4 A DEFINIÇÃO E A CONSTITUCIONALIDADE DA TRIBUTAÇÃO EXTRAFISCAL AMBIENTAL NO BRASIL
Diz-se ser a tributação essencialmente fiscal quando seu propósito primordial é arrecadar recursos financeiros. Fala-se, aqui, em fiscalidade. É a forma de tributação clássica e característica daquilo que se chamou de "Estado Tributador" no capítulo anterior.
Extrafiscalidade, por sua vez, é signo que designa o manejo da tributação com o fim de induzir o comportamento dos agentes econômicos. Colacionamos, aqui, o conceito de Paulo de Barros Carvalho:
"A experiência jurídica nos mostra, porém, que vezes sem conta a compostura da legislação de um tributo vem pontilhada de inequívocas providências no sentido de prestigiar certas situações, tidas como social, política ou economicamente valiosas, às quais o legislador dispensa tratamento mais confortável ou menos gravoso. A essa forma de manejar elementos jurídicos usados na configuração dos tributos, perseguindo objetivos alheios aos meramente arrecadatórios, dá-se o nome de extrafiscalidade" [72].
Em verdade, o conceito do renomado tributarista adequa-se melhor à noção de extrafiscalidade promocional, que exploraremos mais adiante. Há, porém, também a chamada tributação extrafiscal proibitiva, cuja finalidade não é estimular comportamentos, mas justamente desestimulá-los. Por isso, cremos ser melhor o conceito firmado por Roque Antonio Carrazza:
"Extrafiscalidade é, portanto, o emprego dos meios tributários para fins não-fiscais, mas ordinatórios, isto é, para disciplinar comportamentos de virtuais contribuintes, induzindo-os a fazer ou deixar de fazer alguma coisa. A fazer, bem entendido, o que atende ao interesse público; a não fazer o que, mesmo sem tipificar um ilícito, não é útil ao progresso do país" [73].
É importante aqui ressalvar que se prefere falar em tributação extrafiscal, proibitiva ou promocional, do que em tributo extrafiscal, proibitivo ou promocional. É que, em essência, como adverte Paulo de Barros Carvalho, não há tributo puramente fiscal ou extrafiscal. As noções de fiscalidade e extrafiscalidade amalgamam-se num só tributo, embora seja possível reconhecer a prevalência de um dos elementos [74].
A dimensão finalista do tributo [75], observamos nós, denota um fenômeno mais amplo da realidade jurídica em geral: a funcionalização do Direito. De fato, hoje, está esgotado o paradigma da neutralidade do Direito, bem como de sua natureza estática. Toda ordem jurídica é arquitetada em cima de uma função, seja esta protetivo-repressiva, seja promocional. A primeira função é típica das ordens que desejam a manutenção do status quo. A segunda condiz com as ordens que buscam a reforma da realidade. No Estado que se pretende dalguma forma social, a função promocional do Direito deve ganhar maior espaço e importância, como já vislumbrara Norberto Bobbio em meados do século passado [76].
Está plenamente demonstrado que essa pretensa neutralidade, em verdade, esconde a opção pela conservação do estado presente das coisas. O Direito, isto é inegável, é espaço de luta. Esse espaço, porém, é regrado, é formatado pelas regras do jogo. Estas têm fonte no direito positivo e, muito em especial, na Constituição, local próprio em que devem ser buscadas as funções do Direito.
Essa funcionalização do Direito Tributário deve ocorrer por instrumento da extrafiscalidade. Não, porém, da extrafiscalidade tal como entendida tradicionalmente, mas sim como direcionada à efetivação dos valores jurídico-constitucionais [77].
No âmbito do direito ao meio ambiente, a função promocional é especialmente relevante, pois que, por sua estrutura interna, referido direito é exercido não somente em face do Estado, como também de toda a sociedade, tanto as pessoas jurídicas de direito públicos, quanto a pessoas jurídicas de direito privado e a pessoas físicas; tanto ao Estado quanto aos empreendedores e aos cidadãos comuns. Sendo todos devedores do dever geral de proteção ambiental, cabe ao Estado não somente prestar condutas, como também influenciar condutas a serem prestadas por todos. Por isso, em se tratando do direito difuso ao meio ambiente, mais ainda do que em relação aos direitos sociais e difusos em geral, a efetivação dos direitos constitucionais deve ser reforçada grandemente por métodos de intervenção indireta do Estado; em especial, a tributação.
Assim, as técnicas extrafiscais de tributação são instrumentos importantíssimos de estímulo à promoção não somente das metas constitucionais postas para a ordem econômica e social do Estado brasileiro [78]. De fato, a tributação assim empregada deve ser entendida como "um dos mais poderosos instrumentos da ação estatal sobre a economia" [79].
Voltando nossa atenção para a crise dos direitos fundamentais de que já falamos e para o problema da ausência de punição real dos atos ilícitos, deve-se atentar para o fato de que a proibição da conduta, criando hipótese de incidência de pena, não é a única forma de desestímulo ao fato social indesejável. Ao lado dessa punição, existe a tributação proibitiva. É o que explica Alfredo Augusto Becker:
"(O) Estado, para impedir ou desestimular determinado fato social, tem dois caminhos a escolher:
a) ou a regra jurídica que declare ilícito aquele fato social;
b) ou o tributo extrafiscal proibitivo.
Optando pelo segundo, a intervenção do Estado será indireta porque, mediante o tributo extrafiscal, aquilo que pode ser exigido juridicamente é só o tributo e este é, precisamente, o objeto secundário. Aliás, no tributo extrafiscal ''proibitivo'', a percepção do tributo contraria o objetivo do Estado, pois aquilo que o Estado realmente deseja não é o tributo, mas sim aquele reflexo econômico-social que resulta da circunstância dos indivíduos evitarem ou se absterem de realizar a hipótese de incidência do tributo ''proibitivo''" [80].
É importante destacar aqui que a tributação proibitiva não é medida adequada para qualquer forma de prejuízo ambiental. Há casos em que o fato ambientalmente indesejado deve ser reprimido veementemente, devendo a conduta que o realiza ser penalizada como ato ilícito. Nesses casos, a utilização de normas tributárias para o desestímulo da atividade é mesmo inconstitucional, devendo ser ela compreendida como ofensiva ao princípio da proibição de insuficiência [81].
De fato, o pressuposto da tributação é a presença de ato lícito no campo antecedente da regra-matriz do tributo. Ainda quando se aplica o princípio munus non olet para permitir a incidência de imposto de renda sobre o produto de crime, deve-se observar que o fato em si de auferir renda não é ilícito. Ilícita é a causa antecedente por meio do qual se auferiu renda, mas não esta em si. Assim, sempre que se estiver diante de ato ilícito, a conseqüência será a imposição de uma sanção penal, civil ou administrativa [82]. Como veremos a seguir, mesmo a tributação chamada de proibitiva incide sobre ato lícito; isto é, sobre atividade lícita, mas não neutra, e sim meramente tolerada pelo Estado.
Na outra face da crise, a da crise de prestação de atividades de interesse ambiental, a solução passa pela complementação da atividade material direta do Estado pela intervenção indireta na economia consistente na premiação dos agentes econômicos que decidem realizar atividades que gerem externalidades positivas, consistentes em benefícios ambientais. O instrumento dessa premiação, no âmbito tributário, é o que aqui estamos chamando de tributação promocional, também chamada de tributação negativa, por gerar redução da arrecadação [83].
Tanto a tributação proibitiva quanto a tributação promocional são formas de intervenção do Estado no domínio econômico por indução [84]. E tanto numa quanto noutra, se a tributação extrafiscal é guiada para a proteção de interesses sociais e ambientais, diz-se predominar não mais a fiscalidade e não mais a extrafiscalidade econômica, senão a extrafiscalidade socioambiental.
Demonstrando-se a impotência do Estado em promover, materialmente e por mão própria, o direito fundamental ao meio ambiente, bem como em punir, adequadamente, as atividades poluentes, surge como necessária uma atividade interventora suplementar no meio econômico, a fim de influenciar os agentes econômicos a adotarem opções e ações que vão ao encontro do interesse social e difuso, sem, contudo, obrigá-los formalmente por meio de penalidades. Para tanto, faz-se necessária uma ponderada limitação da liberdade econômica e da autonomia com os fins sociais e os bens jurídicos fundamentais que informam nossa ordem constitucional, como já explanamos antes.
A livre iniciativa é princípio da ordem constitucional econômica brasileira, devendo esta, não obstante, também buscar "assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social" (art. 170, caput, CRFB). Essa tensão entre liberdade econômica e justiça social reproduz na instituição, dentre nossos princípios da ordem econômica, da função social da propriedade (da qual decorre a função social da empresa) ao lado da livre concorrência (incisos III e IV do mesmo art. 170 da Lei Maior).
A solução dessa tensão leva em conta a atividade econômica de que se está diante. Por isso, adotando como parâmetro o interesse social e a necessidade de amparar os bens jurídicos fundamentais, que representam o conjunto básico demandado pela dignidade humana, podemos destacar quatro espécies de atividades econômicas:
(a) atividades incentivadas pelo Estado;
(b) atividades indiferentes frente ao Estado;
(c) atividades toleradas pelo Estado;
(d) atividades proibidas pelo Estado.
As atividades incentivadas são aquelas que concorrem para o bem-estar social e para a tutela dos bens jurídicos fundamentais e que, por isso, devem ser estimuladas ou mesmo encabeçadas pelo Poder Público. Como exemplo, temos a prestação de serviço de saúde por particulares.
Atividades indiferentes são aquelas que não se destinam, necessariamente, ao bem comum ou à dignificação do ser humano, mas que também não representam nenhum desvalor ao interesse social. Neste grupo está a maioria das atividades econômicas desenvolvidas.
Atividades toleradas são aquelas que contêm em si um desvalor social, mas com intensidade insuficiente para alcançar o grau de proibição. Por serem socialmente indesejáveis, essas atividades devem ser desestimuladas pelo Poder Público, por meio de tributação exasperada e de restrições administrativas. Não se trata de atividades "acolhidas" pelo Estado, mas tão-só "toleradas". O exemplo típico é a produção e comercialização de bebidas alcoólicas e de tabaco. Outro exemplo, mais pertinente ao presente estudo, é o desenvolvimento de atividades ambientalmente impactantes licenciadas, as quais, embora não sejam ilícitas, estão na "zona de tolerância ambiental" referida por José Marcos Domingues de Oliveira [85].
Por fim, atividades proibidas são aquelas incompatíveis com o interesse social e com os bens e valores jurídicos fundamentais e que devem, portanto, ser reprimidas pelo Estado, por meio de normas sancionadoras de ordem civil, administrativa e penal. É o caso da produção de drogas entorpecentes.
Das quatro espécies de atividades econômicas acima descritas, deve-se observar que a primeira demanda a adoção de tributação promocional por parte do Estado. À segunda corresponde a tributação meramente fiscal, sem importância extrafiscal. A terceira, porém, deve justificar a adoção de tributação proibitiva. A última, por fim, tendo como objeto atividades ilícitas, exclui a intervenção por meio do direito objetivo tributário, demandando, em geral, a incidência do direito objetivo penal.
Chamamos a atenção para o fato de que as atividades meramente toleradas pelo Estado geram custos que acabam sendo suportados por toda a população. Esses custos devem ser internalizados no preço dos produtos gerados por essas atividades por meio da chamada tributação proibitiva. No âmbito do Direito Tributário, esse é o mandamento que se atribui ao princípio do poluidor-pagador [86].
Essa tributação proibitiva tem como finalidade desincentivar atividades indesejadas e consiste em exasperar a carga tributária sobre a atividade econômica meramente tolerada. Colacionamos aqui a definição dada por Alfredo Augusto Becker:
"Tributo extrafiscal ''proibitivo'': é o dever preestabelecido por uma regra jurídica que o Estado utiliza como instrumento jurídico para impedir ou desestimular, indiretamente, um ato ou fato que a ordem jurídica permite" [87].
Segundo entendemos, a tributação proibitiva possui dupla finalidade: (i) imputar aos produtores e consumidores dos produtos nocivos os custos sociais e ambientais da atividade social e ambientalmente indesejada; (ii) desestimular a produção, a comercialização e consumo do produto nocivo.
Apesar da semelhança, esses dois objetivos não correspondem precisamente àqueles preconizados pela teoria do duplo dividendo. Para esta teoria, o primeiro dividendo seria a própria mudança de comportamento dos contribuintes, enquanto o segundo seria a desoneração de fenômenos econômicos positivos, como os gastos com folha de salários e investimentos, decorrente da mudança do quadro geral de tributação do Estado, a partir de reforma que tenderia não à alteração da carga tributária global, mas sim ao rearranjo das fontes de custeio, reduzindo a tributação distorciva. [88]
O primeiro dividendo da teoria acima citada é-nos caro, pois alcança o objetivo de proteção do meio ambiente. Todavia, o segundo, para efeito de tutela e efetivação do direito fundamental ao meio ambiente saudável, é indiferente. Isso não determina, porém, que seja ele descartado como fim político alheio à matéria ambiental.
A tributação das atividades econômicas toleradas (como a do tabaco, para fugir da questão ambiental) deve buscar repassar esses custos sociais para as empresas que desempenham essa atividade econômica e para os consumidores do produto socialmente indesejável. Sem essa tributação, a sociedade como um todo estará suportando esse custo, em benefício do lucro da empresa social e ambientalmente irresponsável.
Essa lógica de intervenção estatal por meio da tributação legitima, inclusive, a imposição de legislação infraconstitucional que exige, rigorosamente, o correto pagamento das obrigações tributárias principais e acessórias pelas empresas de dado ramo econômico (como ocorre, p. ex, com as empresas do ramo tabagista). A responsabilidade tributária – em sentido econômico – dessas empresas é condição para que se tolere a atividade econômica danosa. Se a entidade empresarial e os consumidores do produto não arcarem, por meio do pagamento de tributos, com os custos sociais que envolvem o consumo de tabaco (por exemplo), essa atividade que antes era indesejável passa a se tornar intolerável, não merecendo mais respaldo por parte do Estado.
Enfim, seja pela tributação proibitiva, adequada às atividades econômicas meramente toleradas, seja pela tributação promocional, adequada às atividades incentivadas pelo Estado, a extrafiscalidade socioambiental deve se fazer presente de modo amplo, de tal forma que a tributação extrafiscal socioambiental dirigida seja a regra, e não mais a exceção em nosso sistema normativo, respeitados, sempre, os parâmetros constitucionais.
4.2 A constitucionalidade da tributação extrafiscal socioambiental no Brasil
Nesse momento, há de se indagar se as razões aqui apontadas para a utilização da extrafiscalidade socioambiental devem ser acolhidas em nossa ordem constitucional.
Autores clássicos já reconheciam a compatibilidade do manejo da extrafiscalidade com o regime constitucional [89]. Se isso é válido com relação a propósitos econômicos, e se era válido em constituições anteriores, certamente também o será se a finalidade for social, humana, e tiver respaldo no princípio da dignidade humana, e se estivermos tratando da ordem jurídica inaugurada pela Constituição de 1988, cujo caráter social é inegável.
Entende nosso Supremo Tribunal Federal que a extrafiscalidade pode sim ter finalidade não-econômica e alcançar diversas finalidades sociais, desde que o princípio constitucional da livre iniciativa seja sopesado e, por meio do parâmetro da proporcionalidade, prevaleçam outros direitos, valores e princípios jurídico-constitucionais, como a saúde e o meio ambiente.
Deveras, as razões que acima expomos, entre outras, levaram o Supremo Tribunal Federal, em julgamento de ação cautelar (AC 1657/RJ [90]) que tratava do fechamento da American Virginia, empresa do ramo tabagista, a julgar plenamente legítima a tributação extrafiscal para a proteção do direito fundamental à vida e à saúde, permitindo, inclusive, o fechamento da empresa em caso de inadimplência generalizada das obrigações tributárias. Transcrevemos, aqui, trechos relevantes do brilhante voto do Min. Cezar Peluso;
"O Decreto-Lei nº 1.593/77 outorga exclusivamente aos detentores de registro especial na Secretaria da Receita Federal o direito de exercer atividade de fabricação de cigarros, cuja produção, como aduz o memorial da Fazenda, é meramente tolerada pelo poder público, que a respeito não tem alternativa política e normativa razoável. Sua função está em resguardar interesse específico da administração tributária no controle da produção de cigarros e que não é apenas de cunho fiscal-arrecadatório. Antes, a indústria do tabaco envolve, como é intuitivo, implicações importantes sobre outros atores e valores sociais, tais como os consumidores, os concorrentes e o livre mercado, cujos interesses são também tutelados, com menor ênfase, pela ordem constitucional.
A existência de normas tributárias com caráter não meramente arrecadatório suscita desde logo a questão de suas finalidades extrafiscais. (...)
Ao investigar a ratio iuris da necessidade de registro especial para a atividade de produção de cigarros, vê-se, logo, que provém de norma inspirada não só por objetivos arrecadatórios, senão também por outras finalidades que fundamentam a exigência jurídica dos requisitos previstos para a manutenção do registro especial, entre os quais se inclui o da regularidade fiscal.
(...)
Ademais, o caso é do que a doutrina chama de tributo extrafiscal proibitivo, ou simplesmente proibitivo, cujo alcance, a toda evidência, não exclui objetivo simultâneo de inibir ou refrear a fabricação e o consumo de certo produto. A elevada alíquota do IPI caracteriza-o, no setor da indústria do tabaco, como tributo dessa categoria, com a nítida função de desestímulo por indução na economia".
No mesmo sentido do voto do Min. Cezar Peluso, em que reconhece a constitucionalidade da tributação extrafiscal proibitiva da atividade tabagista, permitindo inclusive o encerramento da atividade econômica em caso de não-pagamento de tributos, foi o voto do Min. Gilmar Mendes. Este esclarece, porém, que o grau de intervenção do Estado deve ser proporcional à necessidade de defesa da saúde, do consumidor, do meio ambiente e de outros valores relevantes. Transcrevemos trechos interessantes de seu voto:
"É certo, não obstante, que a questão constitucional é deveras interessante. Tem-se um imanente conflito entre a liberdade de iniciativa e liberdade de concordância, como valores da ordem econômica, por um lado, e, por outro, a defesa da saúde e do consumidor como princípios justificadores da intervenção do Estado regulador.
Tenho como entendimento assentado que a liberdade de iniciativa não é liberdade absoluta, mas liberdade passível de ser condicionada pela ordem jurídica. Cabe ao Estado regulador estabelecer as normas que lastrearão o exercício da atividade econômica, sempre tendo em vista o bem-estar social.
A questão está em saber quando esta intervenção estatal reguladora da atividade econômica é adequada e necessária e se está justificada por imperativos de saúde pública, defesa do consumidor, valorização do trabalho humano, proteção do meio ambiente etc.; ou seja, se ela corresponde ao princípio da proporcionalidade.
(...)
No âmbito dessa atividade, os comprovados e graves danos à saúde pública causados pelo cigarro e por outros derivados do fumo, assim como a necessidade de um plus de proteção ao consumidor do tabaco, tendem a funcionar como uma espécie de justificativa geral para a intervenção estatal mais rigorosa".
A Constituição brasileira de 1988 é dirigente, no sentido de impor ao Poder Público a efetivação de uma dada realidade socioeconômica. Para a concretização desse programa, devem ser utilizados todos os poderes atribuídos aos órgãos de Estado, entre eles, a tributação extrafiscal. Nesse sentido, é o magistério de Roque Antonio Carrazza:
"Do mesmo modo, a Constituição, ao estatuir que as pessoas políticas devem (i) promover a ''dignidade humana'' (art. 1º, III), ''o bem de todos'' (art. 3º, IV), ''a saúde'', (art. 6º, caput, e 196, caput), ''a assistência aos desamparados'' (art. 6º, caput) e ''programas de assistência integral à saúde da criança e do adolescente'' (art. 227, § 1º); (ii) ''assegurar a todos existência digna'' (art. 170, caput); (iii) proporcionar seguridade social, mediante ações que garantam ''os direitos relativos à saúde'' (art. 194, caput); (iv) prestar assistência social, tendo por objetivos, dentro outros, ''a habilitação e a reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária'' (art. 203, IV); e (v) ''amparar as pessoas idosas, (...) defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida'', implicitamente exige que os tributos – aí compreendido o ICMS – venham ajustados a estes louváveis objetivos, que interessam à presente e às futuras gerações" [91].
Como se pode notar, a tributação extrafiscal é forma de intervenção do Estado na economia, por meio de indução. Como intervenção que é, significa restrição da liberdade econômica dos agentes de mercado. Portanto, com tal liberdade precisa ser ponderado o bem jurídico tutelado pela intervenção, a fim de que esta seja legitimada e validada constitucionalmente. Demais disso, a tributação extrafiscal também se mostra como restritiva do princípio isonômico. De fato, não há extrafiscalidade sem tratamento desigual de contribuintes, sem restrição do princípio da isonomia tributária [92]. Essa constatação, por si só, não deve afastar o instrumento extrafiscal. Também aqui é caso de ponderação.
As mesmas razões que legitimam a tributação extrafiscal proibitiva com finalidade socioambiental justificam, a fortiori, a tributação promocional, que consiste em gerar benefícios tributários para aqueles que realizam atividades geradoras de benefícios socioambientais. Essa tributação não se limita à criação de créditos financeiros premiadores das externalidades positivas; instrumentaliza-se, deveras, por meio de deduções na base de cálculo do tributo, bem como por meio da adoção de alíquotas privilegiadas para os contribuintes que adotaram a atividade prestigiada, ou mesmo por instrumento de isenções e imunidades (estas, necessariamente, criadas por emenda à Constituição).
Em verdade, numa economia de mercado, a tributação proibitiva e a tributação promocional acabam funcionando, ao menos na tributação dos entes empresariais, como faces de uma mesma moeda. De fato, sendo as pessoas jurídicas empresárias concorrentes entre si, o tratamento mais rigoroso de uma empresa mais poluidora (tributação proibitiva) acaba significando o favorecimento tributário de outra menos poluidora (tributação promocional), enquanto que a tributação favorecida (tributação promocional) de uma empresa que gera benefícios ambientais ocasiona prejuízo à empresa que não cria tais benefícios (tributação proibitiva).
Por fim, é importante afastar o preconceito de rejeitar a tributação extrafiscal ambiental com base na suposta constatação de que esta significaria "vender" ao empreendedor o "direito de degradar o meio ambiente". Não se trata disso. Como já expomos antes, há atividades que, embora contenham em si desvalor social, são toleradas pelo Estado, e não proibidas. No campo ambiental, isso é muito comum, porquanto quase todo empreendimento que utiliza recursos ambientais gera alguma forma de impacto ambiental. Este deve ser minimizado, mas não absolutamente proibido. A decisão sobre proibir ou permitir, com ressalvas, um impacto ambiental dá-se pelo órgão ambiental competente, no âmbito do processo de licenciamento, o qual deve ser precedido de estudo de impacto ambiental. Aqui temos uma típica hipótese de ponderação de bens e interesses no seio da Administração Pública [93]. Outro exemplo de ofensa ao meio ambiente que não é ato ilícito é a extração de madeira de área que não consiste em reserva legal, e em que é expedida pelo órgão competente a devida licença. Também aqui temos atividade econômica meramente tolerada pelo Estado. Nesses casos, não é possível cominar penas (sanções penais) pela realização da atividade, mas é possível (ou mesmo impositiva) a tributação extrafiscal proibitiva.
Se, diversamente, a conduta do agente ferir o cerne do bem jurídico tutelado e não for razoável entender por lícita a atividade, obviamente, a tributação proibitiva torna-se inadequada e vem a ser legítima a pretensão criminal contra o autor do fato. Se, nesse caso, o Estado, por meio de legislação, exclui a persecução criminal e maneja a tributação extrafiscal, estará incorrendo em inconstitucionalidade, por violação da proibição de insuficiência, que é uma das facetas do princípio da proporcionalidade [94].
Nesses termos, concluímos que não é qualquer atividade econômica ambientalmente impactante que permite o uso da tributação proibitiva. Somente aquela que for tolerada pela ordem jurídica pode ensejar tal forma de tributação extrafiscal. E, ainda assim, a tributação proibitiva ambiental, bem como a promocional, sendo restritivas da liberdade econômica e da isonomia tributária, deverão ser justificadas constitucionalmente por meio do método da ponderação, sujeito à prova da proporcionalidade.
4.3 A extrafiscalidade ambiental e os tributos ambientais
Como já assinalamos no decorrer deste estudo, chamamos de extrafiscalidade socioambiental o direcionamento da tributação por finalidades sociais e ambientais, e não econômicas ou fiscal. A extrafiscalidade socioambiental serve, como dissemos, à efetivação de direitos fundamentais sociais e difusos, como o direito à saúde, à educação, à moradia e ao meio ambiente. Todavia, quando quisermos nos referir especificamente à tributação dirigida pela finalidade de proteção do meio ambiente, falaremos em extrafiscalidade ambiental.
A extrafiscalidade ambiental deve ser entendida de forma ampla, mormente, quando tratamos de instrumento de efetivação do direito ao meio ambiente saudável. Nisso concordamos com o entendimento de Marcus de Freitas Gôuvea:
"De fato, é notório que efeitos extrafiscais podem ser alcançados com a operação de isenções, imunidades e incentivos. Porém, subsiste a possibilidade de que tais efeitos decorram de qualquer método exonerativo (como a redução de alíquota e da base de cálculo, a concessão de créditos presumidos, os programas especiais de tributação, os parcelamentos, as moratórias e programas como o REFIS)" [95].
A finalidade da tributação não é aumentar a arrecadação; ao contrário, quanto menor for a arrecadação, mais eficiente terá sido a norma tributária extrafiscal. Como bem defendem Fábio Fraga Gonçalves e Janssen Hiroshi Murayama, a finalidade da extrafiscalidade ambiental, em especial da tributação proibitiva, é progredir para o lado decrescente da Curva de Laffer [96]. Esta aponta graficamente a relação existente entre a variação da alíquota do tributo e a variação da arrecadação do tributo. Nessa curva, há o ponto ótimo, em que ocorre a arrecadação máxima. A partir desse ponto, o aumento da alíquota determinará diminuição da arrecadação. Isso se deve à menor ocorrência do fato jurídico tributário, o qual restou tolhido pela majoração de alíquota. Assim, p. ex., na tributação ambiental extrafiscal proibitiva, majorando-se a alíquota do tributo incidente sobre a atividade ambientalmente indesejada, esse fato resta desestimulado e, por obra de lei econômica, mais do que jurídica, passa a ocorrer em menor volume. Independentemente da vontade concreta do empreendedor, esse resultado ocorrerá por força da própria "mão invisível" do mercado, "mão" esta direcionada, por sua vez, pela "influência visível" do Estado. Eis uma realidade inevitável, a qual somente pode ser obviada pela ineficácia social da legislação e da administração tributária [97].
No que tange à tributação ambiental promocional, a arrecadação tributária relativa ao tributo também tende a cair. De fato, sendo estimulada a atividade econômica desejada, esta tenderá a ocorrer em maior volume e substituirá atividades indesejadas, que geram arrecadação. Logo, ocorrendo mais fatos econômicos que não geram arrecadação e menos fatos que geram arrecadação, o ingresso final de recursos será menor.
A noção de extrafiscalidade ambiental e de tributação ambiental ensejam o surgimento da expressão "tributo ambiental", também conhecido por "tributo verde". Assim, relacionando tributo à extrafiscalidade ambiental, diríamos ter um tributo extrafiscal ambiental. O conceito de tributo ambiental, porém, não pode ser alcançado com tanta facilidade, até mesmo porque não há exclusivamente extrafiscalidade ou fiscalidade em cada tributo. É o que advertia Antônio José da Costa [98] em obra de 1986, com forte na lição de Paulo Barros Carvalho, no sentido de que não existe propriamente tributo fiscal ou extrafiscal. Extrafiscal não seria o tributo, mas sim o intuito por meio do qual ele foi introduzido na ordem jurídica, ou a finalidade com a qual foi alterada sua base de cálculo ou sua alíquota. Em verdade, se pensarmos em tributo no sentido de obrigação tributária, a ressalva é correta. Todavia, se expressarmos por tributo a norma jurídica tributária, cremos poder chamá-la sim de fiscal ou extrafiscal, embora, na maioria dos casos, as duas finalidades se imbriquem. É que a noção de finalidade deve ser integrada à acepção da norma jurídica; isto é imposição científica reconhecida modernamente pelo fenômeno da funcionalização do direito, o qual já comentamos antes.
Dessa forma, a extrafiscalidade ambiental não pode ser utilizada para alcançar um conceito puro de tributo ambiental, mas somente um conceito impuro, amplo. É o que observamos da análise de diversos textos doutrinários. De fato, a expressão "tributo ambiental" pode ser concebida em sentido amplo e em sentido estrito. Extraímos da lição de José Marcos Domingues de Oliveira:
"Em sentido estrito, tributo ambiental significa um tributo novo cobrado em razão do uso do Meio Ambiente pelos agentes econômicos. Já em sentido amplo, tributo ambiental é um tributo tradicional ou ordinário adaptado de molde a servir aos esforços de proteção ambiental" [99].
Alinhado ao conceito dado por Domingues de Oliveira está a definição presenteada por Guilherme Doin Braga e Katiana Bilda de Castro:
"Existem [tributos verdes] em um sentido amplo ou estrito. Amplo quando um tributo ordinário, que integra permanentemente o sistema tributário, é adaptado de forma a servir aos esforços de proteção ambiental em face da utilização direta do meio ambiente; e estrito quando for tributo novo cobrado em razão do uso do meio ambiente pelos agentes econômicos em virtude de atos ou situações apenas indiretamente a ele conexos" [100].
Já o conceito do jurista português José Casalta Nabais é o seguinte:
"(É), hoje em dia, relativamente consensual a idéia de dividir dicotomicamente esses tributos em duas espécies, pelo que ou são tributos ambientais em sentido estrito, técnico ou próprio, que prosseguem uma finalidade extrafiscal incentivante (reine Lenkungssteuern), ou são tributos ambientais em sentido amplo, atécnico ou impróprio, que visam a uma finalidade reditícia (reine Umweltfinanzierungabgaben)" [101].
De modo compatível, mas não idêntico, com conceitos anteriores, a portuguesa Cláudia Dias Soares entende serem impostos ambientais, em sentido próprio, aqueles destinados à preservação ambiental, e, em sentido impróprio, aqueles destinados à recomposição ambiental [102]. Por sua vez, diz-nos o tributarista espanhol Pedro M. Herrera Molina, com base no Modelo de Código Tributário Ambiental para a América Latina, que, para que esteja presente um tributo ambiental, "el hecho imponible debe tipificar las actividades que ocasionan el daño ambiental o generan el gasto público ambiental" [103]. Tem-se aqui o conceito de tributo ambiental em sentido estrito, isto é, o tributo que incide sobre atividade poluente, de modo a desincentivá-la. Vê-se, aqui, que, em sentido estrito, o tributo ambiental seria sempre um "tributo proibitivo".
De fato, este último conceito parece ser o mais adequado para uma definição stricto sensu. Tributo ambiental – ou verde – deve ser entendido, em sentido estrito, como aquele que tem em sua hipótese de incidência um fato econômico negativamente impactante ao meio ambiente, devendo sua base de cálculo, por sua vez, quantificar esse fato indesejado. Como já dissemos antes, a extrafiscalidade ambiental não serve ao propósito de determinar o conceito de tributo puramente ambiental, visto que não há nenhum tributo puramente fiscal ou extrafiscal, sendo ambos elementos finalísticos presentes, em maior ou menor grau, em todos os tributos.
A extrafiscalidade ambiental, porém, serve para definir o conceito de tributo ambiental em sentido amplo. Neste lato sensu, toma-se por tributo ambiental aquele que é informado por finalidade extrafiscal ambiental, independentemente de incidir sobre atividade poluente ou ambientalmente indesejável. Aqui incluem-se os "tributos premiais", que visam ao incentivo de atividades ambientalmente benéficas ou responsáveis. Em geral, essa extrafiscalidade manifesta-se na alíquota do tributo, que é maior ou menor em razão da compatibilidade ambiental do fato econômico previsto na hipótese de incidência.
Como se pode perceber, o elemento definidor do tributo ambiental em sentido estrito é a hipótese de incidência, a qual é confirmada pela base de cálculo, enquanto que o elemento marcante do tributo ambiental em sentido amplo é sua alíquota, que é maior ou menor em razão não da hipótese de incidência geral, mas sim da qualidade do fato econômico que é previsto genericamente por esse elemento da regra-matriz.
Embora se possa pensar que o tributo ambiental em sentido estrito seja mais importante do que o em sentido amplo, essa ilação não é verdadeira. A introdução de externalidades positivas ambientais (que são efeitos socialmente positivos gerados pelo agente econômico sem a apropriação de seu resultado) nas atividades dos contribuintes somente pode ser operada por meio da tributação promocional, a qual se dá em tributos ambientais em sentido amplo. Já as externalidades negativas [104] (que são efeitos negativos marginais da atividade econômica não-contabilizados no processo produtivo como custo da empresa, acabando por resultar em custo social e ambiental) podem ser imputadas à empresa por meio de tributo ambiental em sentido estrito ou de tributo ambiental em sentido amplo. Noutros termos, podemos dizer que a tributação proibitiva (que incorpora à empresa as externalidades ambientais negativas) pode tanto ser introduzida por meio de tributo ambiental em sentido estrito, quanto por meio de tributo ambiental em sentido amplo, enquanto que a tributação promocional (que premia a externalidade ambiental positiva) só é introduzida por meio de tributo ambiental em sentido amplo.
Em verdade, interessa-nos mais os tributos ambientais em sentido amplo do que os em sentido estrito, porquanto permitem maior flexibilidade do Estado na atividade de influenciar os agentes a adotar decisões econômicas adequadas ao propósito de proteção do meio ambiente, compatibilizando-se esse interesse social e difuso com a liberdade individual do empreendedor, a quem ainda se reserva um campo de livre arbítrio. No âmbito desse conceito amplo, abrem-se mais possibilidades ao legislador, o qual, como bem lembram Fábio Fraga Gonçalves e Janssen Hiroshi Murayama, poderá aproveitar tributos já existentes para promover a tributação ambiental. É o que asseveram os referidos autores:
"O Poder Público poderá aproveitar tributos já existentes e introduzir na legislação específica um viés de extrafiscalidade destinado ao preenchimento da finalidade ambiental, até mesmo porque a tributação ecológica não deve representar aumento da carga tributária. A majoração das alíquotas em determinadas ocasiões deve ser contrastada com a adoção de benefícios fiscais para aqueles que passarem a agir com maior responsabilidade sócio-ambiental" [105].
Fala-se ainda em tributação ambiental também quando a exação é criada a fim de arrecadar receitas para a realização de projetos ambientais. Nesse sentido, a dupla de estudiosos acima citada assevera que a tributação ambiental pode atuar em dois campos: com fim extrafiscal ou com fim de arrecadação, naquilo que chamamos de "fiscalidade ambiental". Em verdade, acreditamos que a verdadeira tributação ambiental é aquela justificada pela extrafiscalidade ambiental, seja de forma proibitiva, seja de forma promocional. O financiamento de atividades reparadoras ou preventivas de danos ambientais pode ocorrer com a aplicação de normas financeiras e decorrer de quaisquer tipos de tributos, não se tratando de utilização da legislação tributária para a proteção do meio ambiente, senão da legislação financeira. Isso não impede, porém, que tributos verdadeiramente ambientais tenham sua destinação afetada a atividades ambientais. Isso pode ocorrer, mas nem é necessário, nem afeta a natureza jurídica da tributação.
Como já afirmamos, a internalização das externalidades negativas ambientais pode ser realizada por meio da tributação ambiental proibitiva, tanto com tributos "verdes" em sentido amplo quanto com tributos ambientais em sentido estrito. Essa internalização, além de desincentivar o fato econômico indesejado, funciona como mecanismo de efetivação do princípio ambiental do poluidor-pagador. Por força deste, os custos ambientais devem ser internalizados nos preços das mercadorias. O princípio do poluidor-pagador, como se percebe, parte da idéia de que o consumo é o grande responsável pelos fatos econômicos. Assim, os consumidores dos produtos que geram custos ambientais devem pagar por estes. Para tanto, esses custos devem estar integrados nos preços dos produtos, por meio da tributação.
Deve-se indagar, porém, que custos ambientais são esses. A resposta para essa indagação é dada por Fábio Fraga Gonçalves e Janssen Hiroshi Murayama:
"Há dois tipos básicos de custos associados ao meio ambiente: (i) o custo de se reparar uma lesão já perpetrada ao ecossistema; e (ii) o custo de se aprimorar determinado processo produtivo, com vistas a interromper a continuidade das lesões ambientais" [106].
De acordo com a lição acima transcrita, há dois custos ambientais básicos: o reparatório e o preventivo. Estes dois custos devem ser cobertos pela tributação ambiental proibitiva. Não se pode, porém, vincular o tributo ambiental e a internalização de custos ambientais com a idéia de uma fiscalidade ambiental. Deveras, não basta arrecadar receitas para anular as externalidades negativas ambientais, gerando, assim, a justiça econômica. É preciso, mais do que isso, desincentivar a própria ocorrência dos fatos ambientalmente negativos e incentivar a prática de atividades que gerem externalidades ambientais positivas. Aqui, deve-se lembrar que não estamos preocupados meramente em gerar justiça isonômica na distribuição dos ônus relativos aos custos ambientais. O propósito central é efetivar o direito fundamental difuso ao meio ambiente saudável, o qual demanda o desestímulo de qualquer atividade potencialmente lesiva ao meio ambiente. Por isso, mais importante do que o direcionamento do produto da arrecadação é a capacidade da tributação interferir nas decisões e atividades praticadas pelos agentes econômicos.
Enfim, expostas as linhas gerais da extrafiscalidade ambiental e dos tributos ambientais (em sentido amplo e estrito), chegamos ao momento de analisar as normas jurídicas vigentes hoje no Brasil que dão concretude à tributação extrafiscal ambiental, bem como examinar as propostas legislativas existentes e formular nossas propostas para uma integral reforma da legislação tributária do país, começando pela Constituição da República, para que possamos ter não um tributo, mas todo um direito positivo tributário "verde" no país.