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Natureza jurídica do lançamento tributário

Agenda 01/05/2023 às 11:37

Para alguns estudiosos, o lançamento é um procedimento administrativo. Para outros, porém, o lançamento é um ato jurídico-administrativo.

Continua grassando interminável discussão acerca da natureza jurídica do lançamento tributário.

Para alguns estudiosos, o lançamento é um procedimento administrativo. Para outros, porém, o lançamento é um ato jurídico-administrativo. Qual, afinal, a corrente correta?

Ambas as correntes, a nosso ver, procedem. Depende do enfoque a ser dado à palavra “lançamento”.

Como assinalamos na nossa obra, a palavra “lançamento não é unívoca, mas, multívoca[1]

Enquanto ato de lançar, isto é, de constituir o crédito tributário, o lançamento é um procedimento, conforme prescrição do art. 142 do CTN: 

“Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível.

Parágrafo único. A atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional.” 

O que o art. 142 do CTN define é o procedimento do lançamento. Daí a parcela ponderável da doutrina especializada defendendo a tese de procedimento administrativo, quando, na verdade, a norma legal não define o lançamento, mas apenas descreve o seu procedimento.

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Procedimento dá a ideia de algo que se prolonga no tempo. Por isso, o lançamento pode ter início em determinado dia e terminar no mesmo dia, da mesma forma que pode terminar na semana seguinte, ou no mês seguinte, tudo dependendo da simplicidade ou da complexidade de cada caso concreto.

O lançamento pressupõe um agente administrativo competente (agente do fisco) para verificar a ocorrência do fato gerador, apurar o montante devido depois de identificar a matéria tributável.

O ato de lançamento é obrigatório e vinculado, isto é, não discricionário, sob pena de responsabilidade funcional do agente fiscal competente.

Uma vez apurado o montante devido e identificado o sujeito passivo o agente fiscal deve notificá-lo do ato do lançamento. Com essa notificação encerra-se o procedimento do lançamento.

Uma vez feita a notificação do lançamento tem-se por definitivamente constituído o crédito tributário, nos termos do art. 145 do CTN, correndo a partir de então o prazo para o contribuinte satisfazer o crédito tributário, ou apresentar impugnação administrativa. Apresentada a impugnação administrativa instaura-se, ipso facto, o processo administrativo tributário para dirimir a controvérsia.

É um grande equívoco considerar que a constituição definitiva do crédito tributário somente ocorre com a final manifestação no processo tributário, porque até lá o crédito poderá ser parcial ou totalmente alterado, como assinala a jurisprudência do STJ como forma de protelar o início do prazo prescricional para a cobrança do crédito tributário. A jurisprudência equivocada do STJ permite sustentar que o crédito tributário só se aperfeiçoa com a final manifestação do Poder Judiciário, considerando que a decisão administrativa irreformável, igualmente, pode ser impugnada judicialmente.

Cria-se, dessa forma, a figura de lançamento provisória que não tem guarida na ordem jurídica vigente. É próprio do ato jurídico perfeito comportar alteração por via de impugnação administrativa ou judicial. O que não pode, nem se admite é a impugnação de algo que ainda está em constituição. Não se pode confundir o procedimento administrativo do lançamento, para constituir o crédito tributário com o processo administrativo tributário, como meio de solver o litígio.

A exteriorização do procedimento do lançamento em um documento suficiente para constituir o crédito tributário (auto de infração, notificação de lançamento fiscal etc.) constitui um ato jurídico-administrativo. É o lançamento propriamente dito, capaz de produzir efeitos jurídicos: torna líquida e certa a obrigação tributária preexistente.

Toda essa discussão sobre a natureza jurídica do lançamento reside no fato de considerar o “lançamento” como uma palavra unívoca, não se atentando para o seu duplo significado. 


[1] Cf. nosso Lançamento tributário teoria e prática. Indaiatuba: Foco, 2019, p.15

Sobre o autor
Kiyoshi Harada

Jurista, com 26 obras publicadas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 20 (Ruy Barbosa Nogueira) da Academia Paulista de Letras Jurídicas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 7 (Bernardo Ribeiro de Moraes) da Academia Brasileira de Direito Tributário. Acadêmico, Titular da cadeira nº 59 (Antonio de Sampaio Dória) da Academia Paulista de Direito. Sócio fundador do escritório Harada Advogados Associados. Ex-Procurador Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

HARADA, Kiyoshi. Natureza jurídica do lançamento tributário. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 28, n. 7243, 1 mai. 2023. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/103835. Acesso em: 23 dez. 2024.

Mais informações

Texto publicado no Migalhas, edição nº 5.579, de 11-4-2023.

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