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O fim da jornada 6x1:

Agenda 15/11/2024 às 18:20

A manutenção do regime atual de jornada de trabalho está em descompasso com os princípios dos direitos humanos e com as tendências globais de sustentabilidade laboral.

O debate sobre a jornada de trabalho 6x1 — seis dias de trabalho para um dia de descanso — revela um dilema central da sociedade contemporânea: como equilibrar a produtividade econômica com a dignidade e o bem-estar humano. À luz dos avanços no direito comparado, do movimento mundial pela redução da jornada de trabalho e do contexto histórico que remonta à Revolução Industrial, fica evidente que a manutenção desse regime está em descompasso com os princípios dos direitos humanos e com as tendências globais de sustentabilidade laboral.

Historicamente, a jornada 6x1 tem suas raízes na Revolução Industrial, quando a lógica produtivista transformou homens, mulheres e crianças em peças de uma engrenagem voltada para o lucro. Durante o século XIX, jornadas de 12 a 16 horas diárias, seis dias por semana, eram a norma, frequentemente em condições insalubres. Apenas após intensas lutas dos movimentos operários, direitos como o descanso semanal e a redução da carga horária começaram a ser conquistados.

Esse período histórico nos ensina que o regime 6x1 é um resquício de um modelo ultrapassado, que colocava o lucro acima da vida humana. Hoje, com o avanço tecnológico e o aumento da produtividade por trabalhador, a manutenção desse regime carece de justificativa, perpetuando desigualdades e comprometendo a saúde física e mental dos trabalhadores.

Em diversos países, há um movimento crescente pela redução da jornada de trabalho como forma de melhorar a qualidade de vida e aumentar a eficiência produtiva:

Essas experiências reforçam que a redução da jornada de trabalho, incluindo o abandono do modelo 6x1, é uma tendência global baseada em evidências práticas e benefícios coletivos.

No direito comparado, é possível observar legislações que caminham para jornadas mais curtas e descansos mais frequentes:

Essas medidas indicam que o Brasil está atrasado em abandonar a jornada 6x1 como padrão. Apesar de termos legislações avançadas, como a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), ainda carregamos práticas que perpetuam o desgaste físico e psicológico dos trabalhadores.

A manutenção da jornada 6x1 também precisa ser analisada sob a ótica dos direitos humanos, que garantem a todos o direito a condições dignas de trabalho (art. 23 da Declaração Universal dos Direitos Humanos). Trabalhar seis dias seguidos com apenas um dia de descanso compromete o equilíbrio entre vida profissional e pessoal, prejudicando o convívio familiar, o acesso ao lazer e, muitas vezes, a saúde.

O Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966) reforça o direito ao descanso, lazer e limitação da jornada como elementos essenciais para a dignidade humana. Nesse contexto, regimes como o 6x1 entram em conflito com esses princípios, especialmente quando aplicados sem flexibilidade ou compensações adequadas.

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O Brasil, como signatário de tratados internacionais e protagonista na construção de direitos sociais, tem o dever de avançar nesse debate. Superar o regime 6x1 significa alinhar-se às melhores práticas globais e garantir que o progresso tecnológico beneficie os trabalhadores, em vez de reforçar estruturas ultrapassadas.

Além disso, pesquisas mostram que trabalhadores mais descansados são mais produtivos e menos propensos a erros e acidentes. Implementar jornadas mais curtas e semanas de trabalho mais equilibradas é uma oportunidade para melhorar a competitividade econômica e a qualidade de vida da população.

O fim da jornada 6x1 não é apenas uma demanda trabalhista; é uma questão de evolução social e justiça. A história nos ensina que os direitos trabalhistas avançam quando colocamos o ser humano no centro do debate. O Brasil deve liderar esse movimento, abolindo regimes arcaicos e adotando modelos que promovam dignidade, saúde e produtividade. Afinal, o trabalho deve servir à vida, e não o contrário.


Referências

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BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: Saraiva, 2022.

DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2023.

HOBSBAWM, Eric. A Era das Revoluções: Europa 1789-1848. São Paulo: Paz e Terra, 2018.

KELLER, Berndt; SEIFERT, Hartmut. Flexicurity: Potentials and Challenges for Coordinated Employment Policy. Transfer: European Review of Labour and Research, v. 19, n. 3, p. 345-364, 2013.

ONU. Declaração Universal dos Direitos Humanos, 1948. Disponível em: https://www.un.org. Acesso em: 11 nov. 2024.

ONU. Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, 1966. Disponível em: https://treaties.un.org. Acesso em: 11 nov. 2024.

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THOMPSON, E. P. A Formação da Classe Operária Inglesa. São Paulo: Paz e Terra, 2020.

VANDENBROUCKE, Frank. A European Social Union: Labour Market Coordination and Social Investment. Cambridge: Cambridge University Press, 2020.

Sobre o autor
Gustavo Lopes Pires de Souza

Gustavo Lopes Pires de Souza, especializado em Direito Desportivo, Direito Empresarial, e também atua como consultor de negócios com foco em empresas, ética e gestão esportiva. Formado em Direito com licenciatura em Ciências Sociais, doutorado hc em Direito, Gestão e Polímata pela EBWU (EUA), além de mestrado em Direito Desportivo pela Universitat de Lleida, traz uma rica experiência acadêmica e profissional, incluindo atuação como professor e palestrante em diversas instituições de ensino. Como influenciador digital e comentarista, participa ativamente em discussões sobre temas jurídicos e esportivos, contribuindo para uma maior compreensão e engajamento do público nessas áreas. Além disso, é autor de diversos livros e artigos que exploram as complexidades do Direito e suas implicações sociais.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUZA, Gustavo Lopes Pires. O fim da jornada 6x1:: uma questão de justiça social e evolução dos direitos humanos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 29, n. 7807, 15 nov. 2024. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/111675. Acesso em: 15 nov. 2024.

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