De todos os lugares vinham aos milhares. E em pouco tempo eram milhões. Invadindo ruas, campos e cidades. Espalhando amor aos corações. Em resposta o céu se iluminou. Uma luz imensa apareceu. Tocaram fortes os sinos, os sons eram divinos. A paz tão esperada aconteceu. Inimigos se abraçaram e juntos festejaram. O bem maior, a paz, o amor e Deus.
(A Guerra dos Meninos – Roberto Carlos)
RESUMO. O presente texto tem por finalidade precípua analisar sem efeitos exaurientes a novíssima Lei nº 14. 826, de 2024, que instituiu a parentalidade positiva e o direito ao brincar como estratégias intersetoriais de prevenção à violência contra crianças.
Palavras-chave. Parentalidade; positiva; prevenção; violência; crianças.
INTRODUÇÃO.
Uma Nação verdadeiramente desenvolvida passa necessariamente pelos cuidados dispensados às nossas crianças e valorização dos nossos idosos. A vida é feita de ciclos. Cada fase da vida representa um mundo; fantasias, sonhos e realidade. Tudo no seu tempo, espaço e hora; há momentos para brincar e se divertir; há tempo para se desenvolver e produzir; há tempo de maturidade e sabedoria. Portanto, a vida é uma roda gigante, que vai girando, o tempo vai passando, as fases vão sendo paulatinamente superadas; geralmente, os conceitos jurídicos e físicos vão sendo superados, facilmente perceptível: criança, adolescente, juventude, pessoa idosa. Cada momento em que se vive, aumentam-se as páginas do livro da vida.
Pensando nesse desenvolvimento gradativo, a partir da proteção da criança, etapa prioritária para o crescimento de um país, o legislador pátrio fez introduzir no ordenamento brasileiro a novíssima Lei nº 14.826, de 20 de março de 2024, cuja finalidade é de instituir a parentalidade positiva e o direito ao brincar como estratégias intersetoriais de prevenção à violência contra crianças. A novíssima ordem jurídica nasce a partir da apresentação do Projeto de Lei nº 2861/2023, cuja autora Deputada Federal LAURA CARNEIRO, apresentou robusta e assaz justificação, a saber:
“(...) A presente iniciativa legislativa fundamenta-se no preâmbulo da Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, reconhecendo que a criança, para pleno e harmonioso desenvolvimento de sua personalidade, deve crescer no seio da família, em um ambiente de felicidade, amor e compreensão; no Art. 226 § 8º da Constituição Federal que determina que o Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações e Art. 227 que estabelece o dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de coloca-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. Pesquisa nacional de violência doméstica contra crianças publicada em abril de 2023 aponta que 90% das violências acontecem em ambientes domésticos. Segundo dados do Disque 100, 72,7% das violências aconteceram na casa onde reside a vítima e o suspeito, 15,7% na casa da vítima e 5,2% na casa do suspeito. Os dados apontam para a urgência de políticas públicas de prevenção que promovam habilidades parentais de educação e disciplina não violenta, recursos notoriamente associados às mudanças relacionais no contexto familiar e, como consequência, a redução dos conflitos e da aplicação de violência. Desde os primeiros meses de vida, as crianças adquirem habilidades importantes por meio do brincar com objetos e pessoas. Ao brincar, elas exploram diferentes objetos e reagem a estímulos lúdicos propostos por pessoas próximas, além de exercitar suas habilidades de maneira prazerosa. À medida que essas habilidades se tornam mais complexas, o brincar proporciona oportunidades para aprender em contextos de relações socioafetivas, onde são desenvolvidas habilidades como cooperação, autocontrole e negociação. Além disso o brincar estimula a imaginação e a criatividade.1 A parentalidade positiva é uma abordagem que tem como objetivo promover a relação de afeto, confiança e vínculo entre pais e filhos, por meio de atividades lúdicas e recreativas. Trata-se de uma forma de interação que valoriza o brincar, o riso e a descontração como elementos importantes para o desenvolvimento infantil e para o fortalecimento dos laços familiares. A abordagem tem se mostrado eficaz para fortalecer o vínculo emocional entre pais e filhos. Segundo um estudo publicado na revista "Frontiers in Psychology",a prática de atividades lúdicas com os filhos pode promover uma comunicação mais aberta e empática entre pais e filhos, além de reduzir o estresse familiar e aumentar a autoestima das crianças.2 A Lei nº 13.257/2016, que instituiu o Marco Legal da Primeira Infância, reconhece a importância do brincar para o desenvolvimento infantil e estabelece que é dever do Estado e da sociedade garantir às crianças o direito de brincar. Embora a parentalidade lúdica não seja mencionada de forma explícita na legislação brasileira, o artigo 4º da lei estabelece que é dever do Estado garantir a convivência familiar e comunitária da criança, assegurando seu direito ao brincar e ao lazer, e incentivando a participação dos pais nesse processo. A legislação ainda prevê que as políticas públicas devem promover a participação das famílias na construção de um ambiente seguro e acolhedor que estimule o desenvolvimento integral e saudável das crianças. O artigo 9º da mesma lei estabelece que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios devem criar programas e serviços que promovam a participação das famílias na educação e cuidado das crianças na primeira infância, inclusive por meio de atividades lúdicas e recreativas. Assim, embora não haja menção explícita à parentalidade lúdica, a Lei nº 13.257/2016 reconhece a importância do brincar – primeira linguagem da criança – no desenvolvimento infantil e estabelece medidas para promover a participação dos pais nesse processo, visando garantir um ambiente propício ao desenvolvimento integral e saudável das crianças na primeira infância. O Programa Criança Feliz, criado pelo Decreto nº 9.579/2018, tem como objetivo colaborar no exercício da parentalidade e fortalecer os vínculos familiares, visando o cuidado, a proteção e a educação de crianças na faixa etária de até seis anos de idade. O programa incentiva a participação dos pais nas atividades lúdicas e recreativas com seus filhos, promovendo assim a parentalidade lúdica de forma indireta. As melhores evidências disponíveis em nível global apontam para a importância de se investir em ações de apoio ao cuidado e programas de Educação Parental como ferramenta de combate à violência, acolhimento e empoderamento familiar. O documento técnico INSPIRE – Sete Estratégias pra pôr fim à violência contra crianças e adolescentes da Parceria Global pelo Fim da Violência, iniciativa das Nações Unidas, apresenta algumas das evidências internacionalmente reconhecidas dos impactos positivos da educação parental. Existem evidências promissoras que apontam para a eficácia da capacitação em habilidades parentais e do apoio oferecido por meio de grupos. Um exemplo é a iniciativa ACT Raising Safe Kids, que foi implementada em pelo menos dez estados dos Estados Unidos e em diversos países de renda média e baixa. Esse programa mostrou-se eficaz ao reduzir em até 50% o uso de práticas disciplinares severas. Outro exemplo é o programa SOS!, oferecido por profissionais da Atenção Primária em Saúde em Unidades Básicas de Saúde durante visitas de rotina para imunização. Esse programa reduziu significativamente o comportamento parental abusivo ou negligente em uma série de países de renda média ou baixa3. Estudos realizados com famílias no Brasil mostram que o estilo parental autoritário, caracterizado pela baixa responsividade e baixa exigência, é considerado o mais prejudicial para o desenvolvimento infantil4. Por outro lado, estilos parentais participativos, baseados em práticas positivas, são reconhecidos por promover habilidades sociais e minimizar problemas comportamentais em crianças5. Programa6 de visitas domiciliares periódicas a famílias com gestantes e crianças menores de seis anos já demonstra resultados na redução da violência. Pesquisa experimental aponta que famílias que receberam o programa aplicaram 22% menos punições físicas (castigos e violências) nas crianças quando comparadas ao grupo de controle. Pais e mães atendidos pelo referido programa têm mais livros infantis em casa (probabilidade 14,4% maior) e interagem mais com os seus filhos. Eles ensinam canções numa probabilidade 13,2% maior do que os cuidadores de crianças que não são acompanhados pelo programa. A parentalidade lúdica pode ter um impacto significativo no desenvolvimento do país, pois promove a formação de indivíduos mais saudáveis e felizes. Crianças que crescem em um ambiente familiar e comunitário que valoriza o brincar e a interação positiva entre pais e filhos têm maior probabilidade de desenvolver habilidades socioemocionais, como empatia, autocontrole e resolução de conflitos, além de terem maior chance de sucesso escolar. Por outro lado, a falta de habilidades socioemocionais pode levar a problemas de comportamento, baixo rendimento escolar, dificuldades de relacionamento interpessoal e até mesmo ao envolvimento em atividades ilegais. Isso pode ter um impacto negativo no desenvolvimento do país, incluindo a perda de recursos financeiros e humanos e a redução da qualidade de vida da população. Considerando a importância e a urgência do tema, solicito o apoio à aprovação da matéria(...)”
Sabe-se que o Estatuto da Criança e do Adolescente prevê os direitos fundamentais das crianças e dos adolescentes, a partir do artigo 7º, elencado o direito à vida e à saúde; o artigo 15 define o direito à Liberdade, ao Respeito e à Dignidade e o artigo 19 define o Direito à Convivência Familiar e Comunitária.
De plano, o novo comando normativo determina que a parentalidade positiva e o direito ao brincar constituem políticas de Estado a serem observadas no âmbito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
Em seguida, pontua que é dever do Estado, da família e da sociedade proteger, preservar e garantir o direito ao brincar a todas as crianças. O conceito de criança no difere daquele definido no artigo 2º do ECA, considerando-se criança, para os fins da nova lei a pessoa com até 12 (doze) anos de idade incompletos.
Na seara do esforço coletivo, o artigo 4º determina que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios desenvolverão, no âmbito das políticas de assistência social, educação, cultura, saúde e segurança pública, ações de fortalecimento da parentalidade positiva e de promoção do direito ao brincar.
O novo comando normativo fornece conceito autêntico contextual, de parentalidade positiva, em seu artigo 5º, como sendo o processo desenvolvido pelas famílias na educação das crianças na condição de sujeitos de direitos no desenvolvimento de um relacionamento fundamentado no respeito, no acolhimento e na não violência.
A lei define ainda que ser dever do Estado, da família e da sociedade a promoção dos seguintes aspectos da parentalidade positiva:
I - manutenção da vida: ações de proteção e manutenção da vida da criança, de forma a oferecer condições para a sua sobrevivência e saúde física e mental, bem como a prevenir violências e violações de direitos;
II - apoio emocional: atendimento adequado às necessidades emocionais da criança, a fim de garantir seu desenvolvimento psicológico pleno e saudável;
III - estrutura: conjunto de equipamentos de uso comum destinados a práticas culturais, de lazer e de esporte, com garantia de acesso e segurança à população em geral;
IV - estimulação: promoção de ações e de campanhas que visem ao pleno desenvolvimento das capacidades neurológicas e cognitivas da criança;
V - supervisão: estímulo a ações que visem ao desenvolvimento da autonomia da criança;
VI - educação não violenta e lúdica: ações que promovam o direito ao brincar e ao brincar livre, bem como as relações não violentas.
Vale ressaltar noutro giro que a aplicação da novíssima lei, sem prejuízo dos princípios estabelecidos nas demais normas nacionais de proteção aos direitos da criança e do adolescente, terá como base, entre outros, os direitos e garantias fundamentais da criança e do adolescente a:
I - brincar livre de intimidação ou discriminação;
II - relacionar-se com a natureza;
III - viver em seus territórios originários;
IV - receber estímulos parentais lúdicos adequados à sua condição peculiar de pessoa em desenvolvimento.
A Lei em apreço se incumbiu de inserir o inciso VII, no artigo 5º da Lei nº 14.344, de 24 de maio de 2022, instrumento que criou mecanismos para a prevenção e o enfrentamento da violência doméstica e familiar contra a criança e o adolescente, nos termos do § 8º do art. 226 e do § 4º do art. 227 da Constituição Federal, a saber:
VII - promover a parentalidade positiva e o direito ao brincar como estratégias de prevenção à violência doméstica contra a criança e o adolescente.
REFLEXÕES FINAIS
Criança feliz
Feliz a cantar
Alegre a embalar
Seu sonho infantilOh! Meu bom Jesus
Que a todos conduz
Olhai as crianças
Do nosso Brasil(Criança Feliz- Do Re Mi)
Percebe-se, claramente, que o novo comando normativo instituiu a parentalidade positiva e o direito ao brincar como estratégias intersetoriais de prevenção à violência contra crianças.
A norma de violência traz a cláusula de vigência em seu artigo 11, dizendo que a lei entra em vigor após decorridos 180 (cento e oitenta) dias de sua publicação oficial. Assim, considerando os dispositivos do artigo 8º, § 1º, da Lei Complementar nº 95, de 1998, segundo o qual a contagem do prazo para entrada em vigor das leis que estabeleçam período de vacância far-se-á com a inclusão da data da publicação e do último dia do prazo, entrando em vigor no dia subsequente à sua consumação integral.
Desta feita, a novíssima em entrará em vigor no dia 17 de setembro de 2024, numa terça-feira, cabendo ao poder público editar atos normativos necessários à efetividade da lei, cabendo ainda aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios estabelecer as ações de promoção da parentalidade positiva e do direito ao brincar, em programas já existentes ou novos, no âmbito das respectivas competências.
É de bom alvitre ressaltar que a nova ordem jurídica se encontra em sintomia com os documentos e Declarações Universais dos Direitos das Crianças, a exemplo da DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS DAS CRIANÇAS – UNICEF, de 20 de Novembro de 1959, que destaca que a criança gozará de proteção especial e disporá de oportunidade e serviços, a serem estabelecidos em lei por outros meios, de modo que possa desenvolver-se física, mental, moral, espiritual e socialmente de forma saudável e normal, assim como em condições de liberdade e dignidade. Assevera que a criança deve desfrutar plenamente de jogos e brincadeiras os quais deverão estar dirigidos para educação; a sociedade e as autoridades públicas se esforçarão para promover o exercício deste direito. E mais que isso, a criança deve ser protegida contra toda forma de abandono, crueldade e exploração. Não será objeto de nenhum tipo de tráfico.
Para além disso, o Decreto nº 99.710 de 21 de novembro de 1990, promulgou a Convenção sobre os Direitos da Criança, a qual entrou em vigor internacional em 02 de setembro de 1990.
Por derradeiro, há de considerar a necessidade de proporcionar à criança uma proteção especial foi enunciada na Declaração de Genebra de 1924 sobre os Direitos da Criança e na Declaração dos Direitos da Criança adotada pela Assembleia Geral em 20 de novembro de 1959, e reconhecida na Declaração Universal dos Direitos Humanos, no Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos (em particular nos Artigos 23 e 24), no Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (em particular no Artigo 10) e nos estatutos e instrumentos pertinentes das Agências Especializadas e das organizações internacionais que se interessam pelo bem-estar da criança.
Assim, deve-se afirmar com todas as letras do alfabeto, de A a Z que proteger os direitos das crianças dentro de uma concepção focada na doutrina da proteção integral, é assegurar ao país uma expectativa de vida melhor, sadia e ética, próspera e alvissareira, longe da doutrinação nojenta e perniciosa, cada vez mais precoce, inundando nossos espaços sociais, escolares e familiares de um submundo de culturas paupérrimas, obscenas e cruéis, introduzindo literaturas com expressões de baixo calão, adoção de livros de apadrinhados políticos, constando no avesso da epiderme a podridão da militância patológica, abjeta e imunda, uma enxurrada de impropérios, fazendo mister a adoção da parentalidade positiva, com estratégias intersetoriais de prevenção à violência, assim, consistente num processo de escudo social, desenvolvido pelas famílias na educação das crianças na condição de sujeitos de direitos no desenvolvimento de um relacionamento fundamentado no respeito, no acolhimento e na não violência.
A inocência da criança, a doçura da vida; a estampa do amor inocente; assim, a criança é a fonte da pureza, anjo de alma pura e sentimento bom. A todos, a missão de conservar e proteger essas crianças, proporcionando-lhes um cenário de paz, fraternidade e amor pueril, fazendo brotar a esperança de bons fluidos de outono e promessa de proteção em todas as estações.
REFERÊNCIAS
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BRASIL. Lei nº 14.826, de 20 de março de 2024. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2023-2026/2024/lei/L14826.htm. Acesso em 21 de março de 2024.
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