Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br

Ataques a Brasilia: uma analise da intervenção federal e seus desdobramentos

RESUMO

A intervenção federal em Brasília, ocorrida em 08 de janeiro de 2023, após a invasão e vandalismo das sedes dos Três Poderes por apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro, representou um marco na história recente do Brasil. Este estudo analisa detalhadamente os eventos que levaram à intervenção, sua condução e os resultados obtidos, bem como as leis penais aplicáveis ao caso utilizando uma abordagem qualitativa documental e bibliográfica, foi examinado cuidadosamente o contexto político e social que motivou a intervenção, assim como os desdobramentos legais e penais decorrentes dos atos de violência. Também foi discutido acerca da eficácia da intervenção em restabelecer a ordem pública e proteger a institucionalidade democrática do país. Concluindo que, a intervenção federal teve um papel importante na contenção da crise naquele momento, mas também levantou questões necessárias sobre a democracia brasileira e a segurança institucional.

Palavras-chave: 08 de janeiro de 2023; Intervenção federal; Brasília; Violência política; Desdobramentos Penais.

ABSTRACT

The federal intervention in Brasília, which took place on January 8, 2023, after the invasion and vandalism of the headquarters of the Three Powers by supporters of former president Jair Bolsonaro, represented a milestone in the recent history of Brazil.

This study analyzes in detail the events that led to the intervention, its conduct and the results obtained, as well as the criminal laws applicable to the case. Using a qualitative documentary and bibliographical approach, the political and social context that motivated the intervention was carefully examined, as well as the legal and criminal consequences arising from acts of violence. It was also discussed about the effectiveness of the intervention in reestablishing public order and protecting the country's democratic institutions. Concluding that, federal intervention played an important role in containing the crisis at that time, but it also raised necessary questions about Brazilian democracy and institutional security.

Keywords: January 8, 2023; Federal intervention; Brasilia; Political violence; Criminal Developments.

INTRODUÇÃO

No dia 08 de janeiro de 2023, o Brasil testemunhou um evento de extrema gravidade e impacto político: a invasão e vandalismo das sedes dos Três Poderes em Brasília por apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro, conhecido como Intentona Bolsonarista. Essa crise representou uma séria ameaça à institucionalidade democrática e à segurança do Estado, exigindo medidas emergenciais para conter a violência e restaurar a ordem pública.

Com isso, nesta análise, investigaremos em detalhes os eventos que culminaram na intervenção federal no Distrito Federal, decretada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva como resposta aos atos de vandalismo. Utilizando uma abordagem metodológica hipotético-dedutiva e uma pesquisa qualitativa documental e bibliográfica, examinaremos a forma de criação e aplicação da intervenção federal, sua eficiência e possível legado.

Ao longo do presente estudo, será explorado o contexto político e social que levou à implementação da intervenção em Brasília, assim como os desdobramentos legais e penais decorrentes dos atos de violência. Além disso, analisaremos criticamente os resultados obtidos com a intervenção, confrontando-os com as expectativas iniciais e discutindo sua relevância para a democracia brasileira e para a estabilidade institucional do país.

Por fim, esta pesquisa visa contribuir para uma melhor compreensão dos eventos ocorridos em 08 de janeiro de 2023 e seus impactos sobre o cenário político nacional.

METODOLOGIA

A pesquisa foi fundamentada utilizando-se mão do método hipotético- dedutivo no qual trará um melhor entendimento sobre a forma de criação e aplicação da intervenção federal no dia 08 de janeiro de 2023, analisando sua aplicabilidade eficiência e possível legado.

Ainda, a abordagem adotada neste estudo é predominantemente qualitativa. Isso se deve à necessidade de compreender a natureza dos eventos ocorridos durante a intervenção em Brasília, bem como os fenômenos sociais e políticos que a motivaram e resultaram dela.

Serão analisados Documentos Oficiais, como decretos presidenciais, relatórios do interventor federal, pronunciamentos do governo e do Legislativo, bem como informações disponibilizadas por órgãos governamentais, para compreender o contexto e os detalhes da intervenção; Fontes Jornalísticas e Acadêmicas confiáveis para obter uma visão ampla e diversificada sobre os eventos e suas repercussões; Entrevistas e Pronunciamentos: Quando disponíveis, serão considerados pronunciamentos de autoridades envolvidas na intervenção, bem como entrevistas com especialistas em segurança pública, direito constitucional e política para aprofundar este presente trabalho; e também haverá a consulta em bibliografias, com autores como CONDÉ, QUIRINO e SCHROEDER.

Portanto, este estudo será caracterizado como uma pesquisa documental e bibliográfica, baseada na análise de documentos oficiais, fontes jornalísticas e acadêmicas e Constituição. Não houve coleta de dados primários por meio de pesquisa de campo, entrevistas ou questionários.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos
  1. REFERENCIAL TEÓRICO

A INTERVENÇÃO FEDERAL EM BRASÍLIA - 08 DE JANEIRO DE 2023

Em 08 de janeiro de 2023, Brasília, a capital do Brasil, testemunhou um evento sem precedentes. Apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro, também chamados de Intentona Bolsonarista ou simplesmente de 08 de janeiro, invadiram e vandalizaram as sedes dos Três Poderes: o Congresso Nacional, o Palácio do Planalto (sede da Presidência da República) e o Supremo Tribunal Federal.

Cerca de 4 mil pessoas de todo o território brasileiro, foram convocadas pelas redes sociais para ir a Brasília protestar contra a eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

As demandas solicitadas pelos violentadores incluíam uma intervenção militar, o fechamento do Congresso, a prisão de Lula e a retomada do poder por Bolsonaro. Esse episódio teve grande impacto significativo na história recente do país, gerando assim uma intervenção federal.

Essa intervenção também foi amplamente discutida em todo o país devido às decisões e ações tomadas pelo governo federal durante o período em que ela estava vigorando.

Com isso, vale ressaltar que, as situações constitucionais previstas que são passíveis de intervenção federal, estão listadas no art. 34 da Constituição, quais sejam:

Art. 34. A União não intervirá nos Estados nem no Distrito Federal, exceto para: (EC no 14/96 e EC no 29/2000) I–manter a integridade nacional; II– repelir invasão estrangeira ou de uma unidade da Federação em outra; III– pôr termo a grave comprometimento da ordem pública; IV–garantir o livre exercício de qualquer dos Poderes nas unidades da Federação; V– reorganizar as finanças da unidade da Federação que: a)suspender o pagamento da dívida fundada por mais de dois anos consecutivos, salvo motivo de força maior; b) deixar de entregar aos Municípios receitas tributárias fixadas nesta Constituição, dentro dos prazos estabelecidos em lei; VI–prover a execução de lei federal, ordem ou decisão judicial; VII– assegurar a observância dos seguintes princípios constitucionais: a) forma republicana, sistema representativo e regime democrático; b) direitos da pessoa humana; c) autonomia municipal; d) prestação de contas da administração pública, direta e indireta; e) aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e

serviços públicos de saúde. (BRASIL, 1988)

Ainda, a intervenção federal deve ser solicitada pelo governador do estado ou pelo presidente do Tribunal de Justiça no caso de estados e pelo prefeito no caso de municípios. A decisão de realizar este ato é tomada pelo Presidente da República, sendo que sua execução fica a cargo de um interventor nomeado pelo governo central. Ademais, destaca-se que é uma medida excepcional e temporária, destinada a restabelecer a normalidade e a ordem, geralmente envolvendo o uso das forças armadas ou de outros órgãos do governo central, e, em virtude disso, acaba sendo alvo de críticas pela forma como é aplicada, considerando que, como veremos adiante, carrega consigo um caráter violento e que minimiza a população que está subjugada pela intervenção Com isso, analisaremos em detalhes como a intervenção foi conduzida,

qual o contexto levou à sua implementação, o que ocorreu durante o período de intervenção em Brasília e se os objetivos que motivaram sua imposição foram alcançados ao seu término.

Intervenção em Brasília: contexto e condução

Com a promulgação dos votos da eleição de 2022, que declararam Luiz Inácio Lula da Silva como presidente eleito para o regime governamental durante os anos de 2023 a 2026, diversos protestos contrários a nomeação da nova presidência eclodiram ao redor do país, motivados pelos eleitores de Jair Messias Bolsonaro, ex-presidente do Brasil e que estava disputando a candidatura para renovar seu mandato na eleição mencionada.

Assim, considerando que Lula tomou a posse no início deste ano, em 08 de janeiro ocorreram diversos atos atentatórios à justiça e integridade física das pessoas no Palácio do Planalto Central, em Brasília, Distrito Federal, onde vários delitos de vandalismo foram cometidos por grupos extremistas que, inconformados com o resultado das eleições de 2022, decidiram invadir a futura moradia do novo presidente com o fito de demonstrar sua indignação perante à

decisão democraticamente tomada.

Após os atos terroristas de domingo (8/1), em Brasília, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) decretou intervenção federal no Distrito Federal. É a terceira vez desde 1988 que a União promove uma iniciativa do tipo, mas a intervenção no DF difere das estabelecidas no Rio de Janeiro e em Roraima, seja pela forma de gestão, seja pelo alcance. (RODAS, 2023)

Desta forma, o Senado aprovou o decreto de intervenção federal na segurança pública do Distrito Federal, decretado pelo presidente Lula após os atos destrutivos em Brasília, conforme acima mencionado. A intervenção previa efeitos até o final do mês de janeiro e visava conter a grave crise de ordem pública. O interventor, Rodrigo Garcia Capelli, secretário-executivo do Ministério de Justiça e Segurança Pública, tinha autoridade para comandar as forças de segurança do Distrito Federal e poderia requisitar recursos do governo local para a intervenção. A medida levou ao afastamento do governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha, pelo período de 90 dias, devido aos atos terroristas e alegada omissão das autoridades na área da segurança e inteligência. (SCHROEDER, 2023)

A medida foi vista como extrema e necessária, para restaurar a ordem pública após os atos de vandalismo e desordem causados. A Câmara dos Deputados aprovou o decreto, que recebeu o número 11.377/2023, e uma comissão externa de senadores foi proposta para acompanhar as investigações dos atos de vandalismo. (SENADO FEDERAL, 2023)

Alguns senadores questionaram a necessidade da intervenção, enfatizando a inação generalizada que levou aos distúrbios. Propôs-se a criação de uma comissão parlamentar de inquérito – CPI – para investigar os eventos, e os senadores ressaltaram a importância de responsabilizar aqueles que orquestraram e financiaram os atos. A democracia foi enfatizada como vencedora sobre a barbárie, e os prejuízos aos prédios governamentais foram compartilhados com emoção, destacando a importância de manter a instituição dos Três Poderes. (SENADO, 2023)

Dado este contexto, analisaremos os resultados obtidos com esta intervenção e a recepção pública perante o ato interventor realizado.

Os resultados obtidos x esperados da intervenção em Brasília

O decreto de intervenção federal em Brasília levantou questionamentos sobre suas consequências imediatas e repercussões internacionais devido às medidas restritivas de autonomia.

O federalismo é a regra explícita na Constituição Federal, mas a intervenção é necessária para conter atos de vandalismo e proteger o patrimônio público, como ocorreu no Distrito Federal.

Desta forma, a intervenção no Rio de Janeiro, durante o governo de Michel Temer, serviu como exemplo anterior de intervenção parcial, excepcional e temporária. A nomeação de um general como interventor gerou críticas de constitucionalistas, que argumentavam que a nomeação deveria ser baseada na idoneidade moral e capacidade civil em vez de ser militar. (CONDÉ, 2023)

A intervenção no Distrito Federal se assemelha à do Rio, mas há diferenças importantes. No primeiro não houve restrições à reunião, prisão ou locomoção, enquanto nos estados de defesa e de sítio, essas restrições são aplicadas. Uma questão pendente era a de que a intervenção seria prolongada até que a normalidade fosse restaurada, o que temporariamente mitigaria o poder constituinte derivado.

A aceitação internacional da intervenção por líderes em vários países foi notável e refletiu positivamente no governo brasileiro em termos de governança e governabilidade. No entanto, a confiança dos investidores estrangeiros nas empresas brasileiras tornou-se uma incógnita durante o período interventivo. (CONDÉ, 2023)

A punição dos infratores acampados e envolvidos em atos de vandalismo deve ser proporcional e razoável para garantir que tais atitudes não se repitam. O debate gira em torno de crimes de terrorismo ou vandalismo. Os gastos com a justiça e a aplicação da lei nessas situações desviam recursos que poderiam ser usados em áreas como educação, saúde, saneamento e moradia.

Em 31 de janeiro, assim como prometido pelo presidente quando foi proposta a intervenção federal em Brasília, chegou ao fim o ato interventivo, com a publicação do relatório dos resultados obtidos pelo agente interventor, ou seja,

Ricardo Cappeli. O interventor federal apresentou o resultado das ações tomadas durante este período e voltou ao cargo de secretário-executivo do Ministério da Justiça e Segurança Pública com o fim da medida excepcional, tendo sigo designado Sandro Avelar para assumir a gestão de segurança pública no Distrito Federal. (QUIRINO,2023)

De acordo com um relatório apresentado pelo interventor federal, todos os eventos de vandalismo em Brasília têm relação com o acampamento instalado em frente ao Quartel-General entre novembro de 2022 e janeiro de 2023.

Além disso, destacou a falta de responsabilidade entre os comandos de segurança e apontou a instabilidade gerada pela posse de Anderson Torres na Secretaria de Segurança Pública. Autoridades foram informadas sobre o aumento de pessoas no quartel-general dias antes do vandalismo iniciar, o que demonstra a negligência com que os entes agiram frente a aglomeração e protestos iminentes prestes a explodir. (SCHWINGEL, 2023)

Durante a intervenção, houve a exoneração de comandantes, chefes e subchefes da Polícia ligados à operação de 8 de janeiro. Seis inquéritos policiais militares foram abertos para investigar a conduta e omissões envolvendo os ataques. Além disso, o secretário-executivo, chefe de gabinete e subsecretária de Inteligência também foram exonerados.

O relatório apresentado pelo interventor destacou falhas operacionais relativas à tentativa de golpe do Estado em 8 de janeiro. O documento incluiu fotos, imagens e informações sobre o acampamento dos extremistas, que foi denominado de “minicidade terrorista” no relatório. Ele também revela que a Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal recebeu informações de inteligência sobre a probabilidade de atos violentos na capital, mas não elaborou um plano operacional nem emitiu ordens de serviço para a atuação policial. (QUIRINO, 2023)

Além disso, investigações começaram a ter andamento, incluindo a prisão de ex-autoridades como Anderson Torres, Fábio Augusto Vieira e o governador Ibaneis Rocha, que permaneceu afastado mesmo após o fim do período interventivo. (SCHWINGEL, 2023)

Fazendo uma comparação com os atos interventivos ocorridos no Rio de Janeiro em 2018, percebem-se algumas diferenças entre as aplicações de cada

intervenção.

Primeiramente, temos as motivações de cada intervenção. A do Rio de Janeiro foi motivada pela grave crise de segurança pública e aumento de violência no estado, que incluiu problemas com o tráfico de drogas e crimes violentos, tendo maior foco na segurança. Já a de Brasília foi uma resposta aos atos de vandalismo e expectativa de golpe de Estado, tratando-se, de fato, de uma medida excepcional em reação às atitudes antidemocráticas e de violência que atingiram os prédios dos Três Poderes da República.

A natureza da intervenção do Rio de Janeiro envolveu principalmente a área de segurança pública, com a atuação das forças armadas e medidas focadas na redução da violência. Embora a de Brasília também tenha envolvido a segurança pública, ela teve um caráter mais abrangente, incluindo medidas para lidar com os atos já mencionados acima.

Também, destaca-se a diferença na duração entre ambas as medidas, considerando que a do Rio perdurou por quase um ano, e a de Brasília limitou- se apenas a um mês.

Quanto às autoridades envolvidas, na intervenção do Rio de Janeiro as forças armadas desempenharam um papel central na segurança pública, com a nomeação de um general como um interventor. Todavia, em Brasília, o interventor escolhido atua dentro da administração pública, com caráter de idoneidade moral e capacidade civil.

Por fim, em relação aos desdobramentos legais, a intervenção carioca teve impactos na segurança pública e na autonomia do estado, com a suspensão de emendas constitucionais durante o período que vigorou. Já em Brasília, embora o foco tenha sido parecido em relação à área de atuação, sua principal motivação legal fora a resposta aos atos que a motivaram, não tendo a mesma longa duração ou restrições legislativas como as citadas no fenômeno anterior.

Enquadramentos penais ao ataque em Brasília

O ataque ocorrido em Brasília às sedes dos Três Poderes em janeiro de 2023, representa uma séria ameaça à institucionalidade democrática e à segurança do

Estado. As medidas institucionais para combater esse tipo de violência devem ir além do plano jurídico, abrangendo também ações políticas para desmantelar o suporte desses eventos nas casas legislativas e no Executivo.

No entanto, no âmbito legal punitivo, o Código Penal brasileiro oferece instrumentos para lidar com tais situações, especialmente por meio do CAPÍTULO II, intitulado como "Dos delitos contra as estruturas democráticas", dedicado diretamente aos "Crimes contra o Estado Democrático de Direito", incluído ao CP por meio da Lei 14.197/21.

Este capítulo do CP engloba dois delitos específicos: a abolição violenta do Estado Democrático de Direito (artigo 359-L) e o golpe de Estado (artigo 359-M). Esses delitos lidam diretamente com a essência do Estado de Direito, que se expressa mediante a estabilidade e a operação adequada de suas instituições democráticas, como podemos ver:

Abolição violenta do Estado Democrático de Direito

Art. 359-L. Tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais:

Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, além da pena correspondente à violência.

(BRASIL, 1940)

Golpe de Estado

Art. 359-M. Tentar depor, por meio de violência ou grave ameaça, o governo legitimamente constituído:

Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 12 (doze) anos, além da pena correspondente à violência.

(BRASIL, 1940)

Os tipos penais presentes nesse título, como citados acima "abolição violenta do Estado Democrático de Direito" e "golpe de estado", são, contudo, aplicáveis às invasões e depredações das sedes dos poderes constitucionais brasileiros. A depredação desses espaços não apenas restringiu o exercício dos poderes, mas também representou uma ameaça pessoal aos seus integrantes, além de evidenciar a intenção clara de abolir o Estado Democrático de Direito, pedindo a deposição do governo eleito democraticamente por um regime militar.

Nesse contexto, os invasores diretos e organizadores devem responder criminalmente, mesmo que a maioria escape da punição. Além disso, a omissão daqueles que deveriam evitar tais eventos, também pode configurar crimes, como

prevaricação.

Prevaricação

Art. 319 - Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal:

Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa. [...]

(BRASIL, 1940)

É importante destacar que os eventos de 8 de janeiro de 2023 extrapolaram qualquer manifestação legítima de crítica aos poderes constitucionais, não sendo possível alegar causa de exclusão de ilicitude, pois como pode-se ver, essa exclusão está retratada no art. 23 do Código Penal, e com isso, os criminosos que atentaram bens públicos não se encaixam:

Art. 23 - Não há crime quando o agente pratica o fato:

I - em estado de necessidade;

II - em legítima defesa;

III - em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito. Excesso punível

Parágrafo único - O agente, em qualquer das hipóteses deste artigo, responderá pelo excesso doloso ou culposo.

(BRASIL, 1940)

Prosseguindo no caso da invasão e vandalismo das sedes dos Três Poderes, além atentado à ordem pública e a democracia, outros artigos do direito penal brasileiro podem ser aplicados a esses invasores, sendo assim:

Dano

Art. 163 - Destruir, inutilizar ou deteriorar coisa alheia: Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.

Dano qualificado

Parágrafo único - Se o crime é cometido:

I - com violência à pessoa ou grave ameaça;

II - com emprego de substância inflamável ou explosiva, se o fato não constitui crime mais grave

III - contra o patrimônio da União, de Estado, do Distrito Federal, de Município ou de autarquia, fundação pública, empresa pública, sociedade de economia mista ou empresa concessionária de serviços públicos

IV - por motivo egoístico ou com prejuízo considerável para a vítima:

Pena - detenção, de seis meses a três anos, e multa, além da pena correspondente à violência.

(BRASIL, 1940)

E ainda:

Violação de domicílio

Art. 150 - Entrar ou permanecer, clandestina ou astuciosamente, ou contra a vontade expressa ou tácita de quem de direito, em casa alheia ou em suas dependências:

Pena - detenção, de um a três meses, ou multa. [...]

§ 4º - A expressão "casa" compreende:

[...]

III - compartimento não aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou atividade.

(BRASIL, 1940)

Além das repercussões penais, também se deve considerar a busca por reparação cível pela depredação do patrimônio público, mesmo que os danos sejam considerados irreparáveis. Essas considerações, feitas no contexto do direito penal e dos tipos de crime de proteção ao Estado Democrático de Direito, estão sujeitas a mudanças à medida que os acontecimentos se desdobram.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

O dia 08 de janeiro de 2023 marcou um evento sem precedentes na história recente do Brasil, com a invasão e vandalismo das sedes dos Três Poderes em Brasília por apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro, também conhecido como Intentona Bolsonarista ou simplesmente 8 de Janeiro. Este evento teve consequências significativas para a estabilidade política e social do país, bem como para a democracia brasileira. Abaixo, destacam-se alguns resultados e discussões sobre esse acontecimento histórico:

ASPECTO

RESULTADOS/CONSIDERAÇÕES

Ameaça à institucionalidade

democrática

O ataque representou uma séria

ameaça à institucionalidade

democrática e à segurança do Estado.

Medidas institucionais

As medidas para combater esse tipo de violência devem ir além do plano jurídico, abrangendo também ações

políticas.

Instrumentos legais

O Código Penal brasileiro oferece instrumentos para lidar com essas situações, especialmente por meio do Capítulo II, dedicado aos "Crimes contra o Estado Democrático de

Direito".

Tipos penais aplicáveis

Os tipos penais de "abolição violenta do Estado Democrático de Direito" e "golpe de Estado" são aplicáveis às invasões e depredações das sedes dos poderes constitucionais.

Restrição do exercício dos poderes

A depredação desses espaços restringiu o exercício dos poderes constitucionais, além de representar uma ameaça pessoal aos seus

integrantes.

Responsabilidade dos invasores

Os invasores diretos e organizadores devem responder criminalmente, mesmo que a maioria escape da

punição.

Aplicação de outros artigos do CP

Outros artigos do Código Penal brasileiro, como os relacionados ao dano e à violação de domicílio, podem

ser aplicados aos invasores.

Omissão das autoridades

A omissão daqueles que deveriam

evitar tais eventos também pode

configurar

prevaricação.

crimes,

como

a

Busca por reparação cível

Além das repercussões penais, também se deve considerar a busca por reparação cível pela depredação do

patrimônio público.

Mudanças à medida que acontecimentos se desdobram

os

As considerações feitas no contexto do direito penal e dos tipos de crime de proteção ao Estado Democrático de Direito estão sujeitas a mudanças à medida que os acontecimentos se

desdobram.

Quadro elaborado pelas autoras: Maria Eduarda Gonçalves Soares e Rayssa Marcela Leite Mineiro.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A intervenção federal em Brasília, desencadeada pelos eventos ocorridos em 08 de janeiro de 2023, foi um episódio marcante na história política do Brasil. Este estudo proporcionou uma análise aprofundada dos eventos que levaram à intervenção, sua condução e os resultados obtidos.

Observou-se que a intervenção foi uma medida excepcional e necessária para conter a grave crise de ordem pública desencadeada pela invasão e vandalismo das sedes dos Três Poderes na capital brasileira.

Ao longo desta pesquisa de análise, ficou evidente que a intervenção teve impactos significativos na estabilidade política e na segurança institucional do país. Embora tenha sido eficaz na contenção imediata da crise, levantou importantes questões sobre a democracia brasileira e a fragilidade das instituições democráticas diante de atos de violência política.

As implicações legais e penais decorrentes dos eventos de 08 de janeiro também foram examinadas, destacando a necessidade de responsabilização dos envolvidos e a aplicação adequada da lei para garantir a preservação do Estado de Direito.

No entanto, é importante ressaltar que este estudo não esgota todas as questões relacionadas à intervenção federal em Brasília. A pesquisa possibilita reflexões contínuas e está sujeita a revisões à medida que novas informações e análises surgem.

Por fim, este estudo ressalta a complexidade e a delicadeza dos desafios enfrentados pelo sistema democrático brasileiro diante de crises políticas. A intervenção federal em Brasília não apenas evidenciou a necessidade de medidas excepcionais para garantir a ordem e a estabilidade institucional, mas também destacou a importância de um debate contínuo sobre os limites e as implicações dessas intervenções para a democracia.

REFERÊNCIAS:

BRASIL. Código Penal. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto- lei/del2848compilado.htm . Acesso em: 03 abr. 2024

BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidente da República, [1988]. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 03 abr. 2024

CONDÉ, Joseane de Menezes. Os impactos da intervenção no Distrito Federal. São Paulo: Migalhas,2023. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/380419/os-impactos-da-intervencao-federal- no-distrito-federal . Acesso em: 03 abr. 2024

QUIRINO, Flávia. Termina intervenção federal na segurança pública do DF. Brasília,DF: Brasil de Fato, 2023. Acesso em: 03 abr. 2024 em:https://www.brasildefatodf.com.br/2023/01/31/termina-intervencao-federal-na- segurança-publica-do-df-decretada-apos-os-atos-golpistas. Acesso em: 03 abr. 2024

RODAS, Sérgio. Intervenção federal no DF é a terceira decretada desde a Constituiçãode1988.Conjur,2023.Disponívelem:https://www.conjur.com.br/2023- jan-10/intervencao-federal-df-terceira-decretada- 1988. Acesso em: 03 abr. 2024

SCHROEDER, Lucas. Entenda o que significa a intervenção federal no DF. São Paulo: CNN, 2023. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/politica/entenda-o- que-significa-a-intervencao-federal-no-df/. Acesso em: 03 abr. 2024

SENADO FEDERAL. Intervenção federal na segurança pública do DF vai apromulgação.Brasília:AgênciaSenado,2023.Disponível em:https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2023/01/10/intervencao-federal- na- seguranca-publica-do-df-vai-a-promulgacao. Acesso em: 03 abr. 2024

SCHWINGEL, Samara. Intervenção federal na segurança do DF chega ao fim e Capelli diz que a missão foi “cumprida”. Brasília, DF: Metrópoles, 2023. Disponível em: https://www.metropoles.com/distrito-federal/intervencao-federal-na- seguranca-do-df-chega-ao-fim-e-cappelli-diz-que-missao-foi-cumprida. Acesso em: 03 abr. 2024

Sobre os autores
Herbeth Barreto de Souza

Advogado e Professor. Mestre em Ciências Criminais pela PUCRS e Professor da disciplina de Direito Penal IV da FACSUR︎

Rayssa Marcela Leite Mineiro

Discente do Curso de Direito da Facsur

Maria Eduarda Gonçalves Soares

Discente do Curso de Direito da Facsur

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!