A Lei nº 9.437, de 20 de fevereiro de 1997,
estabeleceu como delito autônomo - sancionando
com pena de reclusão de dois a quatro anos e multa, sem
prejuízo da pena por eventual crime de contrabando ou descaminho
- o fato do agente realizar uma das ações típicas
previstas no caput do art. 10 ("Possuir,
deter, portar, fabricar, adquirir, vender, alugar, expor à
venda ou fornecer, receber, ter em depósito, transportar,
ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar,
manter sob guarda e ocultar arma de fogo (...), sem a autorização
ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar"),
utilizando-se de arma de fogo ou acessórios de uso
proibido ou restrito (§2º do art. 10), cuja enumeração
encontra-se atualmente do art. 161 do Dec. nº 55.649/65 (R-105,
disciplina a fiscalização de produtos controlados).
A inovação legislativa tem enorme repercussão
prática no campo da competência para processar e
julgar hipóteses envolvendo receptação de
armamento estrangeiro internado clandestinamente no território
nacional, consoante restará demonstrado no decorrer do
texto. É que anteriormente à edição
do diploma legal em referência, a jurisprudência predominante
da 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça
(STJ) vinha decidindo pela competência da Justiça
Federal em tais circunstâncias, sob o fundamento de que
"face a existência de anterior delito de contrabando,
da competência da Justiça Federal, compete a esta
julgar e processar delito de receptação da arma
contrabandeada que, na espécie, é delito de autonomia
relativa" (CC nº 15.165-RJ, julg. em 19.10.95, CC
nº 15.716-RJ, julg. em 07.12.95, DJU de 04.03.96, CC nº
19.139-RJ, julg. em 23.04.97, DJU de 09.06.97, todos da Relatoria
do Min. William Patterson; CC nº 18.804-SP, Rel. Min. Anselmo
Santiago, julg. em 28.05.97, DJU de 04.08.97), atraindo, inclusive,
a competência para o conhecimento dos crimes conexos (Súmula
nº 122 do STJ, CC nº 16.349-RJ, Rel. Min. William Patterson,
julg. em 26.06.96, DJU de 29.10.96). Este entendimento ensejou
uma avalanche de ações penais nas três varas
criminais da Seção Judiciária do Rio de Janeiro,
já que, invariavelmente, cada "batida" da Polícia
Militar nas favelas da cidade representava a apreensão
de drogas, armas e munições de uso proibido.
A definição da competência da
Justiça Federal veio a partir da discussão sobre
a pertinência do enquadramento de tais apreensões
na Lei de Segurança Nacional (Lei nº 7.170/83, art.
12, Parágrafo único), conforme determinação
constante da Resolução nº 122, de 24.7.96,
do Sr. Secretário de Segurança Pública do
Estado do Rio de Janeiro (ato normativo que teve sua vigência
suspensa pelo Supremo Tribunal Federal, em decisão proferida
na ADIn nº 1.489-RJ, Rel. Min Octavio Gallotti, julg. em
19.3.97, Informativo STF nº 64), que compelia as autoridades
policiais a autuação na Lei nº 7.170/83, de
pessoas envolvidas com armamento ou material militar, privativo
das Forças Armadas, entendimento lamentavelmente sufragado
pela Justiça Estadual que, de forma insistente e sem maior
reflexão, passou a encaminhar todo e qualquer feito relativo
a apreensão de armas à Justiça Federal, incluindo
um caso em que o artefato militar (granada de mão) fora
utilizado para a prática de um delito comum (tentativa
de homicídio), da competência da Justiça Estadual.
Não concordando com essa capitulação
legal, os Juízes Federais, acolhendo sucessivos requerimentos
do Ministério Público Federal, suscitaram vários
conflitos de competência, tendo o STJ rechaçado a
tese da violação da Lei de Segurança Nacional
(LSN), afirmando, contudo, a competência da Justiça
Federal por outro fundamento, consistente na configuração
do crime de receptação de arma contrabandeada (art.
180, caput), nos termos expressos na ementa do aresto
supramencionado.
É importante salientar que, paradoxalmente,
em alguns casos envolvendo, igualmente, apreensão de armas
de uso proibido (ou privativas das Forças Armadas), o STJ
decidiu pela competência da Justiça Estadual, não
subsumindo os fatos ilícitos no tipo penal da receptação.
Assim ocorreu, ad exemplum, no CC nº 16.000-RJ (Rel.
Min. Vicente Leal, v.u, julg. em 24.04.96, DJU de 24.06.96), cuja
ementa encontra-se vazada nos seguintes termos: "PROCESSUAL
PENAL. DESCAMINHO. COMPETÊNCIA. JUÍZO ESTADUAL. Inexistindo
qualquer finalidade atentatória à Lei de Segurança
Nacional, de vez que o quadro fático emoldurado nos autos
não traduz a ocorrência de crime em detrimento de
bens, serviços ou interesses da União Federal, de
suas autarquias e empresas públicas, impõe-se o
afastamento da competência da Justiça Federal para
apreciar e julgar o caso. Conflito conhecido. Competência
do Juízo Suscitado". Mais recentemente, igual
orientação foi acolhida no julgamento do CC nº
16.472/RJ (Rel. Min. Vicente Leal, v.u, julg. em 28.05.97, DJU
de 30.06.97), in verbis: "CONSTITUCIONAL.
PROCESSUAL. PENAL. TRÁFICO DE DROGAS. APREENSÃO
DE ARMA DE FABRICAÇÃO ESTRANGEIRA. COMPETÊNCIA.
JUSTIÇA ESTADUAL. Em procedimento investigatório
policial em que se apura o crime de tráfico de entorpecentes,
rotina nas favelas do Rio de Janeiro, a circunstancial apreensão
de pistola de uso privativo das Forças Armadas não
desloca a questão para a competência da Justiça
Federal. Conflito conhecido, Competência do Juízo
Estadual, o suscitado". No mesmo diapasão, a decisão
levada a efeito no CC nº 18.165-RJ, (Rel. Min. Cid Flaquer
Scartezzini, v.u, julg. em 09.04.97, DJU de 12.05.97).
Na hipótese específica do emprego do
artefato bélico (granada de mão) na tentativa de
homicídio supracitada (CC nº 16.294-RJ, Rel. Min.
Anselmo Santiago, v.u, julg. em 26.02.97, DJU de 26.05.97), firmou-se,
também, a competência da Justiça Estadual
para o processo e julgamento do fato infringente da norma, extraindo-se
um fundamento prático subjacente à decisão,
qual seja, impedir que o cometimento de qualquer delito comum
(e.g., um roubo) com armamento de uso proibido ensejasse automaticamente
a competência da Justiça Federal, pois é fato
público e notório que os marginais estão
fortemente armados, conforme consta da ementa do aresto: "PENAL
E PROCESSUAL PENAL - PERSEGUIÇÃO E FUGA - EMPREGO
DE ARTEFATO DE USO MILITAR - GRANADA DE MÃO - HOMICÍDIO
TENTADO - CONFLITO DE COMPETÊNCIA - JUSTIÇA FEDERAL
E JUSTIÇA COMUM ESTADUAL - LEI DE SEGURANÇA NACIONAL
- INOCORRÊNCIA DE OFENSA - COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA
COMUM. 1. Sempre que o uso de artefato militar tenha por objetivo
exclusivo, rechaçar perseguição policial
tendente a capturar o agente, como no caso concreto, não
há falar em ofensa à Lei de Segurança Nacional.
2. Trata-se de crime comum, sujeito à jurisdição
estadual. 3. Conflito conhecido para declarar competente o juízo
suscitado, da 1ª Vara Criminal de Santa Cruz-RJ".
Feita a exposição do atual posicionamento
da jurisprudência do STJ sobre a matéria, que, como
visto, não apresenta uniformidade de tratamento, urge analisar
em que condições a entrada em vigor da novel Lei
nº 9.437/97 poderá contribuir para solucionar a problemática
relativa à competência jurisdicional para processar
e julgar ações penais em que haja apreensão
de armas, acessórios e artefatos de uso proibido por civil.
Entendemos que o fato do legislador ter criado um
tipo penal autônomo para subsumir normativamente
a conduta do agente que for preso em poder de armamento de uso
proibido, sem possuir autorização legal ou regulamentar,
trouxe como corolário inafastável a impossibilidade
de, doravante, ser enquadrado tal atuar na moldura do delito
de receptação (art. 180, caput,
do CP), segundo a orientação até então
preconizada pela maioria dos julgados da 3ª Seção
do STJ, com a qual, aliás, jamais concordamos, na medida
em que, para justificar a competência da Justiça
Federal, valeu-se da indigitada "autonomia relativa"
da receptação frente ao contrabando, seu pressuposto
anterior, in casu. Ora, a doutrina é pacífica
em asseverar que é da essência da receptação
pressupor, necessariamente, a existência de um delito antecedente,
do qual possui plena autonomia, bastando a comprovação
da obtenção criminosa da res, (1) de sorte
que não tem sentido obtemperar que, para fins de competência,
a autonomia da receptação "é relativa",
dependente da investigação da natureza do crime
pressuposto e do respectivo sujeito passivo, nem sempre devidamente
identificados.
Nem se alegue, em prol da manutenção
da construção jurisprudencial elaborada pela 3ª
Seção do STJ que, malgrado não se possa mais
falar na existência da receptação clássica
prevista no Código Penal, poder-se-ia conceber a nova figura
típica como uma espécie de "receptação
especial", visto que a mesma alberga alguns núcleos
verbais próprios daquela ("adquirir", "receber"
e "ocultar"). Ocorre, no entanto, que esta exegese
não merece acolhida, pois o dispositivo legal apresenta
mais 15 (quinze) verbos (tipo misto alternativo) que expressam
ações portadoras de total independência conceitual
relativamente ao crime previsto no art. 180 do Estatuto Repressivo,
sendo outra, inclusive, a objetividade jurídica
tutelada pela lex nova, consistente na proteção
à incolumidade pública e à integridade física
das pessoas.
Registre-se, ademais, para aqueles que enquadravam
a receptação de armas contrabandeadas na alínea
"d" do § 1º do art. 334 do Código Penal
(cf. STJ, CC nº 8.904-2-RJ, Rel. Min. Assis Toledo, DJU de
15.04.94), apesar da habitual ausência da elementar referente
ao "exercício de atividade comercial ou industrial",
que este dispositivo foi tacitamente derrogado pelo § 2º
do art. 10, da Lei nº 9.437/97, exclusivamente no que diz
respeito a esta matéria, por força da aplicação
do princípio da especialidade (lex
specialis derogat legi generali).
É evidente que o art. 334, caput,
do CP, não foi derrogado pela lei especial, posto que o
legislador, conscientemente, não previu as ações
de "importar ou exportar", tendo ressalvado expressamente
no § 2º do art. 10 a aplicação de pena
"por eventual crime de contrabando ou descaminho".
Em decorrência disso, podemos visualizar a seguinte situação
prática, a saber: haverá concurso de crimes (concurso
material) entre o crime do art. 334, caput,
do CP, e o crime previsto na lei especial (não há
falar em post factum impunível), quando, dentro
de um mesmo contexto fático, o agente, após
perpetrar o delito de contrabando de armas de uso proibido, resolve
transferi-las a outrem, executando uma das condutas descritas
no art. 10 da lei em comento (e.g., "vender",
"ceder", "emprestar", etc.).
Tal evento constituirá exceção, pois a experiência
forense revela que a autoria do contrabando é, via de regra,
desconhecida, carecendo o Ministério Público de
elementos de convicção para imputar ao traficante
preso com armamento proibido a responsabilidade pela sua internação
ilícita no território nacional.
Nesta hipótese, e somente nela, salvo excepcional
ofensa à Lei de Segurança Nacional, incumbirá
à Justiça Federal o conhecimento conjunto dos crimes
em razão do instituto da conexão (Súmula
nº 122 do STJ), devendo processar e julgar o autor do contrabando
(que responderá também pelo crime previsto no art.
10 da Lei nº 9.437/97, em concurso material), bem como o
agente que "adquirir", "alugar",
"manter sob guarda" o armamento de uso proibido.
Portanto, desde que o acervo probatório coligido aos autos
não permita a identificação do contrabandista,
situação que, repise-se, costuma acontecer na generalidade
dos casos envolvendo apreensão de armas, restará
tão-somente a apuração da prática
do crime autônomo tipificado na lei extravagante
(art. 10), da competência ordinária da Justiça
Estadual, como sustentado acima.
Releva consignar, por oportuno, que a conexão
deverá ser aferida concreta e objetivamente,
dentro dos parâmetros gizados pelo art. 76 do Código
de Processo Penal, devendo o quadro fático emergente dos
autos indicar, obrigatoriamente, uma relação
direta e imediata entre o autor do contrabando e
a pessoa que for presa numa das situações previstas
no art. 10 da Lei nº 9.437/97, possibilitando estabelecer
um nexo causal entre as duas condutas. (2) A mera "conexão"
remota ou hipotética (v.g, homicídios ou
roubos supostamente perpetrados por uma quadrilha presa com armamento
de uso proibido, em que os autores sejam ignorados), à
evidência que não autorizará o chamamento
da Justiça Federal para o processo e julgamento do feito,
consoante foi decidido pelo STJ no CC nº 16.737-RJ (Rel.
Min. Felix Fischer, v.u, julg. em 23.04.97, DJU de 26.05.97),
cuja ementa possui a seguinte dicção: "PROCESSUAL
PENAL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. QUADRILHA, TÓXICOS
E HOMICÍDIOS PRATICADOS COM ARMAMENTO PROIBIDO. CONTRABANDO
OU DESCAMINHO. 1. O uso, de per si, de armamento proibido na prática
de homicídios não indica a competência da
Justiça Federal na forma do art. 109, inciso IV da Lex
Maxima. II. Inexistência de conexão necessária
com os delitos de contrabando ou descaminho. Conflito conhecido,
declarando-se competente a Justiça Estadual". (3)
Poderá ocorrer, excepcionalmente, que
a apreensão de armas, acessórios e artefatos de
uso proibido constitua fato atentatório à Lei de
Segurança Nacional (Lei nº 7.170/83, art. 12), uma
vez satisfeitos os requisitos objetivos e subjetivos previstos
nos arts. 1º e 2º deste diploma legal, sendo imperioso,
para tanto, que a conduta do agente tenha aptidão para
atingir ou periclitar um dos bens jurídicos especificamente
tutelados pela LSN: a integridade territorial, a soberania nacional,
o regime representativo e democrático, a Federação,
o Estado de Direito, e a pessoa dos Chefes dos Poderes da União.
Não se pode deixar de reconhecer que o Estado Democrático
de Direito - visto sob o aspecto do pleno exercício do
sistema de direitos individuais assegurados pela Constituição
(ir, vir e permanecer, etc.) - está constantemente ameaçado
por força da ação violenta e desenfreada
de grupos armados que espalham medo e terror nas ruas e favelas
da cidade.
Imprescindível, para fins de eventual incidência
da LSN, que haja apreensão de uma quantidade considerável
de armamento de uso privativo das Forças Armadas, de alto
poder destrutivo - seria um verdadeiro absurdo sustentar que alguém
colocaria em risco a "Segurança Nacional" com
a ação de portar apenas algumas armas de uso privativo
das Forças Armadas, a não ser que se lhe pretendesse
outorgar uma missão de Sísifo -, conforme
restou reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em recente
decisão proferida no HC nº 74.782-RJ (1ª T.,
Rel. Min. Ilmar Galvão, julg. em 13.05.97, Informativo
STF nº 71), onde foi dado como legítimo o enquadramento
do paciente na LSN por ter introduzido no país cerca de
30.000 (trinta mil) cartuchos de munição próprios
para fuzis "AK-47" e "AR-15", de uso
privativo das Forças Armadas. Anote-se, contudo, que no
HC nº 73.451-1-RJ (2ª T., Rel. Min. Maurício
Corrêa, julg. 08.04.97, DJU de 06.06.97), o STF determinou
o trancamento de ação penal por não reconhecer
preenchidos os requisitos estatuídos nos arts. 1º
e 2º da LSN, sobretudo a parte atinente ao elemento subjetivo
do tipo (motivação política), na conduta
de diretores de fábrica e de transportadora de armamento
militar, aos quais foi imputado o extravio, fora do território
nacional, de armas militares fabricadas exclusivamente para
exportação.
Importa esclarecer, por derradeiro, e por amor à
completitude da explanação, que o fato de incumbir
ao Ministério do Exército "autorizar e fiscalizar
a produção e o comércio de armas de fogo
e demais produtos controlados" (art. 13 da Lei nº
9.437/97, art. 21, VI, do Texto Magno), não tem o condão
de determinar a incidência da norma de competência
inscrita no art. 109, IV, da Lex Mater, posto que, como
é cediço, exige o preceito constitucional em questão
que a ofensa causada pela conduta delituosa atinja os interesses
da União Federal (ou de seus entes paraestatais) de forma
direta e específica, sendo insuficiente a simples
presença de um interesse genérico,
advindo, como no caso vertente, da atribuição legal
para fiscalizar determinada atividade particular. Sobre o assunto,
parece-nos pertinente trazer à colação decisão
proferida pelo STF, ao analisar a competência para o julgamento
do crime previsto no art. 253 do Código Penal ("fabrico,
fornecimento, aquisição, posse ou transporte de
explosivos ou gás tóxico ou asfixiante"
) - produtos que estão, igualmente, listados no art. 161
do Dec. nº 55.649/65 (R-105) como de uso proibido - no sentido
de que a "fiscalização da produção
e comércio de substâncias e engenhos explosivos atribuída
ao Exército não tem o efeito de fazer recair o crime
capitulado do art. 253 do CP, na competência da Justiça
Federal" (RE 89.946-4-PR, v.u, Rel. Min. Rafael
Mayer, 1ª T., RTJ 95/297).
No corpo do valioso aresto, o eminente relator teceu
considerações que são totalmente aplicáveis
à hipótese em testilha, ressaltando-se que, conquanto
a decisão tenha sido prolatada sob o pálio da Carta
Política anterior, apresenta-se atualíssima, já
que a norma do art. 21, VI, da atual Constituição
da República, constitui reprodução integral
do art. 8º, VII, da Constituição ab-rogada.
Eis alguns fragmentos do judicioso voto do relator: "A
circunstância de que caiba à Administração
Federal, por intermédio do Ministério do Exército,
com fulcro no art. 8º., VII, da Constituição,
e nos termos amplos do Decreto nº 55.649/65, a fiscalização
da produção e do comércio de substâncias
e engenhos explosivos e outros elementos relacionados, direta
ou indiretamente, com a produção de material bélico,
não tem efeito de fazer recair na competência da
Justiça Federal, de modo genérico e em função
do tipo objetivo, o crime capitulado no art. 253 do Código
Penal". (...) "De qualquer modo, a sujeição
de tais atividades à fiscalização federal
não pode significar, só por si, que o crime previsto
no art. 253 do Código Penal importe em detrimento de bens,
serviços ou interesses da União, de modo a reclamar
a competência da Justiça Federal. Tratando-se de
crime contra a incolumidade pública, capitulado como crime
de perigo comum, o sujeito passivo da ação delitiva
é a coletividade indeterminada cuja incolumidade a norma
visa proteger, pois é exposta a perigo de sofrer danos
pela utilização indiscriminada de tais elementos" (pág. 298).
A importância desta decisão do Pretório
Excelso é indiscutível, até porque diante
do teor do inciso III do § 3º do art. 10 da Lei nº
9.437/97 ("possuir, deter, fabricar ou empregar artefato
explosivo e/ou incendiário sem autorização"),
o art. 253 do Código Penal teve sua tipicidade restrita
às substâncias tóxicas ou asfixiantes, não
alcançadas pela mudança da legislação
sobre armas de fogo. Portanto, dentro da linha exegética
trazida a lume, e levando-se em conta, ainda, a qualificação
jurídica do novo tipo penal previsto na lei do porte de
arma de fogo, exsurge induvidoso que, atualmente, outra seria
a decisão do STJ no CC nº 12.060-PA (Rel. Min. Edson
Vidigal, julg. em 26.06.96, DJU de 24.02.97), quando concluiu
pela competência da Justiça Federal para julgar o
acusado de ter adquirido e ocultado uma granada de uso privativo
das Forças Armadas, sob a invocação da existência
de interesse da União em razão da comercialização
de material bélico sujeitar-se à fiscalização
federal.
Concluindo, entendemos que, com a eclosão
da Lei nº 9.437/97, criando um tipo penal autônomo
(art. 10), portador de objetividade jurídica preordenada
a tutelar a incolumidade pública e a integridade física
dos cidadãos, a competência jurisdicional para processar
e julgar fatos relativos a apreensão de armas, acessórios
e artefatos de uso proibido, isoladamente considerados, fixou-se
definitivamente na seara da Justiça Estadual, cessando
qualquer discussão a respeito do tema, somente ocorrendo
a competência da Justiça Federal na eventualidade
de restar comprovada a conexão com o delito de contrabando,
ou, ainda, na excepcional incidência da Lei de Segurança
Nacional. Espera-se, assim, que a matéria seja reexaminada
pela 3ª Seção do STJ. (4)
Artigo
Destaque dos editores
Reflexos da Lei de Porte de arma sobre a competência da Justiça Federal
Exibindo página 1 de 2
24/06/1998 às 00:00
Aloísio Firmo Guimarães da Silva
procurador da República no Rio de Janeiro
SILVA, Aloísio Firmo Guimarães. Reflexos da Lei de Porte de arma sobre a competência da Justiça Federal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 3, n. 25, 24 jun. 1998. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1123. Acesso em: 23 nov. 2024.