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Petições eletrônicas no processo civil brasileiro

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Agenda 15/09/2007 às 00:00

8. A ICP-OAB

A Ordem dos Advogados do Brasil, por meio de seu Conselho Federal, buscando preservar o sigilo e a independência, instituiu sistema próprio de infra-estrutura de chaves públicas para certificação de advogados, a ICP-OAB, em funcionamento desde outubro de 2002. Pretende a OAB recadastrar seus inscritos para a emissão de novo cartão de identidade de advogado, com certificação digital, por meio da Casa da Moeda do Brasil, válido em todo o território nacional por três anos. [181]

Em alguns estados já é possível ao advogado a obtenção de seu certificado digital da ICP-OAB, que é interoperável com a ICP-Brasil [182] e igualmente está sob a égide da Medida Provisória nº 2.200/2001.

Nesse tocante, é de se destacar que há campanha no sentido de que o certificado digital utilizado na prática profissional da Advocacia deverá ser aquele fornecido pela entidade autorizada legalmente, [183] isto é, a Ordem dos Advogados do Brasil, conforme o Estatuto da Advocacia (Lei Federal nº 8.906/1994). Por essa razão, o advogado não deveria adquirir certificados de terceiros para a prática de atos da profissão. No que se refere à validade do certificado emitido pela OAB, o art. 10, § 2º da Medida Provisória nº 2.200/2001 a confirmaria, pois é desnecessária a certificação pela ICP-Brasil se houver o reconhecimento da parte transacionante (no caso, seja na comunicação entre o Poder Judiciário e a OAB, seja entre esta e o inscrito), caso em que o certificado utilizado será igualmente válido. [184]

Os tribunais que reconhecerem o sistema de certificação da OAB, além de verificarem a autenticidade da assinatura, poderão consultar instantaneamente o cadastro de advogados aptos no momento do recebimento da petição. Além disso, esse padrão tecnológico exige menores investimentos em infra-estrutura. [185]

No Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia já existe o protocolo eletrônico de peças – sem necessidade de juntada posterior de papéis –, mediante a utilização da certificação subordinada à ICP-OAB. Para usar o sistema, implantado neste ano, o causídico deve adquirir identidade digital junto à Seção da OAB no Estado. O mecanismo implantado no TJRO está em consonância com a Lei Federal nº 11.280/2006 e emite recibo eletrônico para confirmar o recebimento da petição, com horário certificado pelo Observatório Nacional. [186]


9. O PROCESSO VIRTUAL

A Emenda Constitucional nº 45/2004 veio para incluir na Carta Magna, em seu art. 5º, o inciso LXXVIII, como demonstração da preocupação em acelerar a prestação jurisdicional. Tal dispositivo assegura a todos "a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação" como garantia fundamental. A respeito do tema, é lúcida a reflexão de Marinoni:

...no que diz respeito especificamente à celeridade dos procedimentos, não é preciso dizer que a demora do processo jurisdicional sempre foi um entrave para a efetividade do direito de acesso à justiça. Sim, já que não tem sentido que o Estado proíba a justiça de mão própria, mas não confira ao cidadão um meio adequado e tempestivo para a solução dos seus conflitos. Se o tempo do processo, por si só, configura um prejuízo à parte que tem razão, é certo que quanto mais demorado for o processo civil mais ele prejudicará alguns e interessará a outros. Seria ingenuidade inadmissível imaginar que a demora do processo não beneficia justamente àqueles que não tem interesse no cumprimento das normas legais. [187]

A grande esperança de uma vigorosa aceleração na prestação da tutela jurisdicional é depositada no denominado processo virtual. Nele, o máximo de atos possível é realizado por meio eletrônico, com plena validade jurídica. É a virtualização, com a qual, na esteira do entendimento de Oliveira, o processo se foca menos na ordenação do processo-papel e mais na eficiência da Justiça, mais célere, simples, publicizada e segura. [188]

Como demonstração de iniciativas nesse caminho, o trabalho realizado nos Juizados Especiais Federais, nos quais se destaca vigorosamente a virtualização do processo em âmbito nacional, tem produzido resultados excelentes, embora as questões tratadas sejam de menor valor financeiro, como é de se esperar. Um dos Tribunais Regionais Federais a implantar o processo eletrônico – dispensando a apresentação de documento em papel após o protocolo da petição eletrônica – foi o da 4ª Região. Nos Juizados Especiais Federais da aludida região, a segurança dos dados no e-proc [189] é baseada na geração de chaves criptográficas.

Pode-se pensar que, inicialmente, a aceitação de petições enviadas pela internet concorra com outras alternativas, tais como a entrega pessoal de peças gravadas em meio magnético ou em papel a ser digitalizado posteriormente. Não foi este o caso do e-proc. Veja-se que, segundo o julgamento a seguir, sequer é facultada a utilização de meios convencionais nos processos de sua competência:

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MANDADO DE SEGURANÇA - ATO PRESIDENTE TRF4 - OBRIGAÇÃO DE UTILIZAÇÃO DO PROCESSO ELETRÔNICO (E-PROC) NOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS.

1. A instituição do processo eletrônico é decorrência da necessidade de agilização da tramitação dos processos nos Juizados Especiais Federais, representando à iniciativa o resultado de um enorme esforço institucional do Tribunal Regional da 4ª Região e das três Seções Judiciárias do sul para que não se inviabilize a prestação jurisdicional à população, diante da avalanche de ações que recai sobre a Justiça Federal, particularmente nos Juizados Especiais Federais.

2. O sistema em implantação é consentâneo com os critérios gerais da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade que devem orientar os Juizados Especiais, previstos no art. 2º da Lei 9.099/95, e que são aplicáveis aos Juizados Especiais Federais, conforme disposto no art. 1º da Lei 10.259/2001.

3. A sistemática implantada assegura o acesso aos equipamentos e aos meios eletrônicos às partes e aos procuradores que deles não disponham (Resolução nº 13/2004, da Presidência do TRF/4ª Região, art. 2º, §§ 1º e 2º), de forma que, a princípio, ninguém tem o acesso à Justiça ou o exercício da profissão impedido em decorrência do processo eletrônico.

- Segurança denegada.

(TRF4, MS 2004.04.01.036333-0, Corte Especial, Relator João Surreaux Chagas, publicado em 19/10/2005)

No Juizado Virtual, o processo é acessível de qualquer lugar do mundo, por página segura, maximizando a publicidade. As petições recebidas, assinadas digitalmente de modo a garantir a origem e o conteúdo, são juntadas automaticamente pelo sistema e é emitido um protocolo eletrônico. [190] O executor de cada ato processual fica registrado, com data e hora. Também com base em assinaturas digitais criptografadas os juízes assinam sentenças, com um clique, o que lhes permite resolver problemas urgentes sem se deslocar à sede da Justiça. [191] Cópias de segurança redundantes em vários locais são igualmente característica do sistema. Ademais, o uso de certificação nos Juizados Especiais Federais controla o acesso das partes ao processo, mediante cadastro e uso de senha, [192] e, visando a reforçar a segurança, os atos processuais não podem sofrer modificações após adentrarem o sistema. [193]

Surpreendentemente, o custo médio de um processo eletrônico no e-proc, em que, além da otimização do trabalho, são dispensados insumos como papel, tinta, grampos e etiquetas, é de vinte reais, contra oitocentos necessários no modelo tradicional. [194]

Lima busca enumerar as peculiaridades próprias do processo eletrônico: publicidade, [195] velocidade, comodidade, facilidade de informação, com sua conseqüente democratização; menor contato pessoal; rotinas e decisões jurídicas automatizadas; autos digitalizados; ampliação do conceito espacial de jurisdição; participação de técnicos de informática [196] em questões processuais; cuidado com a segurança dos dados processuais; extensão dos poderes processuais dos magistrados; validação das provas digitais e o surgimento de nova categoria de excluídos processuais. [197] Porta acrescenta a transparência, a proteção ao meio ambiente e efetiva implementação do ordenamento jurídico. [198] Se por um lado muitas dessas características são vantajosas, outras podem ser uma ameaça à legitimidade do processo judicial, na visão daquele autor, segundo quem as possibilidades de fraude se multiplicam e a punição por seu cometimento enfrenta obstáculos como a identificação do fraudador, que poderá ademais se encontrar nas mais diversas localidades do planeta.

Apesar dos riscos cogitados por muitos, o secretário-geral do Conselho Nacional de Justiça, juiz federal Sérgio Tejada, esclarece que há planos de se implantar o processo eletrônico em todo o Poder Judiciário, [199] no que o Brasil deve ser pioneiro. Entusiasma-se Tejada com as vantagens da virtualização do processo: para ele, o processo virtual é a mudança, muito além de simplesmente informatizar a burocracia. Complementa que segundo pesquisa, "...o tempo médio de julgamento de um processo na Justiça brasileira é de cerca de 700 dias. Já nos Juizados Especiais que já utilizam a tramitação eletrônica, esse tempo cai para 37 dias". [200] O conselho pelo juiz secretariado, que ficará mais acessível com o uso do processo virtual – hoje é necessário ir a Brasília ou remeter o material por correio para lá dar entrada em um processo, enquanto que virtualmente isso será possível instantaneamente de qualquer parte do globo –, desenvolve um sistema baseado em software livre [201] a ser disponibilizado sem custo a todos os tribunais. [202]

Outra iniciativa de virtualização do processo se vislumbra no Supremo Tribunal Federal, que já tem mais de 250 mil processos totalmente virtuais em andamento. [203] Pretende-se que os recursos extraordinários sejam processados de forma eletrônica.

Para além das enumeradas, há mais especialidades a se desvendar com o uso da internet no processo, algumas já em prática, outras em tese.

Exemplificando a prática, aponta-se que nas Varas Federais da 4ª Região, o correio eletrônico é utilizado para envio de cartas precatórias e outras comunicações de atos processuais, conforme disposto no Provimento nº 1/2000 da Corregedoria. [204] Outrossim, é possível aos advogados que atuam em processos em curso na Justiça Federal da referida região o pagamento via internet [205] de custas, tanto em primeira como em segunda instância. [206]

No campo das possibilidades, por fim, assinala-se que, logrando o documento eletrônico demonstrar a possibilidade de resguardar autenticidade e integridade, os títulos executivos – os quais segundo Borba [207] deverão deixar progressivamente o meio documental tradicional – poderão eventualmente passar a ser aceitos nos termos do art. 614 do Código de Processo Civil, ao que não se opõe o pensamento de Greco. [208] Demonstra essa inclinação a exposição de Lucca:

Na nova redação que se pretende dar ao art. 566 do Código de Processo Civil, assim ficaria tal dispositivo:

"Pode promover a execução forçada o credor por obrigação expressa em documento por lei considerado título executivo extrajudicial, redigido por escrito ou constante de registro eletrônico autorizado."

O acréscimo da expressão "ou constante de registro eletrônico autorizado" parece traduzir a inequívoca intenção de dar ao título com suporte eletrônico a mesma força daquele materializado no pedaço de papel. [209]


10. A NECESSÁRIA INTEGRAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO

A integração entre os sistemas dos diversos órgãos jurisdicionais mostra-se condição da plena operabilidade do peticionamento eletrônico, bem como requisito para a viabilização de algumas de suas maiores vantagens.

Ocorre que, conforme analisa Cerdeira, [210] os tribunais brasileiros, com fundamento na autonomia que lhes é dedicada, têm se informatizado sem o adequado planejamento, resultando em protocolos de comunicação incompatíveis. Em que pese a semelhança entre as informações de um e de outro tribunal, cada um as trata com programas de computador diferenciados, sem que tivesse havido ao menos o estabelecimento de um padrão de intercomunicação de dados. E a importância desse padrão não é menor, já que, como é cediço, também na informática há normas de caráter técnico que permitem a compatibilidade de equipamentos e informações. A grande rede mundial é notório exemplo do que se pode conseguir com diretivas comuns para o intercâmbio de informação.

No que se refere aos tribunais, a criação do Conselho Nacional de Justiça, competente para definir normas de caráter geral para serem seguidas por eles, pode reverter esse quadro.

As vantagens de um protocolo de comunicação comum seriam da maior relevância: pesquisas de dados tornar-se-iam possíveis no âmbito de todos os tribunais, com reflexos no controle da prestação jurisdicional e na efetiva aplicação das decisões (na esfera penal, por exemplo, condenações produziriam resultados em todos os Estados da Federação). Na remessa de autos de um órgão jurisdicional a outro, não seria necessário qualquer recadastramento de informações, abrindo-se ainda a possibilidade de remeterem-se autos integralmente virtuais por meio do "malote digital". Não menos relevantes seriam os benefícios da integração do Poder Judiciário com outros órgãos, como a Receita Federal e cartórios extrajudiciais.

A semente dessa comunhão de informações já se vislumbra no convênio Bacenjud, entre o Banco Central do Brasil e o Poder Judiciário, permitindo ao primeiro a imediata constrição judicial de numerário ("penhora on-line") por meio da internet. [211]

Nesse tocante, destaca-se o projeto da Rede Informática do Poder Judiciário – Infojus –, que busca a interligação de todas as unidades e instâncias do Poder Judiciário no Brasil. Este projeto, em razão do qual o Supremo Tribunal Federal instituiu Comissão Interdisciplinar, por meio da Portaria nº 156/2000, [212] poderá servir de estrutura para a implantação de meta ainda mais ousada, que seria a rede de comunicação internacional da Justiça, atualmente denominada Iudicis. [213]

Como um dos pilares da integração almejada, ter-se-ia ainda o Sistema Nacional de Integração das Bases de Dados da Justiça Federal e do Superior Tribunal de Justiça. Dentre seus benefícios de grande destaque a serem implantados, cita-se a compilação de dados processuais relevantes em uma única base, propiciando importantes avanços na utilização do Rol Nacional dos Culpados e na verificação de distribuição de processos. [214]

Menke anota que qualquer infra-estrutura que pretenda atingir a coletividade deve ser fundada na interoperabilidade, devendo ser possível a comunicação entre os diversos equipamentos envolvidos; nesse sentido, o modelo adotado pela Medida Provisória nº 2.200/2001 – idêntico ao da Alemanha e ao de outros países – seria apropriado em termos de interoperabilidade, por se basear em um tronco comum a sua normatização. Preleciona ainda o autor que, no caso de uma infra-estrutura de chaves públicas, para que seus usuários sintam a confiança necessária no sistema, normas e padrões compatíveis devem ser estabelecidos. A neutralidade tecnológica, vista por alguns como inafastável, deve ser vista com cautela, pois do contrário pode ser um desserviço aos sistemas de determinação de autoria dos documentos eletrônicos. Nessa seara, destaca Menke que pouca atenção tem sido dispensada no Brasil à necessidade de reassinatura, após um certo período, de documentos eletrônicos arquivados por longo tempo, uma vez que o passar dos anos pode tornar ineficazes as técnicas criptográficas neles aplicadas, descartando sua aptidão como prova. [215]

Finalmente, calha destacar a título de exemplo que, buscando a interoperabilidade, com fundamento na plataforma de dados do Sistema "Justiça Moderna", do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, este tribunal, bem como os de Mato Grosso, Goiás, Mato Grosso do Sul, Maranhão e Tocantins teriam firmado convênio de integração de dados informáticos. [216]

Sobre o autor
João Luiz Pianovski Vieira

bacharel em Direito pela Universidade Federal do Paraná, assessor do Ministério Público Federal em Curitiba (PR), pós-graduando lato sensu em Direito Aplicado pela Escola da Magistratura do Paraná

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VIEIRA, João Luiz Pianovski. Petições eletrônicas no processo civil brasileiro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1536, 15 set. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10415. Acesso em: 23 dez. 2024.

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