, onde todos os grandes players são essencialmente montadoras, como a Apple, Qualcomm, Broadcom, Cisco Systems e Nvidia essas norte americanas.

O primeiro grande round, ocorreu em setembro de 2020, quando fabricantes que usam equipamentos ou tecnologia de propriedade norte-americana precisarão solicitar uma licença antes de fornecer produtos à gigante chinesa de telefonia Huawei, responsável por cerca de 14% da receita da TSMC, , o que já atingiu de imediato a empresa de Taiwan.

Fundada em 1987, a TSMC, foi a primeira empresa do mundo voltada para a fundição. Seu modelo de negócio foi pioneiro por se concentrar na fabricação de chips sob medida. Envolvida em 272 processos de produção tecnológica distintos e atendendo a uma rede de 499 parceiros na Ásia, Europa e América do Norte, em uma visão global com operações em todo mundo.

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A liderança da empresa colocou os holofotes sobre Taiwan em meio a falta de chips, que paralisam ou restringem uma série de outros itens nesse momento, conforme comentamos no artigo anterior, obrigando as fabricas de todo mundo a redesenharem suas cadeias produtivas focando em produtos de maior valor, veja como exemplo a indústria automobilística. Lembro que Taiwan tem o domínio pleno dos chips de última geração sendo responsável por cerca de 90% deles, o que só coloca mais fogo nessa fogueira.

A TSMC continua sendo a maior fabricante de chips por contrato do mundo, e a China ainda ocupa apenas a quinta colocação nesse estratégico mercado. Ao mesmo tempo enquanto a TSMC fabrica produtos de ponta com a tecnologia de 5 nanômetros, a SMIC (sua concorrente chinesa) pode estar atrasada quase uma década. Só sua última geração de chips de 14 nanômetros está cerca de quatro anos atrás da Qualcomm e da Intel, de acordo com analistas da Fitch Solutions, o que na guerra tecnológica parece ser uma eternidade.

Todos os movimentos indicam que os Estados Unidos temem a influência da China em Taiwan e sua capacidade de invadir ou sabotar as cadeias produtivas que passam pelo país insular. Os semicondutores da TSMC também têm aplicações militares e são utilizados em aeronaves, satélites e drones.

A história da humanidade é essencialmente a história dos avanços tecnológicos, e curiosamente os chips, com sua produção concentrada na mão de poucos, e com domínio absoluto na mão de um só fabricante na ilha de 23 milhões de habitantes, de frente pra China e de péssimas relações com os chineses, é mais um curioso ingrediente nessa guerra de patentes, chips e muita tecnologia para o fundo principal que é definir quem vai ganhar a guerra no mundo regrado pela Inteligência Artificial e pela Internet das Coisas.

Nesse instante, esse avanço dos chips envolve, em primeiro lugar, estabelecer um novo limite para o poder dos microprocessadores, o que indica que a lei empírica definida por Gordon Moore em seus anos na Intel que afirmava que o número de transistores em um microprocessador dobra aproximadamente a cada dois anos ainda está viva e jogando um bolão. Embora muitos tenham tentado dar a lei como morta em inúmeras ocasiões, a realidade é que a inclinação do gráfico, graças ao desenvolvimento de novos avanços tecnológicos, continua a ser mantida a partir do momento em que Moore a observou.

Muitas indústrias, como no caso das montadoras redesenharam inclusive a sua grade de produtos dando prioridade aos modelos de maior valor agregado, e dessa forma suprindo a que queda nas vendas com produtos de maior valor agregado e dessa forma melhorando seus resultados.

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Por trás desse aumento está a reversão de uma tendência que continuou por décadas, na qual a indústria produzia mais carros do que vendia. Naquela época, os fabricantes de automóveis ofereciam descontos significativos para cumprir as metas de volume de vendas a tempo, ou seja os semicondutores redesenham essa indústria e outras tantas.

A falta de chips atinge toda indústria no mundo, e antes que um delirante crie uma nova teoria da conspiração colocando os chineses como culpado, alerto que a falta atinge toda indústria eletroeletrônica do mundo, e isso inclui a China.

Lembro que estamos falando de uma indústria que é muito geograficamente fragmentada entre suas três fases diferentes (design, fabricação e montagem/teste), com enormes interdependências e diferentes fatores críticos. Se na fase de projeto o software e as patentes prevalecerem, e está principalmente nas mãos de empresas norte-americanas e europeias; na fase de fabricação, o mais crítico é a produção de máquinas fotolitografia muito complexas e os processos industriais relacionados ao seu uso, nas mãos de empresas sul-coreanas ou taiwanesas.

Essa situação, juntamente com o potencial uso de microchips em aplicações militares, coloca os equilíbrios entre os diferentes blocos em uma situação muito delicada: no momento, a ARM Holdings, uma das empresas mais importantes em design de chips, com sede no Reino Unido e criada em 1978 quase por acaso por uma empresa de computadores agora extinta, está em espera para venda a uma empresa dos EUA devido a preocupações com os interesses de segurança do país, suas potenciais implicações monopolistas e a oposição de sua subsidiária chinesa, controlada principalmente por fundos de investimento dos EUA, ao lado da holandesa ASML já destacada.

Hoje, tudo tem um chip, de um carro até a escova de dentes a um smartphone, um wearable ou uma câmera. O ano de 2022 está sendo muito interessante para indústria, quando acreditamos as tensões geopolíticas só estão aumentando.

A incorporação de machine learning ou gêmeos digitais em processos logísticos podem ser interessantes para colocar ordem no futuro, mas a realidade é que, após a crise, teremos que reconstruir uma cadeia de suprimentos que, necessariamente, terá que ser muito diferente.

Chegamos a um momento curioso, você pode substituir seu carro movido a petróleo por outro movido a energia elétrica, mas em ambos sua dependência será cada vez maior dos chips, logo o que é mais importante?

A guerra dos chips é e sempre será sobre a capacidade e meio físico de registros de nossas memórias, e logo na economia da desatenção, é fundamental termos um arcabouço jurídico que aperfeiçoe e aprofunde a inovação. A lei de inovação e os demais instrumentos legais existentes hoje não são suficientes para que tenhamos no Brasil empresas do porte da Intel, Microsoft ou Apple. 

No fundo tudo implica em uma mais do que necessária ampliação de memória, e logo voltamos a Gordon Moore.

Sobre o autor
Charles M. Machado

Charles M. Machado é advogado formado pela UFSC, Universidade Federal de Santa Catarina, consultor jurídico no Brasil e no Exterior, nas áreas de Direito Tributário e Mercado de Capitais. Foi professor nos Cursos de Pós Graduação e Extensão no IBET, nas disciplinas de Tributação Internacional e Imposto de Renda. Pós Graduado em Direito Tributário Internacional pela Universidade de Salamanca na Espanha. Membro da Academia Brasileira de Direito Tributário e Membro da Associação Paulista de Estudos Tributários, onde também é palestrante. Autor de Diversas Obras de Direito.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MACHADO, Charles M.. A morte de Moore e a lei de Moore: É preciso atualizar a Lei de Inovação e permitir o surgimento de novos clusters de tecnologia. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 28, n. 7213, 1 abr. 2023. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/103302. Acesso em: 22 dez. 2024.

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