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Desigualdade de gênero: a evolução dos direitos femininos

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Agenda 28/06/2024 às 00:17

3. POLÍTICAS PÚBLICAS PARA MULHERES

Políticas Públicas são ações e programas desenvolvidos pelo governo, visando garantir certos direitos à população e colocá-los em prática de maneira efetiva. Em suma são ações práticas do Estado para garantir o melhor interesse público e a solução de problemas sociais que afetam toda uma coletividade. Esses problemas podem resultar do surgimento de novos fatores, fatores reprimidos ou recorrentes, que expressam problemas não resolvidos ou mal resolvidos.

O Planejamento, a criação e execução das ações de Políticas Públicas são realizados pelos três poderes, cada qual com sua Função. Assim o Poder Executivo é responsável pelo planejamento e aplicação da medida, o Legislativo deve criar as leis, já o Judiciário deve fazer o controle da Lei e confirmar se ela é adequada para o cumprir o objetivo.

Ocorre um ciclo que consiste em 7 etapas. Na primeira etapa ocorre a identificação do problema, com o reconhecimento de situações que precisam de uma solução ou melhora. A partir desse ponto na segunda etapa é formada uma agenda definida pelo governo, levando em conta a relevância social e urgência. Na terceira etapa será discutida as alterativas que podem ser eficazes na solução do problema. Assim chegamos à tomada de decisão, etapa onde serão definidas as ações que serão executadas. A partir daí na quinta etapa teremos a implementação das medidas.

Assim após a medida ser colocada em prática, a próxima etapa avalia a eficiência dos resultados e a necessidade de ajustar as medidas para melhores resultados. Por fim na sétima e última etapa, pode ocorrer a extinção da política pública, pois ela alcançou seu proposito e o problema deixou de existir ou se demonstrou ineficaz e perdeu importância diante de outras necessidades mais relevantes.

Atualmente conforme descreve Mello e Marques do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA (2008), as Políticas Públicas para mulheres são elaboradas baseadas em quatro visões a partir da qual a presença feminina é compreendida:

  1. Visão Reprodutiva; o Estado parte da Maternidade para definir necessidades e responsabilidades. Mulheres como mãe e cuidadoras

  2. Visão Produtiva; reforçando os papéis femininos como mães responsáveis pela família e pelo cuidado de dependentes. Adotando aspectos que orientam a ampliação ou inclusão produtivas das mulheres em ações como o Programa de Fomento às Atividades Produtivas Rurais. Mulheres enquanto mão de obra de trabalho remunerado.

  3. Visão Inclusiva; Mulheres como “Público-Alvo” prioritário. Ações voltadas a partir da identificação do problema como a redução da violência contra a mulher e na política nacional de atenção à saúde da mulher.

  4. Visão Reativa; Inclusão Posterior no planejamento de uma política pública, quando o Estado identifica que as mulheres compõem parte significativa e atua para corrigir ou aprimorar o bom andamento da política.

Dessa forma, as políticas públicas devem ser discutidas e planejadas com atenção especial a todas as particularidades, diante ao desafio de construir ferramentas que efetivamente atendam a superação da desigualdade de gênero, com a transformação de estruturas sociais que alcancem mudanças no comportamento, atitudes e valores, políticos, econômicos e culturais.

Conforme Tatau Godinho a ação feminista frente ao Estado na elaboração de políticas públicas apresenta um aspecto essencial para impulsionas uma agenda de políticas públicas direcionada à mulher:

Foi uma conquista do movimento de mulheres, como parte do reconhecimento destas como sujeitos sociais, como sujeitos de reivindicação, colocar-se como uma questão legítima as instituições políticas, os governos, os Estados se obrigarem a reconhecê-las na construção de políticas. Isso foi construído nesses 25, 30 anos, em alguns países 40 anos de organização política e social de mulheres, de um crescimento nosso enquanto um sujeito social coletivo, que faz com que as instituições e a sociedade não possam nos ignorar nem deixar de falar em políticas de gênero, políticas dirigidas às mulheres. Mas, à medida que se perde a radicalidade e se arrefecem as bases fundamentais do feminismo, de construção da igualdade real entre mulheres e homens – o que pressupõe uma luta por igualdade real entre os indivíduos -, essa legitimidade conquistada vai sendo assimilada ao mesmo tempo em que constrói novos traços para o feminismo. Traços que o limitam e introduzem uma face perversa: a igualdade ganha uma face segmentada e perde, portanto, seu desafio universal. Merecerá o nome de igualdade? Enquanto setores das mulheres podem usufruir um certo nível de igualdade que vai sendo construída, ou, pelo menos, um certo nível de direitos aos quais não tínhamos acesso, enquanto gênero, essa igualdade é totalmente permeada pela desigualdade geral da sociedade (Godinho, 2000, p.35-36)

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Em 1983, São Paulo e Minas Gerais tornaram-se os pioneiros a criar conselhos estaduais para discutir políticas públicas referente ao tema. No mesmo ano foi criado o Programa de Atenção Integral a Saúde da Mulher e após ele outros programas foram criados. Entre eles destacam-se; Casa da Mulher Brasileira, Central De Atendimento À Mulher, Protocolo De Atendimento As Vítimas de Violência Sexual, Pacto Nacional Pelo Combate À Violência Contra as Mulheres, Você Tem Voz, Eu Respeito As Mulheres, Maria da Penha Vai À Escola e Salve Uma Mulher.

3.1. Programas

A Casa Da Mulher Brasileira foi uma Ação do Programa Mulher Viver sem Violência desenvolvido pela Secretaria Nacional de Políticas para as Mulheres da Presidência da República. A primeira unidade foi inaugurada em 2015, em Campo Grande, Mato Grosso do Sul.

Trata-se de um centro de Atendimento humanizado e especializado no atendimento a mulher vítima de violência doméstica, que oferece apoio psicológico e jurídico, além de alojamento de passagem e capacitação para sua autonomia econômica.

Também destinado a mulher vítima de violência existe a Central de Atendimento a Mulher, o ligue 180, que além de receber os relatos de violência, encaminha o conteúdo a órgãos competentes e monitora o andamento dos processos.

Já o projeto Salve uma Mulher, foi instituído em 2019 em prol do enfrentamento, conscientização e prevenção a violência, em especial ao assédio sexual no ambiente do trabalho e a violência doméstica, em parceria com a sociedade civil e com serviços não-especializados da rede de atendimento à mulher.

Dentre os objetivos do programa, cabe citar a ampla divulgação da Lei Maria da Penha, dos direitos garantidos a mulher vítima de violência, fomento de iniciativas que conscientizem a sociedade sobre a importância do respeito e da igualdade de gênero e sobre o enfrentamento a violência doméstica e assédio no mundo do trabalho.

Assim como o Salve uma Mulher, um dos objetivos do programa Maria da Penha vai a escola é a disseminação da Lei 11.340/2006 - Lei Maria da Penha. O programa é fruto de Acordo de Cooperação Técnica entre diversas instituições, que se uniram para divulgar a Lei em escolas do Distrito Federal.

3.1.1. Coordenadoria de Políticas para Mulher

A Coordenadoria de Políticas para Mulher do Estado de São Paulo, criada em 2012, é um órgão do governo que visa promover a igualdade entre homens e mulheres por meio de elaboração de políticas públicas e da educação em direitos humanos relacionados ao tema. Suas diretrizes são: Contribuir na redução das desigualdades de gênero; combater todas as formas de discriminação; ampliar a cidadania das mulheres; possibilitar a autonomia pessoal das mulheres e Combater todas as formas de violência contra a mulher.

Os serviços diretos da Coordenadoria da Mulher são: As Casas de Atendimento às Mulheres Vítimas de Violência desenvolvem as seguintes atividades; os Centros de Referência e Atenção às Mulheres que Sofrem Violência Doméstica; Casas Abrigo e Centros de Cidadania a Mulher (CCMs)

As Casas de Atendimento às Mulheres Vítimas de Violência desenvolvem as seguintes atividades: Orientação por telefone a mulheres que precisem de apoio e agendamento de atendimento; Prestação de serviço-referência para o acompanhamento da questão da violência de gênero e para a realização dos encaminhamentos necessários a cada problema; Orientação, capacitação e formação de grupos de mulheres para o enfrentamento da violência sexual e doméstica; Casas Abrigo são espaços seguros que oferecem moradia sigilosa e protegida para as mulheres em situação de risco de vida iminente e seus filhos menores de 14 anos; Encaminhamento para Hospitais da rede municipal para atendimento de violência sexual e doméstica, inclusive nos casos de necessidade de cirurgia plástica reparadora.

Os Centros de Referência e Atenção às Mulheres que Sofrem Violência Doméstica são locais que tem objetivo prestar gratuitamente atendimento psicológico, social e jurídico às mulheres que sofrem violência doméstica e familiar.

A Casas Abrigo é um serviço sigiloso voltado para mulheres vítimas de violência doméstica e familiar que correm risco de vida por parte de seus agressores. As vítimas são encaminhadas através dos Centros de Atenção e Referência.

Os Centros de Cidadania a Mulher é um espaço de qualificação e formação em cidadania ativa, onde mulheres de várias raças e etnias podem se organizar e defender seus direitos sociais, econômicos e culturais.

3.2. Agenda 2030 da ONU

A agenda 2030 da ONU é baseada na concretização dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) adotados durante a Assembleia Geral das Nações Unidas, realiza em Nova York, em setembro de 2015;

Os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e 169 metas que estamos anunciando hoje demonstram a escala e a ambição desta nova Agenda universal. Eles se constroem sobre o legado dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio e concluirão o que estes não conseguiram alcançar. Eles buscam concretizar os direitos humanos de todos e alcançar a igualdade de gênero e o empoderamento das mulheres e meninas. Eles são integrados e indivisíveis, e equilibram as três dimensões do desenvolvimento sustentável: a econômica, a social e a ambiental. Os Objetivos e metas estimularão a ação para os próximos 15 anos em áreas de importância crucial para a humanidade e para o planeta. (NAÇÕES UNIDAS BRASIL, 2015, online).

Os 17 objetivos propostos são; a erradicação da pobreza, fome zero e agricultura sustentável, saúde e bem-estar, qualidade de ensino, igualdade de gênero, água potável e saneamento, energia acessível e limpa, trabalho decente e crescimento econômico, indústria, inovação e infraestrutura, redução das desigualdades, cidades e comunidades sustentáveis, consumo e produção responsáveis, ação contra a mudança global do clima, vida na água, vida terrestre, paz, justiça e instituições eficazes, parcerias e meio de implementação.

A igualdade de gênero, também conhecido como ODS5, busca alcançar a igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas. Para isso busca por fim a todos os meios de discriminação contra pessoas do sexo feminino, seja no âmbito social, no ambiente familiar e profissional, vejamos;

Objetivo 5. Alcançar a igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas.

5.1 Acabar com todas as formas de discriminação contra todas as mulheres e meninas em toda parte.

5.2 Eliminar todas as formas de violência contra todas as mulheres e meninas nas esferas públicas e privadas, incluindo o tráfico e exploração sexual e de outros tipos.

5.3 Eliminar todas as práticas nocivas, como os casamentos prematuros, forçados e de crianças e mutilações genitais femininas.

5.4 Reconhecer e valorizar o trabalho de assistência e doméstico não remunerado, por meio da disponibilização de serviços públicos, infraestrutura e políticas de proteção social, bem como a promoção da responsabilidade compartilhada dentro do lar e da família, conforme os contextos nacionais.

5.5 Garantir a participação plena e efetiva das mulheres e a igualdade de oportunidades para a liderança em todos os níveis de tomada de decisão na vida política, econômica e pública.

5.6 Assegurar o acesso universal à saúde sexual e reprodutiva e os direitos reprodutivos, como acordado em conformidade com o Programa de Ação da Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento e com a Plataforma de Ação de Pequim e os documentos resultantes de suas conferências de revisão.

5.a Realizar reformas para dar às mulheres direitos iguais aos recursos econômicos, bem como o acesso a propriedade e controle sobre a terra e outras formas de propriedade, serviços financeiros, herança e os recursos naturais, de acordo com as leis nacionais.

5.b Aumentar o uso de tecnologias de base, em particular as tecnologias de informação e comunicação, para promover o empoderamento das mulheres.

5.c Adotar e fortalecer políticas sólidas e legislação aplicável para a promoção da igualdade de gênero e o empoderamento de todas as mulheres e meninas em todos os níveis (NAÇÕES UNIDAS BRASIL, 2015, online).

Diante de todo o exposto vemos que a desigualdade de gênero é uma das principais problemáticas discutidas na atualidade.

3.3. Estatísticas Comprovam a Desigualdade de Gênero

Conforme Relatório disponível no site da ONU em 2019, a estimativa da população era 7,8 bilhões de pessoas no mundo, sendo 5,6 bilhões de mulheres e 2,2 bilhões de homens. No Brasil dados do IBGE de 2024 demonstram que 27,2 % das mulheres possuem nível superior, enquanto homens cerca de 19,5%. Contudo ao analisar outros dados, vemos claramente a discriminação que existe.

Taxa de Desemprego por Gênero no Brasil: a taxa de desemprego feminina foi historicamente maior do que a masculina. Dentre as mulheres desempregadas, 31,3% estavam nessa condição há pelo menos dois anos, enquanto entre os homens desempregados, essa proporção foi de 23%.

Desemprego Global: A Organização Internacional do Trabalho (OIT) estimou que o desemprego atingiria 220 milhões de pessoas no mundo em 2021. No recorte por gênero, a deterioração do mercado de trabalho foi pior para as mulheres. 

Desigualdade Salarial: Em 2019, as mulheres receberam, em média, 77,7% do montante auferido pelos homens. Essa desigualdade é ainda maior nas funções e cargos que asseguram os maiores ganhos. Entre diretores e gerentes, as mulheres receberam apenas 61,9% do rendimento dos homens.

Impacto dos Afazeres Domésticos: Comparando o tempo dedicado com afazeres domésticos dados revelam que as mulheres dedicam quase o dobro de horas semanais sendo 21,3 horas contra 11,70 horas semanais.

Em relação ao gênero feminino dados ainda demonstram que a renda tem grande impacto no período dedicado a afazeres. Mulheres com menores rendimentos chegam a dedicar mais de 24 horas semanais, enquanto as que possuem maiores rendimentos dedicam cerca de 18 horas semanais.

Força de Trabalho: A força de trabalho é composta por pessoas empregadas ou a procura de emprego. Quando verificamos esses dados entre mulheres com mais de 15 anos de idade, verifica-se que 54,5% integravam a força de trabalho, já analisando os homens 73,7% integram a força de trabalho. Ainda em relação a força de trabalho, analisando o gênero feminino, dados demonstram que mulheres com crianças com menos de 3 anos de idade integram 56,6% da força de trabalho, enquanto as mulheres sem crianças com menos de 3 anos de idade integram 66,2% da força de trabalho. Sendo oposto os dados quando comparamos os dados do gênero masculino. Homens com crianças com menos de 3 anos integram 89,% da Força de Trabalho, enquanto os sem criança com menos de 3 anos integram 82,8% da Força de Trabalho.

Mães Solo: Segundo estimativas da ONU, a média global de mães solo é de 8%. No Brasil durante 2012 a 2022, pesquisas da Fundação Getúlio Vargas, demonstraram um aumento de 17,8% nos números de lares chefiados por mães solteiras. Assim em 2022 no Brasil, o número estimado de mães solo ficou em 11,3 milhões. Dados ainda revelam que 14,9% dos lares brasileiros são chefiados por mães solo. A pesquisa também aborda que mães solos têm rendimento 39% inferior ao dos homens casados com filhos e 20% menor do que as mulheres casadas com filhos.

Jananína Feijó, da Fundação Getúlio Vargas, explica: “Mais de 50% dessas mães não possuem ensino superior ou ensino médio. Geralmente elas tiveram o primeiro filho numa idade muito jovem, no momento em que elas tiveram que interromper os estudos. Então isso tende a afetar a carreira profissional dela para sempre porque ela interrompe os estudos numa fase crucial de acumulação de capital humano”

Entrevistada sobre o tema, pelo Bom Dia Brasil, programa da Rede Globo, Iara da Silva, de 53 anos, que passou por tal situação diz: “Eu digo para você que é bastante complicado. O pai dá só o básico. A pensão alimentícia, só aquele básico e nada mais”. Ante o exposto é evidente as dificuldades sofridas por mães solo, na criação e sustento de seus filhos.

Sobre a autora
Márcia Cristina Gonçalves dos Santos

Graduada em Direito Pelo Centro Universitário Carlos Drummond de Andrade - Unidrummond Cursando Pós em Direito das Mulheres Cursando Pós em Direitos Humanos

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Trabalho apresentado ao Centro Universitário Carlos Drummond de Andrade – UNIDRUMMOND, Campus Tatuapé, como requisito para a conclusão do curso de Direito, sob orientação da professora Dra. Maria Regina de Castro Busnello.

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