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Personalidade jurídica do MST: caminhos para sua responsabilização civil

Agenda 21/09/2008 às 00:00

A atuação dos integrantes do denominado Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra – MST tem sido marcada por constantes violações ao Estado Democrático de Direito não apenas porque deixaram, a muito tempo, de atuar no mero exercício da liberdade de manifestação e de associação, mas porque, sobretudo, tem representado reiterada afronta ao direito à propriedade, ao cumprimento de ordens judiciais de reintegração de posse e ao direito de ir e vir de usuários de rodovias, entre outros atos, classificados pelo Promotor de Justiça Gilberto Thums, do Conselho Superior do Ministério Público do Rio Grande do Sul, como de "guerrilheiros", o que inclusive ensejou a iniciativa daquele órgão no sentido de postular a "dissolução" do movimento e a declaração de sua "ilegalidade".

A tarefa não é nada fácil, como bem sabem aqueles que tiveram contra si atos de invasão e de vandalismo praticados pelos ditos "sem-terra". Isto porque embora o MST apresente uma estrutura bem montada, com estrutura invejável de coordenação para "manifestações" de toda ordem, resiste a adotar personalidade jurídica própria, evitando com isso que seu patrimônio seja atingido por ações judiciais cíveis que busquem reparação por danos causados em decorrência de suas invasões. O movimento tampouco reconhece expressa e claramente que utiliza entidades regularmente constituídas a fim de angariar os recursos – inclusive públicos – necessários à suas atividades notadamente ilícitas.

Contudo, o relatório dos trabalhos da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito da Terra (2005), do Congresso Nacional, logrou reunir um extraordinário conjunto de elementos que configuram a "prova inequívoca da existência jurídica, sob a forma de um grupo econômico" do MST, podendo ser responsabilizado solidariamente em eventuais ações cíveis.

Consta do relatório que já há anos a mídia informa que a Associação Nacional de Cooperação Agrícola – ANCA e a Confederação das Cooperativas de Reforma Agrária – CONCRAB seriam os "braços financeiros" do MST, que acabou sendo corroborado pelos seguintes – veementes – indícios:

Posteriormente, foram reunidos pela Comissão outros elementos probatórios indicando: ao reivindicar recursos federais, a ANCA e a CONCRAB apresentam planos de trabalho em que descrevem como suas as instalações do MST nos "assentamentos"; ao prestar contas aos órgãos e entidades federais, ANCA e CONCRAB citam como seus eventos que foram organizados pelo MST; ANCA e CONCRAB têm uma estrutura física extremamente enxuta e recursos humanos escassos (uma sede em São Paulo, uma filial em Brasília, nove auxiliares administrativos e três faxineiras), o que não permitiria o recebimento de mais de R$ 30 milhões em convênios, a não ser que o executor fosse o próprio MST; advogados do MST são pagos pela ANCA; recursos de um convênio federal com a ANCA foram desviados para a organização da festa de comemoração dos 20 anos do MST; dirigentes da ANCA e da CONCRAB ocupam postos de direção nacional do MST; e funcionários da ANCA trabalham para a CONCRAB, inclusive movimentando recursos desta entidade – e vice versa.

Mais adiante, com o avanço das investigações pela Comissão, "constatou-se que, além de ANCA, CONCRAB e suas filiadas estaduais, municipais e locais (AESCA/AECA, CCA, cooperativas de produção e cooperativas de crédito, associações de assentados), outras entidades também integram a estrutura do MST, ligando-se direta ou indiretamente às entidades-mães".

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Outro conjunto importante reunido pela Comissão é o de "escolas do MST". Verificou-se que o ITERRA, localizado em Veranópolis/RS, tem como sócios-fundadores a ANCA e a CONCRAB. O sigilo bancário dessa entidade foi transferido para a CPMI da Terra, e se constatou que as irregularidades identificadas nas entidades paulistas se repetem com surpreendente freqüência e similaridade na escola gaúcha, além de haver grande e suspeita circulação de recursos entre a escola e seus sócios. A Escola Florestan Fernandes, cuja inauguração mereceu grande destaque na mídia, é denominada "Universidade do MST". Analisando o CNPJ dessa escola, verifica-se que se trata de uma filial do ITERRA, ou seja, a universidade do MST pertence, indiretamente, à ANCA e à CONCRAB, os sócios-fundadores da sede.

Outro grupo de entidades ligadas ao MST é o de gráficas e editoras. Em pelo menos um caso, a ligação é notória: o Jornal Brasil de Fato, que publica, em nome do MST, o periódico de mesmo nome. Constatou-se que uma das pessoas que fazia o serviço bancário da ANCA e da CONCRAB é, na verdade, funcionário do Jornal Brasil de Fato. Esse "compartilhamento" de empregados só se admite como lícito, se ANCA, CONCRAB e Brasil de Fato foram considerados um grupo econômico (CLT, art. 3º).

Outra entidade é a Gráfica e Editora Peres, cujas benesses em subcontratações da ANCA e da CONCRAB, em diversos convênios federais, levantam forte suspeita de pertencer à estrutura do MST. É suspeito também o fato de que, ao mesmo tempo que a Gráfica e Editora Peres recebeu benefícios da ANCA e da CONCRAB, políticos de esquerda receberam doações ou contrataram serviços dessa empresa durante o período eleitoral de 2002, conforme mostra o site do Tribunal Superior Eleitoral, no sistema de prestação de contas eleitorais ali disponibilizado.

As suspeitas não param por aí. O Capítulo XIV das chamadas "Normais Gerais do MST", por incrível que pareça, denomina-se "Personalidade Jurídica" e contém a seguinte regra: "105. O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra possui uma associação com personalidade jurídica, que á a ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE COOPERAÇÃO AGRÍCOLA, para fins contábeis e financeiros. E em nome da qual deverão estar todas as propriedades e documentos legais do Movimento." No Capítulo X, que trata "Das Finanças", a regra 73 estabelece que os bens do Movimento deverão ser colocados em nome da ANCA: "73. Todos os bens coletivos, móveis e imóveis do Movimento deverão ser colocados em nome da Associação Nacional de Cooperação Agrícola".

Inevitável, assim, concluir que o MST é um grupo de entidades que podem responder solidariamente pelos atos uns dos outros, o que ensejou a recomendação ao Ministério Público, pela Comissão, de que, "por ocasião do ajuizamento de ações cíveis visando a indenização por danos causados ao patrimônio público, privado e ambiental por membros do Movimento dos Sem-Terra (MST), passe a incluir, na qualidade de litisconsortes passivos, a Associação Nacional de Cooperação Agrícola – ANCA, a Confederação das Cooperativas de Reforma Agrária do Brasil – CONCRAB e o Instituto Técnico de Capacitação e Pesquisa da Reforma Agrária – ITERRA, conjunta ou separadamente, em virtude de haver restado configurado que constituem a figura jurídica de grupo econômico".

Idêntico fundamento pode ser utilizado por proprietários de áreas rurais invadidas e depredadas pelos integrantes do MST, desde que devidamente documentados (fotografias, testemunhas, jornais, etc.), postulando o reconhecimento judicial do "grupo econômico", a fim de eficazmente garantir a justa reparação pelos danos materiais – incluindo lucros cessantes – e morais sofridos, a ensejar, quem sabe, finalmente, a pedagógica repressão à balbúrdia e à desordem patrocinada pelo Movimento.

Sobre o autor
Paulo Roberto Pegoraro Junior

Doutorando em Direito pela PUC/RS. Mestre em Direito pela Unipar. Professor de Processo Civil da graduação e pós-graduação da Univel. Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PEGORARO JUNIOR, Paulo Roberto. Personalidade jurídica do MST: caminhos para sua responsabilização civil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1908, 21 set. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11759. Acesso em: 22 nov. 2024.

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