Hodiernamente, devido às constantes ações de criminosos, organizados ou não, tendentes a desestabilizar o poder estatal, o tema "combate à criminalidade" passou a ter grande destaque nos veículos de comunicação e, sobretudo, no meio político e jurídico.
Muitos juristas, políticos e pessoas do povo dão suas opiniões, em geral depreciativas e equivocadas, sobre as instituições responsáveis pelo sistema da segurança pública e sistema penitenciário e apresentam soluções para o problema, tais como: aumento da pena, redução da maioridade penal, reforma processual, separação dos presos observando-se o grau de periculosidade, dentre outras.
Com efeito, as propostas acima apresentadas poderiam, em princípio, trazer bons resultados, mas evidentemente a resolução do problema depende, acima de tudo, de uma providência principal, qual seja, o restabelecimento do amplo poder investigativo da autoridade policial.
Com o advento da "Constituição Cidadã", promulgada pela Assembléia Constituinte para "libertar" o povo da opressão e arbitrariedade imposta pelo regime militar, erigiu-se um novo conceito de Estado, sobre os alicerces do "Estado de Direito" e do regime político "Democrático", com a concessão de "Direitos e Garantias Fundamentais", para um povo que não estava, e ainda não está, preparado para exercê-los, e com o enfraquecimento do poder da Polícia Judiciária, que, durante a ditadura, fora utilizada para o cometimento de arbitrariedades contra os opositores do sistema de exceção, impondo, por conta disso, restrições à atuação policial na persecução penal.
O nosso sistema processual, do tipo acusatório, estabelece, nitidamente, a separação e as atribuições dos envolvidos na persecução penal. Inicialmente, na fase extraprocessual, no âmbito da Polícia Judiciária, temos a autoridade policial, ou seja, o delegado de polícia, com atribuição exclusiva para, de maneira imparcial e independente, esclarecer o fato criminoso e a respectiva autoria, e, na seqüência, temos a fase processual com as participações independentes do promotor de justiça, autor da ação penal, do acusado e do juiz de direito.
Durante a fase extraprocessual, ou seja, investigativa, a autoridade policial instaura inquéritos policiais para colher elementos probatórios a fim de se verificar a ocorrência ou não de uma infração penal. Devido a sua imparcialidade, o delegado de polícia, autoridade legalista, atua para esclarecer o fato supostamente criminoso com o escopo de se obter a verdade real dos fatos, seja para incriminar, seja para inocentar o suspeito.
Todavia, com o advento da Constituição Federal de 1988, a atividade de Polícia Judiciária foi extremamente cerceada sob o argumento de que seria necessário limitar as prerrogativas da autoridade policial para se garantir o exercício dos "Direitos Fundamentais". A partir de então, o legislador adotou a equivocada técnica de condicionar quase todas as providências investigativas (em especial: mandado de busca domiciliar, interceptação telefônica, quebra de sigilo e prisão temporária), a prévia autorização judicial. Com isso, o legislador desprestigiou a função da autoridade policial, que é um servidor público concursado e bacharel em Direito, e dificultou o exercício da atividade policial investigativa, contribuindo, involuntariamente, para o aumento da criminalidade e da impunidade.
Como é cediço, o criminoso é dinâmico, seu expediente é diuturno e ininterrupto, e não está sujeito aos entraves procedimentais. Assim como o criminoso, a Polícia Judiciária está permanentemente de plantão, mas, por outro lado, tem a sua atuação parcialmente restringida por condicionantes legais, que cerceiam e comprometem o dinamismo, a celeridade imprescindível para a eficiência da atuação policial, o que, aliás, favorece apenas o criminoso.
O Poder Judiciário, em razão da essência da sua função e do déficit de juízes, não tem condições de acompanhar o expediente e o dinamismo do criminoso e da Polícia Judiciária. Por esse motivo, a técnica legislativa de se condicionar quase todas as providências investigativas a controle prévio pelo Poder Judiciário é um grande equívoco, pois compromete, de forma irreparável, a eficiência, a celeridade da atuação da Polícia Judiciária, e beneficia o criminoso, visto que facilita a destruição de provas e consequentemente ocasiona a impunidade. Portanto, concluí-se que, para se preservar o dinamismo da ação policial, o controle de legalidade pelo Poder Judiciário deve ser ulterior e não anterior à prática da diligência.
Diante de tal quadro, o delegado de polícia pode ser equiparado ao chefe de estado em um regime monárquico de governo, pois não passa de uma figura emblemática cujos poderes e atribuições são extremamente limitados.
A Polícia Judiciária é atualmente uma instituição renovada e cônscia de seu dever de tutelar os Direitos Fundamentais da pessoa humana. É, indiscutivelmente, a instituição pública mais transparente e fiscalizada, pois, além da fiscalização interna, é também fiscalizada diretamente pelo Poder Judiciário e, indiretamente, pelos advogados, pelo Ministério Público, pela Ouvidoria, pela Polícia Militar, pela Guarda Municipal, pela Imprensa e pela própria sociedade.
Urge mudar essa realidade! O legislador constituinte originário e a sociedade devem restabelecer o amplo poder investigativo da Polícia Judiciária em prol do combate ao desenfreado crescimento da criminalidade. Felizmente, não mais vivemos sob a égide de um estado de exceção e de ditadura militar, mas, por outro lado, corremos o risco iminente de vivermos sob o jugo da criminalidade se não confiarmos nas instituições públicas em especial na Polícia Judiciária ou Civil, que, por sua atuação, deveria estar imune a ingerências políticas e ser reconhecida e inserida no ordenamento constitucional como uma instituição autônoma e essencial à justiça, e não como apenas um órgão da segurança pública.