V – QUANDO OS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS PODEM SER NEGOCIADOS ENTRE O ADVOGADO E SEU CONSTITUINTE
Deve ser admitido que os honorários advocatícios contratuais possam ser negociados entre o advogado e seu constituinte, inclusive quando o contrato de prestação de serviços tenha por objeto também a atuação judicial, desde que o mandante tenha, de fato, liberdade para negociar; não assim, quando se tratar de réu pobre, e o serviço a ser prestado for obedecer ao sistema da assistência judiciária gratuita.
Para a primeira hipótese, veja-se a decisão proferida quando do julgamento da ADI-MC no. 1194-DF, Pleno, Rel. Min. Maurício Corrêa, dec. un. pub. DJU 29.3.1996, p. 9.344, quando entendeu-se que o art. 21 e seu parágrafo único da Lei no. 8.906/94 deveria ser interpretado no sentido de que "é disposição supletiva da vontade das partes, podendo haver estipulação em contrário, por ser direito disponível".
E exemplificando a segunda hipótese, a decisão proferida quando do julgamento do RESP no. 919.243-SP, STJ, 3ª. Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, dec. un. pub. DJU 07.5.2007, p. 326, cuja ementa passo a transcrever, em parte:
"PROCESSO CIVIL E CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO PROPOSTA POR ADVOGADO, EM DESFAVOR DE SEUS EX-CLIENTES, QUE SE RECUSARAM A RECEBER APENAS METADE DO VALOR LEVANDO EM ACORDO JUDICIAL. ALEGAÇÃO DE QUE A RETENÇÃO ERA DEVIDA A TÍTULO DE PAGAMENTO DE HONORÁRIOS ESTABELECIDOS EM CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS. EXISTÊNCIA CONCOMITANTE DE NOMEAÇÃO, DO ADVOGADO, PARA O PATROCÍNIO DA CAUSA, COM BASE EM CONVÊNIO EXISTENTE ENTRE A PROCURADORIA – GERAL DO ESTADO DE SP E A OAB/SP. ALEGAÇÃO DE NULIDADE RECONHECIDA QUANTO AO CONTRATO PARTICULAR DE HONORÁRIOS. (...)
(...) Deve ser prestigiada a conclusão do Tribunal no sentido de que nulo o contrato paralelo de fixação de honorários quando, simultaneamente, o patrocínio da causa foi assumido nos termos de Convênio para assistência judiciária firmado entre a OAB/SP e a PGE-SP, que garante a remuneração, com dinheiro público, pelos serviços prestados. É, portanto, vedado ao advogado cobrar honorários paralelamente à assunção da causa pelo Convênio firmado com a PGE-SP. (...)".
VI – EFETIVO TRABALHO COMO FATO GERADOR DO DIREITO DO ADVOGADO AOS RESPECTIVOS HONORÁRIOS
Se não há diferença de natureza jurídica pela prestação de serviços advocatícios, tanto fazendo se são contratados independentemente de atuação judicial, como, e.g., para assessoria ou consultoria; se são contratados para atuação judicial; ou se o advogado é nomeado pelo Juízo para atuar em um processo em benefício de réu pobre, ou revel, pelo regime da assistência judiciária gratuita, também não poderá haver diferença de natureza jurídica entre os honorários que serão devidos em cada daquelas hipóteses de prestação de serviços, desde que efetivamente, como foi dito, o advogado tenha desempenhado os serviços profissionais que dele se esperava.
Onde houver efetivo trabalho de prestação de serviços de advogado, aí também terá que haver remuneração por esses serviços, ou seja, honorários.
VII – OS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS COMO CRÉDITOS DE NATUREZA ALIMENTAR
É o fato de constituírem-se em "retribuição do trabalho" desempenhado pelo advogado que dá aos honorários advocatícios a natureza jurídica de – créditos de natureza alimentar – no que a jurisprudência sempre foi tranqüila.
Assim, por exemplo, nas ementas dos respectivos arestos a seguir transcritas:
"PROCESSUAL CIVIL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CARÁTER ALIMENTAR.
Os honorários advocatícios constituem verba de caráter alimentar, achando-se incluída na ressalva do art. 100, "caput" da Constituição.
Recurso ordinário improvido."
(ROMS no. 1392-SP, STJ, 2ª. Turma, Rel. Min. Antônio de Pádua Ribeiro, dec. un. pub. DJU 08.5.1995, p. 12.354)
"HONORÁRIOS DE ADVOGADO. AÇÃO PARA A SUA COBRANÇA (CPC, ART. 275, II, "m") . CORREÇÃO MONETÁRIA. INCIDE DESDE DATA ANTERIOR À DO AJUIZAMENTO DA CAUSA, FACE A NATUREZA ALIMENTAR DOS HONORÁRIOS. Hipótese em que se determinou a incidência da correção a partir da "publicação da Lei no. 6.899/81, e não à data do aforamento da ação". Improcedência da alegação de ofensa ao art. 1º., § 2º. da referida Lei. Dissídio não demonstrado na forma regimental. Recurso especial de que se deixou de conhecer."
(RESP no. 32.900-SP, STJ, 3ª. Turma Rel. Min. Nilson Naves, dec. Un. Pub. DJU 17.5.1993, p. 9.337)
"PROCESSO CIVIL. DESISTÊNCIA. AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO. DESPESAS PROCESSUAIS E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS (ART. 20, PAR. 4º., CPC). ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA. IPC DE JANEIRO DE 1989 (LEI 7730/89).
A desistência do processo, em ação de desapropriação, sujeita o expropriante ao pagamento das despesas processuais e de honorários advocatícios (CPC, art. 26). Se não há condenação, aplica-se a regra inscrita no art. 20, parágrafo 4º. do CPC.
Os honorários de advogado têm caráter alimentar. Na liquidação é de se levar em conta o percentual de 70,28% relativo ao IPC de janeiro de 1989."
(RESP no. 32.741-SP, STJ, 1ª. Turma, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, dec. un. pub. DJU 27.9.1993, p. 19789)
"CONSTITUCIONAL. PRECATÓRIO. PAGAMENTO NA FORMA DO ART. 33, ADCT. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS E PERICIAIS: CARÁTER ALIMENTAR. ADCT, ART. 33.
Os honorários advocatícios e periciais têm natureza alimentar. Por isso, excluem-se da forma de pagamento preconizada no art. 33, ADCT.
Recurso não conhecido."
(RE no. 146.318-SP, STF, 2ª. Turma, Rel. Min. Carlos Velloso, dec. Un. Pub. DJU 04.4.1997, p. 10.537)
VIII – SIGNIFICADO DA EXPRESSÃO – "HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS"
Entende-se por honorários advocatícios sucumbenciais aqueles fixados por ocasião da sentença , em razão do acolhimento, total ou parcial, mas em proporção maior que o reconhecido ao adversário.
Por ocasião da sentença, e em razão do acolhimento, porque o CPC de 1973, ao contrário do de 1939, não mais condicionou o seu cabimento quando fosse verificada a existência de "dolo ou culpa" da parte vencida, bastando o fato objetivo da derrota da parte contrária, a sucumbência.
Como dito por PONTES DE MIRANDA:
"No direito anterior, apenas se exigia ao juiz arbitrar "com moderação e motivadamente" os honorários dos advogados (Código de Processo Civil de 1939, art. 64, § 1º.). Quanto às ações a respeito das quais incidiria a regra jurídica de então, havia divergências e erros que apontamos nos Comentários (I, 2ª. ed., 417-424), em grande parte oriundos da referência infeliz a "dolo ou culpa" do demandado. Tudo isso não tem mais relevância. Hoje, o que importa é saber-se quem foi o vencido e o juiz, na sentença, tem de condená-lo ao pagamento dos honorários advocatícios. Se o juiz ou tribunal deixou de cumprir o seu dever, qualquer que tenha sido a ação, e ainda cabe recurso, tal omissão pode ser o fundamento recursal ou um dos fundamentos recursais. Se o interessado deixa de recorrer e a sentença passa em julgado, nada mais pode fazer o vencedor. Se recorreu e perdeu, quanto a esse ponto, a decisão só é suscetível de rescisão. Não há ação independente para haver esses honorários do advogado ou dos advogados do vencedor se não houve condenação ou não houve recurso, ou o vencedor perdeu no recurso e adveio a res iudicata. A conclusão não é ex lege. O dever do juiz é que é efeito da incidência da regra jurídica cogente, razão por que não precisa ter sido pedida, na inicial ou depois, a condenação." (Comentários ao Código de Processo Civil (1973), Rio de Janeiro, Forense, Tomo I, 1973, p. 418)
E também por VALENTIN CARRION:
"O princípio da demanda determina ao vencido ressarcir o vencedor dos prejuízos da demanda, seja autor ou réu, não se origina da culpa, mas do risco de ter movido ação ou de tê-la resistido; é semelhante ao princípio da responsabilidade civil (...). Esse princípio foi introduzido no processo civil de 1939 pela L. 4632/65 (e depois pelo CPC de 1973, art. 20), afastando o princípio até então vigente que exigia dolo ou culpa para fundamentar a condenação em honorários. (...)". (Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho, São Paulo, Ed. Saraiva, 24ª. ed., 1999, p. 610)
YUSSEF SAID CAHILI chama a atenção para o caráter de pena disciplinar que a imposição dos honorários advocatícios ao vencido, pelo juiz, tinha sob a égide do CPC de 1939:
"Manifestando a sua opção, o Código de 1939 não acolheu, como sistema, a regra da sucumbência; estabeleceu, isto sim, uma pena disciplinar, qual fosse a condenação da parte no pagamento de honorários, desde que se tivesse conduzido temerariamente, e outra condenação, destinada exclusivamente ao réu, qual fosse também a condenação em honorários, desde que tivesse ensejado a demanda por culpa, dolo contratual ou extracontratual (arts. 63 e 64).
"A Lei no. 4.632 ,de 18.5.1965, alterou o art. 64 daquele Código, para determinar que a sentença condenaria o vencido ao pagamento da honorária advocatícia do vencedor."
E a seguir, comentando já o sistema da regra da sucumbência que foi adotado pelo art. 20 do CPC de 1973:
"Rigorosamente, o sistema do Código – como, aliás, acontece nas legislações – não comporta reduzir-se ou adaptar-se a um princípio único; a se pretender que o legislador adotou simplesmente o princípio da sucumbência, ou se teria de admitir existirem derrogações expressivas à sua regra fundamental, em desprestígio de sua condição de princípio, ou ficariam sem explicação plausível as diversas regras inseridas no ordenamento processual, sobre as quais o princípio da sucumbência não oferece nenhuma aplicação.
"Na realidade, nenhum sistema legal, na pretensão de suficiência, consegue manter fidelidade absoluta a qualquer dos critérios doutrinários antes acenados; todavia, estes não se repelem, mas se completam.
"O princípio da causalidade, porém, para além de apresentar-se como melhor justificação e mais preciso na prática, é aquele se caracteriza por uma generalidade menos vulnerável à crítica sob pretexto de insuficiência; ademais, traz em seu contexto a regra da sucumbência, como especificação objetiva, completando-se, por outro lado, com as demais regras que não lhe são conflitantes, mas que se completam, na solução dos processos que não resultam em condenação." (Honorários Advocatícios, in Enciclopédia Saraiva de Direito, São Paulo, v. 41, 1977, p. 477, "fine" /478 e 479)
Entendimento este que é aceito pela jurisprudência, como ilustrado pela ementa do respectivo acórdão, a seguir transcrita:
"PROCESSO CIVIL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. PRINCÍPIOS. JURISPRUDÊNCIA E DOUTRINA. ART. 21, CPC. RECURSO PROVIDO.
I - O sistema do Código de Processo Civil de 1973 adotou o critério objetivo da sucumbência para a fixação dos honorários de advogado e para o ressarcimento das despesas processuais pelo vencido ao vencedor.
II - Segundo o princípio da causalidade, aquele que deu causa à instauração do processo, ou ao incidente processual, deve arcar com os encargos daí decorrentes.
III - Sendo recíproca a sucumbência, isto é, se cada uma das partes houver decaído de parte de seus respectivos pedidos, respondem elas na proporção do que ficaram vencidas.
IV - Inviável é o exame, na espécie, do decaimento de parte mínima do pedido antes da elaboração dos cálculos de liquidação, onde se aferirá a correção ou não dos valores indicados nas razões do recurso especial.
(RESP 174360, STJ, 4ª. Turma, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, dec. un. pub. DJU 18.02.2002, p. 447)
Os honorários advocatícios sucumbenciais, portanto, não decorrem do direito da parte, mas sim, da vitória desta na causa, graças ao trabalho prestado pelo advogado; é um elemento da sentença, posto que o juiz encontra-se obrigado funcionalmente a estipulá-los; e é, ainda, um direito que surge com a sentença, vale dizer, não lhe era preexistente.
É neste sentido que a jurisprudência, já sob a égide do CPC de 1973, qualifica os honorários advocatícios sucumbenciais como "sanção processual que não integra o pedido".
Assim, como decidido no AI no. 73.966-SP, STF, 1ª. Turma, Rel. Min. Soares Muñoz, dec. un. pub. DJU 09.3.1979, p. 1584:
"A REDUÇÃO DA VERBA CONCERNENTE AOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS NÃO DÁ ENSEJO A SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA, PARA AUTORIZAR A IMPOSIÇÃO DE HONORÁRIOS AO VENCEDOR DA CAUSA, PORQUANTO NÃO INTEGRAM ELES O PEDIDO; CONSTITUEM SANÇÃO PROCESSUAL IMPOSTA AO VENCIDO E FIXADOS, QUANTITATIVAMENTE, PELO JUIZ, OBEDECIDOS OS LIMITES E OS CRITÉRIOS ESTABELECIDOS NO PARÁGRAFO 3º. E SEUS INCISOS DO ART. 20 DO CPC."
IX – OS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS NÃO SÃO ACESSÓRIO DO DIREITO DA RESPECTIVA PARTE
Os honorários advocatícios de sucumbência podem deixar de ter natureza alimentar porque podem vir a não se verificar? Em outras palavras: a parte que contratou o advogado, este havendo assumido o risco do resultado, vem a perder a causa, e por causa disso o advogado nada receberá – daí não se poder ter aquela espécie de honorários advocatícios como alimentar ?
Há alguma jurisprudência que vem afirmando isso, seja porque acredita que, podendo não existir, sequer poderia o advogado ter a expectativa de sobreviver no futuro com o possível ganho da causa; seja porque os honorários advocatícios, em sua acepção mais geral, não se encontram elencados na redação dada ao art. 100, § 1º.- A da CF/88 pela Emenda no. 30/2000.
É sobre esses dois aspectos que passarei a tratar.
XI – OS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS E AS POLÍTICAS PÚBLICAS LEGISLATIVAS PROMOTORAS DE OUTROS BENS JURÍDICOS CONSTITUCIONALMENTE MAIS RELEVANTES
Há várias situações nas quais, embora a vitória da parte, seu representante judicial finda por não ter direito a honorários advocatícios sucumbenciais.
Assim, em atenção à espécie da ação (mandado de segurança – Súmula no. 512 STF; Súmula no. 105 STJ; ações civis públicas – apenas em caso de má-fé: Lei no. 7.347/85, arts. 17 a 19; estendendo o privilégio também às ações de improbidade administrativa: RESP no. 577.804-RS, STJ, 1ª. Turma, Rel. Min. Teori Albi Zavacski, dec. un. pub. DJU 14.12.2006, p. 250).
Também em razão do objeto da causa (FGTS – art. 29-C da Lei no. 8.036/90).
Por não se tratar o órgão de atuação judicial de advogado, sendo exemplo a decisão proferida quando do julgamento do RESP no. 34386-SP, STJ, 4ª. Turma, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, dec. un. pub. DJU 24.3.1997, p. 9.019, cuja respectiva ementa passo a transcrever, em parte:
"DIREITOS CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA POR CULPA NO TRABALHO. EMPRESA PREPONENTE COMO RÉ. JUROS COMPOSTOS. NÃO – APLICAÇÃO. AÇÃO CIVIL "EX DELICTO" INTENTADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. PROCEDÊNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. VERBA INDEVIDA. ESTATUTO DA ADVOCACIA, ART. 23. RECURSO DESPROVIDO.
(...) II – Em caso de procedência da pretensão ajuizada em ação civil "ex delicto" pelo Ministério Público, ilegítima a condenação do vencido ao pagamento dos honorários advocatícios, tendo em vista que, por definição legal (art. 23 da Lei no.8.906/94), os honorários são destinados tão-somente ao advogado."
Como medida de equiparação de uma parte em relação à outra, beneficiada com certos privilégios processuais pela lei, como ilustrado pela decisão proferida quando do julgamento do RESP no. 493.823-DF, STJ, 2ª. Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, dec. Um. pub. DJU 15.3.2004, p. 237, cuja ementa do respectivo acórdão transcrevo a seguir:
"PROCESSO CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MINISTÉRIO PÚBLICO AUTOR E VENCEDOR.
Na ação civil pública, a questão da verba honorária foge inteiramente das regras do CPC, sendo disciplinada pelas normas próprias da Lei no. 7.347/85, com a redação dada ao art. 17 pela Lei no. 8.078/90.
Somente há condenação em honorários, na ação civil pública, quando o autor for considerado litigante de má-fé, posicionando-se o STJ no sentido de não impor ao Ministério Público condenação em honorários.
Dentro de absoluta simetria de tratamento, não pode o Parquet beneficiar-se de honorários, quando for vencedor na ação civil pública.
Recurso especial improvido."
Também não cabe honorários advocatícios sucumbenciais se vencedor a Defensoria Pública, sendo réu o Estado do qual aquela é órgão institucional, entendendo a jurisprudência haver confusão, embora as autonomias administrativa, organizacional e financeira asseguradas à primeira.
Assim, e por todas, veja-se a decisão proferida quando do julgamento do RESP no. 798.673-RS, STJ, 4ª. Turma, Rel. Min. César Asfor Rocha, dec. un. pub. DJU 30.4.2007, p. 327, cuja ementa respectiva transcrevo:
"RECURSO ESPECIAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ESTADO. DEFENSORIA PÚBLICA. CONFUSÃO ENTRE CREDOR E DEVEDOR.
É indevida a condenação do Estado ao pagamento da verba honorária, quando a parte vencedora está representada em juízo pela Defensoria Pública. Confusão entre credor e devedor.
Recurso conhecido e provido."
Demonstrando a não – vinculação dos honorários advocatícios sucumbenciais ao direito da parte, e até mesmo expondo hipótese em que sequer termina alguma das partes a responder por aqueles honorários, mas sim terceiro – o Estado, nas causas em que nomeado advogado dativo no regime da assistência judiciária gratuita – veja-se a decisão proferida quando do julgamento do RESP no. 296.886-SE, STJ, 4ª. Turma, Rel. Min. Barros Monteiro, dec. um. pub. DJU 01º.02.2005, p. 563, cuja ementa transcrevo:
"INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. ADVOGADO DATIVO NOMEADO AO AUTOR, MENOR E JURIDICAMENTE NECESSITADO. CONDENAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA IMPOSTA AO ESTADO.
Inexistência, no caso, de alegação pelo recorrente de contrariedade aos arts. 128 e 460 do CPC.
"O advogado, quando indicado para patrocinar causa de juridicamente necessitado, no caso de impossibilidade da Defensoria Pública no local da prestação do serviço, tem direito aos honorários fixados pelo juiz, segundo tabela organizada pelo Conselho Seccional da OAB, e pagos pelo Estado" (art. 22, parágrafo 1º. Da Lei no. 8.906, de 4.7.1994).
Recurso especial não conhecido."
Em todas essas hipóteses, verifica-se em comum a existência de um política legislativa, complementada, aqui e ali, por uma atuação judicial, até certo ponto discricionária (como nos exemplos da ação de mandado de segurança, da ação de improbidade administrativa e da equiparação da parte vencida ao Ministério Público Federal quando de ação civil pública, supra citados), explicitamente voltada à questão da não – incidência de honorários advocatícios sucumbenciais, visando a um bem juridicamente mais relevante – um mais amplo acesso à justiça, uma melhor defesa aos necessitados, especialmente quando dependentes de serviços públicos de assistência judiciária inexistentes, ou deficitários.
Ora, não há qualquer política legislativa explicitada no art. 100, § 1º. – A da CF, com a redação dada pela Emenda no. 30/2000, no sentido de instituir hipótese de não – incidência, relativamente aos honorários advocatícios sucumbenciais.
E tampouco há um bem jurídico mais relevante que possa justificar razoavelmente (princípio do devido processo legal) a imposição de regime de execução de quantia certa contra a Fazenda Pública mais draconiano em relação aos honorários advocatícios sucumbenciais, do que quanto aos honorários advocatícios contratuais, cujo instrumento respectivo tenha sido juntado aos autos.
A não ser que se entenda que o bem jurídico mais relevante seria o simples benefício do Estado, que poderia ter mais tempo, assim, para pagar algumas de suas dívidas, causadas por atos ilícitos por ele praticados, o mais das vezes, ou por atos lícitos (como a desapropriação por interesse de reforma agrária) os quais devam resultar em indenização ao expropriado, sob pena de enriquecimento sem justa causa por parte do Estado (imediatamente) e da coletividade (mediatamente).
Um outro aspecto é que o rol descrito no art. 100, § 1º. – A da CF/88, com a redação dada pela Emenda no. 30/2000, nada mais representa do que a positivação de entendimentos que já vinham sendo esposados pelo Eg. STF em decisões, inclusive, plenárias.
Porque somente a hipótese de honorários advocatícios sucumbenciais, por não ter sido arrolada no elenco da norma contida no art. 100, § 1º. – A da CF/88 deveria deixar de ser havida como de natureza alimentar, embora o evidente propósito do legislador constituinte reformador de positivar aqueles entendimentos pretorianos máximos, é questão de impossível resposta satisfatória.
O que leva a um terceiro aspecto.
A conclusão de que os honorários advocatícios sucumbenciais não teriam natureza jurídica de crédito alimentar, porque não se encontram literalmente descritos no art. 100, § 1º. – A da CF/88 é de um rudimentarismo hermenêutico sem paralelo.
Não se pode interpretar o sentido de uma frase, apenas visualizando-se as palavras que nela estão contidas, e olvidando-se, assim, o contexto em que aquela frase está inserida.
Mesmo uma interpretação literal não pode ignorar as influências que recebe do conjunto do Texto Constitucional, e do meio histórico – econômico – social em que esse texto é aplicado e vivido.
Como dito por JOSÉ AFONSO DA SILVA:
"No entanto, está superada a idéia de que a frase é que é a unidade de sentido. O desenvolvimento dos estudos sobre a relação da linguagem com o contexto demonstra que o texto é que é a unidade de sentido, e que o sentido da frase depende do sentido do texto. Assim se pode concluir que não são as palavras nem as frases que dão sentido às normas constitucionais, nem são estas que dão sentido à Constituição. Esta, como texto jurídico, é que é uma unidade de sentido, de sorte que as normas que a compõem recebem o seu sentido a partir do sentido do todo, ainda que uma interação dialética, entre texto e contexto, cada um dá sentido ao outro.
"Pode-se dizer, a partir daí, que a tarefa da hermenêutica constitucional consiste em desvendar o sentido mais profundo da Constituição pela captação de seu significado interno, da relação de suas partes entre si e mais latamente sua relação com o espírito da época, ou seja, a compreensão histórica do seu conteúdo, sua compreensão gramatical na sua relação com a linguagem e sua compreensão espiritual na sua relação com a visão total da época. OU, em outras palavras, o sentido da Constituição se alcançará pela aplicação de três formas de hermenêutica: a) a hermenêutica das palavras; b) a hermenêutica do espírito; c) a hermenêutica do sentido, segundo Richard Palmer (..), que prefiro chamar de hermenêutica contextual.
"A hermenêutica das palavras não é a interpretação gramatical estritamente considerada. Nela se inclui sim a explicação de palavras, assim como a explicação do contexto factual, tal como o cenário histórico, mas ela exige não só o conhecimento factual do meio histórico no momento da interpretação, mas também o conhecimento da língua, de suas transformações históricas e de suas características intrínsecas, porque a interpretação gramatical pertence ao momento da linguagem. A interpretação da linguagem mostra a Constituição na sua relação com a língua, tanto na estrutura das normas como na estrutura de suas partes normativas; assim podemos ver o princípio das partes e do todo, em ação na interpretação gramatical (...), e só assim esse tipo de interpretação tem alguma utilidade, ainda que se possa destacar seu bom serviço no momento da pré-compreensão constitucional." (Interpretação da Constituição – I Seminário de Direito Constitucional e Administrativo, texto disponível em http://www.tcm.sp.gov.br/legislação/doutrina/30a03_06_05?jose_afonso1.htm, acesso em 26.8.2007) (grifei)
Assim também a forte advertência de LENIO LUIZ STRECK:
"(...) Pode-se dizer, a partir das lições de A. Sercovich, que o discurso dogmático dominante é transparente porque as seqüências discursivas remetem diretamente à "realidade", ocultando as condições de produção do sentido do discurso. A este fenômeno podemos denominar de fetichização do discurso jurídico, é dizer, através do discurso dogmático, a lei passa a ser vista como sendo uma – lei – em – si, abstraída das condições (histórico – sociais) que a engendra (ra) m, como se a sua condição – de – lei fosse uma propriedade "natural". (...)
"Por isso, o processo de produção do sentido (daquilo que é sentido/pensado/apreendido pelo sujeito) do discurso jurídico, sua circulação e seu consumo, não podem ser guardados sob um hermético segredo, como se sua holding fosse uma abadia do medievo. Isto porque o que rege o processo de interpretação dos textos legais são as suas condições de produção, as quais, devidamente difusas e oculta (da)s, "aparecem" como se fossem provenientes de um "lugar virtual", ou de um "lugar fundamental". Ora, as palavras da lei não são unívocas; são, sim, plurívocas, questão que o próprio Kelsen já detectara de há muito. Por isto, é necessário dizer que, pelo processo interpretativo, não decorre a descoberta do "unívoco" ou do "correto" sentido, mas, sim a produção de um sentido originado de um processo de compreensão, onde o sujeito, a partir de uma situação hermenêutica, faz uma fusão de horizontes a partir da sua historicidade. Não há interpretação sem relação social." (Hermenêutica Jurídica em Crise, Porto Alegre, Livraria do Advogado Editora, 4ª. ed., 2003, p. 17, "fine"/18 e 19)
Forte neste sentido, PAULO BONAIDES, lembrado por JOSÉ ALFREDO DE OLIVEIRA BARACHO:
"O publicista brasileiro diz que não pretende postular uma "técnica interpretativa especial para as leis constitucionais, nem preconizar meios e regras de interpretação que não sejam aquelas válidas para todos os ramos do Direito, cuja unidade básica não podemos ignorar nem perder de vista (doutra forma não se justificaria o longo exórdio que consagramos à teoria da interpretação e seus distintos métodos), mas nem por isso devemos admitir se possa dar à norma constitucional, salvo violentando-lhe o sentido e a natureza, uma interpretação de todo mecânica e silogística, indiferente à plasticidade que lhe é inerente, e a única saída aliás a permitir acomodá-la a fins, cujo teor axiológico assenta nos princípios com que a ideologia tutela o próprio ordenamento jurídico". Mostra que não deve o jurista, ao interpretar a norma constitucional, afastá-la de sua origem política e ideológica, proveniente da vontade política fundamental. Em matéria constitucional, é quase impossível apegar-se a critérios absolutos de interpretação." (Processo Constitucional, Rio de Janeiro: Forense, 1984, p. 359)
Ainda, INOCÊNCIO MÁRTIRES COELHO:
"Talvez seja por isso que juristas do porto de um Gustavo Radbruch – nisto distinguindo-a da interpretação filológica – possam dizer que "a interpretação jurídica não é pura e simplesmente um pensar de novo aquilo que já foi pensado, mas, pelo contrário, um saber pensar até ao fim aquilo que já começou a ser pensado por um outro".
"(...) Nesse sentido, observa Antônio Osuna Fernández – Largo, com total pertinência, que o nó górdio da compreensão normativa reside nessa antinomia entre o abstrato e o concreto e que, por isso mesmo, o maior problema para o intérprete – aplicador do direito consiste, precisamente, em traduzir – na verdade, em trazer – para a sua situação histórica e para a sua condição de sujeito por ela afetado, uma norma que é enunciada sempre em termos genéricos e a partir de supostos típicos.
"Ao fim e ao cabo, o de que se trata, como afirma Francisco Lopez Ruiz, é de uma transformação das disposições legais em direito interpretado – como decorrência da assumida descontinuidade que existe entre a expressão lingüística da disposição e sua compreensão e interpretação para fins de aplicação -, uma transformação realizada no raciocinar de um operador de direito situado e datado, historicamente condicionado, portanto, cujas idéias e valores, para não dizer preconceitos ou ideologia, se não determinam, pelo menos condicionam, em larga medida, a sua visão do justo."
E finalmente:
"No mesmo sentido, afirma Friedrich Muller que as regras tradicionais de interpretação não podem ser individualizadas como métodos independentes entre si, porque desde o início do processo de concretização elas se manifestam não apenas complementando-se e apoiando-se reciprocamente, mas também entrelaçadas, materialmente, umas com as outras.
"Apesar de importantes, essas observações não primam pela originalidade, porque há mais de século e meio o velho Savigny já advertia que os elementos gramatical, lógico, histórico e sistemático não constituem quatro classes de interpretação, entre as quais se possa optar segundo o gosto ou o capricho, mas apensa quatro operações, distintas embora, cuja integração é indispensável para o êxito da operação." (Elementos de Teoria da Constituição e de Interpretação Constitucional, in Hermenêutica Constitucional e Direitos Fundamentais, Brasília, Brasília Jurídica/IBDP, 1ª. ed., 2ª. tir., 2002, p. 54, "fine"/55, 56 e 81) (grifei)
Vale lembrar as palavras de JOSÉ ADÉRCIO LEITE SAMPAIO a respeito da interpretação literal da Constituição:
"É interessante registrar, ainda naquela decisão, a importância que desempenha a dimensão semântica das expressões, capaz de deslocar para segundo plano uma interpretação sistemática ou teleológica. "O conteúdo político de uma Constituição não é conducente ao desprezo do sentido vernacular das palavras, muito menos ao do técnico, considerados institutos consagrados pelo Direito". Seria, no entanto, leviana a generalização de que seria a literalidade ou a gramática o centro das atenções interpretativas do Tribunal, como pode dar a entender aquela decisão. A finalidade constitucional deve ser sempre colocada num plano privilegiado. Mas que finalidade ? O Ministro Carlos Velloso, com apoio na doutrina de JOSÉ ALFREDO DE OLIVEIRA BARACHO, ao anotar a necessidade de serem desenvolvidas regras especiais de orientação para a boa interpretação constitucional, destacando aqueles princípios que se referem ao conteúdo teleológico da Constituição, divisou uma conseqüência ou finalidade constitucional inolvidável: a de instrumento de governo destinado à proteção e à garantia da liberdade e dignidade do homem. (...)" (A Constituição Reinventada, Belo Horizonte, Del Rey Editora, 2002, p. 783) (grifei)
Seria constitucionalmente desejado que um advogado, após trabalhar anos e anos em um processo judicial, levasse ainda mais de ano para receber os honorários sucumbenciais que lhe pertencem, e que fez por merecer com o seu trabalho autônomo, apenas porque as condições do mercado de trabalho não lhe permitiram obter do seu constituinte um instrumento contratual?
Ou, ainda, pense-se na seguinte hipótese: o mesmo advogado, postulando para uma mesma empresa em duas ações distintas contra uma mesma exigência impositiva tributária, a primeira relativa à obrigação tributária principal, a segunda contra multas aplicadas acessoriamente àquela obrigação – na primeira ação, trabalhou apenas pelos honorários sucumbenciais; na segunda, logrou obter instrumento contratual prevendo parte do pagamento em caso de vitória, a título de adiantamento; ganhando em ambas, pelo mesmo esforço despendido no mesmo Juízo (dada a conexão), receberá primeiro os honorários contratuais, em vista da preferência de seu requisitório; mas, na segunda causa, levará mais de ano, por falta daquela preferência...
Que sentido há nisso ?
A ilogicidade se torna ainda mais evidente ao raciocinar-se com a seguinte observação de JOÃO BOSCO LEOPOLDINO DA FONSECA:
"Cabe ainda uma observação, extraível do próprio voto citado, e que me foi sugerida pelo Professor Artur Alexandre Mafra, da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais, em decorrência de leitura e revisão na redação deste artigo.
"Observou-me que, como pela profissão de mandatário (art. 1290, § único do CCB) não se presume a gratuidade, em não havendo contrato, prevalecerá o princípio da sucumbência, dentro dos limites estabelecidos pela lei (art. 20, §§ 3º. e 4º. e 5º. do CPC). Entretanto, se há contrato, seria difícil eticamente entender-se a soma dos honorários provenientes de uma e outra fonte – com analogia relativamente ao "bis in idem" do Direito Tributário. Creio que, neste caso, deveria prevalecer o contrato, dentro de suas limitações legais." (O Contrato de Honorários, Revista da AMAGIS, 1986, Ano IV, v. IX. p. 47)
Tomando de empréstimo o exemplo, poderíamos ter a seguinte situação: a) presente a abusividade, por haver o advogado contratado honorários advocatícios elevados, e por também serem elevados os fixados a título de sucumbência, seria possível (a título argumentativo) fazer "prevalecer o contrato" – em tal circunstância, dada a sua natureza alimentar, o advogado os receberia com preferência, quando da expedição do respectivo precatório; b) ausente o abuso, o advogado que não logrou contratar honorários receberá apenas os sucumbenciais, e estes, por não terem idêntica natureza alimentar que os contratuais, só os receberá por precatório, sem qualquer preferência...
Daí para se estimular o abuso, como meio de o advogado, ao fim e ao cabo, receber mais rapidamente aquilo que seria de seu direito, é um passo...
Um derradeiro argumento.
É princípio de Direito Público que o silêncio não é apto a criar, a modificar ou a extinguir direitos; para isso, a Administração Pública há que editar atos jurídicos, expressar sua vontade; um outro prisma admite que, numa situação em que a Administração Pública silencia, seja possível atribuir, ainda que nessa situação de inércia, efeitos jurídicos, desde que uma norma legal imponha a uma situação de fato verificada em concreto tal conseqüência.
Assim, com CÉSAR GARCÍA NOVOA:
"Es lugar común en la literatura jurídica definir el silencio de la Administración como la pasividad o ausencia de expresividad de la Administración Pública. Y más concretamente, como la falta, en una circunstancia determinada, de un pronunciamiento administrativo, y la consiguiente ausencia de las consecuencias jurídicas que tal pronunciamiento está destinado a producir. (...) Esta inactividad normativa o silencio de norma positiva, puede contribuir a formar zonas de no derecho y constituirá em algunas circunstancias, un supuesto de laguna del Derecho. (...) Esta era la interpretación de la inactividad normativa que mejor se acomodaba a planteamientos liberales clásicos, desde uma perspectiva garantista a favor del ciudadano y de desconfianza de la actuación de los poderes públicos. Solo cuando, al amparo de la formulación del Estado Social, se asignan a los órganos públicos deberes positivos de actuar, puede comprenderse que el incumplimiento normativo tenga consecuencias jurídicas. Es lo que ocurre com la llamada inconstitucionalidad por omisión cuando el incumplimiento fuese por parte del legislador, especialmente en los supuestos en los que la Constitución impusiese un "mandato", privando al legislador de la libertad para determinar si actúa o no actúa, y circunscribiendo esa libertad a la decisión del momento en que se pueda producir su intervención legislativa. (...)
"La ulterior superación de la teoria del dogma de la voluntad, supuso – sobre todo a partir de ls aportaciones de BETTI – a el colocar el centro de gravitación del negocio jurídico, no en la declaración de voluntad, sino en la autonomia privada. Y la autonomia privada no se manifiesta – afirma BETTI – exclusivamente a través de declaraciones de voluntad, sino de comportamientos que pueden constituir expresiones de la misma. El próprio BETTI va a rechazar que se pueda atribuir al silencio la condición de una declaración de voluntad. Para este autor este modo de actuar, próprio de quienes exaltan el dogma de la voluntad, responde a una "mentalidad individualista". No tiene sentido justificar determinados efectos acudiendo a la ficción de declaración tácita o implícita. El silencio nunca puede calificarse como una declaración de voluntad, ni siquiera tácita.
"Este rechazo a dotar de um sentido declarativo al silencio generaría la reacción de autores como TRABUCCHI o SANTORO PASSARELLI. Para éstos, la relevancia jurídica del silencio no vendría tanto de su carácter de presunción de voluntad, sino de modalidad de presupuesto de hecho al que la ley anuda un efecto jurídico, es decir, al que se vincula por mandato de la norma, la producción de una modificación en el mundo jurídico. Ésta será la expresión del silencio más adecuada para ser asumida por el Derecho Público, donde, en virtud de la necesidad de garantizar la seguridad jurídica, el derecho a la tutela judicial u otros derechos sustantivos que, como se dijo, pueden resultar bloqueados por la inactividad de la Administración, el silencio debe ser considerado, no como un "acto", sino como un "hecho jurídico, al que se atribuya por mandato de ley distintos efectos según cada concreta circunstancia." (El Silencio Administrativo en Derecho Tributário, Navarra, Aranzadi Editorial, 2001, p. 17, 19, 20, 29 e 30)
Ora, o art. 100, § 1º. – A da CF/88 não disse, expressamente, que os honorários advocatícios sucumbenciais não deveriam ser havidos como de natureza alimentar; silenciou a respeito.
Não há norma constitucional alguma que imponha a esse silêncio, ou que sequer lhe relacione indiretamente, a conseqüência jurídica de extrair-se aquela conclusão negativa, de não serem ditos honorários sucumbenciais, créditos de natureza alimentar.
Aliás, inclusive a hermenêutica tradicional sempre foi avessa a utilizar-se da norma legal para definir conceitos jurídicos controversos, deixando à doutrina e à jurisprudência essa tarefa.
Portanto, não há fundamento normativo de qualquer espécie que autorize concluir-se no sentido de que os honorários advocatícios sucumbenciais não constituem créditos de natureza alimentar, ao contrário do que já decidido em sede de controle de inconstitucionalidade pelo Eg. STF.
Forçoso concluir-se, desse modo, e ao final, pela natureza alimentícia dos créditos devidos pela Fazenda Pública, a título de honorários advocatícios sucumbenciais.
Deve-se aplaudir, conseqüentemente, a decisão proferida pela Colenda 1ª. Turma do Eg. STF, quando do julgamento do RE no. 470407-DF, Rel. Min. Marco Aurélio, dec. Un. Pub. DJU 13.10.2006, cuja respectiva ementa passo a transcrever:
"CRÉDITO DE NATUREZA ALIMENTÍCIA. ARTIGO 100 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. A definição contida no § 1º.-A do artigo 100 da Constituição Federal, de crédito de natureza alimentícia, não é exaustiva.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. NATUREZA. EXECUÇÃO CONTRA A FAZENDA. Conforme o disposto nos artigos 22 e 23 da Lei no. 8.906/94, os honorários advocatícios, incluídos na condenação, pertencem ao advogado, consubstanciando prestação alimentícia cuja satisfação pela Fazenda ocorre via precatório, observada ordem especial restrita aos créditos de natureza alimentícia, ficando afastado o parcelamento previsto no artigo 78 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, presente a Emenda Constitucional no. 30, de 2000. Precedentes: Recurso Extraordinário no. 146.318-0-SP, Segunda Turma, Relator Ministro Carlos Velloso, com acórdão publicado no Diário da Justiça de 4 de abril de 1997, e Recurso Extraordinário no. 170.220-6-SP, Segunda Turma, por mim relatado, com acórdão publicado no Diário da Justiça de 7 de agosto de 1998."