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O amparo social ao deficiente

Agenda 24/09/2008 às 00:00

Existe o benefício assistencial de prestação continuada destinado ao deficiente que não tenha meios de prover à sua própria mantença, como é de conhecimento no meio jurídico. De fato, o chamado amparo social destina-se ao idoso ou ao deficiente, sempre que a condição de miserabilidade reduza a pessoa à insuficiência dos elementos mínimos da sobrevivência digna. No dizer da lei de regência, é devido um salário mínimo mensal a quem tenha ao menos 70 anos de idade, ou seja portadora de deficiência, e que não possua meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. É o que estabelece o artigo 20, caput, da Lei 8742/93.

No que concerne à condição de miserabilidade, a lei estabeleceu o já bastante debatido critério disposto no parágrafo terceiro desse mesmo dispositivo legal, fixando que se considera incapaz de prover a manutenção própria aquele cuja família tenha renda mensal per capita inferior a um quarto do salário mínimo.

As Cortes Pátrias já sedimentaram que o critério legal não é contábil, senão programático, exemplificativo, paradigmático, tão-somente delineador de um contexto rigoroso de reconhecimento da miserabilidade, a fim de evitar a concessão do benefício a quem dele não necessite de modo absoluto. Cuida-se de benefício assistencial, custeado pelo Tesouro sem contraprestações vertidas por contribuintes aos moldes do Seguro Social que sustenta os benefícios previdenciários. Assim, é mesmo de se ter rigor na análise e concessão desse tipo de beneplácito, resguardando-o para quem efetivamente precise sem sobrecargas à já exaurida sociedade contribuinte. Nada melhor do que a elaboração de um estudo social, instruindo-se eventual processo judicial com prova pericial sob a batuta de Assistente Social de confiança para o deslinde da efetiva situação do núcleo familiar de quem busca o amparo social.

Mas a questão que aqui se pretende abordar é outra.

O benefício assistencial destina-se ao idoso e ao deficiente. A idade é uma condição objetiva que se comprova por documentos, salvo raríssimas exceções. Já a deficiência reclama a vistoria médica para que se conclua pela ocorrência ou não do critério legal da incapacidade para a vida independente e para o trabalho (parágrafo segundo da referida lei). Sim, é necessário que se faça uma prova pericial ou, muito mais raramente, que se tenha já uma prova médico-documental recente e absolutamente conclusiva.

A questão é: e se a incapacidade existir porém não for definitiva, vale dizer, se for temporária?

Variam os entendimentos. Há quem entenda que o amparo social, como se destina ao deficiente, incapaz para a vida independente e para o trabalho, é devido somente a quem esteja inválido do ponto de vista previdenciário, de modo definitivo. Haveria aí uma linha de simetria. Se o indivíduo for filiado, ostentar a qualidade de segurado previdenciário e preencher todos os demais requisitos, receberá aposentadoria por invalidez; se lhe faltar essa condição e estiver em estado de miserabilidade, receberá amparo social.

Seria esse o melhor desfecho?

Cremos que não. A lei assistencial fala que "pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho" (parágrafo segundo do artigo 20). Sim, é verdade. Mas é também do regime assistencial que, sempre e sempre, o benefício de prestação continuada deverá ser revisto a cada dois anos, exatamente "para a avaliação da continuidade das condições que lhe deram origem" (artigo 21, caput). Vejamos a lei:

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Art. 21. O benefício de prestação continuada deve ser revisto a cada 2 (dois) anos para avaliação da continuidade das condições que lhe deram origem.

§ 1º O pagamento do benefício cessa no momento em que forem superadas as condições referidas no caput, ou em caso de morte do beneficiário.

§ 2º O benefício será cancelado quando se constatar irregularidade na sua concessão ou utilização.

Ora, não tem sentido dar-se foros absolutistas à deficiência para que possa ser concedido o benefício ao mesmo tempo em que a lei de regência manda (diga-se, exige) que essa deficiência seja periodicamente reavaliada. Nem se diga que esse dispositivo pretende apenas preservar casos de má-fé. Tal presunção não se assenta em nenhum elemento normativo da lei, que não pode ser interpretada de modo restritivo estabelecendo-se um regime ainda mais excepcionalmente rigoroso do que os termos expressos na tinta que o Legislador empregou. Não. A lei diz que o benefício deve ser revisto para se "avaliar a continuidade das condições que lhe deram origem" e não para se cassar eventual concessão indevida. Afinal, sempre que a fraude ocorrer, haja ou não dispositivo expresso, é óbvio que o benefício será cassado de qualquer forma. O que a lei resguarda é a possibilidade de, alterando-se as condições sociais ou quaisquer dos elementos que deram causa à concessão do benefício, seja esse cancelado. Certamente não será com tristeza que alguém deixará de ser deficiente, retornando à possibilidade de trabalhar e reconstruir sua vida.

Deficiência não é sinônimo de invalidez permanente. Nem assim pretendeu o Legislador.

Portanto, sempre que houver a condição de miserabilidade e estiver presente a incapacidade para a vida independente e para o trabalho, ainda que essa incapacidade seja temporária, devido será o benefício assistencial de prestação continuada, enquanto perdurar a mesma situação social coexistente com a deficiência.

Sobre o autor
Marco Aurélio Leite da Silva

analista judiciário da Justiça Federal

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Marco Aurélio Leite. O amparo social ao deficiente. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1911, 24 set. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11764. Acesso em: 5 nov. 2024.

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