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A responsabilidade tributária dos administradores.

A incidência do art. 135, III, do CTN

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Agenda 16/01/2008 às 00:00

5. A natureza da responsabilidade dos administradores

De início, achamos relevante rememorar as teses possíveis de serem adotadas no que tange à natureza da responsabilidade tributária decorrente da incidência do art. 135, III, do CTN (ver item III do parecer):

i) Responsabilidade por substituição, exclusiva do administrador que incidiu numa das hipóteses legais;

ii) Responsabilidade subsidiária, em sentido próprio, do administrador e "responsabilidade" principal da sociedade;

iii) Responsabilidade principal do administrador e subsidiária da sociedade;

iv) Responsabilidade subsidiária, em sentido impróprio, do administrador;

v) Responsabilidade solidária do administrador que responde com a sociedade igualmente e sem benefício de ordem.

A mera leitura dos acórdãos do Superior Tribunal de Justiça pode levar confusão mental ao estudioso do tema. Em muitos acórdãos, lê-se que a responsabilidade tributária prevista no art. 135 do CTN é por substituição (p. ex., AgRg no REsp 724.180/PR, REsp 670.174/RJ). Noutros julgados, está expresso que a responsabilidade acolhida nesse preceito legal é subsidiária (p. ex., REsp 833.621/RS, REsp 545.080/MG); logo, por transferência tributária. Noutros, menciona-se a responsabilidade solidária (p. ex., REsp 86.439/ES, AgRg no AG 748.254/RS). Chegamos a encontrar ementa de acórdão em que se refere, simultaneamente, à responsabilidade subsidiária e à responsabilidade por substituição (EDcl no REsp 724.077/SP).

A existência de julgados aparentemente contraditórios, porém, não exime o intérprete da lei e da jurisprudência de examiná-los procurando coerência. Ainda que a lei não seja coerente, nem o seja a prática judicial, deve sê-lo o hermeneuta, por imposição não só de técnica, mas também de justiça. É o que indica Norberto Bobbio: "Là dove la coerenza non è condizione di validità, è però pur sempre condizione per la giustizia dell’ordinamento" [12] (grifo do original).

Apesar da aparente dissonância, não cremos que exista verdadeira divergência jurisprudencial nesse ponto. Em verdade, o Superior Tribunal de Justiça simplesmente não acolhe a distinção feita doutrinariamente entre responsabilidade por substituição e por transferência. Assim, quando se lê que o sócio responde "por substituição", não se quer desonerar a sociedade. Simplesmente, quer-se dizer que o sócio-gerente responde em lugar da (em substituição à) sociedade quando esta não adimple os créditos tributários e é caso de aplicação do art. 135, III, do CTN.

Na prática, em grande parte dos casos, a Fazenda Pública costuma buscar primeiro o patrimônio da sociedade para só então, em caso de insucesso, pesquisar bens pessoais dos administradores, o que é coerente com um sistema de responsabilidade subsidiária. Essa práxis é abonada pela jurisprudência, batizando-se essa operação de "redirecionamento da execução fiscal". Neste, a ação de execução fiscal é ajuizada contra a sociedade e, não havendo satisfação do crédito, inclui-se o administrador no pólo passivo do processo executivo. Admite-se, ainda, que a ação de execução seja diretamente ajuizada contra sociedade e administrador, se o nome deste constar da Certidão da Dívida Ativa. Nessa hipótese, é incongruente afirmar que a responsabilidade do sócio-gerente é por substituição, visto que, no mesmo processo, está-se cobrando dele o crédito tributário sem "irresponsabilizar" a sociedade.

A análise da jurisprudência do STJ no que tange à responsabilidade derivada da aplicação do art. 135, III, do CTN deve se basear mais nos seus pressupostos e conclusões do que em atenção aos signos "substituição", "pessoalmente", "subsidiária" e "solidária" que comumente surgem qualificando a responsabilidade tributária do "sócio-gerente" que comete infração à lei. Assim, para se desvendar a natureza da responsabilidade acolhida, devemos partir, antes de tudo, da natureza dos atos que ensejam essa responsabilidade.

Como vimos no item anterior, o STJ, quando admite o chamamento do administrador à execução fiscal, parte da idéia de responsabilidade por ato ilícito. É a ilicitude que permite sua responsabilização, ilicitude esta que deve ter sido praticada durante o exercício da gerência. É irrelevante a condição de sócio; não é suficiente a condição de administrador; é necessária a prática de ato ilícito.

Pois bem. Se o elemento relevante para a caracterização da responsabilidade tributária do art. 135, III, do CTN fosse a condição de sócio, faria sentido a tese da responsabilidade subsidiária. Deveras, se o terceiro respondesse por ser sócio, seria plenamente razoável que demandasse o esgotamento do patrimônio da sociedade para que só então viesse a ser chamado a pagar o crédito tributário. Como, porém, não responde por ser sócio, mas porque, na condição de administrador, pratica ato ilícito, não faz o menor sentido que seja facultado a ele esquivar-se da responsabilidade exigindo que, primeiro, responda a sociedade para, só em caso de sua insolvabilidade, seja a ele imposta a sanção pela ilicitude.

A concepção de responsabilidade por ato ilícito exclui o caráter de subsidiariedade da obrigação do infrator. Este deve responder imediatamente por sua infração, independentemente da suficiência do patrimônio da pessoa jurídica. Eis o sentido de estar expresso no caput do art. 135 do CTN que são "pessoalmente responsáveis" os administradores infratores da lei. Dessa forma, deve ser excluída a tese da responsabilidade subsidiária em sentido próprio.

Dessa forma, ainda nos casos em que os julgados do STJ mencionam a "responsabilidade subsidiária", só é razoável interpretá-los como referentes à responsabilidade subsidiária em sentido impróprio, tal qual já a conceituamos no início. Vale dizer, nesse caso, estariam os julgadores exigindo, para a responsabilização do administrador-infrator, três requisitos cumulativos: (a) a própria condição de administrador, (b) a prática de ato ilícito e (c) a ausência de pagamento do crédito tributário no prazo da lei ou do regulamento; não se deve exigir, porém, o esgotamento do patrimônio da pessoa jurídica.

O afastamento da tese da responsabilidade subsidiária ainda é corroborado por importante precedente da egrégia Primeira Seção. Trata-se dos Embargos de Divergência 702.232/RS (Rel. Min. Castro Meira, julgado em 14.9.2005 e publicado em 26.9.2005), em que a Corte, apesar de ter por mira a presunção de certeza e liquidez da Certidão da Dívida Ativa, acabou por firmar que, estando o administrador (sócio-gerente) nela contemplado, pode ser a execução movida diretamente contra ele, ao lado da pessoa jurídica. Vejamos a ementa:

"TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. ART. 135 DO CTN. RESPONSABILIDADE DO SÓCIO-GERENTE. EXECUÇÃO FUNDADA EM CDA QUE INDICA O NOME DO SÓCIO. REDIRECIONAMENTO. DISTINÇÃO.

1. Iniciada a execução contra a pessoa jurídica e, posteriormente, redirecionada contra o sócio-gerente, que não constava da CDA, cabe ao Fisco demonstrar a presença de um dos requisitos do art. 135 do CTN. Se a Fazenda Pública, ao propor a ação, não visualizava qualquer fato capaz de estender a responsabilidade ao sócio-gerente e, posteriormente, pretende voltar-se também contra o seu patrimônio, deverá demonstrar infração à lei, ao contrato social ou aos estatutos ou, ainda, dissolução irregular da sociedade.

2. Se a execução foi proposta contra a pessoa jurídica e contra o sócio-gerente, a este compete o ônus da prova, já que a CDA goza de presunção relativa de liquidez e certeza, nos termos do art. 204 do CTN c⁄c o art. 3º da Lei n.º 6.830⁄80.

3. Caso a execução tenha sido proposta somente contra a pessoa jurídica e havendo indicação do nome do sócio-gerente na CDA como co-responsável tributário, não se trata de típico redirecionamento. Neste caso, o ônus da prova compete igualmente ao sócio, tendo em vista a presunção relativa de liquidez e certeza que milita em favor da Certidão de Dívida Ativa.

4. Na hipótese, a execução foi proposta com base em CDA da qual constava o nome do sócio-gerente como co-responsável tributário, do que se conclui caber a ele o ônus de provar a ausência dos requisitos do art. 135 do CTN.

5. Embargos de divergência providos".

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Transcrevemos o trecho mais importante do voto do Min. Relator:

"A questão dos autos (responsabilização tributária do sócio-gerente) aponta para três situações de fato distintas:

a) execução promovida exclusivamente contra a pessoa jurídica e, posteriormente, redirecionada contra o sócio-gerente, cujo nome não constava da CDA;

b) execução inicialmente proposta contra a pessoa jurídica e o sócio-gerente e

c) execução promovida exclusivamente contra a pessoa jurídica, embora do título executivo constasse o nome do sócio-gerente como co-responsável.

Cada uma dessas hipóteses implica solução jurídica diferenciada.

No primeiro caso, correta a orientação adotada pela Primeira Turma. Iniciada a execução contra a pessoa jurídica e, posteriormente, redirecionada contra o sócio-gerente, que não constava da CDA, cabe ao Fisco demonstrar a presença de um dos requisitos do art. 135 do CTN. Se da CDA consta apenas a pessoa jurídica como responsável tributária, decorre que a Fazenda Pública, ao propor a ação, não visualizava qualquer fato capaz de estender a responsabilidade também ao sócio-gerente. Se, posteriormente, pretende voltar-se também contra o patrimônio do sócio, deverá demonstrar a infração à lei, ao contrato social ou aos estatutos ou, ainda, dissolução irregular da sociedade. Nesse sentido, há precedentes de ambas as Turmas:

(...)

Na segunda hipótese, encontra-se correta a tese esposada pela Segunda Turma. Se a execução foi proposta contra a pessoa jurídica e contra o sócio-gerente, a questão resolve-se com a inteligência do art. 204 do CTN c⁄c o art. 3º da Lei n.º 6.830⁄80, segundo os quais a Certidão de Dívida Ativa goza de presunção relativa de liquidez e certeza (admite prova em contrário, a cargo do responsável), tendo o efeito de prova pré-constituída.

Proposta a execução, simultaneamente, contra a pessoa jurídica e o sócio-gerente, haverá inversão do ônus da prova, cabendo a este último demonstrar que não se faz presente qualquer das hipóteses autorizativas do art. 135 do CTN. Nesta senda, também não há discordância entre as Turmas:

(...)

Como se vê, as duas teses são perfeitamente conciliáveis, adotando-se uma ou outra a depender da situação fática subjacente à lide.

A terceira situação não difere substancialmente das duas anteriores. Se da CDA consta o nome do sócio-gerente, mas a execução é proposta somente contra a pessoa jurídica, é de se reconhecer que o ônus da prova compete igualmente ao sócio, tendo em vista a presunção relativa de liquidez e certeza que milita em favor da Certidão de Dívida Ativa.

Em conclusão: no caso em que a CDA já indica a figura do sócio-gerente como co-responsável tributário, tendo sido a ação proposta somente contra a pessoa jurídica ou também contra o sócio, há presunção relativa de liquidez e certeza do título que embasa a execução, cabendo o ônus da prova ao sócio. Na hipótese típica de redirecionamento, há presunção também relativa de que não estavam presentes, na propositura da ação, os requisitos necessários à constrição patrimonial do sócio. Nessa circunstância, inverte-se o ônus da prova, que passará à Fazenda Pública exeqüente" (grifo nosso).

De acordo com o voto do Min. Relator, há três situações admissíveis:

i) o nome do administrador não está na CDA e a execução é ajuizada contra a pessoa jurídica: trata-se de redirecionamento em sentido estrito;

ii) o nome do administrador está na CDA, mas a execução é ajuizada somente contra a pessoa jurídica: trata-se de redirecionamento em sentido impróprio, pois o responsável já consta do título executivo;

iii) o nome do administrador está na CDA e a execução é ajuizada diretamente contra o sócio, ao lado da pessoa jurídica: não se trata de redirecionamento.

Para efeito de análise da responsabilidade derivada do art. 135, III, do CTN, é útil analisar a hipótese iii, em que se admite o ajuizamento da execução fiscal diretamente contra o administrador (sócio-gerente), o que denota a existência, desde o início, de pretensão do Fisco diretamente contra ele, em momento em que ainda não se procurou esgotar os bens do patrimônio da pessoa jurídica.

Deve-se notar que a admissão do responsável, desde o início, no pólo passivo do processo de execução não se resume a questão de legitimidade. Se se estivesse diante de processo de conhecimento, poder-se-ia estar diante de mera análise de legitimidade, pois uma pessoa pode participar desse tipo de processo ainda que não haja pretensão de direito material contra si, havendo o autor, mesmo no caso de improcedência, exercido seu direito de ação.

No processo de execução, as coisas se passam distintamente. Neste, não se admite o processamento da ação se o juízo não estiver convencido da existência da pretensão e da ação de direito material. É que a exigibilidade do crédito (ou, impropriamente, do "título executivo") é pressuposto do processo de execução. É o que nos ensinam Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart:

"O título executivo, judicial ou extrajudicial, deve conter obrigação certa, líquida e exigível. É o que prescreve claramente o art. 586 do CPC, em relação à execução de títulos extrajudiciais, e também o que decorre da leitura do contido nos arts. 475-I, § 2º, e 475-J do CPC.

Tais características eram comumente associadas ao título executivo, mas na verdade – como agora fazem questão de esclarecer as novas redações dos arts. 580 e 586 (introduzidas pela Lei 11.382/2006) – são atributos da obrigação a ser executada. Ou seja, é a obrigação que deve ser certa, líquida e exigível e não propriamente o título" [13] (grifo nosso).

Dessa forma, se o STJ admite que, estando presumida a responsabilidade do sócio-gerente (mencionado na CDA), é possível que a execução seja ajuizada diretamente contra ele, está também admitindo que, nessa hipótese, a Fazenda Pública tem, desde o início, pretensão plenamente exigível contra esse administrador, pois não é possível impor a execução a alguém contra quem não se tem obrigação exigível. Ora, se a obrigação contra o responsável é desde já exigível, não dependendo de condição futura (como, p. ex., o esgotamento da busca do patrimônio da pessoa jurídica), é insustentável defender que essa responsabilidade seja subsidiária em sentido próprio.

Note-se bem a diferença: (a) no processo de conhecimento, o juiz pode permitir que figure no pólo passivo da demanda pessoa contra quem não tenha o autor ainda crédito exigível (por exemplo, obrigação com condição ou termo); (b) no processo de execução, o juiz não pode permitir que figure no pólo passivo da demanda pessoa contra quem não tenha o autor crédito exigível. Logo, se a jurisprudência permite que a execução seja proposta contra o terceiro – responsável –, está, conseqüentemente, admitindo que este tem obrigação exigível para com a Fazenda Pública.

No processo de execução, o juiz, para admitir o processamento da ação, parte do direito material já atestado. Como diz Paulo Cesar Conrado: "(...) i) se, por meio do primeiro (processo de conhecimento), o Estado-juiz ‘diz o direito material tributário’ (partindo dos fatos sociais que foram reconstruídos, no processo, por meio da linguagem das provas), ii) no processo de execução, o Estado-juiz parte do ‘direito material tributário já dito’, reconhecendo que a obrigação (tributário ou sua anversa) já se encontra ‘dita’ (...)" [14]. A citação encaixa-se perfeitamente em nosso caso. Se o STJ admite a execução contra o administrador, diretamente e não por mero redirecionamento, é porque reconhece, por pressuposto, a exigibilidade da obrigação do responsável, o qual, nesse caso, não responde por mera subsidiariedade. Do contrário, estar-se-ia admitindo "denunciação da lide realizada pelo autor em processo de execução", o que é inadmissível, ao menos no Brasil [15].

Não existe ação de execução sem a presença de pretensão a uma prestação exigível. O processamento dessa ação depende da existência de pretensão a ser exercida. Assim, no processo executório, diferentemente do processo cognitivo, é válida a afirmação de F.C. Pontes de Miranda no sentido de que "se se exerce a ação, exerce-se a pretensão de que faz parte" [16]. Destarte, podemos assegurar que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, ao admitir o ajuizamento da execução fiscal diretamente contra o sócio-gerente, ao lado da sociedade, está por admitir também que a pretensão contra este é desde já exigível, podendo o Fisco ingressar em seu patrimônio sem que seja necessário esgotar a busca de bens da empresa. Assim, deve-se excluir tanto a tese da responsabilidade subsidiária (em sentido próprio) do administrador quanto a tese da responsabilidade subsidiária da pessoa jurídica.

Por força do mesmo julgado (EREsp 702.232/RS), absolutamente seguido pelas Turmas que compõem a Primeira Seção daquela colenda Corte Superior, que admite que figurem como réus da execução tanto o administrador quanto a pessoa jurídica, não é possível acolher a tese da responsabilidade por substituição. Ora, se o administrador responde ao lado da pessoa jurídica, obviamente, sua responsabilidade não é exclusiva, não devendo ser desonerada a sociedade empresária.

Realmente, preocupando-se o Direito Tributário com o fato econômico da circulação de riqueza, se a pessoa jurídica promove esse fato econômico, surge para si a obrigação tributária, independentemente de haver ilicitude ou não por parte dos administradores. Não há o menor sentido em "desonerar" dos respectivos tributos a pessoa jurídica que "auferiu faturamento", "vendeu mercadorias", "prestou serviços". Portanto, deve ser excluída a tese da responsabilidade tributária exclusiva, por substituição propriamente dita.

Por tudo isso, cremos que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça sustenta, em substância, a tese da responsabilidade solidária. Essa conclusão é confirmada por precedente em que a própria Fazenda Pública saiu derrotada. Trata-se do REsp 717.717/SP, em que a Primeira Seção do STJ, apesar de ter acatado tese desfavorável ao INSS, negando validade à interpretação do art. 13 da Lei 8.620/93 que permitia a responsabilização de sócios sem poderes de gerência, arrimou-se no art. 1.016 do atual Código Civil, que determina a responsabilidade solidária dos administradores perante terceiros (inclusive o Fisco). A idéia principal desse acórdão é que, ainda em relação às contribuições para a Seguridade Social, os sócios-gerentes somente são "solidariamente" responsáveis quando cometerem um dos atos do art. 135 do CTN. Ora, assim, presumiu-se que a responsabilidade do art. 135 é solidária.

De fato, representando as normas de responsabilidade tributária "garantia" especial ao crédito tributário, não faz sentido algum interpretar o Código Tributário Nacional de modo a dotar essa espécie de crédito de menor garantia que os créditos comuns da empresa para com terceiros. Assim, se, por força do Código Civil, respondem os administradores solidariamente com a pessoa jurídica pelos atos ilícitos que cometerem, não é possível aceitar que, se o ato ilícito for cometido contra a Administração Tributária, a responsabilidade desse administrador fique condicionado à ausência de bens da sociedade, bem como não é correto defender que a pessoa jurídica fique desonerada [17].

A tese da responsabilidade subsidiária – em sentido próprio – peca por ler implícito no art. 135 do CTN a condição de "impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte" (pessoa jurídica), condição esta que só está expressa somente no art. 134 do CTN, que, de fato, instituiu responsabilidade subsidiária para as pessoas ali descritas. Demais disso, se a responsabilidade do art. 135 do CTN também fosse subsidiária, perderia sentido o inciso I desse mesmo art. 135. Qual é o sentido de responsabilizar subsidiariamente, pela prática de ato ilícito, quem já é responsável subsidiário? O único sentido possível do inciso I do art. 135 do CTN é o seguinte: os responsáveis subsidiários do art. 134, caso pratiquem ilicitude, passam a ter responsabilidade solidária, respondendo juntamente com a pessoa jurídica independentemente de haver "impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal" por parte desta; nesse caso, a responsabilidade subsidiária cede para a responsabilidade solidária, que é mais rigorosa.

Por sua vez, a tese da responsabilidade por substituição, pessoal e exclusiva, peca por prever implícito no art. 135 do CTN a desoneração da pessoa jurídica contribuinte, coisa que não está dita nem insinuada nesse dispositivo legal. A desoneração do contribuinte não pode ocorrer por obra de mera interpretação extensiva; demanda, rigorosamente, norma expressa nesse sentido. Logo, não havendo qualquer preceito que afaste o dever da pessoa jurídica de pagar o crédito tributário, continua ela com este dever, sem óbice para a exigência de pagamento também do terceiro responsável.

Em verdade, a responsabilidade tributária imposta ao administrador em decorrência da prática de ato ilícito é, no que tange ao nascimento, à natureza e à cobrança, autônoma da responsabilidade (em sentido amplo) da pessoa jurídica contribuinte pelo pagamento do crédito tributário. O dever desta decorre de ato lícito: o fato jurídico tributário propriamente dito (evento econômico – produção, circulação ou detenção de riqueza). Já a responsabilidade daquele decorre de ato ilícito: a "infração de lei" prevista no caput do art. 135 do CTN. A hipótese normativa de nascimento duma obrigação é fato lícito; a doutra, fato ilícito. Em substância, as naturezas de ambas as obrigações são distintas. A obrigação do responsável é tributária tão-só mediatamente, pois a norma que a impõe remete seu prescritor à obrigação tributária stricto sensu. Em suma, trata-se de obrigações distintas, autônomas (nesses termos), atadas entre si simplesmente pelo nexo de adimplemento: o pagamento duma extingue a outra.

Assim, surgindo a responsabilidade do administrador-infrator, não temos uma obrigação solidária propriamente dita, senão obrigações solidárias. Explicamos. Não temos uma obrigação unitária com pluralidade de sujeitos passivos na relação jurídica. Temos, isto sim, duas ou mais obrigações, ligadas pelo vínculo da solidariedade. É o que a doutrina antiga chamava de solidariedade imprópria.

J.M. de Carvalho Santos [18], citando a lição de Windscheid baseada no direito romano, diferenciava a solidariedade perfeita da solidariedade imperfeita. Na primeira, haveria unidade de obrigação e pluralidade de sujeitos. Na última, haveria pluralidade de obrigações e unidade de execução. Essa distinção também foi mencionada por Paulo de Lacerda [19]. F.C. Pontes de Miranda [20], por sua vez, assim explica os conceitos de que estamos tratando:

"Entre diferentes créditos do mesmo credor contra diferentes devedores, pode dar-se que um se libere se o outro solve a dívida. A causa seria a mesma, na solidariedade: na solidariedade imperfeita, há duas ou mais, conforme o número de devedores. Pode-se dizer que a solidariedade dita imperfeita não é solidariedade? Não. O que não se confunde com a solidariedade é a concorrência de pretensões sem solidariedade".

A utilidade do conceito de solidariedade imperfeita para a análise da responsabilidade do terceiro infrator está em observar que sua obrigação não se confunde com a obrigação do contribuinte. As referidas obrigações nascem em momentos distintos, têm natureza distinta uma da outra e podem ser declaradas pela autoridade competente em momentos distintos; nesse sentido, são autônomas. Sem embargo disso, há entre elas nexo de adimplemento, de modo que o pagamento duma obrigação extingue a outra, por isso podemos dizer que são obrigações solidárias (solidariedade imperfeita). Além disso, a responsabilidade em sentido estrito (do administrador que incorre no art. 135 do CTN) é subordinada à obrigação tributária do contribuinte, no sentido de que sua existência, validade e eficácia dependem de ser existente, válida e eficaz esta última. Isso demonstra que estamos diante de relação jurídica de garantia. Nesse sentido, a obrigação do responsável é subordinada (à existência, validade e eficácia da obrigação do contribuinte).

Enfim, tomando por base a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, cremos que devam ser descartadas as teses da responsabilidade substitutiva e subsidiária (em sentido próprio) do administrador que comete ato ilícito e incorre no art. 135 do CTN. Assim, quando se lê nos julgados a menção de que respondem os "sócios-gerentes" "por substituição", deve-se entender aí meramente a referência à responsabilidade em sentido amplo, em que o responsável responde "em lugar" do contribuinte. Por sua vez, nas ementas em que se observa a expressão "responsabilidade subsidiária", somente podemos aí tomar a responsabilidade subsidiária em sentido impróprio, a qual exige, além da condição de administrador e da prática de ato ilícito, a ausência pagamento pontual do tributo (a antiga "insolvência comercial"), e não a insolvabilidade do contribuinte (pessoa jurídica). A responsabilidade subsidiária em sentido impróprio confunde-se, em seus efeitos práticos, com a responsabilidade solidária.

Dessa forma, em conclusão, restando somente as teses da responsabilidade subsidiária em sentido impróprio e a da responsabilidade solidária, pensamos ser mais adequada a adoção desta última, seja em razão dos fundamentos encontrados nos mais diversos julgados do Superior Tribunal de Justiça, seja em razão da interpretação sistemática da ordenação tributária. Logo, o terceiro que (a) for administrador e (b) cometer o ato ilícito no exercício da gerência da empresa responde solidariamente com a pessoa jurídica pelo pagamento do crédito tributário, sendo sua responsabilidade (do administrador-infrator) autônoma da obrigação do contribuinte quanto ao nascimento, à natureza e à cobrança, mas subordinada quanto à existência, validade e eficácia. Demais disso, as responsabilidades de cada responsável são autônomas entre si, quanto à existência, validade e eficácia, sendo atadas tão-somente pelo nexo de adimplemento.

Por fim, ressalvamos que o art. 135, III, do CTN pode ser aplicado para responsabilizar não só o administrador de direito, mas também o administrador de fato da empresa. Assim, ainda que o estatuto ou contrato social não confira poderes a um dos sócios para praticar atos de gerência, se este é o administrador de fato da pessoa jurídica, deve ser igualmente responsabilizado pela prática de atos ilícitos.

Sobre o autor
Anselmo Henrique Cordeiro Lopes

Procurador da República. Mestre e Doutor (cum laude) em Direito Constitucional pela Universidad de Sevilla. Ex-Procurador da Fazenda Nacional.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LOPES, Anselmo Henrique Cordeiro. A responsabilidade tributária dos administradores.: A incidência do art. 135, III, do CTN. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1659, 16 jan. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10854. Acesso em: 23 dez. 2024.

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