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Concessão do pedido da tutela antecipatória na própria sentença

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Agenda 11/09/2024 às 19:28

5. Do dano em que pode incorrer o consumidor

O defeito oculto apresentado pelo bem adquirido, uma vez não solucionado no prazo de trinta dias, delimitado pelo art. 18, § 1.º, do CDC, dá margem a que uma série indeterminada de problemas sejam criados para o consumidor, que passa a viver a expectativa de quando a sua coisa irá ser restituída; qual o grau de confiabilidade no conserto e o que fazer para recuperar de imediato o prazer proporcionado pelo bem que, de repente, se viu privado do uso pelo fato de vício do produto, vício este que já estaria latente e não foi percebido pelo adquirente quando da sua compra.

Essas situações produzem lesões múltiplas e indiscriminadas ao patrimônio material e pessoal do lesado, de modo que se deve procurar sempre e compreensivamente a restitutio in integrum de todo o prejuízo experimentado. Daí porque tem o autor direito a ser indenizado tanto pelo dano patrimonial, quanto pelo dano moral que experimentar. O primeiro exige a produção de prova do dano e sua extensão. O segundo independe de prova porque nem sempre é causado por uma perda pecuniária, não se podendo avaliar ou visualizar ataque ao patrimônio do lesado. Ambos, entretanto, podem ser cumulados quando oriundos do mesmo fato, nos termos da Súmula n.º 37, do STJ.

Se os autos revelarem que se trata o consumidor de pessoa cuja notoriedade profissional é inconteste e inconspurcada, posto ser profissional com largo relacionamento no seu campo funcional, grau que, até prova em contrário, lhe confere a condição de pessoa de bem, sendo certo que, só por isso, ou seja, por ser pessoa de reputação ilibada e de todos conhecida, vivendo, por exemplo, em cidade notoriamente provinciana, mantendo vida honrada e recatada, com endereço residencial e profissional certos, deve merecer por parte dos vendedores, no mínimo, tratamento digno e atenção redobrada ao carro que lhes foi confiado para recuperação, mormente se for de fabricação multinacional, de valor elevado, cuja aquisição requer o desembolso de quantia vultuosa nem sempre permitida a todo cidadão.

Maior gravidade ocorrerá se não houver de imediato solução para o problema apresentado pelo veículo, ao ponto de deixar-se o consumidor a pé em virtude dos vendedores não haverem lhe ofertado carro reserva para sua locomoção, sabendo-se que o mesmo exerce atividade profissional que lhe exige o constante deslocamento a inúmeras repartições públicas e privadas, além do que possui filho cuja enfermidade patológica requer frequentes visitas a consultórios médicos, laboratórios e viagens a outros Estados para realização de exames não obtidos pelos estabelecimentos de saúde da cidade onde reside e Estados circunvizinhos.

Isso, obviamente, causa desgostos e aborrecimentos; macula a honra e a dignidade do indivíduo, pois, como preleciona Carlos Alberto Bittar

a frustração de objetivos visados é que, nessa área, produz os danos morais, no exato ponto em que atinge a moralidade ou afetividade do lesado, como em certas modalidades de contrato, embora em quaisquer outras posições negociais se possam sentir os mesmos reflexos negativos”.

(Reparação Civil por Danos Morais. 2.ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, p. 191).

Não há, como negar-se, em sã consciência, a aplicação in totum das normas do Código de Defesa do Consumidor aos contratos de compra e venda de qualquer natureza, notadamente no que tange às atinentes aos princípios da comutatividade, da equidade e da boa fé, também contempladas pelo Código Civil Brasileiro, donde se extrai do seu art. 159, que todo aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano.


Conclusão

O instituto da tutela antecipatória representa uma das maiores conquistas do direito brasileiro da atualidade. Pode-se dizer mesmo que é o mecanismo de maior agilidade processual que se pode dispor em nossos dias para satisfazer o bem da vida perseguido pelo litigante porque permite, a um só tempo, obter por antecipação o direito pleiteado e a garantia da sua execução provisória.

Por via da tutela antecipatória o fator tempo tem sido minimizado pelo Juiz na condução do processo, pois através dessa nova técnica se abandona a clássica liturgia da movimentação processual, que só transtorno trazia para o autor que tem razão desde o aforamento da ação.

Agora, com a antecipação da tutela, a exemplo do que acontecia mutatis mutandis, no passado com as medidas cautelares, a parte pode obter, desde logo, provimento judicial que lhe assegura a imediata exigência do seu cumprimento através de medida executiva levada a efeito na própria sede da ação ordinária em andamento, enquanto se aguarda o julgamento de mérito, se a concessão da tutela não coincidir com este estágio processual.

É preciso racionalizar o tempo do processo. É indispensável que se fiscalize ou cronometre, como o árbitro de futebol, o tempo despendido pelas partes litigantes para a prática de determinados atos, para se aquilatar que eventual investida de uma delas não se mostre como manobra tendente a obliterar ou a postergar a trajetória da medida judicial aviada para garantir o direito posto em discussão.

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A demora na conclusão do processo é sempre prejudicial ao autor que tem razão, posto beneficiar o réu que não a tem. Como enfatiza Luiz Guilherme Marinoni (Op. Cit., p. 21) “se o autor é prejudicado esperando a coisa julgada material, o réu, que manteve o bem na sua esfera jurídico-patrimonial durante o longo curso do processo, evidentemente é beneficiado. O processo, portanto, é um instrumento que sempre prejudica o autor que tem razão e beneficia o réu que não a tem! (...) Se o processo é um instrumento ético, que não pode impor um dano à parte que tem razão, beneficiando a parte que não a tem, é inevitável que ele seja dotado de um mecanismo de antecipação da tutela, que nada mais é do que uma técnica que permite a distribuição racional do tempo do processo.”

Nem sempre a vida transcorre ao sabor do desejo da pessoa humana. Ninguém pode antever o acaso. Portanto, há circunstâncias que refletem inevitável estado de necessidade, que gera situação de perigo, que independe da vontade da parte que tem razão e que exige a premente intervenção judicial para garantir a pretensão ordenatória deduzida em juízo, bem como para remediar ou amenizar a gravidade da situação retratada. Nessas circunstâncias, a decisão judicial sobre a tutela antecipatória, que visa acudir a urgência atemporal, é a última esperança do jurisdicionado.

Diante disso, é razoável defender-se a ideia de que é possível a antecipação da tutela ainda que o Juiz já esteja em condições de proferir a sentença de mérito, onde, obviamente, será concedida a medida novidadeira, havendo ou não o magistrado procedido à instrução processual. Sustenta-se, então, que a antecipação da tutela se dará em cognição exauriente.

Isto será possível porque a situação de emergência pode surgir não no nascedouro da ação, mas efetivamente no instante do proferimento da sentença definitiva, quando a crise processual que autoriza a sua concessão estiver a reclamar uma intervenção eficaz e urgente do órgão judicial para debelá-la antes que dê causa ao perecimento do direito reivindicado e ao descrédito da Justiça.

Veja-se que existem dois atos decisórios em uma só peça. Um interlocutório; outro de mérito. Para atacar os efeitos da tutela antecipatória (decisão interlocutória) não basta a interposição da apelação, mesmo que esse recurso venha a ser recebido no efeito suspensivo.

É indispensável que o réu sucumbente interponha concomitantemente o recurso de agravo de instrumento e requeira ao relator que suspenda o cumprimento da decisão interlocutória que concedeu a tutela na própria sentença (decisão de mérito) até o pronunciamento definitivo da turma ou câmara (art. 558, CPC/1973 - atual 1.019, inciso I, CPC/2015). Tem-se aqui um belo exemplo de exceção ao princípio da unirrecorribilidade das decisões.


REFERÊNCIAS

ALVIM, Arruda. Código do Consumidor Comentado. 2.ª ed., 2.ª tiragem, 1995. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais.

BITTAR, Carlos Alberto. Reparação Civil por Danos Morais. 2.ª ed.. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais.

FUX, Luiz. Tutela Antecipada e Locações. 1995. Editora Destaque.

GOMES, Orlando. Contratos. 11.ª ed. 1986. Rio de Janeiro: Editora Forense.

LIEBMAN, Enrico Tulio. Eficácia e Autoridade da Sentença e Outros Escritos Sobre a Coisa Julgada. 3.ª ed., 1984. Rio de Janeiro: Editora Forense.

JÚNIOR, Fredie Didier. Curso de Processo Civil: Introdução ao direito processual civil, parte geral e processo do conhecimento. 21.ª ed. Salvador: Editora Jus Podivm, 2019.

JÚNIOR, Nelson Nery. Código de Processo Civil Comentado. 18.ª ed. revista, atualizada e ampliada. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2019.

JÚNIOR, Humberto Theodoro. Tutela de Segurança. Revista de Processo n.º 88, out/nov/1997. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais.

- O Contrato e Seus Princípios. Ed. 1993. Rio de Janeiro: Aide Editora.

JÚNIOR, Ruy Rosado Aguiar. Extinção dos Contratos por Incumprimento do Devedor. 1.ª ed. 1991. Rio de Janeiro: Aide Editora.

MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela Antecipatória, Julgamento Antecipado e Execução Imediata da Sentença. 2.ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais.

MARQUES, José Frederico. Manual de Direito Processual Civil, Vol. III. 1997. São Paulo: Editora Bookseller.

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil, Vol. VIII. 9.ª ed. 1991. Rio de Janeiro: Editora Forense.

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STRECK, Lenio Luiz. Dierle Nunes. Leonardo Carneiro da Cunha. Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: Editora Saraiva, 2016.

ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da Tutela. 1997. São Paulo: Editora Saraiva.

ZENI, Fernando César. Deferimento do Pedido de Tutela Antecipatória na Sentença. Jornal Síntese n.º 23.


Notas

1 Tutela de Segurança. Revista de Processo n.º 88, out/nov/1997. São Paulo: Editora Revista dos Trbunais, p. 24.

2 Curso de Processo Civil, Volume I. 4.ª ed. São Paulo: Editora RT, 1998, p. 145.

3 Tutela Antecipada e Locações. Ed. Destaque, 1995, p. 116.

4 Antecipação da Tutela. São Paulo: Editora Saraiva, 1997, p. 81.


Abstract: The present study on the possibility of granting anticipatory protection in the sentence itself, resulting from exhaustive judicial cognition, was prepared in April 2000. It was published in the version presented here in the Revista dos Tribunais. Ano 89. Volume 774. April 2000, pp. 97-107. Due to its relevance, our objective is to reinvigorate it based on the new concepts and uses brought by the CPC 2015 to such a relevant institute of Civil Procedural Law.

Key words: Early protection – Urgent protection – Guardianship of evidence - Early judgment of the case – Summary cognition – Exhaustive cognition – Judgment on the merits.

Summary: 1. Introduction - 2. Granting the measure in early judgment of the case - 3. Anticipatory relief: Prolegomena - 4. Anticipatory relief and its granting - 5. Damage that the defendant may incur - 6. Conclusion.

Sobre o autor
José Eulálio Figueiredo de Almeida

Professor de Direito Processual Penal da Universidade Federal do Maranhão - UFMA. Juiz de Direito Titular da 8.ª Vara Cível em São Luís. Membro da Academia Maranhense de Letras Jurídicas. Especialização em Processo Civil pela UFPE. Especialização em Ciências Criminais pelo UNICEUMA. Doutor em Direito e Ciências Sociais pela Universidad del Museo Social Argentino - UMSA.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALMEIDA, José Eulálio Figueiredo. Concessão do pedido da tutela antecipatória na própria sentença . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 29, n. 7742, 11 set. 2024. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/110790. Acesso em: 22 dez. 2024.

Mais informações

Artigo atualizado a partir da versão originalmente publicada na Revista dos Tribunais. Ano 89. Volume 774. Abril 2000, pp. 97- 107.

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